Análise crítica do Decreto 4.564/79, que dispõe sobre o processo administrativo no Estado do Amazonas

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O presente trabalho busca realizar pesquisa analítica a cerca do processo administrativo tributário com foco no Decreto 4.564/79, que dispõe sobre o processo administrativo no Estado do Amazonas.

Introdução

O presente trabalho busca realizar pesquisa analítica a cerca do processo administrativo tributário no Estado do Amazonas. Sua importância verifica-se, pois, é justamente no processo administrativo, que existe a primeira possibilidade do contribuinte de frear ilegalidades cometidas pelo Estado, em sua pretensão arrecadatória desenfreada.

            O processo, entendido como o conjunto de procedimentos que possibilita a efetivação da pretensão de um direito, deve respeitar princípios constitucionais, como Direito a petição, Princípio da Ampla Defesa, Princípio do Contraditório, da Legalidade, do Devido Processo Legal, entre outros.

            Será pelo ato da autoridade estatal, em suas funções definidas em lei, que surgirá no mundo jurídico, através dos diversos tipos de lançamento (por homologação, por declaração e de ofício), os famosos Autos de Infração.

            É, no plano processual, que se insere a discussão do processo administrativo fiscal ao qual este trabalho pretende discutir. Para tanto será exemplificado e analisado o Decreto 4.564/79 do atual processo administrativo fiscal que regula o ESTADO DO AMAZONAS, e suas diversas alterações.

Considerações sobre o processo administrativo fiscal

De pronto devemos diferenciar o processo administrativo do judicial, afim de obter melhor circunscrição do objeto estudado. A distinção entre processo e procedimento será fundamental para análise do Decreto, tendo em vista a não distinção pelo diploma legal dos diferentes institutos, como veremos. Da mesma, forma a verificação dos princípios que norteiam o processo se faz fundamental.

Dejalma Campos, conceitua como procedimento e não como processo, seguindo a doutrina de Sundfeld, o  conjunto ordenado de ações  que busca a solução da pretensão do Estado e garante os princípios de defesa do contribuinte e assim, conceitua:

“O objeto do procedimento administrativo se identifica com a sanção de um ato administrativo,de natureza tributária,de caráter individual ou geral, que tem sua origem na própria administração publica,com a finalidade de  regular a relação jurídica existente entre ela e o contribuinte ou responsável, nesta instância” (pg.21)

O mesmo autor diferencia o procedimento administrativo do processo judicial, da seguinte maneira:

“O objeto do processo judicial tributário, reside na emissão de uma norma individual, de natureza jurisdicional, por um órgão independente da autoridade tributária e do contribuinte ou responsável. Por conseguinte, a norma individual, criando a razão de um processo tributário, estabelecendo caso concreto o exato alcance das obrigações determinadas pelas normas gerais de direito tributário substantivo.” (pg. 21)

Já Cleide Previtalli Cais,em seu livro O Processo Tributário, entende não ser um procedimento, mas sim um processo que ocorre em âmbito administrativo: ”assim, muito embora estudiosos tracem discussões quanto a abrangência da expressão processo tributário (...) as normas que regulam a discussão dos temas tributário sem esfera administrativa, resulta no adequado termo processo tributário.”(pg. 214)

O procedimento, seria, então entendido como aquele oriundo do simples pedido, sem pretensão resistida.

Nesta índole, cabe ressaltar as palavras de Hugo de Brito, doutrina a qual a aderimos, quanto a diferenciação entre procedimento e processo. Dita o doutrinador:

“Sempre que houver apenas uma série de atos tendentes a um resultado final considerada seu aspecto formal, mas que não tenha como finalidade a produção de  um resultado que deva ser legitimado pela participação das interessados (...) tem-se um mero procedimento.  Quando essa série de atos tiver um propósito de produzir um resultado  que deva ser legitimado pela participação dos interessados (v.g. uma lide, um conflito  o reconhecimento de direito(...)) tem-se além do procedimento do aspecto formal, também um processo propriamente dito.” (pg. 55)

 Assim, nos deteremos dentro da analise proposta, a diferenciação entre os institutos presente no diploma legal, de modo que nos ateremos apenas a parte processual.

             Importante ressaltar, para entendimento do processo administrativo que analisaremos a partir do próximo capítulo uma série de princípios aos quais a lei que regula o processo deve respeitar e concretizar.

            Cais, neste estudo elenca o Princípio da Legalidade (CF art. 5º II, e art. 37), da Impessoalidade (não discriminação na prestação de serviços), da Moralidade (probidade dos atos do administrador), Publicidade (CF art. 5º, incisos XXXIII, XXXIV, LX, LXXII), além da Eficiência, Finalidade, Motivação, Razoabilidade, Proporcionalidade.

            Contudo, a autora especifica princípios relacionados ao processo, que devem ser ressaltados: Coexistência De Curso De Processo Administrativo E Judicial, Admissibilidade De Recurso De Decisão Proferida Em Instância Administrativa Não Pode Ser Subordinada A Nenhum Condicionante, Valoração Da Multa Com Relação Ao Princípio Da Não Confiscatoriedade, Desconsideração  De Atos Ou Negócios Jurídicos Pela Autoridade Administrativa.

            Desta forma, podemos verificar o arcabouço e o contexto legal que se insere o processo administrativo fiscal, a fim de realizar a analise do Decreto 4.564/79, que regula o processo fiscal no Estado do Amazonas.

Descrição analítica do DECRETO Nº 4.564, DE 14 DE MARÇO DE 1979

O presente decreto nas Disposições Gerais e inicia a fase litigiosa em seu art. 3º como segue:

“Art. 3º Instaurada a fase contenciosa o Processo Tributário Administrativo desenvolve-se ordinariamente, em duas instâncias organizadas na forma deste Regulamento para instrução, apreciação, saneamento, julgamento e decisão das questões surgidas entre o sujeito passivo ou responsável por obrigações fiscais e a Fazenda Estadual, relativamente à interpretação e aplicação da legislação tributária.

Parágrafo único. A Instância Administrativa, iniciada pela instauração do procedimento contencioso, termina com a Decisão irrecorrível exarada no processo, ou o decurso do prazo para o recurso ou, ainda, a afetação do caso do Poder Judiciário.”

Insta ressaltar, que neste capítulo, há convalidação dos princípios da Ampla Defesa, como no disposto no art.13 que explicita que não será prejudicial o recurso que contiver o nome errado; e da Legalidade e Publicidade no seu art. 8º que proíbe o arquivamento do processo sem o devido despacho.

Segue o presente diploma, dispondo sobre atos, termos, nulidades e prazos no seu Capitulo II. Quanto aos prazos é importante dizer que eles estão dispostos em Seção específica e não espalhados como em muitas leis deste tipo.

Seu artigo 24, elenca os prazos, que para nosso estudo é importante ressaltar os relativos as obrigações do autuado,visto na prática é o que deve ser cumprido, pois as obrigações do Fisco geralmente extrapolam o prazo previsto pelo ”excesso de demandas”. No mais, parabenizemos a intenção do legislador ao determinar prazos para todos os atos da autoridade fiscal, em consonância com o principio da duração razoável do processo.

 Assim relevam-se:

“Art. 24. Os atos processuais devem obedecer, conforme o caso, aos seguintes prazos, sem prejuízo de outros especialmente previstos.

(...)

II - 10 (dez) dias, para:

f) pedido de reconsideração;

g) recurso de revista;

(...)

III - 20(vinte) dias, para:

a) interposição de recurso voluntário ao CRF;

b) o autuado pagar o débito fiscal após a decisão de primeira instância;

c) cumprimento da decisão de primeira instância.

(...)

IV - 30 (trinta) dias, para:

a) impugnação da exigência fiscal;

c) recolhimento do débito fiscal, que o autuado entender devido.”

            Não obstante, há prazo ordinário de 10 dias para as omissões do Decreto bem como a consideração de prazo razoável (pelo entendimento do julgador).

No Capitulo III trata dos recursos, parte substantiva desta analise, visto que é através de sua interposição que se garante a Ampla Defesa e o Duplo Grau de julgamento, e que, de fato, dá rito do processo administrativo fiscal.

Este capítulo inicia apresentando afigura do Consultor Tributário do Estado. Este é responsável, entre outras coisas por julgar em primeira instancia, aplicar penalidades, além de decisões processuais, como  requisitar documentos, verificar revelia e perempção, exarar despachos interlocutórios, conforme disposto no art. 29 do Decreto.

Os recursos de segunda instância estão dispostos na Seção II, em especial no art. 34, ipisis litteris:

Art. 34. Ao Conselho de Recursos Fiscais, com sede na Capital e jurisdição em todo o Território Estadual, órgão integrante da Secretaria da Fazenda, são cabíveis os seguintes recursos:

1 - recurso voluntário;

2 - recurso de ofício;

3 - recurso de revista; e

4 - pedido de reconsideração

O conselho citado será integrado por 6 membros, sendo 3 efetivos da administração, e 3 representantes dos contribuintes.

Segue o decreto especificando as condutas relativas a Defesa, Instrução Processual, Revelia, Intempestividade,  Pedido de Restituição e da Decisão de Primeira Instância.

O primeiro apontamento é que o pedido de restituição não é designado como mero procedimento, mas sim como processo administrativo, assim como outro procedimentos presentes no Decreto. O que revela uma visão peculiar sobre a devolução de créditos indevidos pelo Estado do Amazonas e um falta de distinção do legislador.

Necessário ressaltar que, não cabe qualquer tipo de recurso aos despachos interlocutórios (§ 3º do art. 86), que se aplica revelia na inércia do contribuinte quanto a notificação da infração, e a decisão sobre a defesa gera a possibilidade de interposição de 2 recursos constantes no próximo capitulo: Recurso Voluntário, quando mantido o Auto de Infração e indeferida a Defesa, e o Recurso de Ofício, quando o Auto de Infração não é mantido e a decisão é contrária a Fazenda.

 Contudo, pode-se dispensar o recurso de ofício se o valor da autuação for inferior a 3 UBAs.

Desta forma, o diploma legal discorre sobre os procedimentos de julgamento em segunda instância. O que vale dizer, em termos processuais, é que a decisão em segunda instância gera a possibilidade dos recursos do art. 109:

“Art. 109. Dos Acórdãos do Conselho de Recursos Fiscais são admissíveis os seguintes recursos:

I - pedido de reconsideração;

II - recurso de revista;”

Os recursos expostos no art.109, possuem características diferentes dos anteriores, pois tem restrições quanto a matéria, e não analisam o conjunto fático integralmente, como na primeira e  segunda instâncias.

O Pedido de Reconsideração deve versar sobre matéria não apreciada. Parecido como os Embargos de Declaração do processo civil. Seu conhecimento também é limitado nos termos do art. 113, ou seja decisão unânime, matéria já apreciada, ser a única interposição do recurso, além do prazo legal.

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Já o Recurso de Revista, este tem o objetivo de alinhar a jurisprudência do Tribunal, ou seja, só pode ser interposto se a decisão contrariar  acórdão proferido em processo de matéria idêntica.

Após este capitulo, há um específico sobre confissão de divida e parcelamento, que novamente gera estranheza, visto se tratar de procedimento, e não de matéria processual.

Por fim, há o lançamento fiscal no Capítulo VIII, que decorre dos critérios do a § Único do art. 137: “Os créditos a que se refere este artigo somente poderão constituir dívida depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei, pelo contrato, ou por decisão final proferida em processo administrativo regular.” E também dos procedimentos de inscrição na Dívida Ativa.

Há também, disposições sobre Consulta e Regime Especial, e recentemente, foi introduzida disposições sobre o processo eletrônico de acordo com o Decreto 32.977/12. Na prática este instituto cada vez mais comum, faz com que as petições e intimações sejam feitas por meio eletrônico.

Por fim, vale ressaltar que após a inscrição de Dívida Ativa e, ante o não pagamento do débito, a legislação prevê o procedimento para propor ação de Execução:

“Art. 179. São exeqüíveis as decisões:

I de primeiro grau, quando tornadas definitivas;

II de segundo grau, quando esgotar o prazo para os recursos estabelecidos neste Regulamento.”

 Conclusão

O Lançamento do débito fiscal interrompe o prazo decadencial do art. 174 do CTN.  Este lançamento propicia o inicio da fase litigiosa onde as partes discutem sobre a legalidade deste provável título executivo. Este título executivo apenas poderá ser expadido se acabada a fase litigiosa (art. 178) será proveniente da inscrição em Dívida Ativa:

“Art. 178. São definitivas, na esfera administrativa, as decisões de que não mais caiba recurso.”

Assim, podemos verificar que o presente Decreto possui a qualidade de respaldar atos juridicamente, e busca sempre o norte previsto constitucionalmente através dos princípios da Legalidade, com Contraditório e Ampla Defesa, vide a composição da 2ª instância. Vemos também as garantias expostas como no art.180, que segue in verbis:

“Art. 180. O Processo do Contencioso Tributário Administrativo é gratuito e não depende de garantia de qualquer espécie.

Parágrafo único. O impugnante poderá depositar, em dinheiro, a totalidade do valor atualizado, em litígio, nos termos da legislação vigente, para elidir a incidência, da correção monetária e juros de mora.”

É nobre também, a tentativa de regular os prazos da administração, em artigos presentes durante todo o diploma legal. Nobre, porém inócua.

Também se verifica a afirmação da Legalidade art. 182 que dispõe “supletivamente” das demais legislações existentes sobre o processo administrativo fiscal:

“Art. 182. Aplicam-se supletivamente ao Processo Tributário Administrativo as normas sobre Processo Administrativo Fiscal da União e as da Legislação Processual Civil e Penal.”

Registre-se que a presente legislação é notavelmente baseada na legislação federal, e que possui em seu bojo a normatização de procedimentos que essencialmente, conforme dita Cais, não compõe a chamada fase litigiosa, pois não há lide, entendida como confronto de interesses à luz da tutela jurisdicional administrativa.

Assim, podemos concluir que, compondo o Decreto 4.564/79, os procedimentos fazem com que caráter do diplomas e jamais próximo de um código estadual de normatização dos procedimentos e processo fazendário.

            Enfim, o fim do processo administrativo gera a possibilidade de execução do título, se vitoriosa as pretensões fiscais, e temos os seus termos em fase judicial.

Bibliografia:

            Segundo, Hugo de Brito Machado, Processo Tributário.  4ª Edição, São Paulo, ed. Atls, 2009.

Campos, Dijalma de. Direito Processual Tributário:prática administrativa e judicial. 5ª Edição, Ed. Rideel, 2010. São Paulo.

Cais, Cleide Previtalli. O processo Tributário. 7ªedição.Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2011.

DECRETO Nº 4.564, DE 14 DE MARÇO DE 1979 - Publicado no DOE de 14.03.79

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Sobre o autor
Leandro Romeo Peccequillo Freire

Bacharel em Ciências Sociais pela USP (2008), Bacharelando em Direito pelo Mackenzie (formatura em 12/2015), Estagiário na Dessimoni & Blanco Advogados

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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