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A defesa do consumidor em juízo

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Resumo:


  • A defesa do consumidor em juízo é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal, sendo essencial para a efetividade da tutela jurisdicional e o equilíbrio nas relações de consumo.

  • O Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece mecanismos de proteção e definições claras sobre consumidor, fornecedor, produtos e serviços, visando a regulação das relações de consumo e a reparação de danos.

  • Ações coletivas, como a Ação Civil Pública, são ferramentas importantes para a defesa de interesses metaindividuais ou coletivos, e o CDC ampliou a legitimidade para ajuizar tais ações, incluindo o Ministério Público e associações.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

CAPÍTULO IV

1 SIGNIFICANTE DENOTATIVO DE "HOMOGÊNEO" E A NATUREZA COLETIVA DO INTERESSE INDIVIDUAL HOMOGÊNEO

Desde o clássico pensamento de Platão, já encontramos a lição de impossibilidade de se atingir o conhecimento sem explicação racional e, consistindo esta no fato de "tornar claro o pensamento por meio da voz, com o emprego de verbos e substantivos", iniciaremos o nosso estudo da natureza do interesse individual homogêneo pela análise do significante denotativo deste, porque cremos que o conhecimento não pode ser tomado de forma independente da linguagem.

Pesquisando sobre as palavras componentes do termo Interesse Individual Homogêneo, podemos verificar a natureza coletiva deste interesse, por exemplo, através do termo "homogêneo", que em função adjetiva, como na lei exerce, é o termo qualificativo de substantivo no qual todas as partes possuem a mesma natureza e estão solidamente e/ou estreitamente ligadas. Rememorando os traços característicos dos interesses coletivos, observamos a presença daqueles por meio deste adjetivo.

Vale lembrar que a nota de organização mínima, como traço característico do interesse coletivo, pode ser vislumbrada no interesse individual homogêneo, porque o adjetivo da homogeneidade qualifica aquilo que por sua natureza faz resultar a estreita ligação dos seus componentes, como supra apontado.

Destarte, o traço de afetação a grupo determinado ou determinável no interesse individual homogêneo é ainda mais presente do que no interesse coletivo stricto sensu, pois, como todo grupo, caracteriza-se por ser reunião de pessoas ligadas para fim comum, é a afetação a grupo determinado ou determinável elemento que terá o seu nascedouro na origem comum desta espécie de interesse metaindividual, como apontada pelo art. 81, inciso III do CDC.

Não podemos olvidar que é da própria natureza daquilo que é coletivo a característica de pertencer a uma classe, povo, ou a qualquer grupo; corolário é a existência de um vínculo jurídico básico comum a todos os participantes do grupo formado em torno de interesse individual homogêneo, pois este é o interesse de um grupo decorrente de origem comum, fator que lhe defere situação jurídica diferenciada dos demais interesses metaindividuais.

Conclua-se que o traço distintivo do interesse individual homogêneo para o coletivo - stricto sensu - é a sua divisibilidade, decorrente da sua afetação a um grupo mais restrito e determinado de pessoas, que estão ligadas entre si para um fim comum decorrente de origem comum.

2 FUNDAMENTOS JURÍDICO-NORMATIVOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DO INTERESSE INDIVIDUAL HOMOGÊNEO COMO INTERESSE COLETIVO

A Lei n.º 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) mesmo antes das modificações introduzidas pela Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) já apontava a sua característica de instrumento processual para a defesa de interesses metaindividuais, seja pelo fato de não excluir o uso da ação popular, que sempre teve o escopo de defender os interesses da coletividade pública de natureza metaindividual (art. 1.º, da Lei n.º 7.347/85), além de que o efeito da sentença civil da ACP, prevista no artigo 16, mostra o caráter coletivo deste instrumento processual por ser "erga omnes", salvo a improcedência por falta de provas.

Estes pequenos exemplos normativos demonstram que a Lei n.º 7.347/85, sempre teve cunho de defesa de interesse coletivo (metaindividual) e, logo, não é do seu campo normativo a defesa de interesse individual, ou seja, aquele interesse que não tenha natureza coletiva.

Desta feita, quando o artigo 21 da Lei n.º 7.347/85, mandado acrescentar pela Lei n.º 8.078/90, preceitua que "aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do título III da lei que institui o Código de Defesa do Consumidor " (grifo nosso), estes interesses individuais citados no preceito normativo em tela, o qual faz reminiscência a aplicação da parte processual da defesa em juízo dos interesses metaindividuais prevista no CDC, só podem referir-se a interesses de natureza coletiva ou de interesse da sociedade, porque, se fosse de outra forma, estariam sendo tutelado interesses de natureza puramente individual por meio da ACP.

É ponto pacífico que não cabe a tutela através de ACP de interesses que não tenham a natureza coletiva, e, logicamente, a reminiscência normativa a individuais do artigo 21 da Lei n.º 7.347/85 só pode reportar-se aos interesses individuais homogêneos.

Corolário é que os interesses individuais homogêneos, como espécies de interesses metaindividuais possuem natureza coletiva, pois, caso contrário, a Lei n.º 8.078/90 não introduziria a sua tutela através de sua inclusão normativa na Lei de Ação Civil Pública, via artigo 21.

Alerta-se, ainda, que a Lei n.º 8.078/90 aponta a natureza coletiva do interesse individual homogêneo, não sendo apenas um interesse individual exercido de forma coletiva, quando analisamos o preceituado no artigo 81 caput, de que a defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo ( grifos nosso).

Lembrando-se de que a defesa em juízo de direito individual está plenamente abrangida pelo artigo 5.º da CF desde a simples lesão, e que a regra geral é de que, quando se tratarem de interesses de natureza coletiva, a Constituição e a legislação prevêem um instrumento processual específico, é conseqüência lógico-hemenêutica que, quando no mesmo caput do artigo 81 in fine, o legislador preceituou sobre a defesa dos interesses do consumidor a título coletivo e, em seguida, no parágrafo único e incisos do preceito normativo em análise, estabeleceu que a defesa coletiva será exercida quando se tratarem de: interesses ou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

Obriga-nos o concatenamento destes fragmentos de disposição normativa (art. 81 caput in fine com parágrafo único e incisos) a concluir que a mens legis normatizou nestes preceitos a defesa coletiva em juízo dos interesses ou direitos que tem efetivamente a natureza coletiva, excluindo da sua tutela os interesses de natureza individual que podem ser ajuizados de forma conjunta ou coletivizada através das espécies de litisconsórcio previstas no sistema processual comum.

Percebe-se, assim, que o parágrafo único do artigo 81 da Lei n.º 8.078/90 é o pórtico de entrada do sistema processual para o acesso à tutela jurisdicional daqueles interesses de natureza coletiva e que permaneciam numa dimensão paralela do jurídico, fora do raio de ação de seus instrumentos jurídico-processuais, por não se enquadrarem nos clássicos moldes da legitimação ordinária, ligada à titularidade subjetiva, e que busca o fundamento para a sua tutela jurisdicional nos critérios maiores de relevância do bem jurídico a ser protegido e interesse social, a exemplo as previsões expressas destes critérios nos artigos 82, inciso IV, parágrafo 1.º, e, 84, parágrafo 3.º do CDC.

Conclusão necessária do anteriormente exposto é que, por estar incluída no inciso III do parágrafo único do artigo 81 da Lei n.º 8.078/90 a definição do que sejam interesses ou direitos individuais homogêneos, conjuntamente com os interesses difusos e coletivos stricto sensu, estas espécies de interesses metaindividuais possuem natureza coletiva como estes, sendo, portanto, uma das espécies de interesses coletivos lato sensu.

Avançando na análise normativa do texto da Lei n.º 8.078/90, especialmente no que se refere à previsão da ação civil coletiva para a responsabilidade dos danos individualmente sofridos (artigo 91) que, para Arnold Wald, por exemplo, é instrumento adequado somente para a tutela dos interesses individuais homogêneos fora dos casos previstos no artigo 1° da Lei n.º 7.347/85 quando tratar-se de defesa do consumidor, por que embora exercido de forma coletiva, excluída está a tutela através da ação civil pública nos casos de interesses individuais homogêneos não expressamente previstos no artigo 1° da Lei de Ação Civil Pública ( meio ambiente, consumidor, patrimônio público e social).

Necessário torna-se lembrar de que a ação civil coletiva da Lei n.º 8.078/90 constitui-se em instrumento específico para atuação no âmbito das relações de consumo para a tutela dos interesses individuais homogêneos, mas que esta norma não anula o preceituado no artigo 83 do CDC, que legisla no sentido de que para a defesa dos direitos e interesses protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar a sua efetiva tutela.

Observa-se, claramente, que este preceito (art. 83 do CDC) não exclui o uso da ACP para a tutela dos interesses individuais homogêneos, seja nos casos expressos, seja em outros não previstos expressamente, como é o caso dos interesses ligados às relações do trabalho, uma vez que permite a tutela dos interesses e direitos previstos no CDCin generi, portanto, das três categorias( difusos, coletivos e individuais homogêneos), preocupando-se o legislador em propiciar a sua adequada efetiva tutela, consignado expressamente no final do preceito normativo.

Válido lembrar de que o próprio artigo 1° da Lei n.º 7.347/85 prevendo que a ação civil pública não prejudica o uso da ação popular, já seguia o princípio de que o importante no campo da tutela de interesses metaindividuais é a efetiva proteção do bem jurídico de relevância e interesse social, e quaisquer interesses individuais homogêneos possuem estes caracteres.

Destarte, o artigo 89 do CDC, vetado pelo Presidente da República, preceituava expressamente que as normas do seu título III, que trata da defesa do consumidor em juízo, "aplicam-se, no que for cabível a outros direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, tratados coletivamente." Este preceito normativo, embora vetado, reforça a idéia de que não era intenção do legislador fazer, como não fez no artigo 81 do CDC, expressa distinção quanto a natureza metaindividual, logo, coletiva lato sensu, dos diversos interesses tutelados pelo CDC, somente diferindo quanto ao grau de concretude dos interesses metaindividuais previstos.

Cristalino, portanto, que quando o parágrafo único do artigo 81 e incisos, preceitua que a defesa coletiva será exercida no caso de se tratar de interesses ou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, em nenhum momento está normatizando que a defesa coletiva somente será exercida através das ações civis coletivas do CDC, previstas no artigo 91, excluindo dos casos não previstos expressamente o uso da ACP para a tutela dos interesses individuais homogêneos.

Desta forma, embora exista no CDC um instrumento específico para a tutela dos interesses individuais homogêneos em juízo no campo das relações de consumo para a responsabilidade dos danos individualmente sofridos, as ações civis coletivas, estes interesses não perdem a sua natureza coletiva ante a existência na Lei da previsão do seu exercício mediante defesa a título coletivo, conjuntamente com os interesses coletivos por excelência, que são: os difusos e coletivos stricto sensu (art. 81 do CDC).

Além do que o CDC expressamente normatiza que, para a defesa dos interesses ou direitos por ele tutelados, são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar a sua adequada e efetiva tutela (artigo 83), prevalecendo o critério da relevância social dos interesses.

No caso das relações de trabalho que é o campo de nosso estudo, a defesa dos interesses individuais homogêneos só pode ser exercida por meio da ação civil pública, sendo impossível a sua defesa por meio das ações civis coletivas, próprias para as relações de consumo.

3 A TUTELA JURISDICIONAL DO CONSUMIDOR

(JUSTIFICATIVAS E SALVAGUARDAS)

Ao comentar a tutela de direitos sociais, Mauro Cappelletti, apud Richard Tur (1982:135), afirma que "o gozo dos tradicionais bem como dos novos direitos sociais pressupõe mecanismos para sua efetiva proteção", dizendo ainda que "tal proteção, mais do que nunca, é melhor assegurada mediante um remédio eficaz dentro do esquema do sistema judiciário".

E o próprio Molony Report, de 1962, conclui que "as leis e regulamentos são de pouca valia, a menos que sejam observados", haja vista que "a maior causa da fraqueza do consumidor no passado tem sido na aplicação inadequada das multas leis feitas em seu favor".

Além disso, há evidente desigualdade de condições entre o consumidor, principalmente se individualmente considerado, de um lado, e o fornecedor de bens e serviços, de outro, sendo de todo conveniente, pois, que se agrupem os consumidores ou então entreguem a um órgão com maior capacidade de postulação a defesa de seus legítimos interesses.

Como bem acentua Mauro Cappelletti (1985:11-12), a "pobreza jurídica não é somente a pobreza de um indivíduo que não tem recursos financeiros, que não tem cultura bastante, que não tem posição social adequada, ou seja, pobreza econômica, social, jurídica, cultural etc.", asseverando ainda que a "pobreza pode ser um fenômeno mais vasto", "fenômeno de grupos, de categorias", concluindo que, nesse caso encontra-se exatamente o consumidor, mesmo porque o somos todos nós, sem exceção e, por conseguinte, "pobres economicamente ou culturalmente". Acrescenta ainda que, "o consumidor que compra um produto com pequeno defeito equivalente a um dólar, não pode se defender individualmente", eis que "aí se trata de um interesse fragmentado, demasiado pequeno para que o cidadão, individualmente, defenda seu direito". "Mas", conclui, "se todos os consumidores, em conjunto, decidirem atuar, serão milhões de dólares, e não apenas um, pois milhares, centenas de milhares ou milhões de consumidores estarão comprometidos", chegando-se à conclusão de que, além dos interesses individuais de cada consumidor, há interesses difusos e coletivos, a demandar tratamento mais eficaz e sobretudo rápido.

Também para o Prof. Fábio Konder Comparato (1974), da Universidade de São Paulo, consumidores são aqueles "que não dispõem de controle sobre bens de produção e, por conseguinte, devem se submeter ao poder dos titulares destes". E complementa tal enfoque asseverando que "o consumidor é, pois, de modo geral, aquele que se submete ao poder de controle dos titulares de bens de produção, isto é, os empresários".

Tais circunstâncias ficam ainda mais evidentes quando se levam em conta, por exemplo, os danos causados por um produto alimentício ou medicinal nocivo à saúde, ou então por um bem de consumo durável perigoso, ficando as vítimas em situação de literal desamparo, não apenas em face de sua impotência ante o produtor, como também pelos frágeis instrumentos de defesa de que dispõem, fragilidade essa demonstrada pela exigência até hoje entre nós vigente, de não apenas demonstrar-se o dano sofrido, mas também o nexo causal entre o dano e o produto e, o que é pior, e mais difícil ainda, a culpa residente em negligência ou imperícia do produtor.

Isto tudo, por óbvio, mais que justifica o princípio da "inversão do ônus da prova" aliada à "responsabilidade objetiva" pelo fato do produto, já consagrados nas legislações de diversos países e agora do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor que consagrou, dentre os princípios da "política nacional de relações de consumo" (art. 4.º), o "reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo", e como um dos seus direitos básicos "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência".

4 TUTELA PREVENTIVA

Adverte Sessarego que "no cabe restringir la tutela de la persona a la reparación del daño una vez que este se se haya producido. Es decir, no es posible tutelar negativamente al ser humano. Por el contrario, en la actualidad se suraya que la protección de la persona humana tiene, eminentemente, un sentido positivo. Ello supone procurar jurídicamente al sujeto las mejores condiciones para el pleno y libre desarrollo de su personalidad, removiendo los obstáculos que entorpezcan la consecución de esta finalidad. Pero, esta tutela positiva es también, prioritariamente, de orden preventivo. La más reciente y alerta doctrina no sólo enfatiza en la necessidad de una tutela integral y unitaria de la persona sino que preconiza que la más adecuada protección del ser humano es aquella de carácter preventivo. Se hace notar por algunos autores de vanguardia que los modelos tradicionales de protección de la persona fracasan, no sólo porque no consideran su tutela integral, sino en tanto no comprenden que ella es eficaz si toma en cuenta la exigencia de prevenir que se produzcan atentados contra el ser humano en un immediato futuro. Com el propósito de anteciparse a las probales agresiones que pueden cometerse contra la persona es que se incluye, en los más recientes ordenamientos jurídicos, acciones de caráter preventivo. Estas on la acción de amparo, a nível constitucional, y la acción inhibitoria, dentro del área derecho civil. Ambas acciones están destinadas a evitar la consumación de una imminente amenaza contra la persona, capaz de causar o daño o, en caso de haberse producido el evento dañoso, obtener su inmediata cesación para impedir la continuación e incremento del daño. Estas acciones, que no son de naturaleza repressiva sino preventiva, brindan al sujeto una relativa seguridad jurídica". (Proteción a la persona humana, Ajuris 56/107).

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Carlos Cárdenas Quiróz recorda o recente Projeto do Código Civil peruano, cujo artigo 17, al. 2, dispunha que "el juez, a solicitud y por cuenta del interessado, puede ordenar la desación de un hecho potencialmente susceptible de causar daño a la persona o la paraliación de la actividad generadora del daño, siempre que se encuentre verosímilmente acreditado" (Apuentes sobre el denominado daño a la persona, Rev. Direito Civil 70/20); mas o citado dispositivo, na versão que acabou prevalecendo, proposta pela Comissão Revisora, só reconheceu o direito da pessoas agravada a solicitar a cessação dos atos lesivos, descartando a possibilidade de agir em juízo diante de uma ameaça: em outros termos, consagrou-se uma limitada ação inibitória, restringindo o amplo alcance do artigo 295 da Constituição daquele país, para ater-se exclusivamente à chamada "liberdade individual", que dá lugar à específica ação de habeas corpus (Sessarego, ob. cit., p. 108).

Em nosso direito, ausente disposição legal explícita, demonstra Flávio Luiz Yarshell, de maneira convicente, a admissibilidade da mais ampla tutela preventiva ou inibitória e da tutela específica do dano moral: o exame do tema comporta duplo enfoque, conforme se tome o momento da consumação do dano. Quando se trata de prevenir a perpetração do ilícito (impedindo que o dano moral venha a se consumar), ou mesmo de fazer cessar a violação que está em curso (impedindo sua reiteração ou agravamento), não há dúvida de que a intervenção judicial pode dar-se mediante a imposição de prestações de fazer e não-fazer. Trata-se de atuar sobre a conduta do autor da violação, para que se abstenha da prática do ilícito; ou para que cesse a violação já iniciada; ou ainda para que, desde logo, desfaça a materialidade ou o resultado de seu ato ilícito, potencial ou concretamente gerador de um dano moral. Cuida-se, a título exemplificativo, de impedir que a imagem da pessoa – expressa em fotografia ou traduzida em obra intelectual de caráter biográfico, por exemplo – seja veiculada indevidamente, impondo-se um dever de abstenção (não veicular a imagem ou a obra em que ela se contenha); ou de impedir que se perturbe o sossego e a saúde, nos casos de uso nocivo da propriedade, tal qual previsto pelo artigo 554 do Código Civil; ou ainda de impor ao fornecedor, no âmbito das relações de consumo, que se abstenha de empregar – ou mesmo que desfaça – meios ou atos tendentes à cobrança de débitos do consumidor, que o exponham ao ridículo, a constrangimento ou ameaça, conforme previsão do artigo 42 da Lei n.º 8.078/90. Em todos esses casos, portanto, não se cogita de uma tutela propriamente sancionatória, no sentido de tutela que venha a neutralizar os efeitos do dano consumado, mas essencialmente preventiva ou inibitória, isto é, apta a impedir a consumação, reiteração ou o agravamento do dano.

E anota que o ordenamento brasileiro conhece instrumentos eficazes no sentido dessa tutela: Além de disposições legais constantes da legislação extravagante – como os dos artigos 11-12 da Lei da Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85) e artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor -, o artigo 461 e parágrafos do Código de Processo Civil trazem o fundamento para a tutela específica nas obrigações de fazer e não-fazer, tutela essa que desfruta de declarada primazia, e que pode ser concedida antecipadamente, de sorte, portanto, a atuar de forma preventiva (inclusive para garantir seu atributo de tutela específica). A disposição tem inteira pertinência com a prevenção do dano moral, pois é precisamente no âmbito dos direitos não patrimoniais – nome, imagem, honra, intimidade, privacidade – que as tutelas preventiva e específica revelam-se mais necessárias, precisamente pelas dificuldades de – após consumada a lesão – obter-se uma justa e adequada reparação.

A jurisprudência tem admitido essa forma de tutela antecipada: Inequívoco o direito líquido e certo ao cancelamento dos efeitos da negativação decorrentes da inscrição do nome do impetrante perante o SPC, quando referida inscrição não se constituir em outra coisa que não seja o prejuízo gratuito às outras relações que venha a querer contrair. Inexistência de prejuízo ao credor-exequente enquanto não definido o quantum debeatur em sentença a ser proferida em embargos do devedor. Mostra-se abusiva a inscrição gratuita perante o SPC, bem como a decisão judicial indeferitória da medida cautelar, porque flagrantes prejuízos deste ato, de difícil e incerta reparação. Suspensão dos efeitos decorrentes da negativação até o trânsito em julgado da decisão a ser proferida nos embargos de devedor (1.ª Câmara do TAlçRS, 16.04.1996, JTARS 98/225).

Ressalva-se que, "se o devedor não ofereceu a devida garantia, no assegurar o cumprimento de eventual obrigação advinda do insucesso ou sucesso parcial da ação contra si movida, não é plausível proibir que não seja seu nome registrado no órgão de proteção ao crédito". (3.ª Câmara do TalçRS, 24.04.1996, JTARS 98/263).

5 DISPENSA DO PAGAMENTO DE CUSTAS, EMOLUMENTOS OU OUTRAS DESPESAS JUDUCIAIS

Preceitua o artigo 87 do CDC, o seguinte: "Nas ações coletivas de que trata este Código não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogados, custas, e despesas processuais. Parágrafo único - Em caso de ligitimidade de má-fé, a associação autora e os diretores responsáveis pela propositura da ação serão solidariamente condenados em honorários advocatícios e ao décuplo das custas, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos."

Despesas com o processo: normalmente, quando ingressa com uma ação, a pessoa, de início, precisa arcar com o pagamento das taxas administrativas, denominadas custas judiciais. Além disso, alguns processos pressupõem conhecimento técnico de áreas alheias ao direito (químico, biologia etc.), o que torna necessária a intervenção de técnicos especializados para auxiliar o juiz: são os denominados peritos, remunerados, assim como os advogados, por honorários.

O Ministério Público, o município e demais órgãos estão isentos desses pagamentos pôr integrarem o Estado.

Ainda, há de se falar em litigância de má-fé: ocorre quando a associação ingressa com uma ação em juízo, tendo, pelas circunstâncias peculiares ao fato, certeza absoluta do engano, do vício ou da impropriedade do seu pedido judicial, elaborado com a finalidade exclusiva de causar um mal, um prejuízo ao fornecedor

6 COMPETÊNCIA E INTERVENÇÃO DE TERCEIROS. PROCEDIMENTO.

Estabelece o artigo 101 do CDC, que: "Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste Título, serão observadas as seguintes normas: I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor; II - a réu que houver contratado seguro de responsabilidade poderá chamar ao processo o segurador, vedada a integração do contraditório pelo Instituto de Resseguros do Brasil. Nessa hipótese, a sentença que julgar procedente o pedido condenará o réu nos termos do artigo 80 do Código de Processo Civil.

Se o réu houver sido declarado falido, o síndico será intimado a informar a existência de seguro de responsabilidade facultando-se, em caso afirmativo, o ajuizamento de ação de indenização diretamente contra o segurador, vedada a denunciação da lide ao Instituto de Resseguros do Brasil e dispensado o litisconsórcio obrigatório com este.

O artigo 102 do CDC, adotou que: "Os legitimados a agir na forma deste Código poderão propor ação visando compelir o Poder Público competente a proibir, em todo o território nacional, a produção, divulgação, distribuição ou venda, ou a determinar alteração na composição, estrutura, fórmula ou acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo regular se revele nocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal."

Dever de fiscalizar: o Poder Público (União, Estados e Municípios) tem o dever de fiscalizar os produtores, a fim de que produtos nocivos ou perigosos à saúde não ingressem no mercado nacional.

Todavia, quando o Poder Público não adota espontaneamente as medidas que se fizerem necessárias, as associações de consumidores e o Ministério Público podem mover processo judicial para obrigar que o faça.

Pode ser ajuizada uma ação de "obrigação de fazer", em que o autor da ação pleiteia ao juiz que fixe um prazo para que o Poder Público tome as medidas necessárias. No final desse prazo, o Poder Público arcará com uma multa para cada dia de descumprimento da ordem judicial, sem prejuízo da responsabilidade dos agentes administrativos omissos.

7 O PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO, DE EXECUÇÃO E OS EMBARGOS DO DEVEDOR

A Lei n.º 8.078/90, fortifica-se no seu artigo 97, que: "A liquidação e a execução de sentença poderão ser promovidas pela vítima e seus sucessores, assim como pelos legitimados de que trata o artigo 82."

O artigo 98, esclarece que: "A execução poderá ser coletiva, sendo promovida pelos legitimados de que trata o art. 82, abrangendo as vítimas cujas indenizações já tiverem sido fixadas em sentença de liquidação, sem prejuízo do ajuizamento de outras execuções. Parágrafo 1.º - a execução coletiva far-se-à com base em certidão das sentenças de liquidação, da qual deverá constar a ocorrência ou não do trânsito em julgado. Parágrafo 2.º - É competente para a execução o Juízo; I - da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso de execução individual; II - da ação condenatória, quando coletiva a execução."

O artigo 99, torna efetivo o seguinte: "Em caso de concurso de créditos decorrentes de condenação prevista na Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, LACP, e de indenizações pelos prejuízos individuais resultantes do mesmo evento danoso, estas terão preferência no pagamento. Parágrafo único - Para efeito do disposto neste artigo, a destinação da importância recolhida ao Fundo criado pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, ficará sustada enquanto pendentes de decisão de segundo grau as ações de indenização pelos danos individuais suficiente para responder pela integralidade do devedor ser manifestamente suficiente para responder pela integralidade das dívidas."

Preferência no pagamento: se houver ofensa conjunta a interesses individuais homogêneos e difusos, a satisfação dos débitos originários daqueles terá precedência.

Autua o artigo 100, o seguinte: "Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização devida. Parágrafo único - O produto da indenização devida reverterá para o Fundo criado pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, LACP (fluid recovery)."

Execução supletiva: só nessa hipótese é que os entes referidos no artigo 82 poderão promover a liquidação da sentença, cujo produto reverterá para o Fundo indicado e não mais para os consumidores lesados, que se mantiveram inertes.

Proceder a liquidação: quando o fornecedor for condenado pela prática de um crime contra o consumidor, este, ou os entes legitimados na hipótese tratada no artigo 98, poderá servir-se da sentença condenatória penal também para efeitos civis, caso em que não caberá discussão judicial quanto ao dever de pagar, mas só com relação ao valor que o fornecedor terá de pagar.

Execução: depois de apurado o valor que cada consumidor lesado vai receber, o juiz ordena que o réu faça o pagamento no prazo de 24 horas. Se o réu não cumprir a ordem, o juiz mandará vender os bens do réu em leilão para que a conta seja paga. Esta é a última fase do processo: a execução.

Linhas atrás, quando falamos da funções jurisdicionais, fizemos ver o que é notório em nosso processo e que é a independência e autonomia, assim como a imprescindibilidade do processo de execução, como regra, para a materialização das atividades executivas. Raras são as exceções.

Esta separação que dá origem ao binômio processo de conhecimento - execução forçada remonta a antigas origens do direito romano-canônico, consolindando-se sobretudo no direito medieval, origem do processus executivus.

Mas é induvidoso que o dogma da necessária antecedência de uma cognição plenária e exauriente como pressuposto da possibilidade de execução teve grande aceitação pela filosofia iluminista, porque prestigia a certeza jurídica fundamental para o capitalismo moderno. Esta doutrina encontra-se profundamente arraigada no âmago de nosso processo civil.

No entanto, não deixa de ser de certa forma paradoxal o grande número de títulos executivos extrajudiciais de nosso direito, quiçá o mais pródigo do mundo em conferir executividade a títulos de origem não judicial.

Construído sobre tal base, o processo de execução repele o exercício de cognição mais aprofundada ou mesmo estranha aos incidentes do próprio processo. É falsa, todavia, a afirmação de que inexista cognição no processo executivo. Aliás é falsa a afirmativa de que as funções jurisdicionais sejam puras, sendo comum encontrarmos interpenetração de execução cautela e conhecimento em um mesmo processo.

Mas é óbvio que cada espécie se caracteriza pela existência de uma preponderância de uma atividade, no caso do processo de execução, das atividades satisfativas, materializadoras do direito encartado na sentença ou no título extrajudicial, existindo contudo, notas de cognição e cautelaridade em seu bojo.

Mas como dissemos, a cognição dentro do processo de execução almeja em primeira plana os incidentes internos do procedimento, sendo defeso e contrário à índole do processo executivo imiscuir-se questões relativas ao título executivo, ou seja, à obrigação exeqüenda, salvante os casos de prescrição ou decadência, que podem ser veículados através de exceção de pré-executividade.

Tal atividade está reservada aos embargos de devedor ou de terceiro. Ação de cognição, de eficácia declaratória negativa ou desconstitutiva, incidental, os embargos dão origem a uma nova relação processual, absolutamente distinta da relação executiva e que tem termo via sentença de mérito ou não.

Esta circunstância, ou seja, do afastamento de atividade cognitiva de maior volume do processo de execução, resulta do fato deste processo se destinar a atividades satisfativas, mas não só disto. Há que lembrar que o título judicial, em nosso sistemática, conta com presunção iuris tantum de certeza, liqüidez e exigibilidade, conforme se dessume dos artigos 586 do CPC e 3º da LEF.

Esta presunção, segundo o legislador, assume uma feição tal que veda a inserção de discussão acerca dela em sede de execução. Foi uma opção legislativa cuja origem deve ser buscada em uma série de fatores, mas legem habemus.

Os embargos de devedor, de seu turno, possuem uma eficácia extra-processo e que opera ex lege, qual seja a eficácia suspensiva da execução na porção sobre a qual versem. A redação dada ao inciso I do artigo 791 do CPC, dada pela Lei n.º 8.953/94, não deixa margem à discussão, como outrora havia na doutrina e na jurisprudência, para o efeito suspensivo dos embargos do devedor. Interpostos os embargos, suspensa estará a execução na porção por eles impugnada.

Em outras palavras, os embargos terão efeitos suspensivo sobre a porção da execução que consistir o seu objeto. Inobstante a clareza do dispositivo, alguns magistrados menos avisados, que, diga-se, são minoria, desatentam para a possibilidade de prosseguimento da execução na porção não embargada, suspendendo indevidamente in totum a execução.

Há que salientar que os embargos, conforme sejam referentes a título judicial ou extra judicial, podem possuir a característica de demandas de cognição sumarizada, pois nos embargos à execução lastreada em título judicial reduz-se sensivelmente a esfera de abrangência da cognição a ser realizada a teor do artigo 741 do CPC.

De fato, no caso de título judicial, feriria a coisa julgada permitir-se ampla discussão em torno de matérias sobre as quais já houve tratativa em sentença e sobre as quais operou-se a maxima preclusio. Ao revés em caso de título extrajudicial, abre-se ensanchas à ampla cognição em torno dos elementos do título.

Pois bem, não se pode negar o cabimento da antecipação dos efeitos da tutela em sede de embargos, em que pese a negativa de alguma doutrina que preconiza que não se pode adiantar tutela declaratória ou constitutiva. In casu, tratar-se-ia de conceder efeitos suspensivo ao julgamento da apelação interposta em sede de embargos e que, ex vi do artigo 520, inciso V, do CPC é desprovida de efeito suspensivo, em que pese a circunstância de haver uma sentença contrária à pretensão do embargante ser fator ponderável a infirmar a existência dos requisitos para a antecipação dos efeitos da tutela. É que como todo ato humano, a sentença não está livre de conter erros e veicular arbitrariedades rematadas.

8 A FLUID RECOVERY DO DIREITO BRASILEIRO

As ações coletivas que têm por objeto a reparação dos danos causados a pessoas indeterminadas podem carrear consigo algumas dificuldades. É o que tem demonstrado a experiência norte-americana, quando a sentença condena o réu a ressarcir o dano causado a centenas ou milhares de membros da class, surgindo então problemas de identificação das referidas pessoas; de distribuição entre elas da arrecadação; do uso do eventual resíduo não reclamado pelos membros da coletividade.

A jurisprudência norte-americana criou então remédio da fluid recovery (uma reparação fluida), a ser eventualmente utilizado para fins diversos dos ressarcitórios, mas conexos com os interesses da coletividade: por exemplo, para fins gerais de tutela dos consumidores ou do ambiente.

A colocação desse tipo de ações coletivas no Código do Consumidor é diversa da que ocorre com as class actions norte-americanas, em que o juiz desde logo quantifica a indenização pelos danos causados: no sistema criado pelo Código, o bem jurídico objeto de tutela ainda é indivisível e a condenação é genérica, limitando-se a fixar a responsabilidade do réu e a condená-lo a reparar os danos causados. Esses serão apurados e quantificados em liquidação de sentença, movida por cada uma das vítimas para a posterior execução e recebimento da importância correspondente à sua reparação. A condenação faz-se, portanto, pelos danos causados, mas em termos ilíquidos, e o pagamento a cada credor corresponderá exatamente aos danos sofridos.

Todavia, o legislador brasileiro não descartou a hipótese de a sentença condenatória não vir a ser objeto de liquidação pelas vítimas, ou então de os interessados que se habilitarem serem em número incompatível com a gravidade do dano. A hipótese é comum no campo das relações de consumo, quando se trate de danos insignificantes em sua individualidade mas ponderáveis no conjunto: imagine-se, por exemplo, o caso de venda de produto cujo peso ou quantidade não corresponda aos equivalentes ao preço cobrado. O dano globalmente causado pode ser considerável, mas de pouca ou ou nenhuma importância o prejuízo por cada consumidor lesado. Foi para casos como esses que o caput do artigo 100, do CDC previu a fluid recovery.

Observa-se, porém, que a indenização destinada ao Fundo LACP, criado pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, nos termos do parágrafo único do artigo 100, é residual no sistema brasileiro, só podendo destinar-se ao referido Fundo se não houver habilitantes em número compatível com a gravidade do dano.

Por isso mesmo, não é correto o pedido direto de recolhimento de indenização ao Fundo, sendo censurável o acolhimento desse mesmo pedido: o pedido indenizatório, em casos que tais, inscreve-se na tutela de interesses individuais homogêneos, de modo que o recolhimento ao Fundo prejudica o direito às indenizações pessoais dos consumidores que quiserem habilitar-se à reparação individual.

Adequado, ao contrário, o pedido de indenização pessoal, por lesão aos interesses individuais homogêneos, com indicação de sua reversão ao Fundo, somente na hipótese de não haver habilitações dos interessados ou, em as havendo, a da reversão pelo eventual resíduo não reclamado.

Destinação da fluid recovery – O parágrafo único do artigo 100 de CDC, destina o produto da indenização pelo dano globalmente causado ao Fundo criado pela Lei n.º 7.347/85 (a lei da denominada Ação Civil Pública). Mas a reversão ao Fundo só pode ocorrer residualmente, como já visto anteriormente.

Exatamente como faz a jurisprudência norte-americana, a indenização é, assim, utilizada para fins diversos dos reparatórios – que não puderam ser atingidos no caso -, mas com eles conexos, por intermédio da proteção aos bens e valores da coletividade lesada.

9 VALOR DA CAUSA NA AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO MORAL

Já se pretendeu que, "omissa a lei sobre os critérios para fixação do valor da causa versando indenização por dano moral puro, aquele, em princípio, é inestimável; assente a caracterização do dano moral puro, é despicienda a comprovação do prejuízo"; mais certamente, porém, "a dificuldade de fixação, na inicial, do valor do dano moral não implica atribuir-se à causa um valor sem conteúdo econômico".

Em substância, a questão pertinente ao valor da causa na ação de reparação de dano moral resolve-se pôr via de estimativa unilateral do autor, que se sujeita contudo ao controle jurisdicional, remarcado ainda pela sua provisoriedade.

Tratando-se de pedidos cumulados, observa-se o mesmo critério quanto à estimativa do valor da causa no concernente aos danos morais, respeitando o patamar mínimo dos efeitos patrimoniais da ação. O que se segue na decisão da 6.ª Câmara do TJSP: "Tem a jurisprudência proclamado que, "nas ações de reparação de danos, à falta de regra específica acerca do valor da causa, este deverá corresponder ao proveito econômico perseguido pelo autor" (RT 647/186). Por outro lado, nada impede que, não dispondo o autor de elementos para calcular o real montante do benefício patrimonial almejado, proponha uma estimativa provisória, a ser definitivamente fixada por ocasião da sentença" (RJTJSP 99/299 e 118/371). Foi o que observou na espécie, pois a autora reclama indenização ampla, de ordem moral e patrimonial, em vista do abalo de crédito sofrido, a lhe acarretar diminuição do faturamento (11.06.1992, RJTJSP 138/327).

10 PEDIDO DE DANO MORAL E SUA CONDENAÇÃO EM SENTENÇA

Em linha de princípio, a concessão de indenização por danos morais exige que tenha havido pedido expresso na petição inicial, como também não se prescinde que a sentença seja explícita no sentido dessa condenação.

É certo que, tratando-se de ação de indenização fundada na morte de pessoa da família (artigo 948, inciso II, do Novo Código Civil), uma jurisprudência mais liberal tem tangenciado o rigor desse princípio, para compreender, por vezes, na "indenização" pedida, tanto o ressarcimento dos danos patrimoniais como a reparação dos danos morais.

Assim, de regra, os pedidos são interpretados restritivamente (CPC, artigo 293), não se considerando a verba a título de dano moral se não foi formulado pedido na inicial, ainda que possa ser formulado em outra demanda (5.ª Câmara de Direito Privado do TJSP, 09.02.1996, JTJ 182/83); e, como pedido novo, não induz litispendência nem afronta coisa julgada, salvo se a anterior ação de indenização por danos materiais foi desacolhida pela ausência de ilicitude do ato.

Afirma-se que "a reparação do dano moral não comporta pedido genericamente formulado; é imprescindível que a parte, na exordial, justifique a indenização, se não para que não fique ao arbítrio do julgador, ao menos para que possa o requerido contrariar a pretensão com objetividade e eficácia"; mas essa regra tem sido abrandada no que se refere ao quantum indenizatório pretendido, com o asserto de que "não resulta em inépcia da inicial o pedido genérico de indenização para reparação do dano moral, vez que seu valor é fixado pelo prudente arbítrio do Juiz da causa" (1.ª Câmara do TJGO, 28.12.1995, RT 730/307).

Privilegiando a ação de indenização por dano moral, em razão das peculiaridades do pedido, pretende-se que, "sendo meramente estimativo o valor da indenização pedida na inicial, não ocorre a sucumbência parcial se a condenação fixada na sentença é inferior àquele montante" (3.ª Turma do STJ, Recurso especial 21.696, 25.05.1993, DJU 21.06.1993).

Igualmente se reconhece a inadmissibilidade da liquidação dos danos morais, se estes não foram objeto da sentença condenatória: A liquidação deve ater-se ao decidido no processo de conhecimento. A responsabilidade do litisdenunciado pressupõe o reconhecimento do prejuízo suportado pelo litisdenunciante. Sendo incontroverso que não só a sentença liquidanda não fez referência a prejuízo de ordem moral, como nada se alegou nesse sentido quando da denunciação da lide, determinando o conteúdo da demanda principal tão-só o ressarcimento dos prejuízos de ordem material suportados pelo litisdenunciante, impende reconhecer a violação ao artigo 610 do CPC, em decorrência da inclusão de indenização por dano moral (3.ª Turma do STJ, Rel. Min. Costa Leite, 15.08.1995, RSTJ 78/232 e RT 725/177. No mesmo sentido, 1.ª Câmara do TJSP, apel. 195.421-1, 16.08.1994).

11 NEXO DE CAUSALIDADE E ÔNUS DA PROVA

Como em qualquer área da responsabilidade civil, põe-se em evidência como pressuposto da obrigação de reparar o dano moral o nexo de causalidade entre ação ou omissão voluntária e o resultado lesivo; neste sentido, aliás, a regra do artigo 927 do Novo Código Civil, sendo mais explícito o Código Civil peruano de 1984, em ser artigo 1.985: "La indenización compreende las consecuencias que derivan de la acción u omisión generadora del daño, incluyendo el lucro cesante, el daño a la persona y el daño moral, debiendo existir una relación de causalidad adecuada entre el hecho e el daño producido".

Portanto, "em sede indenizatória por danos patrimoniais e moral, mesmo levando-se em conta a teoria da distribuição do ônus da prova, a cabência desta está ao encargo do autor a provar o nexo causal constituidor da obrigação ressarcitória, pois, inexistindo causalidade jurídica, ausente está a relação de causa e efeito, mesmo porque actore non probante, reus absolvitur".

12 DANO MORAL E ÔNUS DA PROVA

Regra geral, "no plano do dano moral não basta o fato em si do acontecimento, mas, sim, a prova de sua repercussão, prejudicialmente moral".

Mas esta regra não tem sido aplicada em termos absolutos pela jurisprudência, pois "há danos morais que se presumem, de modo que ao autor basta a alegação, ficando a cargo da outra parte a produção de provas em contrário; assim, os danos sofridos pelos pais por decorrência da perda dos filhos e vice-versa, por um cônjuge relativamente à perda do outro; também os danos sofridos pelo próprio ofendido, em certas circuntâncias especiais, reveladoras da existência da dor para o comum dos homens. Há outros, porém, que devem ser provados, não bastando a mera alegação, como a que consta da petição incial (simples aborrecimento, naturalmente decorrente do insucesso do negócio)" (11.ª Câmara do TJSP, 30.06.1994, JTJ 167/45).

Com efeito, em função da diversidade do dano moral pretendido, tem-se aceito um tratamento diferenciado no que se refere ao ônus probatório, conforme se viu anteriormente, ao cuidar-se da reparação do dano causado pela perda de pessoa da família; do protesto indevido de título de crédito, se reclamada a indenização pela pessoa física ou pela pessoa jurídica; e, de alguma forma, nos casos de lesão deformante e de ofensa à honra da mulher.

13 FORMAS DE REPARAÇÃO DO DANO MORAL

Anota Carlos Bittar que "admitem-se, nesse campo, conforme a natureza da demanda e a repercussão dos fatos, várias formas de reparação, algumas expressamente contempladas em lei, outras implícitas no ordenamento jurídico positivo, como: a realização de certa ação, como a de retratação que, acolhida, pode satisfazer o interesse lesado (Lei n.º 5.250/67, artigos 29 e 30); o desmentido, ou retificação de notícia injuriosa, nos mesmos termos (idem); a divulgação imediata de resposta (idem); a republicação de material com a indicação do nome do autor (Lei n.º 5.988/73, artigo 126); a contrapropaganda, em casos de publicidade enganosa ou abusiva (Lei n.º 8.078/90, artigo 60); a publicação gratuita da sentença condenatória (Lei n.º 5.250/67, artigo 68), ou sob expensas do infrator (Lei n.º 8.078/90, artigo 78); a divulgação de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e serviços (idem, artigo 44)".

Descartados os casos previstos na Lei de Imprensa, pois esta lei especial refoge ao âmbito deste trabalho, os demais indicados – previstos na Lei de Direito Autoral e no Código de Defesa do Consumidor – revelam-se proveitosos, ainda que insuficiente a indicação.

Efetivamente, "un daño inmaterial puede ser resarcido en cuanto ello sea posible por meio de la restitución in natura: esto tiene lugar sobre todo en caso de pública retratación de declaraciones públicamente manifestadas, idóneas para lesionar el honor de outro o perjudicar su crédito (parágrafo 824 del BGB)" (Larenz, Derecho de Obligaciones, I, parágrafo 14, p. 229)

Mais amplamente, ensina Pontes de Miranda: o dano moral ou se repara pelo ato que o apague (e.g. retratação do caluniador ou do injuriante, casamento da mulher deflorada), ou pela prestação do que foi considerado como reparador. A reparação do dano moral pode ser específica; e.g. retificação, reconhecimento de honorabilidade; a condenação à retificação é condenação in natura, aproximativamente; o preceito cominatório pode ser conforme o artigo 302, inciso XII, do CPC (de 1939), ou, se for o caso, conforme a Lei de Imprensa.

De um modo geral, a condenação com que se busca reparar o dano moral é representada, no principal, por uma quantia em dinheiro, a ser paga de imediato, sem prejuízo de outras cominações secundárias, nas hipóteses de ofensa à honra e à credibilidade da pessoa, conforme foi visto anteriormente.

14 FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO

Inexistentes parâmetros legais para o arbitramento do valor da reparação do dano moral, a sua fixação se faz mediante arbitramento, nos termos do artigo 944, do Novo Código Civil.

À falta de indicação do legislador, os elementos informativos a serem observados nesse arbitramento serão aqueles enunciados a respeito da indenização do dano moral no caso de morte de pessoa da família, de abalo da credibilidade e da ofensa à honra da pessoa, bem como do dote a ser constituído em favor da mulher agravada em sua honra, e que se aproveitam para os demais casos.

Controvertida a questão pertinente à concorrência de culpas em matéria de indenização por danos morais, as resoluções preconizadas na fixação do dano resultante da morte de pessoa da família comportam ser generalizadas.

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Sobre o autor
Antônio Carlos Tadeu Borges dos Reis

advogado processualista, pós-graduado em Direito do Consumidor pela EMERJ/UNESA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REIS, Antônio Carlos Tadeu Borges. A defesa do consumidor em juízo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 134, 17 nov. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4489. Acesso em: 20 dez. 2024.

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