Mudanças na instrumentalidade do processo na modernidade

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O seguinte trabalho tem como objetivo a abordagem sobre a legitimidade e capacidade das partes na ação processual de acordo com as novas ideologias sociais.

RESUMO

O seguinte trabalho tem como objetivo a abordagem sobre a legitimidade e capacidade das partes na ação processual de acordo com as novas ideologias sociais. O Direito Processual questiona e busca entender as aplicações do Direito nas relações sociais, transcendendo a dogmática jurídica, tendo como base as conotações éticas, sociais e politicas, que o legitima, dessa forma explanaremos aqui os trâmites do processo buscando definir o conceito de parte na modernidade.

Palavras-chave: Legitimidade e capacidade das partes. Ação processual. Conceito de parte na modernidade.

1 INTRODUÇÃO

O Direito nasce como resposta aos anseios da sociedade exercendo um papel de direção de condutas e de controle social, sendo ao mesmo tempo independente (não é mero reflexo social) e autônomo (traduz as determinações sociais pela sua própria lógica). Apesar da existência desse direito regulador, nem todos os conflitos são evitados e eliminados, a insatisfação de sujeitos conflitantes cria formas variáveis de eliminação de conflitos.

Hoje, diante de um conflito de interesses o Estado-juiz é chamado a intervir e se utilizando do ordenamento jurídico decide o que é justo perante as partes, porém, nem sempre foi assim. Houve uma clara evolução das soluções de conflitos, desde as sociedades mais primitivas até a era moderna, da autotutela a jurisdição.

Nas sociedades primitivas diante dos conflitos a força era usada como solução. Na ausência de um poder soberano e estatal os indivíduos solucionavam seus conflitos por si sós e dessa forma seguia-se a regra de que o mais forte sempre vence. Assim, na ausência de um juiz e se utilizando de força determinado individuo impunha sua decisão sobre as outras partes. Esse regime denomina-se autotutela, que como podemos perceber era uma forma injusta, precária e aleatória de solucionar os conflitos sociais. Valendo ressaltar que algumas formas de autotutela são admissíveis no direito atual como, por exemplo, legitima defesa e o estado de necessidade.

Outra solução possível era a autocomposição, em que a decisão resultava das partes e não da imposição de um interesse sobre outro. As partes resolviam entre si, sem a interferência de terceiros, suas diferenças. São três as suas formas: desistência, uma das partes abre mão de sua pretensão; submissão, aceitação da imposição feita pela outra parte; e transação, concessões reciprocas. Essa era uma prática justa e claramente efetiva e assim os indivíduos passaram a adotá-la cada vez mais, e pouco a pouco começaram a se utilizar da figura de terceiros para lhes ajudarem a solucionar seus conflitos.

Aparece assim a figura dos árbitros, pessoas de confiança de ambas as partes que analisavam as pretensões de cada um e apresentavam soluções plausíveis. Surge assim a imagem do que posteriormente viria a ser o juiz. Dessa forma e com a contínua afirmação e consolidação do Estado, esse passou a se impor diante das relações particulares, e com o seu suficiente fortalecimento surge à jurisdição.

Pela jurisdição, como se vê, os juízes agem em substituição as partes, que não podem fazer justiça com suas próprias mãos (vedada a autodefesa); a elas, que não mais podem agir, resta a possibilidade de fazer agir, provocando o exercício da função jurisdicional. E como a jurisdição se exerce através do processo, pode-se provisoriamente conceituar este como instrumento por meio do qual os órgãos jurisdicionais atuam para pacificar as pessoas conflitantes, eliminando os conflitos e fazendo cumprir o preceito jurídico pertinente a cada caso que lhes é apresentado em busca de solução. (CINTRA; DINAMARCO; PELLEGRINI, 2013, p.31).

O Estado consolidado passa a impor-se sobre os particulares e a eles impõe autoritariamente sua solução para os conflitos de interesses se utilizando para isso o processo (instrumento de jurisdição). Esse será minuciosamente detalhado no presente trabalho que busca analisar não apenas toda sua funcionalidade e eficácia, como, principalmente, sua aplicação na realidade social.

2 AÇÃO

Com o advento do Estado surge a função jurisdicional, em que o mesmo impõe seu poder para solucionar os conflitos sociais. Assim, normas de conduta passam a ser criadas como forma de garantir o cumprimento dos deveres e obrigações. Surge assim o Direito substancial e o Direito processual.

Ao conjunto dessas normas de valoração de condutas sociais, visando à proteção dos interesses considerados essenciais a manutenção de uma dada formação social cuja aplicação é garantida, em última instância, pelo aparelho coativo do Estado, é o que chamamos de direito substancial. (A. ROCHA, 2002, p. 36)

Uma sociedade para se manter existente e pacífica precisa de uma ordem, ordem essa no sentido de valores comuns, em que os indivíduos se organizam e vivem de acordo com os princípios a eles instituídos. O direito, portanto, é um dos meios pelos quais o Estado mantem essa ordem social, impondo a todos os deveres e obrigações comuns e garantidores da vida em sociedade.

Na maioria dos casos os indivíduos aceitam essas normas e as põe em prática como medida de valor de suas condutas, porém, às vezes os interesses dos indivíduos se chocam com as mesmas e surge assim um conflito de interesses. Dessa forma, o Estado, ao falhar na sua função de manter a ordem social deve agir para solucionar tal conflito, e assim nos surge o Direito processual, que nos dita os órgãos responsáveis pela solução desses conflitos, quais os procedimentos a serem seguido, assim como os direitos e deveres das partes envolvidas e do juiz, responsável pela determinação de uma solução plausível.

O direito processual é, justamente, o conjunto das normas jurídicas que dispõem sobre a constituição dos órgãos jurisdicionais e sua competência, disciplinando essa realidade que chamamos de processo, e que consiste numa série coordenada de atos de vontade tendentes à produção de um efeito jurídico final, que, no caso do processo jurisdicional, é a decisão e sua eventual execução. (A. ROCHA, 2002, p.37)

É diante dessas normas que surge o direito de ação. Cabe ao Estado essa função de solucionar os conflitos surgidos na sociedade, de acordo com a norma vigente, e para isso basta que os indivíduos, detentores desse direito fundamental (ação) provoquem a maquina jurisdicional para que essa garanta a proteção dos direitos violados. Assim, esse direito, que trata sobre dignidade humana e não cidadania é um direito de todos os indivíduos, incondicionalmente. É de todos o poder de provocar a atuação jurisdicional do Estado em favor de suas pretensões.

Sendo um direito (ou poder) de natureza pública, que tem por conteúdo o exercício da jurisdição (existindo, portanto, antes do processo), a ação tem inegável natureza constitucional (Const., art.5º, inc. XXXV). A garantia constitucional da ação tem como objeto o direito ao processo, assegurando às partes mão somente a resposta do Estado, mas ainda o direito de sustentar suas razões, o direito ao contraditório, o direito de influir sobre a formação do convencimento do juiz – tudo através daquilo que se denomina tradicionalmente devido processo legal (art.5º, inc. LIV). [...] (CINTRA; DINAMARCO; PELLEGRINI, 2013, p.285).

2.1 Elementos, condições e classificação da ação.

  Ao se ter o conhecimento de que ação é o direito/poder de pedir ao Estado a prestação de sua atividade jurisdicional, se faz agora a abordagem dos elementos, condições e possíveis classificações dessa. São elementos da ação as partes, o Estado-juiz e o objeto, mas se utilizando da doutrina tradicional, aqui os classificaremos: as partes, a causa de pedir e o pedido.

Está presente no art.2º do Código de Processo Civil que: “nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e formas legais”. Assim sendo, as partes (autor e réu) são legalmente elemento primordial da ação. O autor, sujeito ativo, é aquele que pede em seu nome, ou em cujo nome um terceiro, seu representante legal, pede a prestação jurisdicional. Enquanto o réu, sujeito passivo, é aquele que se vê envolvido pela prestação pedida. Vale ressaltar que as partes estão sujeitas à autoridade do juiz e as normas processuais. E que em um processo penal, as partes são o Ministério Público, como sujeito ativo, e o acusado, sujeito passivo.

A causa de pedir, como já diz em seu próprio nome, são as razões que levaram determinado individuo a pedir a prestação jurisdicional, trata-se da devida explicação das causas, dos motivos que levaram o autor a considerar que seu direito foi lesado. Por mais que esse elemento seja autoexplicativo, é considero o mais complexo dos três, pois há uma dificuldade quanto o que precisamente é a causa do pedido, sobre qual é a real pretensão do autor. Seguem duas teorias, a da individuação – a causa de pedir se configura pelas razões jurídicas determinantes do pedido – e a da substanciação – a causa de pedir consiste na exposição dos fatos ditos pelo autor como constitutivos da situação jurídica, adotada pelo Brasil.

Não haveria ação jurisdicional sem um pedido. Esse provimento poderá ter natureza cognitiva – julgamento da pretensão deduzida em juízo pelo autor –, natureza executiva – medida em que o juiz realiza os resultados através da vontade concreta dos direitos – e também pode ter natureza cautelar – que resguarda determinado direito da parte contra possíveis desgastes do tempo. Cada pedido refere-se a determinado objeto, bem da vida, assim, há uma grande variedade de pedidos, que se diferem por seus objetos, gerando ações distintas.

Com os devidos elementos da ação, meio pelo qual se provoca a atividade jurisdicional, nos é possível requerer esse direito. Porém, o Estado só se dispõe a exerce essa atividade se a situação jurídica descrita no processo preencher alguns requisitos, condições da ação. Ou seja, o Estado antes de julgar a causa verifica se a pretensão requerida é possível diante do ordenamento jurídico, independente do resultado dessa, para isso é necessário o preenchimento das condições da ação, pois essas legitimam a atividade jurisdicional.

Embora abstrato e ainda até certo ponto genérico, o direito de ação pode ser submetido a condições por parte do legislador ordinário. São as denominadas condições da ação (possibilidade jurídica, interesse de agir, legitimação ad causam), ou seja, condições para que legitimamente se possa exigir, na espécie, o provimento jurisdicional. A exigência da observância das condições da ação deve-se ao principio de economia processual: quando se percebe, em tese, segundo a afirmação do autor na petição inicial ou os elementos de convicção já trazidos com ela, que a tutela jurisdicional requerida não poderá ser concedida, a atividade estatal será inútil, devendo ser imediatamente negada. Mas ainda que a resposta do juiz se exaura na pronúncia de carência da ação (porque não se configuram as condições da ação), terá havido exercício da função jurisdicional. [...] (CINTRA; DINAMARCO; PELLEGRINI, 2013, p.288).

Determinados pedidos não podem ser apreciados pelo Poder Judiciário por não serem protegidos pelo ordenamento jurídico. Logo, o juiz só poderá oferecer a prestação jurisdicional se a pretensão requerida estiver de acordo com as normas gerais. Um exemplo muito citado é o divorcio, existem países que não aceitam essa prática, logo, é impossível o pedido jurídico para declarar as partes divorciadas. Essa condição é a possibilidade jurídica do pedido, e está diretamente relacionada à causa de pedir, pois é pela avaliação do pedido do autor que será afirmada ou não a proteção do ordenamento jurídico ao bem requerido.

A condição do interesse de agir se sustenta na ideia de que o Estado, mesmo que tenha interesse em exercer a jurisdição, já que essa é garantidora da harmonia social, só deve acionar a máquina jurídica se um resultado útil for extraído de tal ação. Ou seja, a prestação requerida sempre deve ser necessária – acionada diante da impossibilidade de se alcançar determinada pretensão sem interferência do Estado – e adequada – o provimento requerido deve ser apto a dar uma resposta, a corrigir, as queixas do autor.

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O art. 6º do Código de Processo Civil expressa: “ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quanto autorizado em lei.” Esse artigo se refere à condição de legitimidade ad causam, em que se considera titular da ação apenas o sujeito que se diz titular do direito requerido juridicamente, sendo o demandado apenas o sujeito titular da obrigação correspondente, aquele que está envolvido pela ação requerida.  Essa classificação é um tanto quanto fechada e acabava por interferir no acesso ao Poder Judiciário, assim a Constituição Federal ampliou os limites de tal norma, implantando novas formas de ação com sujeitos legítimos variados, como, por exemplo, a ação civil pública em defesa do meio ambiente e dos direitos dos consumidores, como cita Ada Pellegrini (2013, p.290).

A ausência de qualquer uma dessas condições leva a carência da ação, pois o autor ao faltar com um desses requisitos não exerce direito seu poder de ação e assim se torna impossível à apreciação do pedido pelo juiz, valendo ressaltar que a ação não é valida, porém, a atividade jurisdicional é ativada e exercida, já que o juiz vem a declarar a carência da viabilidade de ativação de determinado processo.

Toda ação implica em um pedido de provimento, esses provimentos se diferenciam entre si pelo seu objeto, e com base nesse elemento se classificam as ações. Temos assim a ação de conhecimento e ação executiva. As de conhecimento são aquelas em que o órgão jurisdicional é chamado para conhecer os fatos e argumentos citados pelas partes, para que assim possa julgar quem tem razão, com base nas normas estabelecidas pelo ordenamento jurídico. Esse procedimento se dá em três etapas: conhecimento dos fatos, julgamento desses com base no ordenamento, e determinação das consequências. Assim sendo, diante da variedade de provimentos desse tipo, as ações de conhecimento se subdividem em: ações meramente declaratórias, ações condenatórias e ações constitutivas.

A ação executiva trata da fase executiva do processo onde o autor tem o poder de pedir ao Estado a realização efetiva, por meios coativos, das decisões contidas na sentença. Essa ação busca a satisfação do autor, que busca a aplicação daquilo que foi decido no processo, é a realização prática da resposta dada a prestação, mediante o emprego de força física (coação), apenas se necessário ou em ultimo caso, ou pagamento através da desapropriação dos bens do réu.

2.2 Capacidade das partes

As partes, como já vimos, são aqueles que detêm o poder da ação (sujeito ativo) e os que são envolvidos por essa (sujeito passivo), são os principais sujeitos parciais do processo. Esse é um conceito tradicional e simplório, porém, muito ainda se tem para analisar sobre as partes, como por exemplo: quem pode ser parte, a capacidade das mesmas, intervenção de terceiros etc.

Como já citado, qualquer pessoa pode ser parte no processo. Qualquer individuo pode se figurar como sujeito de uma relação jurídica, tanto ativa quanto passivamente. Além disso, pessoas jurídicas também podem fazer parte dessas relações, já que são reconhecidas por lei como sujeitos de direito e além delas, algumas organizações também exercem esse papel, pois para fins processuais são tratadas como pessoas jurídicas, logo, sujeitos de direito.

O título II do Código de Processo Civil, das Partes e dos Procuradores, do art. 7º ao 13º trata sobre a capacidade processual.  Sabemos que alguns pressupostos são necessários para o desenvolvimento do processo, sendo um deles a capacidade. Capacidade é a aptidão que a parte deve ter para exercitar seu poder jurídico, para que possa por si manifestar sua vontade. Essa capacidade se relaciona com a estabelecida e utilizada pelo Direito Civil: 0 a 16 anos – absolutamente incapaz (precisa de representante); 16 aos 18 anos – relativamente capaz (assistido pelo poder familiar); 18 anos em diante – absolutamente capaz.

A capacidade pode ser plena, quando o sujeito exerce seu poder jurídico com total autonomia, e relativa, quando ele precisa de assistência ou autorização das pessoas indicadas por lei, como, por exemplo, os sujeitos menores de 16 anos (assistência parental ou tutela), os deficientes mentais, os ébrios e toxicômanos, etc. Valendo ressaltar que nesses casos o representado continua sendo a parte e não o representante.

Há também a possibilidade de pluralidade de pessoas, em um ou ambos os polos conflitantes da relação jurídica processual. A isso se da o nome de litisconsórcio, em que duas ou mais pessoas, em conjunto, podem tanto pedir em seus nomes a prestação jurisdicional do Estado quanto serem a parte a quem é pedida a prestação. É, portanto, como nos cita José A. Rocha (2002, p. 248): “a pluralidade de pessoas desempenhando a conduta de parte, quer como autor, quer como réu, ou como autor e réu, simultaneamente”.

Art.46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

I – entre elas houver comunhão de direitos ou obrigações relativamente à lide;

II – os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;

III – entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;

IV – ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito. (BRASIL, Código de Processo Civil, Vade Mecum, 2012).

Embora já esteja integrada em um processo a relação processual comum, juiz-autor-réu, há a possibilidade da intervenção de terceiros que possam vir a ampliar tal relação, através de acréscimos ou substituição de uma das partes. Em um processo civil essa intervenção pode se dar de quatro formas distintas: assistência – ingresso voluntário para ajudar uma das partes; oposição – ingresso voluntário para obtenção do bem que está sendo contestado pelas partes; denunciação da lide – uma das partes traz o terceiro ao processo para que esse se responsabilize da sentença; e nomeação à autoria – o réu, se declarando parte ilegítima, indica o autor como parte legitima da acusação.

3 ATOS PROCESSUAIS

Há uma visível distinção e conexão entre os termos processo e procedimento. Processo, etimologicamente, como nos cita Ada Pellegrini (2013, p. 309), significa marcha avante ou caminhada, e por isso foi entendido muito tempo como a simples sucessão de atos processuais. Porém, o que se percebe é que seu significado ultrapassa isso, processo não é apenas a sucessão de atos, mas também a relação desses atos e a relação dos seus sujeitos.

Procedimento é o meio pelo qual se desenvolve e termina o processo, é sua realidade formal. Entende-se assim que é o meio pelo qual a lei indica os atos e formas da ordem processual. Nesse contexto que analisaremos os atos processuais, que são exatamente os procedimentos, os meios pelos quais se dá o processo.

Processo é conceito que transcende ao direito processual. Sendo instrumento para o legítimo exercício do poder, ele está presentes em todas as atividades estatais (processo administrativo, processo legislativo) e mesmo não estatais. [...]

Terminologicamente é muito comum a confusão entre processo, procedimento e autos. Mas, como já se disse, procedimento é o mero aspecto formal do processo, não se confundindo conceitualmente com este; em um só processo pode haver mais de um procedimento (p. ex., procedimentos em primeiro e segundo graus). [...] (CINTRA; DINAMARCO; PELLEGRINI, 2013, p. 310).

Todo processo é resultante de dois componentes: a relação processual e o procedimento. Esses componentes se completam e se combinam e através de uma série de sucessões desenvolvem o processo até que chegue ao seu fim, a execução, sentença, medidas cautelares. As relações processuais são as posições jurídicas ativas e passivas que se constroem e se sucedem de acordo com os eventos processuais.  Os procedimentos são os atos processuais. Esses são interdependentes e interligados entre si, cada um pressupõe o antecedente formando uma ligação que tem como consequência o processo em si.

A ligação entre relação processual e atos processuais é que são os diversos sujeitos do processo que praticam os atos processuais, esses têm diversos significados e efeitos no desenvolvimento da relação processual. Assim sendo, se classificam os atos processuais em: atos processuais do juiz, das partes e atos simples e atos complexos.

Os provimentos e os atos reais são duas categorias de atos processuais cabíveis a atividade do juiz no processo. Os pronunciamentos, verbais ou escritos, do juiz são os provimentos de um processo. Ele tem o poder de tomar decisões sobre as pretensões a ele apresentadas, determinando as partes devidas providencias. Esses provimentos podem ser finais, em que o juiz decide a causa não podendo mais se pronunciar sobre a mesma (salvo casos especiais previstos em lei), ou interlocutórios, que são os pronunciamentos feitos pelo juiz ao longo do processo, sem que dê fim a este.

Já os atos reais ou materiais não tem caráter de resolução, são aqueles que realizam inspeções, investigações em pessoas ou coisas, ouvem alegações das partes, etc. (instrutórios), e também podem ser atos de documentação, que se refere a rubricar os autos do processo e a folha final. Existem também atos dos auxiliares da Justiça, que são os atos de movimentação do processo, da documentação, comunicação e execução do mesmo.

Os atos postulatórios, dispositivos, instrutórios e reais são os atos processuais das partes, em que os três primeiros se referem à vontade dessas enquanto o ultimo a suas condutas. Os atos postulatórios são aqueles em que a parte pleiteia o provimento jurisdicional, faz seu pedido estimulando assim o exercício da jurisdição. Atos dispositivos já vêm a ser aquele em que se abre mão de determinada posição jurídica ou da própria tutela jurisdicional. Já os atos instrutórios são os de convencimento do juiz, em que as partes se utilizam de seus argumentos para convencer o juiz de suas razões. Os atos reais, como já citado, se referem às condutas das partes, trata-se do pagamento dos custos dos processos, da presença nas audiências, da apresentação dos documentos, prestação de depoimentos, é a participação física das partes no processo.

A maioria dos atos processuais se exaure em uma única conduta, é o caso da demanda inicial, citação, sentença, contestação, que são os atos processuais simples. Mas além deles, existem os atos complexos, que representam vários atos que em conjunto tem uma finalidade em comum, trata-se especificamente da audiência e da sessão. A audiência é o encontro, a reunião, do juiz com as partes, com o Ministério Público, advogados etc., é o momento em que se apresentam as provas, as conclusões dos peritos, as testemunhas e as alegações finais dos advogados.

Já a sessão é a reunião dos órgãos colegiados de jurisdição, em que os advogados e representantes do Ministério Público são ouvidos e a discussão e julgamento da causa é passada para os magistrados. Essas reuniões ocorrem em dias determinados da semana, sem distinção de um processo em particular, como no caso da audiência.

3.1 Instrumentalidade do Processo

Como já explicado acima, o Estado possui a função de zelar pela pacificação social, a qual se alcança através da resolução de conflitos por meio da legislação e jurisdição. Desse modo percebemos que o processo é um instrumento utilizado para a efetivação da justiça, conciliando as divergências existentes na sociedade, possuindo sempre como base os seus princípios. Ada Pellegrini, no seu livro Teoria Geral do Processo, entende a instrumentalidade do processo como sendo:

Falar em instrumentalidade do processo, pois, não é falar somente nas suas ligações com a lei material. O Estado é responsável pelo bem-estar da sociedade dos indivíduos que a compõem: e, estando o bem-estar social turbado pela existência de conflitos entre pessoas, ele se vale do sistema processual para, eliminando os conflitos, devolver à sociedade a paz desejada (2013, p.50).

Portanto ao possuir função precípua de garantir o bem-estar social, deve o Estado garantir aos indivíduos da sociedade a possibilidade de requerer a tutela jurisdicional para a defesa de seus direitos, sendo esse considerado a parte ativa do processo e a sua parte passiva é a pessoa contra quem ou em face de quem se pede essa prestação.

Falar da instrumentalidade nesse sentido positivo, pois, é alertar para a necessária efetividade do processo, ou seja, para a necessidade de ter-se um sistema processual capaz de servir de eficiente caminho à “ordem jurídica justa”. Para tanto, não só é preciso ter a consciência dos objetivos a atingir, como também conhecer e saber superar os óbices econômicos e jurídicos que se antepõem ao livre acesso à justiça.(Ada Pellegrini, 2013, p.50)

3.2 Influência do avanço da sociedade

O Direito processual, como já visto, garante a possibilidade de se utilizar a tutela jurisdicional em seu interesse para a defesa de um direito violado, sendo hoje um direito subjetivo que garante tal prerrogativa, apenas necessitando de legitimidade, interesse e capacidade.  Essa concepção de ação atual se difere da antiga que confundia a ação com o próprio direito material e hoje em dia já possui uma nítida distinção dos dois, existindo uma grande ênfase na problemática da ação quanto aos requisitos necessários para a aquisição de tal.

No presente Código de Processo civil no seu artigo 3° e 6° discorre exatamente sobre quem pode entrar em ação para a invocação da função jurisdicional: ”Art.3° Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade. Art.6° Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.” Por meio disso se percebe uma dificuldade que acaba por ser gerada pela impossibilidade de entrar em ação na falta de legitimidade, em que hoje em dia se encontra diversas situações que o interessado, o legítimo para invocar o direito da ação, não está em condição que possa realizar tal, seja por problemas de saúde, ou até por não ser considerado como legitimo para tal, como nos casos de adoção, que será explanado mais adiante.

De um modo geral, a doutrina entende que o sujeito legitimado para promover a ação é o titular do direito que se faz valer em juízo, e o legitimado para ser réu, ou seja, para sofrer os efeitos da ação, é o sujeito passivo desse direito. (A. ROCHA, 2002, p.194).

Por meio disso se percebe uma dificuldade para o provimento jurisdicional pelas condições da ação, mais especificamente a legitimidade. A falta de legitimidade resulta em ações improcedentes onde o juiz declara a inexistência do direito posto em juízo sendo necessária também a existência de um direito violado ou ameaçado de violação (interesse de agir) para poder requerer a proteção do Estado.

Pelo Código de Processo Civil se percebe no seu art. 6° a impossibilidade de requerer proteção judicial de direito alheio salvo quando autorizado por lei, porém não o legislador não tem como prever certas modificações na sociedade que necessitariam de normas especifica, e essa falta de normas em matérias específicas possuem reflexo direto no interesse de agir e na legitimidade nas condições da ação. Um exemplo disso seria as relações homoafetivas que desde 2011 ganharam direitos, como a possibilidade de casamento civil, e com isso cada vez mais a sociedade se desenvolve de modos que o legislador não previu e acaba por ser necessário decisões do STF para poder garantir a justiça e a paz social.

Com a possibilidade de criar famílias com pais homoafetivos (situação não prevista pelo legislador) acaba por acarretar em um problema na certidão de nascimento da criança do casal. Na certidão fica declarado os pais da criança, sendo legalmente conhecido como um pai e uma mãe, porém com os novos direitos adquiridos pelos homoafetivos também surgiu a necessidade de adoção para o casal e com isso surge o interesse por parte dos pais de ter seu nome no registro da criança como dois pais ou duas mães.

 Casos interessantes mostram um casal de mulheres que gera uma criança por seminação artificial, uma parceira doa o óvulo e a sua parceira irá carregar esse bebê em seu útero. Em um caso como esse como podemos dizer que uma delas não possui legitimidade para exigir que seu nome esteja presente como mãe da criança?

Outro caso em que o autor ativo do processo, que não é o titular de direito, não pode entrar em ação para requerer tutela jurisdicional de sua mãe que se encontra em coma. São questões como essas que se levarmos o Código Processual literalmente acabaremos por cometer injustiças na sociedade, como se pode recusar que um terceiro (filho) entre em ação como sujeito ativo para garantir direito alheio (mãe)?

O direito processual tem o dever de garantir a justiça para todos, especialmente por ter como base princípios de acesso à justiça. Portanto hoje em dia por se verificar mudanças não previstas pelo legislador na sociedade, que ao passar dos anos a sociedade cada vez mais vai se modificando, não se pode impedir que em certos casos entre em ação quem não seja titular de direito, quem não possui a legitimidade garantida por lei, e sim ter uma certa flexibilização por parte dos juízes, o que também se encontra garantido pelos princípios do Direito Processual por meio da persuasão racional do juiz.

O Brasil também adota o princípio da persuasão racional: o juiz não é desvinculado da prova e dos elementos existentes nos autos ( quod non est in actis non est in mundo), mas a sua apreciação não depende de critérios legais determinados a priori. O juiz só decide com base nos elementos existentes no processo, mas os avalia segundo critérios críticos e racionais (CPC, arts. 131 e 436; CPP, arts.157 e 182).

Essa liberdade de convicção, porém, não equivale à sua formação arbitrária: o convencimento deve ser motivado (Const. Art. 93, inc. IX; CPP, art. 381, inc. III CPC, arts. 131, 165 e 458, inc. II) não podendo o juiz desprezar as regras legais porventura existente (CPC,art.334, inc. IV; CPP, arts. 158 e 167) e as máximas de experiência (CPC, art. 335).( Ada Pellegrini, 2013, p.77)

3.2.1 As Relações Homoafetivas e o processo

Após as dificuldades citadas acima irei citar algumas jurisprudências mostrando a dificuldade que existe hoje em dia para a aquisição de direitos como dupla maternidade.

DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE MENORES POR CASAL HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA. 1. A questão diz respeito à possibilidade de adoção de crianças por parte de requerente que vive em união homoafetiva com companheira que antes já adotara os mesmos filhos, circunstância a particularizar o caso em julgamento. 2. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as relativas aos costumes, onde a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. 3. O artigo 1º da Lei 12.010/09 prevê a "garantia do direito à convivência familiar a todas e crianças e adolescentes". Por sua vez, o artigo 43 do ECA estabelece que "a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos". 4. Mister observar a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais diversas consequencias que refletem por toda a vida de qualquer indivíduo. 5. A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si. 6. Os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria), "não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores". 7. Existência de consistente relatório social elaborado por assistente social favorável ao pedido da requerente, ante a constatação da estabilidade da família. Acórdão que se posiciona a favor do pedido, bem como parecer do Ministério Público Federal pelo acolhimento da tese autoral. 8. É incontroverso que existem fortes vínculos afetivos entre a recorrida e os menores – sendo a afetividade o aspecto preponderante a ser sopesado numa situação como a que ora se coloca em julgamento. 9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida que se impõe. 10. O Judiciário não pode fechar os olhos para a realidade fenomênica. Vale dizer, no plano da “realidade”, são ambas, a requerente e sua companheira, responsáveis pela criação e educação dos dois infantes, de modo que a elas, solidariamente, compete a responsabilidade. 11. Não se pode olvidar que se trata de situação fática consolidada, pois as crianças já chamam as duas mulheres de mães e são cuidadas por ambas como filhos. Existe dupla maternidade desde o nascimento das crianças, e não houve qualquer prejuízo em suas criações. 12. Com o deferimento da adoção, fica preservado o direito de convívio dos filhos com a requerente no caso de separação ou falecimento de sua companheira. Asseguram-se os direitos relativos a alimentos e sucessão, viabilizando-se, ainda, a inclusão dos adotandos em convênios de saúde da requerente e no ensino básico e superior, por ela ser professora universitária. 13. A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor, desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do menor, é um gesto de humanidade. Hipótese em que ainda se foi além, pretendendo-se a adoção de dois menores, irmãos biológicos, quando, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, que criou, em 29 de abril de 2008, o Cadastro Nacional de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua intenção a apenas uma criança. 14. Por qualquer ângulo que se analise a questão, seja em relação à situação fática consolidada, seja no tocante à expressa previsão legal de primazia à proteção integral das crianças, chega-se à conclusão de que, no caso dos autos, há mais do que reais vantagens para os adotandos, conforme preceitua o artigo 43 do ECA. Na verdade, ocorrerá verdadeiro prejuízo aos menores caso não deferida a medida. 15. Recurso especial improvido.

(STJ - REsp: 889852 RS 2006/0209137-4, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 27/04/2010, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/08/2010)

Como se pode perceber, a luta dos casais homoafetivos ainda está começando, pouquíssimos são os casos em que concedem aos pais a adoção de criança ou a presença de duas mães ou dois pais na certidão.

Encontramo-nos em uma sociedade democrática que tem como base o Estado de Direito, sendo necessário garantir os direitos fundamentais a todos na sociedade, e preservar a paz social, através da interpretação das normas, que é função do judiciário, de acordo com o seu tempo e realidade social.

4. Conclusão

Com o presente trabalho buscamos a elucidação sobre o Direito Processual, o seu avanço na sociedade e os problemas que ainda possui. Iniciando com um rápido relato do contexto histórico que passa pela autotutela (solução de conflitos pela força), autocomposição (resolução de conflitos sem interferência de terceiros) e finalmente surgindo a figura do juiz, alguém imparcial que busca a melhor solução.

Após esse breve relato passamos a discorrer sobre a ação, a prerrogativa de requerer a tutela jurisdicional, havendo a parte ativa e a parte passiva, ambas participando do processo do inicio ao fim, e para a efetivação desse processo, nos seus trâmites elucidamos os elementos (as partes, a causa de pedir e o pedido) e as condições da ação (possibilidade jurídica, interesse de agira e legitimidade).

Por fim demonstramos as dificuldades existentes para poder requerer a proteção do Estado por causa da legitimação e destacamos um caso de jurisprudência que mostra os efeitos que esse problema gera na realidade social.

A existência de conflitos na sociedade sempre foi algo marcante e de acordo com o tempo e o local encontravam diversas soluções, seja autotutela ou através do Estado. Por meio disso surgiu o Direito Processual, para poder conduzir e garantir a todos a justiça, porém como demonstrado ainda existem certas dificuldades que devem ser superadas para garantir efetivamente a todos o livre acesso à justiça, e ter uma visão menos dogmática nos casos concretos, interpretando a lei de acordo com as mudanças sociais.

Referências

CINTRA, Antônio Carlos; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2012.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiro, 2005.

ROCHA, José de Albuquerque. Teoria geral do processo. São Paulo: Atlas, 2009.


[1] Paper apresentado à disciplina Teoria Geral do Processo, da Unidade Ensino Superior Dom Bosco- UNDB.

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Sobre os autores
Iman El Kems

Aluna do 10 período do Curso de Direito, da UNDB.

Valdenio Nogueira Caminha

Professor Especialista, orientador.

Manuella Castro

Aluna do 8º período do curso de Direito da UNDB - Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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