DA EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA
Com espeque na Emenda Constitucional nº 37/02, relativamente à definição de dívida de pequeno valor para Estados e municípios, o Estado do Piauí, utilizando-se de sua competência derivada, aprovou a Lei 5250/02, estipulando o importe de cinco salários mínimos para as execuções diretas, fato este que manterá inalterada a atual morosidade no pagamento dos seus débitos, ante o ínfimo valor considerado para exclusão do sistema de precatórios.
Esclareça-se, por oportuno, que o ente Público ou a Fazenda Pública ou, ainda, as pessoas jurídicas de direito público interno tais como a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios, as autarquias e fundações públicas, gozam de privilégios quando do pagamento de suas dívidas, mormente aquelas advindas de sentenças judiciais transitadas em julgado e elevadas à condição de títulos judiciais (art. 584, I, CPC), cuja implementação se dá através do instrumento do precatório. [1]
Dentre as garantias e privilégios de que goza a administração pública, com relação aos seus bens, pode-se citar: a inalienabilidade, a imprescritibilidade e a impenhorabilidade, caracteres estes que resguardam as prerrogativas de ordem processual e material e preservam a intangibilidade dos bens públicos, salvo exceções previstas na legislação. [2]
Sob esta ótica, o art. 475, II do CPC não refoge a tal premissa, ante a exigência de que as sentenças de primeiro grau contra a Fazenda Pública não produzam efeitos senão depois do reexame necessário pelo tribunal ad quem, em virtude da obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição no processo de conhecimento, mesmo que não se ataque a decisão pela via recursal cabível, cuja condenação importe em obrigação de pagar quantia certa ou de fazer e não fazer. [3]
É cediço que pelo Dec-Lei nº 779/69 e legislação afim, os entes públicos foram beneficiados com várias prerrogativas processuais, tais como prazos em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer, isenção de depósitos recursais e dispensa de pagamento prévio das despesas processuais ou, ainda, da remessa ex officio para reexame do mérito das decisões de primeira instância. Com isto, ao se tratar da efetivação da tutela jurisdicional, isto é, da satisfação do direito reconhecido, através de um processo executório, ainda aqui se verifica a excessiva proteção à inadimplência do setor público.
Enquanto o devedor comum é citado para pagar o seu débito em 24 horas, sob pena de penhora (art. 652 do CPC), ao ente público era garantida a citação para apresentação de embargos à execução em 10 dias (CPC, art. 730), cujo interregno, juntamente com o prazo do art. 884 da CLT, foi alterado para 30 (trinta) dias, nos termos da MP 2.180-35, de 24.08.2001, que acrescentou o art. 1º-B à lei 9494/97. Não se pode esquecer, ainda, da observância à impenhorabilidade dos bens públicos, cumulada com a garantia dos recursos aplicáveis ao processo executório, elastecendo sobremaneira o trâmite processual que se arrasta por anos ou até décadas.
EXIGÊNCIA DO PRECATÓRIO REQUISITÓRIO
A aparente simplicidade do procedimento citatório não revela quão árdua para o credor se transforma a busca de uma execução efetiva, eis que nos meandros do processo executivo contra o ente público encontra-se a figura do precatório requisitório.
Sobre a obrigatoriedade de obediência ao referido instrumento, a Lei nº 9.081, de 19 de julho de 1995 asseverou em seu art. 1º. verbis: "O caput do art. 4º da Lei nº 8.197, de 27 de junho de 1991, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 4º. Os pagamentos devidos pela Fazenda Pública federal, estadual ou municipal e pelas autarquias e fundações públicas, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão, exclusivamente, na ordem cronológica da apresentação dos precatórios judiciários e à conta do respectivo crédito".
Em conseqüência, o pagamento dos débitos públicos sob a forma de precatório, um instituto que só existe no Brasil, só tem servido para acobertar escândalos e proteger a prodigalidade de chefes do Poder Executivo em todas as esferas, causando as mais variadas distorções no cumprimento do seu rito já quase inerte, além estar adstrito a excessivos atrasos, eterna defasagem que origina o precatório suplementar, além dos desvios de verbas destinadas ao seu pagamento, inclusive daqueles destinados a crédito de natureza alimentícia.
Sob a alegação de proteção aos interesses sociais em detrimento de interesses particulares, o poder público o transforma num instrumento desumano de busca da tutela jurisdicional apesar de, contraditoriamente apregoado como necessário à defesa do princípio da igualdade perante o erário, eis que obedece a ordem cronológica de apresentação com posterior inclusão no orçamento do ano subseqüente para seu efetivo cumprimento, desde que apresentado pelo Tribunal competente até 1º de julho de cada ano.
DO TRATAMENTO CONSTITUCIONAL
Atenta à busca do ideal de justiça social, aliada à vigilância dos doutrinadores e decisões judiciais reiteradas neste sentido, a legislação aos poucos procurou amenizar essa sofrível realidade, partindo do preterimento, dentro da ordem cronológica dos precatórios, ao pagamento dos créditos alimentícios, conforme art. 100, "caput" da CF/88.
Ato contínuo, com a EC-20/98, acrescentou-se o § 3º ao referido art. 100, excluindo-se do regime de precatórios os pagamentos de obrigações da Fazenda Pública Federal, Estadual ou Municipal, decorrentes de sentença judicial passada em julgado, definidas em lei como de pequeno valor, dispensando-os da expedição de precatório e possibilitando a execução direta.
Verificadas as eternas insurgências aos ditames legais, a partir da Emenda Constitucional nº 30/2000, o § 2º do art. 100 da CF/88 estabeleceu que os créditos abertos e dotações orçamentárias serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exeqüenda determinar o pagamento segundo as possibilidades de depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o caso de preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito, incorrendo em crime de responsabilidade, se, por ato omissivo ou comissivo, tentar frustrar a regular liquidação do precatório.
Posteriormente, alterou o § 3º, para se incluir também a Fazenda Pública "Distrital", além de inserir o § 4o ao art. 100, com o fim de autorizar o legislador ordinário a fixar valores distintos e estabelecer o pequeno valor conforme o poder econômico das entidades de direito público.
De toda sorte, a partir dos incontáveis debates em juízo, fincou-se copiosa jurisprudência tratando de matéria quanto à necessidade do procedimento administrativo como também em sentido oposto, denegando tal vinculação quanto ao crédito de pequeno valor, com base no art. 100, § 3º, da CF, que atualmente possui a seguinte redação:
"Art. 100. à exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
"§ 1º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários, apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente."(NR)
"§ 1º-A Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, fundadas na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado." (AC)
"§ 2º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exeqüenda determinar o pagamento segundo as possibilidades do depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o caso de preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito.
"§ 3º O disposto no caput deste artigo, relativamente à expedição de precatórios, não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor que a Fazenda Federal, Estadual, Distrital ou Municipal deva fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado.
Parágrafo incluído pela Emenda Constitucional nº 37, de 12/6/02:
§ 4º São vedados a expedição de precatório complementar ou suplementar de valor pago, bem como fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução, a fim de que seu pagamento não se faça, em parte, na forma estabelecida no § 3º deste artigo e, em parte, mediante expedição de precatório.Parágrafo incluído pela Emenda Constitucional nº 30, de 13/09/00 e
Renumerado pela Emenda Constitucional nº 37, de 12/6/02:
"§ 5º A lei poderá fixar valores distintos para o fim previsto no § 3º deste artigo, segundo as diferentes capacidades das entidades de direito público."Parágrafo incluído pela Emenda Constitucional nº 30, de 13/09/00 e Renumerado pela Emenda Constitucional nº 37, de 12/6/02:
"§ 6º O Presidente do Tribunal competente que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatório incorrerá em crime de responsabilidade." (grifei)
Salvo melhor juízo, o que se depreende da regra inserta no art. 100, § 3º da Constituição, é justamente a desnecessidade da providência de precatório para pagamento de débitos definidos como de pequeno valor, tese reforçada com a inserção do art. 86 ao ADCT que trata do pagamento de precatórios relativos a obrigações de pequeno valor, mas já emitidos antes de entrar em vigor o novo elemento normativo e que, mesmo assim, têm preferência sobre os de maior valor (§ 1º) e caso tenha havido parcelamento, poderão ser pagos em duas parcelas anuais (§ 2º), ficando os de natureza alimentícia com preferência para pagamento sobre todos os demais (§ 3º). Em relação à execução posterior à nova emenda, deve-se aplicar o art. 87 da ADCT, ou seja, sem a expedição de precatório, ante a definição do pequeno valor, consoante os termos do art. 100, § 3º da Constituição Federal de 1988.
DO PREENCHIMENTO DA LACUNA CONSTITUCIONAL PELO JUDICIÁRIO
Sob este aspecto, não obstante os Tribunais Superiores, tais como o STF e o TST adotarem a posição de submeter a execução de tais créditos aos ditames do art. 730 do CPC, já havia um movimento local e pulverizado nacionalmente no sentido de se aplicar sistemática e teleologicamente a execução direta quanto a dívidas de pequeno valor, podendo fazer uso do art. 100, § 3º da CF, c/c o § 1º do art. 17 da Lei 10.259/01 (Juizados Cíveis Federais), art. 449 da CLT, inteligência e aplicação analógica do art. 128 da Lei nº 8.213/91, Lei 10.099/00 e art. 186 do CTN, vez que já se poderia extrair de tais normas a definição do que seria crédito de pequeno valor.
À guisa da Lei 9099/95 em seu art. 3º, I e § 2º, estabeleceu-se o Rito Sumaríssimo na Justiça do Trabalho através da Lei nº 9957/00, dedicado a ações que versassem sobre créditos de até 40 salários mínimos. No entanto, em seu art. 852-A, parágrafo único, fez-se constar que "estão excluídas do procedimento sumaríssimo as demandas em que é parte a Administração Pública direta, autárquica e fundacional", o que não condiz com o caráter alimentar das verbas trabalhistas e com a tendência contemporânea, haja vista que a Lei nº 10.259/01, estabeleceu para a Administração Federal 60 salários mínimos como a definição do crédito de pequeno valor e que deve ser pago em até 60 dias, sob pena de seqüestro pela Justiça Federal, bem como a Lei 10.444/02, que alterou o art. 275 do CPC, fixando para o rito sumário esta mesma quantia.
No entanto, enquanto perdure a proibição de proceder ao rito sumaríssimo no processo de conhecimento quanto a tais entes, há reiteradas decisões dos juízes do Trabalho piauienses e confirmadas pelo Egrégio TRT da 22ª Região no sentido de imprimir eficácia e aplicabilidade deste rito pela via indireta ante a execução direta do crédito do Autor, sob o fundamento da integração normativa, fulcrada no art. 4º da LICC, art. 126 do CPC e art. 8º da CLT, estipuladores de que na ausência de norma reguladora de determinada matéria, o intérprete deve recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito. [4]
A DEFINIÇÃO DE PEQUENO VALOR PELA EC-37/2002
Restava, pois, estabelecer tais limites aos demais entes públicos, cuja lacuna passa a ser regulada pela espécie normativa em análise, ou seja, a Emenda Constitucional nº 37, de 12.06.2002.
Quanto aos precatórios já expedidos e que se enquadram no conceito de crédito de pequeno valor antes da entrada em vigor da referida norma, ou seja, antes de 12.06.2002, e que se encontram total ou parcialmente pendentes de pagamento, o novo texto constitucional ao acrescentar o art. 86 ao Ato das Disposições Constitucionais e Transitórias assim estabeleceu:
"Art. 86. Serão pagos conforme disposto no art. 100 da Constituição Federal, não se lhes aplicando a regra de parcelamento estabelecida no caput do art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, os débitos da Fazenda Federal, Estadual, Distrital ou Municipal oriundos de sentenças transitadas em julgado, que preencham, cumulativamente, as seguintes condições:
I - ter sido objeto de emissão de precatórios judiciários;
II - ter sido definidos como de pequeno valor pela lei de que trata o § 3º do art. 100 da Constituição Federal ou pelo art. 87 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
III - estar, total ou parcialmente, pendentes de pagamento na data da publicação desta Emenda Constitucional.
§ 1º Os débitos a que se refere o caput deste artigo, ou os respectivos saldos, serão pagos na ordem cronológica de apresentação dos respectivos precatórios, com precedência sobre os de maior valor.
§ 2º Os débitos a que se refere o caput deste artigo, se ainda não tiverem sido objeto de pagamento parcial, nos termos do art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, poderão ser pagos em duas parcelas anuais, se assim dispuser a lei.
§ 3º Observada a ordem cronológica de sua apresentação, os débitos de natureza alimentícia previstos neste artigo terão precedência para pagamento sobre todos os demais".(grifei).
Ao regular as situações já constituídas e pendentes de execução, o novo texto deu nova redação ao § 4º do art. 100 da CF/88 além de acrescentar os artigos 84 a 88 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e, no bojo do art. 87 do ADCT define, especificamente, o que é pequeno valor no âmbito da Administração estadual e municipal, cujo teor se transcreve:
...........................................................................................................
Art. 87. Para efeito do que dispõem o § 3º do art. 100 da Constituição Federal e o art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias serão considerados de pequeno valor, até que se dê a publicação oficial das respectivas leis definidoras pelos entes da Federação, observado o disposto no § 4º do art. 100 da Constituição Federal, os débitos ou obrigações consignados em precatório judiciário, que tenham valor igual ou inferior a:
I - quarenta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal;
II - trinta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.
Parágrafo único. Se o valor da execução ultrapassar o estabelecido neste artigo, o pagamento far-se-á, sempre, por meio de precatório, sendo facultada à parte exeqüente a renúncia ao crédito do valor excedente, para que possa optar pelo pagamento do saldo sem o precatório, da forma prevista no § 3º do art. 100. (grifo nosso).
Não obstante, há entendimento no sentido de que o texto é contraditório, e que referida emenda ainda prima pela exigência da emissão do instrumento do precatório, com o diferencial de que não haveria inclusão deste no orçamento mas pagamento direto do débito consignado, em respeito ao princípio da harmonia e separação dos Poderes, o que exige além do trânsito em julgado da ação a expedição do precatório como ato administrativo de competência do Presidente do respectivo Tribunal, doutrina a qual não me atenho, com sustentáculo nas razões acima expostas.
Estabelecida, então, de forma genérica, a definição constitucional da obrigação de pequeno valor junto a todos os entes federados, qual seja, 60 salários mínimos para a União (Lei 10.259/01), 40 para os Estados e 30 para os Municípios (EC-37/02). No entanto, tais valores somente persistem enquanto os legislativos estaduais e municipais não acorrerem à aplicação de sua competência residual e criarem suas próprias leis definidoras de tais importes em nível de administração local.
A reformulação do art. 100, § 3º da CF, permite até mesmo a renúncia ao excedente do crédito de pequeno valor, como forma de antecipar a implementação do crédito, situação prevista inclusive nos arts. 569 e 794, III do CPC quanto à desistência ou renúncia total ou parcial da execução, redundando na extinção do processo em curso, apesar do prejuízo pecuniário decorrente desta faculdade.
Ressalte-se, ademais, que não fosse este o entendimento, ou seja, a exclusão da dívida de pequena monta da emissão de precatório, desnecessária seria a definição do pequeno valor, pois figuraria tal instituto ineficaz e faria letra morta a vontade da norma na previsão constitucional.
EDIÇÃO DA LEI Nº 5250/02 PELO ESTADO DO PIAUÍ
Por seu turno, quanto à matéria discorrida, o Estado do Piauí, utilizando-se de sua competência suplementar, estabelecida no art. 24, § 2º da CF/88, editou a Lei estadual nº 5250, de 02.07.2002, estabelecendo, finalmente, o que considera como dívida de pequeno valor, a ser paga independentemente de precatório, conforme se depreende do art. 1º verbis: "para efeito do que dispõe o art. 100, § 3º, da Constituição Federal no âmbito da Fazenda Estadual, serão considerados de pequeno valor os débitos ou obrigações consignados em precatório judiciário que tenham valor igual ou inferior a cinco salários mínimos".
Nascida sob a névoa inebriante de um certame esportivo mundial arregimentado pelo Brasil e de um processo eleitoral em curso, não suscitou prequestionamentos, alterações, aplausos ou críticas. Erigiu-se à categoria de espécie normativa à míngua de apresentação prévia ao Judiciário local e, principalmente, à sociedade diretamente interessada nos seus preceitos.
Pôs-se em nosso ordenamento jurídico derivado e, não se podendo expungi-la sob a pecha de inconstitucional, não deixa calar a inexorável carga de injustiça com que se perfaz, apesar de arrimada no tecido da nova emenda constitucional.
Significa dizer que os piauienses foram preteridos no seu direito a um processo mais célere após a fixação deste ínfimo valor e, prejudicados sobremaneira na satisfação da tutela jurídica concedida, em decorrência do alcance restrito da presente norma que verteu do legislativo estadual. Some-se a isto o fato de que este Estado é considerado o mais pobre da Federação. Por conseguinte, não será surpresa se os seus Municípios, reconhecidamente pobres, estabelecerem como dívida de pequeno valor a quantia de um salário mínimo nacional, já que não poderão, "data venia", estipular valor a menor, a teor do art. 7º, IV da CF/88.
Destarte, conferida eficácia plena ao artigo 100, § 3º da Constituição Federal, resta a introdução de alterações na legislação orçamentária estadual, certamente sem ocasionar desordem no sistema legal e contábil-financeiro local após a aprovação da Lei nº 5250/02, a qual produzirá pouco impacto ao volume de débitos judiciais deste membro estatal, em virtude da exigüidade do valor definido para excepcionar a requisição do precatório, enquanto se aguardam futuros embates jurídicos dela decorrentes, que por certo virão.
Depreende-se, a priori, que o novo texto constitucional deixou ao talante dos entes públicos a faculdade almejada por qualquer executado, ou seja, a escolha da forma menos onerosa (art. 620, CPC) para tornar exeqüível ou "inexeqüível" a ordem judicial, tal como a lei ordinária editada pelo Estado do Piauí. Entretanto, não se pode olvidar que tal discussão permeará o Judiciário nacional após as definições de mesma natureza por Estados e Municípios em todo o país, ante os claros deixados pelo legislador federal.
Notas
01. NERY JUNIOR, Nelson & NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais, 1999.
02. DINIZ, Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro – 1º Vol. São Paulo. Ed. Saraiva, 2000.
03. TEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Processo Civil – Vol. II. Rio de Janeiro, Ed. Forense, 2001.
04. RDT – Revista do Direito Trabalhista. Brasília. Ed. Consulex - Ano 8 - nº 5 – maio de 2002.