1. DA ANTERIOR INCIDÊNCIA DO PROTOCOLO Nº 21/2011 (DECRETO ESTADUAL CEARENSE Nº 30.542/2011)
No exercício de suas atividades, muitas empresas, promovem vendas diretamente a consumidores finais domiciliados no Ceará, internamente por representantes comerciais. Os clientes que tomam conhecimento das mercadorias via contato eletrônico, site, e-mails, bem como por meio de catálogos apresentados aos consumidores e, por conseguinte, representantes comerciais.
Em conformidade com o que determina o art. 155, §2º, VII, alínea “b”, da Constituição Federal, nestas operações interestaduais, o ICMS vem destacado, em sua totalidade, nas Notas Fiscais respectivas, com a alíquota cheia (interna) do Estado originário da mercadoria. Tais operações mercantis realizadas por empresas de outros estados desencadeiam, como se sabe, a obrigação de pagamento de ICMS em seu estado origem, calculado sob sua alíquota interna.
No entanto, quando da entrada dos referidos bens no Estado do Ceará, muitas destas empresas do seguimento eletrônico sob suas vendas foram surpreendidos com a cobrança indevida de ICMS adicional, utilizando como base de cálculo o valor total dos bens adquiridos, em face do que dispõe o Decreto Estadual Cearense nº 30.542/2011, de 23 de maio de 2011, que regulamenta o Protocolo ICMS nº 21/2011, e que alterou o antigo e também inconstitucional Decreto Estadual nº 29.560/08.
No entanto, recentemente depararam-se inúmeras empresas com a exigência de pagamento de ICMS complementar sobre as vendas a consumidores finais domiciliados no Ceará, sem a qual a mercadoria, não poderia ser liberada no posto de controle situado na entrada do território estadual cearense, onde na maioria das vezes, ocorrera a apreensão de tais produtos até o pagamento do tributo para sua liberação, redundando assim, atrasos nas entrega, quebra de seus compromissos e também, o cancelamento da compra, fazendo com que, o objetivo final (venda) não seja concretizado, assumindo desta maneira, as empresas com retorno dos produtos, já havendo sido pagos outros tributos, taxas de frete, manutenção dos veículos de transporte e acomodação, pedágios, além dos encargos de funcionários e logísticas, sem contar, nos dispêndios paralelos, como sinistros e coberturas.
Todavia, equivocadamente, durante esta exigência, as empresas mesmo tendo sido recolhido o tributo no estado de origem, são tolhidas em sua atividade econômica, sendo a “força” surpreendida com a nova cobrança diferenciada, desta vez, pelo estado do Ceará, sob a insurgência do mesmo fato gerador.
Logo, forçosamente as empresas neste seguimento de venda foram compelidas a pagar o anunciado imposto, para recolhimento do ICMS, de competência Estadual, sem, todavia, qualquer respaldo legal para tal procedimento.
Obrou, assim, em erro ao pagar um imposto o qual não era devido, vindo muitas vezes, a busca por meios de esforços necessários a análise do poder judiciário com a promoção de medidas junto ao legislativo como únicas medidas a externar empenhos contra a aplicação irregular da norma exigida pelo Estado do Ceará.
2. DA VIOLAÇÃO À CONSTITUIÇÃO FEDERAL - ALTERAÇÃO DO CRITÉRIO CONSTITUCIONAL DE REPARTIÇÃO DA ARRECADAÇÃO DO ICMS
O legislador Constituinte, após longas discussões a respeito da partilha do ICMS entre os Estados-Membros e o Distrito Federal, deliberou os seguintes critérios: em geral o imposto será servido ao Estado produtor, reservando-se parte da arrecadação aos estados consumidores.
Assim, quando há uma venda interestadual, a alíquota aplicável depende da condição do adquirente e da destinação do produto. Se o adquirente for consumidor final não contribuinte de ICMS, a alíquota aplicável será sempre a interna do Estado onde se encontra o vendedor, destinando-se todo o produto da arrecadação ao mesmo Estado.
Por outro lado, se o adquirente for contribuinte de ICMS, abrem-se duas possibilidades: o vendedor aplica a alíquota interestadual. Por sua vez, o adquirente da mercadoria, se for vendê-la, credita-se do imposto interestadual e destaca no seu documento fiscal de venda o ICMS calculado segundo a alíquota interna do seu Estado. Se por ventura o adquirente figurar também como consumidor final da mercadoria, ele deverá recolher o que se conhece por diferencial de alíquota.
O poder público estadual editou o Decreto nº 30.542/2011, com a finalidade de estabelecer procedimentos operacionais para a aplicação do Protocolo ICMS nº 21/2011, relativo à operação de entrada no Estado do Ceará de mercadorias ou bens advindos de outra unidade da federação, senão vejamos:
Art. 1º Nas entradas de mercadorias ou bens procedentes das unidades federadas signatárias do Protocolo ICMS nº 21/2011, em que o consumidor final adquire mercadoria ou bem de forma não presencial por meio de internet, telemarketing, showroom ou qualquer outra modalidade, será exigido, nos termos deste Decreto, a parcela do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS - devida na operação interestadual.
§1º A exigência do imposto prevista no caput deste artigo, aplica-se, inclusive, nas operações procedentes de unidades da Federação não signatárias do referido protocolo.
§2º A parcela do imposto devido a este Estado será obtida pela aplicação da alíquota interna aplicável ao produto, sobre o valor da respectiva operação, deduzindo-se o valor equivalente ao percentual aplicado sobre a base de cálculo utilizada para cobrança do imposto devido na origem, no máximo, nos seguintes percentuais:
I - 7% (sete por cento) para as mercadorias ou bens oriundos das Regiões Sul e Sudeste, exceto do Estado do Espírito Santo;
II - 12% (doze por cento) para as mercadorias ou bens procedentes das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e do Estado do Espírito Santo.
§3º O imposto previsto neste artigo será exigível no momento do ingresso da mercadoria ou bem no território deste Estado, quando a operação estiver sem a comprovação do pagamento do imposto relativo à parcela pertencente a este Estado.
§4º O disposto no §3º aplica-se também nas entradas procedentes de unidades federadas não signatária do referido protocolo.
§5º Na hipótese do §3º, quando o destinatário for órgão público estadual, este poderá firmar convênio com a Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará, para reter o imposto devido pelo fornecedor e repassar ao Estado através de GNRE ou DAE, conforme o caso.
Nesta linha, conforme se constata das normas supratranscritas, o poder público Estadual instituiu através do Decreto nº 30.542/2011, uma nova modalidade de cobrança do ICMS quando da entrada de mercadorias ou bens advindos de outros Estados da Federação, em substituição àquela determinada pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 155, II, §2º, VII, alínea “b”.
A inconstitucionalidade é tão gritante que o citado decreto reconhece que modificou a sistemática constitucional de tributação nas operações interestaduais, cujas mercadorias são destinadas a consumidores finais não contribuintes de ICMS, quando apresenta a justificativa de sua criação ao definir que “Considerando que o aumento dessa modalidade de comércio, de forma não presencial, especialmente as compras por meio da internet, telemarketing e showroom, deslocou as operações comerciais com consumidor final, para vertente diferente daquela que ocorria predominante quando da promulgação da Constituição Federal de 1988”.
O fato é que referida exigência encontra-se completamente fora da competência tributária estabelecida pela Constituição aos Estados tributantes, principalmente no presente caso em que a tributação do ICMS relativa a operações interestaduais já foi definida na Constituição Federal.
Destaquem-se os ensinamentos de Hugo de Brito Machado[1], verbis:
O art. 150, inciso V, da Constituição Federal de 1988, veda às diversas entidades tributantes o estabelecimento de limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais. É importante esclarecer que essa regra não impede a cobrança de impostos sobre a circulação em operações interestaduais ou intermunicipais. O que ela proíbe é a instituição de tributo em cuja hipótese de incidência seja elemento essencial a transposição de fronteira interestadual ou intermunicipal.
Essa limitação ao poder de tributar decorre e de certa forma realiza o princípio federativo. Não configura propriamente uma imunidade. Apenas estabelece parâmetros para a atividade tributária. Define, na verdade circunstâncias que a podem tornar inconstitucional. No inciso V, do art. 150, a circunstância que pode tornar um tributo inconstitucional é a interestadualidade, se tomada como essencial para o nascimento do dever jurídico de pagar o tributo, como critério para o seu agravamento.
Com efeito, a Constituição Federal que estabeleceu a competência tributária aos entes tributantes, determinando as diretrizes essenciais aplicáveis aos tributos. Tais regras são extraídas do artigo 155, II, §2º, VII, alíneas “a” e “b”, VIII da Constituição Federal que se pede vênia reproduzir a seguir:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir imposto sobre:
(...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
(...)
§2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
VII – em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;
b) a alíquota interna, quando destinatário não for contribuinte dele;
VIII – na hipótese da alínea a do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual.
Verifica-se desta forma que o comando constitucional é claro ao estabelecer que nas operações interestaduais que destinem bens e serviços ao consumidor final localizado em outro Estado, não contribuinte do imposto, como no presente caso, adotar-se-á a alíquota interna, sendo o tributo devido exclusivamente para o Estado de origem.
A leitura de tais dispositivos não deixa margem de dúvida: a venda de mercadoria a consumidor final localizado em outro Estado que não seja contribuinte do imposto é tributada uma única vez, mediante a alíquota interna do Estado produtor. O diferencial de alíquota apenas tem lugar quando o destinatário da mercadoria, situado em outro Estado, é contribuinte do imposto e não pretende revendê-la, figurando como consumidor final.
No entanto, o Estado do Ceará exige das empresas neste seguimento de vendas o recolhimento de imposto complementar, a guisa de diferencial de alíquota, mesmo nas hipóteses de consumidor final não contribuinte do imposto, e o pior, com valores superiores aos pagos no Estado origem sob pena de ter a mercadoria apreendida.
Ora, trata-se de exigência flagrantemente arbitrária por violar frontalmente os comandos constitucionais em análise. Como visto, a Carta Magna apenas outorgou aos Estados e ao Distrito Federal competência para instituir e cobrar o diferencial de alíquota se as vendas têm como destinatário contribuintes de imposto e simultaneamente consumidores finais.
Em tentativa de suavizar ou camuflar a arbitrariedade, as autuadas defendem-se, no apoio no parágrafo único da cláusula terceira do Protocolo ICMS nº 21/11 e no parágrafo 2º do artigo 2º do Decreto nº 30.542/11, quando se aprimora o recolhimento no seu estado origem, onde é seu domicílio, o ICMS calculado mediante a aplicação de alíquota interestadual. Trataria de modo diverso com a exigência do recolhimento deste diferencial, portanto, de mero subterfúgio para que a exigência descabida do estado cearense não represente aumento da carga tributária suportada às autuadas.
Ora, citamos, por exemplo, o estado de São Paulo, que faz uso legítimo da competência que lhe foi outorgada pelo artigo 155, II, §2º, “b”, da CF/88, e exige o recolhimento do ICMS sob a alíquota interna, todavia, já o Estado do Ceará vem exigindo o diferencial de alíquota, que ambos, somando-se, sobrepõem uma taxação injusta.
É inquestionável que a alteração do critério constitucional de repartição da arrecadação do ICMS, sem a aprovação de uma reforma constitucional e seque contando com a participação de todos os Estados-Membros e do Distrito Federal, acaba por desequilibrar o Pacto Federativo, ofendendo diretamente a Constituição Federal.
Mas não é só. A Carta Magna, em seu artigo 152, também veda a fixação pelos Estados de diferenças tributárias em função da sua procedência e destino, mandamento que está sendo vulnerado pelo Estado do Ceará. Com efeito, se uma mesma mercadoria é comercializada por dois contribuintes, um paulista e um baiano, a consumidores finais estabelecidos no Ceará, à mercadoria procedente de São Paulo sofrerá carga tributária infinitamente superior à originária da Bahia. Admitindo-se, por hipótese, que a alíquota de tal mercadoria nos Estados seja de 18% de imposto e no Ceará seja de 17%, o contribuinte paulista terá de recolher 28% de imposto: 18% de alíquota interna exigida pelo fisco paulista em decorrência de venda a consumidor final não contribuinte do imposto localizado no outro Estado mais 10% de diferencial de alíquota exigido pelo estado cearense, correspondente à diferença entre a alíquota interna interestadual e o percentual de 7% previsto no inciso I do art. 1º do Decreto nº 30.542/11. Por outro lado, o contribuinte baiano, ao vender a mesma mercadoria, recolheria apenas 17% de imposto: 12% ao Estado da Bahia que, por ser signatário do Protocolo ICMS nº 21/11, não exigiria a alíquota interna (exemplificando) mais 5% (17% menos 12%) ao Ceará.
Pois bem. A atitude errônea produzida pelo estado do Ceará, através de sua Secretaria Fazendária, não se limita a exigir imposto além dos limites dados da Constituição Federal. Ela ainda ignora a exigência de lei que institua tal imposto. A simples aprovação de Protocolo entre alguns Estados e o Ceará e a reprodução do seu conteúdo em mero decreto do Ilmo. Senhor governador do Ceará não é suficiente para legitimar a cobrança do ICMS complementar, pois ausente lei aprovada pelo Poder Legislativo do Ceará.
Por derradeiro, note-se que a operação mercantil praticada pela Unidade Federativa sequer se enquadra perfeitamente na hipótese prevista no Protocolo ICMS nº 21/11 e no Decreto Estadual nº 30.542/11.
Ademais, orientam algumas empresas que as vendas dos produtos comercializados são realizadas por intermédio de representantes comerciais, todavia ainda assim, o Estado além de fundar-se em normas claramente inconstitucionais, exige destas empresas o pagamento de imposto em situações fáticas que nem mesmo se enquadrariam nas hipóteses descritas abstratamente nos citados diplomas normativos, o que apenas ressalta a ilegalidade de sua imputação, cuja repetição se pretende evitar e restabelecer o status origem, conferindo, pois, a repetição das quantias pagas erroneamente.
3. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO Nº 30.542/2011 E DO PROTOCOLO ICMS Nº 21/2011
Conforme demonstrado, o ato praticado pelo estado cearense é de todo ilegal e inconstitucional. Ab initio, faz-se mister ressaltar a inconstitucionalidade do Decreto nº 30.542/2011, que ratifica o Protocolo ICMS nº 21/11, do qual o Estado do Ceará é signatário, uma vez que, conforme demonstrado, este confronte o artigo 155, §2º, VII, “b” da Constituição Federal.
Tal decreto estabelece nova hipótese de incidência e cria uma sistemática de aplicação de alíquota do ICMS entre Estados em operações que envolvem bens destinados ao consumidor final, determinando que nestas operações o Ceará, quando figurar como Estado de destino da mercadoria, cobrará uma parcela deste imposto que lhe será devida na forma definida pelo Protocolo 21/2011.
Ora, o Decreto nº 30.542/2011 é visivelmente inconstitucional, posto que infringe escancaradamente o aludido dispositivo da Lei Maior. Deste modo, não pode este Estado servir-se de tal norma para apreender mercadorias, bem com cobrar excessivamente tributos quando indevidos, alegando o não pagamento de parcela do ICMS que supostamente seria devida ao estado, forçando assim, os contribuintes a pagarem de forma indevida.
Segundo aquele dispositivo constitucional, nas operações interestaduais, o ICMS é devido integralmente ao Estado de origem quando as operações que lhe originaram destinarem mercadorias a consumidores finais, ou seja, àqueles que não sejam contribuintes de ICMS. Neste sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
Portanto, a alteração da sistemática de repartição das receitas de ICMS nas operações interestaduais com não contribuintes dependeria de emenda constitucional, conforme já entendeu o Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADIN 4565 MC/PI:
CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERESTADUAL E INTERMUNICIPAL. LEI 6.041/2010 DO ESTADO DO PIAUÍ. LIBERDADE DE TRÁFEGO DE BENS E PESSOAS (ARTS. 150 V E 152 DA CONSTITUIÇÃO). DUPLICIDADE DE INCIDÊNCIA (BITRIBUTAÇÃO – ART. 155, § 2º, VII, B DA CONSTITUIÇÃO). GUERRA FISCAL VEDADA (ART. 155, § 2º, VI DA CONSTITUIÇÃO). MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. Tem densa plausibilidade o juízo de inconstitucionalidade de norma criada unilateralmente por ente federado que estabeleça tributação diferenciada de bens provenientes de outros estados da Federação, pois: (a) Há reserva de resolução do Senado Federal para determinar as alíquotas do ICMS para operações interestaduais; (b) O perfil constitucional do ICMS exige a ocorrência de operação de circulação de mercadorias (ou serviços) para que ocorra a incidência e, portanto, o tributo não pode ser cobrado sobre operações apenas porque elas têm por objeto "bens", ou nas quais fique descaracterizada atividade mercantil-comercial; (c) No caso, a Constituição adotou como critério de partilha da competência tributária o estado de origem das mercadorias, de modo que o deslocamento da sujeição ativa para o estado de destino depende de alteração do próprio texto constitucional (reforma tributária). Opção política legítima que não pode ser substituída pelo Judiciário. Medida liminar concedida para suspender a eficácia prospectiva e retrospectiva (ex tunc) da Lei estadual 6.041/2010. (ADI 4565 MC, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 07/04/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 24-06-2011 PUBLIC 27-06-2011)
O Tribunal Cearense já vislumbra tal impossibilidade de cobrança, quando do recente julgamento em sede de Mandado de Segurança[2]:
Sustenta ainda que as disposições do Protocolo ICMS nº. 21/2011 e do Decreto nº 30.542/2011 afrontam a Constituição Federal em seu art. 155, § 2º, VII, "b", que expressamente prevê a adoção da alíquota interna quando o destinatário não for contribuinte do ICMS, não sendo as referidas espécies legais questionadas instrumentos hábeis a veicular o conteúdo normativo pretendido pelo Estado do Ceará, o que caberia a lei.
(...)
A medida liminar em Mandado de Segurança destina-se a evitar um dano irreparável ao patrimônio jurídico do impetrante. Desde que presentes os pressupostos do fumus boni juris – plausibilidade do direito – e do periculum in mora – dano irreparável ou de difícil reparação, pode o juiz conceder decisão de urgência.
Vislumbro o periculum in mora da prestação jurisdicional requerida, porque o não deferimento da liminar almejada, certamente ocasionará à autora danos irreparáveis ou de difícil de reparação, vez que sofrerá a retenção de mercadorias para cobrança do tributo, além de sofrer com o ônus fiscal excessivo que lhe é imposto, o que lhe trará prejuízos financeiros e limitará o regular e pleno exercício de suas atividades econômicas.
Por outro lado, imperioso se faz reconhecer, pelo menos em análise perfunctória da matéria, a provável ocorrência de malferimento a direito líquido e certo da impetrante, afigurando-se-me ilegal privá-la do direito de comercialização interestadual de sua mercadorias para consumidores finais não contribuintes do ICMS, com a exigência do pagamento do diferencial de alíquota (ICMS CARGA LÍQUIDA).
Outrossim, percebo que a pretensão da impetrante consta na abstenção do impetrado à prática de qualquer ato a obstar a livre circulação das mercadorias vendidas em operações interestaduais a consumidores finais não contribuintes do ICMS.
(...)
Ante o exposto, esteado nas permissividades constantes do art. 7º, inciso III da Lei Federal nº 12.016/2009, CONCEDO a tutela liminar requestada, para o fim de determinar que a autoridade coatora se abstenha da prática de qualquer ato tendente à exigência do ICMS com embasamento no Decreto nº 30.542/2011 nas operações de venda interestaduais não presenciais realizadas pela impetrante PALIMANAN COMÉRCIO DE PISOS E REVESTIMENTOS LTDA., destinadas a pessoas físicas ou jurídicas não contribuintes no Estado do Ceará, até decisão ulterior deste juízo.
Neste tocante, como se observa, o Egrégio Supremo Tribunal Federal deferiu em sede de ADI 4565, a medida cautelar para suspender os efeitos da Lei nº 6041/2010 do Estado do Piauí sob o argumento do Min. Rel. Joaquim Barbosa de que “o rápido avanço tecnológico tem agravado as distorções dos princípios da neutralidade e do pacto federativo”, de forma que as eventuais disparidades de arrecadação decorrentes desse avanço devem ser sanadas por meio de reforma tributária, não podendo tais alterações ser realizadas unilateralmente por cada ente político da federação.
Ainda neste sentido, foram ajuizadas as ADIs 4599 e 4596 propostas contra a legislação dos Estados do Mato Grosso e do Ceará, respectivamente. Em ambas as ações o mérito da questão foi apreciado diretamente pelo plenário do STF, com base no artigo 12 da Lei 9.868/99, que permite que o processo seja analisado diretamente no mérito diante da relevância da matéria e de seu especial significado para ordem social e a segurança jurídica.
A ADI 4599 questiona a constitucionalidade dos Decretos 2.033/2009 e 312/2011 do Estado do Mato Grosso, que determinam a cobrança do adicional de ICMS nas operações de aquisição de produtos vindos de outros Estados, mesmo a compra sendo realizada pelo consumidor final, visando, primordialmente, ao fomento da arrecadação estadual com a tributação de bens adquiridos no comércio eletrônico, de forma que já se faz presente nesta ADI o questionamento da legislação que dá aplicação ao Protocolo 21/2011 neste Estado do Ceará.
Enquanto isso, a ADI 4596, que é a que mais interessa ao presente caso, busca a decretação da inconstitucionalidade da Lei 14.327/2008, do Decreto Estadual 29.560/2008 e do Decreto 30.542/2011, que ratifica o Protocolo 21/2011, todos do Estado do Ceará.
A existência dessas ADIs torna mais evidente a inconstitucionalidade das legislações que ratificam o Protocolo 21/2011, que é o caso do Decreto 30.542/2011 do Ceará, isso porque, impedir ou dificultar o ingresso no Estado do Ceará de mercadorias e bens provenientes de outros Estados da Federação fere o artigo 155, §2ª, VII, “b” da Constituição Federal, o princípio da não discriminação previsto no inciso artigo 152 da Carta Magna e também o pacto federativo, como exposto acima.
Ademais, o referido decreto viola também o principio previsto no artigo 150, V da Carta Magna, que proíbe limitações ao tráfego de pessoas ou bens por meio de tributos interestaduais, com exceção de pedágios. Desta forma, não pode o estado signatário do protocolo, exigir tal cobrança sob o argumento de recolhimento de ICMS complementar. A eloquência de tais decisões, de tribunais que fatalmente analisarão as demandas ora inauguradas em inúmeros estados, em especial, aos incitado no Tribunal de Justiça cearense, corrobora a tese aqui defendida e torna indubitável a violação ao seu direito liquido e certo perpetrada pelo estado.
4. DO PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE E DA VEDAÇÃO A QUEBRA DO PACTO FEDERATIVO
O Decreto nº 30.542/11 fixou os percentuais do tributo em questão, desrespeitando os preceitos básicos da Constituição Federal, na medida em que o ordenamento jurídico pátrio não admite delegação de competência para definir os elementos essenciais do tributo, tais como fixar alíquotas de tributo, ipso facto, tal procedimento não encontra amparo constitucional. Impossível conferir tal discricionariedade à Administração.
Notadamente, no presente caso a inconstitucionalidade é tão flagrante que a alíquota do tributo foi estabelecida através de decreto, na medida em que a Lei não esgotou o estabelecimento das alíquotas, delimitando apenas a alíquota mínima e máxima do tributo ora questionada, deixando tal atribuição para o regulamento, o qual, através do Decreto nº 30.542/11, fixou os percentuais, desrespeitando os preceitos básicos da Constituição Federal, haja vista que esta delegação ao regulamento para fixar alíquotas de tributos, não encontra amparo constitucional.
Assim, a determinação da alíquota de tributo através de decreto, configura uma afronta direta ao art. 150, I da Constituição que estabelece a vedação de exigir ou aumentar tributo que não seja por meio da Lei.
Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
No Direito brasileiro, a Lei deve descrever todos os elementos essenciais da norma tributária que de algum modo, possa influenciar no quantum do tributo devido, tais como, hipótese de incidência, fato gerador, sujeito passivo, base de cálculo e alíquota senão vejamos o que assevera o ilustre Roque Antônio Carrazza[3]:
(...) No Brasil, por injunção do princípio da legalidade, os tributos são criados, in abstracto, por meio de lei (art. 150, I da CF), que deve descrever todos os elementos essenciais da norma jurídica tributária os que, de algum modo, influem no an e no quantum do tributo; a saber: a hipótese de incidência do tributo, seu sujeito ativo, seu sujeito passivo, sua base de cálculo e sua alíquota. Estes elementos essenciais só podem ser veiculados por meio de lei.
O Código Tributário Nacional, em atendimento à norma constitucional, determina que somente a lei pode instituir tributo e fixar alíquota, senão vejamos:
Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:
I - a instituição de tributos, ou a sua extinção;
II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;
III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo;
IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;
V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas;
VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.
Sobre este tema, o Ilustre Tributarista Hugo de Brito Machado[4] asseverou da seguinte forma:
O Código Tributário Nacional, por seu turno, reproduz a regra vedando a instituição de tributo sem que a lei o estabeleça (art. 9º) e explicita o princípio em toda a sua extensão, estabelecendo que somente a lei pode instituir, extinguir, majorar e reduzir tributo, com as ressalvas expressamente previstas; só a lei pode definir o fato gerador da obrigação tributária principal, fixar as alíquotas e bases de cálculo, cominar penalidades e estabelecer as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades (art. 97).
Na verdade, dizer que somente a lei pode estabelecer a instituição de tributos (CTN, art. 97, I) seria suficiente. Mas o Código foi além. Disse que somente a lei pode estabelecer a definição do fato gerador da obrigação tributária principal e do seu sujeito passivo. Com isso já ficou afastada a possibilidade de fixação, em qualquer ato normativo diverso da lei, de qualquer elemento necessário à determinação do tributo, em todos os seus aspectos. Mas o código não ficou aí. Determinou que somente a lei pode estabelecer a fixação da alíquota do tributo, e da sua base de cálculo (art. 97, IV). Assim, ficou inteiramente excluída a possibilidade de se admitir, por via de interpretação em que se desse à expressão fato gerador um sentido menos abrangente, o estabelecimento, em normas diversas da lei, de elementos necessários à fixação do quantum do tributo, ou do sujeito passivo respectivo.
Justo, portanto, a análise desta abordagem de estudo, avaliar medidas legais de modo a combater a infringência legislativa, como condão de assegurar o protecionismo delineado no arcabouço constitucional, evitando os atos confiscatórios.
Neste norte, os comandos estabelecidos pelo Decreto nº 30.542/11, ferem o pacto federativo previsto no artigo 18, da Constituição Federal de 1988[5].
É cediço que a República Federativa do Brasil adota a descentralização política com a repartição das competências tributárias, no entanto, a autonomia dos entes políticos é exercida dentro de uma limitação imposta pela Carta da República, até para que não se extrapole atribuição conferida ao Estado.
As repercussões de normas que excedem os limites do pacto federativo, tais como as editadas pelo Estado do Ceará acima transcritas, são desastrosas, na medida em que ferem de morte a Constituição da República e causam o caos na ordem jurídica. Logo, patente a desfoque da aplicabilidade da norma cearense a contrassenso do texto constitucional.
5. DA ANÁLISE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL AO DECIDIR SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE DO PROTOCOLO N º 21/2011
Após muitos debates e enfrentamentos, a Corte Suprema, em 18 setembro de 2014 julgou em conjunto as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4628 e 4713/ / RExt 680.089 – a primeira ajuizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens Serviços e Turismo (CNC) e a segunda pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), relatadas pelo ministro Luiz Fux, além do Recurso Extraordinário (RE) 680089, com repercussão geral, relatado pelo ministro Gilmar Mendes.
Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do Protocolo ICMS 21/2011, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que exigia, nas operações interestaduais por meios eletrônicos ou telemáticos, o recolhimento de parte do ICMS em favor dos estados onde se encontram consumidores finais dos produtos comprados. Para os ministros, a norma viola disposto no artigo 155 (parágrafo 2º, inciso VII, alínea b) da Constituição Federal.
Em seu voto nas ADIs, o ministro Luiz Fux frisou existir uma inconstitucionalidade material, uma vez que o protocolo faz uma forma de autotutela das receitas do imposto, tema que não pode ser tratado por esse tipo de norma. Além disso, o ministro afirmou que, ao determinar que se assegure parte do imposto para o estado de destino, o protocolo instituiu uma modalidade de substituição tributária sem previsão legal.
Para o ministro Gilmar Mendes, relator do RExt, “(...) essa necessidade [de repartir melhor as riquezas] não é suficiente para que se reconheça a validade da norma em questão, diante do que diz o texto constitucional."
No mesmo sentido, em seu voto nas ADIns o ministro Fux foi enfático ao assinalar a existência de inconstitucionalidade material, uma vez que o protocolo não é meio hábil para a alteração da legislação tributária – ao determinar que se assegure parte do imposto para o estado de destino, o protocolo teria instituído uma modalidade de substituição tributária sem previsão legal. O art. 155 da CF é claro, disse o ministro, ressaltando que “é preciso se aguardar emenda ou norma com força de emenda para esse fim”.
De acordo com seus defensores, o protocolo buscou estabelecer uma forma de repartir a riqueza oriunda do ICMS entre as unidades da federação.
Embora tenham admitido que de fato a configuração atual do imposto reproduz uma concentração da receita nos poucos Estados remetentes – Estados sobretudo da região Sudeste, em que se localizam grande parte das empresas varejistas distribuidoras –, os ministros foram unânimes no entendimento de que a alteração perpetrada pelo Confaz viola o art. 155, parágrafo 2º, inciso VII, alínea b, da Constituição Federal de 1988.
Após a declaração de inconstitucionalidade, a maioria dos ministros concordou em modular os efeitos da decisão proferida (ADI 4628). Os magistrados determinaram que a norma era válida até 18 de fevereiro de 2014, quando o Min. Fux concedeu uma liminar suspendendo os efeitos do protocolo.
Isso significa que os contribuintes que não entraram com ação não poderão requerer judicialmente a devolução do imposto pago quando a norma estava em vigor. O direito de receber, entretanto, está resguardado às empresas que entraram com processos antes de fevereiro, de acordo com os ministros do Supremo.
Com a entrada em vigor do Protocolo 21/2011, evidentemente, gerou calorosos debates e discussões sem fim sobre a sua perceptível inconstitucionalidade e a agressão literal à Constituição Federal. Submetida ao crivo do Supremo Tribunal Federal diante da evidente e prejudicial inconstitucionalidade, diversas associações, entidades e os próprios Estados diretamente atingidos se mobilizaram e ingressaram com diversas ações (ADI) e, inclusive, na qualidade “amicus curiae” para assistir a outros autores originários dessas ações.
Assim, diante de tudo o que foi exposto verifica-se que a decisão concedida pelo Supremo Tribunal Federal, onde ratifica a liminar anteriormente exposta a fim de suspender a exigência da cobrança, for à de fato um inquestionável vitória às empresas de “e-commerce” e aos próprios consumidores das regiões norte e nordeste do País, que chegaram a ter suas mercadorias apreendidas quando não estivessem acompanhadas das respectivas guias de recolhimento.
Notadamente, a decisão proferida com âmbito efeito, tão somente, contextualizou todo o modular estudo sobre o tema, objeto deste artigo, que desde suas sucintas notas introdutivas, destacou o quanto era prejudicial à aplicabilidade irregular do Protocolo 21/2011, e seus desenfreados efeitos ao mundo prático comercial e ao estudo tributário, que agora, repercutirá as empresas anteriormente cobradas à exigibilidade quanto à repetição do crédito anteriormente pago, a anulação dos atos administrativos instaurados a fatos anteriores a liminar do STF de fevereiro de 2014, como mecanismo de desfazimento do ato então tido como imperfeito.
6. DA NOVA INCIDÊNCIA LEGAL – LEI DO ESTADO DO CEARÁ Nº. 15.863 DE 13 DE OUTUBRO DE 2015 COM BASE NA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº. 87/2015
Resta-se claro e tortuoso, a manobra que se impõe quando da aplicabilidade de uma norma, que obrou seu desfecho quando questionada sua inconstitucionalidade. O Supremo, já decidira, produzindo seus efeitos a todo o território nacional.
Ocorre, porém, que a fundamentação que anteriormente estava em falta, agora, é superada, de modo ainda mais perspicaz, pois se traduz uma obrigatoriedade que certamente sufragará o direito do consumidor, que até o presente momento, ainda não sofreram com os aumentos que certamente, deverá está embutido ao preço final do produto de modo a compensar a arrecadação que os estados mais desenvolvidos deixarão de arrecadar.
Ao que nos espanta, estudiosos do assunto, a decisão que ficou sobrestada desde o mês de fevereiro do ano transcorrido, proveniente da decisão liminar do Min. Luiz Fux do Supremo, nota-se convalescida com a promulgação da Emenda Constitucional n. 87/2015, de modo que agora, ou melhor, a partir de 1ª de janeiro de 2016, nas operações interestaduais destinadas a consumidor final, contribuinte ou não do ICMS, aplicação da alíquota interestadual e o ICMS Diferencial de Alíquotas será devido ao Estado de destino. Neste ponto, salienta o novo texto constitucional:
Art. 1º Os incisos VII e VIII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal passam a vigorar com as seguintes alterações:
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual;
a) (revogada);
b) (revogada);
VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída:
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto;
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto;
Art. 99. Para efeito do disposto no inciso VII do § 2º do art. 155, no caso de operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte localizado em outro Estado, o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual será partilhado entre os Estados de origem e de destino, na seguinte proporção:
I - para o ano de 2015: 20% (vinte por cento) para o Estado de destino e 80% (oitenta por cento) para o Estado de origem;
II - para o ano de 2016: 40% (quarenta por cento) para o Estado de destino e 60% (sessenta por cento) para o Estado de origem;
III - para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) para o Estado de destino e 40% (quarenta por cento) para o Estado de origem;
IV - para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) para o Estado de destino e 20% (vinte por cento) para o Estado de origem; V - a partir do ano de 2019: 100% (cem por cento) para o Estado de destino;
Para as operações e prestações que destinem bens e serviços ao consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, será adotada a alíquota interestadual, cabendo ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual, alcançando todas as operações, inclusive vendas por meio de comércio eletrônico, telemarketing e catálogos.
Em relação às operações que tenham como destino o Estado do Ceará, essa questão da partilha, até 2018, é apenas quando o destinatário for não contribuinte do ICMS, assim considerado a pessoa física ou jurídica sem inscrição estadual ou ainda que tenha, seja do Regime de Recolhimento “Outros” (excetuados os casos com tratamento específico). Com os demais contribuintes do ICMS permanecem as disposições do art. 589 do Dec. 24.569/97(RICMS/CE), ou seja, o Diferencial de Alíquotas será devido na apuração da conta gráfica para empresas com escrituração fiscal regular (Regime de Recolhimento Normal) e para os demais regimes de recolhimento, na entrada do Estado.
Com operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte localizado em outro Estado, o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual será partilhado entre os Estados de origem e de destino, a partir da entrada em vigência até 2018, conforme art. 99 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incluído pela Emenda Constitucional nº 87/2015, onde foi estabelecido conforme cronograma, sendo que o inicio de vigência pra 2015 ficou prejudicado, visto que sua vigência legal será para o ano de 2016.
Desta ponta, o Estado do Ceará, como era de se esperar, já promulgou sua nova lei, de modo a tornar exigível o viés jurídico aviltado pelo novo texto constitucional em vigor, mas que apenas aguarda sua exigibilidade. Assim, promulga a Lei Estadual n. 15.863 de 13 de outubro de 2015 que dispõe acerca do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, alterando assim, a lei n. 12.670, de 27 de dezembro de 1996 que disciplina o ICMS no estado.
A partir da entrada em vigência, considerando ser 2016, digamos que a empresa SSP Ltda, de São Paulo, ao realizar uma venda de R$ 10.000,00 referente uma televisão de 90 polegadas para consumidor final no Ceará, não contribuinte do ICMS, em vez de aplicar a alíquota interna para o respectivo produto, deverá destacar a alíquota interestadual, que no caso será de 7% (oriunda do Sul e Sudeste) ou mesmo 4% (produto de origem estrangeira na forma da Resolução do Senado Federal 13/2012). Suponhamos que seja 7% a alíquota destacada na NFe.
A televisão tem alíquota interna no Ceará de 17%, portanto um Diferencial de Alíquota de 10%, que para o caso, um apurado de 10% de 10.000,00 = 1.000,00; valor apurado de R$ 1.000,00, a título de Diferencial de Alíquotas. Desse Diferencial de Alíquotas apurado, R$ 600,00(1.000,00 x 60% = 600,00) fica para São Paulo, e R$ 400,00(1.000,00 x 40% = 400,00) deverá ser enviado pelo vendedor ao Estado do Ceará, na condição de responsável tributário, visto que o destinatário é não contribuinte do ICMS, provavelmente via GNRE.
Deste modo, o texto de lei cearense, passará a viger nos seguintes moldes:
Art. 1º Os dispositivos abaixo da Lei nº 12.670, de 27 de dezembro de 1996, que dispõe acerca do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, passam a vigorar com as seguintes alterações:
I - o art.2º com o acréscimo do inciso IX e dos §§3º e 4º :
"Artigo 2º (...)
IX - as operações e prestações iniciadas em outra unidade da Federação que destinem bens ou serviços a consumidor final não contribuinte do imposto localizado neste Estado.
(...)
§ 3º Na hipótese do inciso IX deste artigo, o remetente da mercadoria ou prestador do serviço recolherá o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna deste Estado e a interestadual da unidade federada de origem, no prazo estabelecido em regulamento.
§ 4º O disposto no §3º deste artigo aplica-se, inclusive, nas operações e prestações praticadas por contribuintes optantes pelo Simples Nacional." (NR)
II - o art.3º com o acréscimo do inciso XVI:
"Artigo 3º (...)
XVI - da entrada, neste Estado, de mercadoria, bem ou serviço, destinado a não contribuinte do ICMS." (NR)
III - o art.14 com nova redação do inciso XII do §2º :
"Artigo 14. (...)
§ 2º (...)
XII - qualquer pessoa indicada nos incisos anteriores que, na condição de contribuinte ou não, consumidor final, adquira mercadoria, bem ou serviço em operações interestaduais." (NR)
IV - o art.28 com nova redação do inciso IX do caput:
"Artigo 28. (...)
IX - na hipótese dos incisos XIII, XIV e XVI do art.3º , o valor, respetivamente, da prestação ou da operação sobre o qual foi cobrado o ICMS no Estado de origem." (NR)
V - o art.44 com nova redação do inciso III do caput e acréscimo do §4º :
"Artigo 44. (...)
III - nas operações e prestações interestaduais:
a) 4% (quatro por cento), nas prestações de serviço de transporte aéreo de passageiro, carga e mala postal;
b) 4% (quatro por cento), para as mercadorias ou bens importados do Exterior por contribuintes do imposto, nos termos da Resolução nº 13, de 25 de abril de 2012, do Senado Federal, desde que:
1. não tenham sido submetidos a processo de industrialização; ou
2. ainda que submetidos a processo de industrialização, resultem em mercadorias ou bens com conteúdo de importação superior a 40% (quarenta por cento);
c) 12% (doze por cento) para as demais prestações e operações com mercadorias ou bens destinados a contribuintes ou não do imposto.
(...)
§4º O disposto na alínea "b" do inciso III do caput deste artigo não se aplica:
I - aos bens e mercadorias importados do exterior do País que não tenham similar nacional, a serem definidos em lista editada pelo Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior -CAMECE;
II - aos bens produzidos em conformidade com os processos produtivos básicos de que tratam o Decreto-Lei nº 288, de 28 de fevereiro de 1967, e as Leis nos8.248, de 23 de outubro de 1991, 8.387, de 30 de dezembro de 1991, 10.176, de 11 de janeiro de 2001, e 11.484, de 31 de maio de 2007;
III - às operações que destinem gás natural importado do exterior do País a outros Estados." (NR)
Art. 2º O recolhimento a que se refere o §3º do art.2º da Lei nº 12.670, de 27 de dezembro de 1996, com a redação determinada por esta Lei, deverá ser realizado pelo contribuinte remetente ou prestador localizado em outra unidade da Federação, na seguinte proporção:
I - para o ano de 2016: 40% (quarenta por cento) do valor correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
II - para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) do valor correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
III - para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) do valor correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
IV - a partir do ano de 2019: 100% (cem por cento) do valor correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual.
Art. 3º No caso de operações ou prestações que destinem bens ou serviços a não contribuinte localizado em outra unidade da Federação, caberá a este Estado, até o ano de 2018, além do imposto calculado mediante a utilização da alíquota interestadual, parte do valor correspondente à diferença entre esta e a alíquota interna da unidade da Federação destinatária, na seguinte proporção:
I - para o ano de 2016: 60% (sessenta por cento);
II - para o ano de 2017: 40% (quarenta por cento);
III - para o ano de 2018: 20% (vinte por cento).
Art. 4º Fica revogado o inciso V do art.45 da Lei nº 12.670, de 27 de dezembro de 1996.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor a partir de 1º de janeiro de 2016.
Ressalte-se que a norma em questão, apesar de estar sendo nominada de Emenda do e-commerce ou venda pela internet, não se trata necessariamente disso. As operações realizadas de forma não presencial, de muito tempo vem trazendo turbulências aos Estados consumidores como no caso do Ceará. Antes do Protocolo ICMS 21/2011, o Ceará editou o Dec. 29.560/08, em que o art. 6º-A já determinava a cobrança do ICMS carga liquida quando o destinatário não fosse contribuinte do ICMS, em operações não presenciais.
Assim, nasceu, conforme exposição acima, no CONFAZ o Protocolo ICMS 21/2011, sendo regulamentado no Ceará pelo Dec. 30.542/2011. O foco seria tributar, partilhando o ICMS, quando das vendas pela internet ou show room, ou seja, nas operações não presenciais, sendo que Unidades Federadas importantes, como São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, ficaram de fora. Esse Protocolo conforme destacamos trouxe muitos problemas e inúmeras medidas judiciais em sede de mandado de segurança, até ser julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4628. O Estado do Ceará suspendeu a cobrança em 14/03/2014, com efeitos desde 21/02/2014, após a comunicação da liminar no Supremo que suspendeu a cobrança pelos estados federados. Mas desde 2012 que tinha a discussão a respeito desse Protocolo ICMS, notadamente com a PEC 197/2012, até dar origem à Emenda Constitucional 87/2015 (cobrança do ICMS sobre as operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado).
A questão maior da EC 87/2015 não é o e-commerce, o fundamento até pode ser, mas o detalhe importante a ser considerado é que nas operações interestaduais com consumidor final, contribuinte ou não, será adotada a alíquota interestadual do ICMS, com mercadoria negociada de qualquer forma, seja pela internet, show room, telemarketing ou outros meios.
CONCLUSÃO
Analisamos ao longo deste trabalho, que pelo princípio se traduziu na ilegalidade quanto a exigência expendida pelo Protocolo 21/2011 da CONFAZ, constatada das normas supratranscritas, onde o poder público Estadual aderiu através do Decreto nº 30.542/2011, uma nova modalidade de cobrança do ICMS quando das entradas de mercadorias ou bens advindos de outros Estados da Federação no Ceará, em substituição àquela determinada pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 155, II, §2º, VII, alínea “b”.
É inquestionável que a alteração do critério constitucional de repartição da arrecadação do ICMS, sem a aprovação de uma reforma constitucional e sequer contando com a participação de todos os Estados-Membros, acaba por desequilibrar o Pacto Federativo, ofendendo diretamente a Constituição Federal. Pois bem, conclui o Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do enveredamento e aplicabilidade do Protocolo da CONFAZ, entendendo justo o pleito pretendido pelo comércio eletrônico, eis que diretamente fora tolhido aos entes contributivos o direito ao seu livre acesso e entrega de mercadorias quando cumprida todas as exigências partidas por normas válidas, todavia, turbada em seus compromissos de entrega, relutando como “expurgante” à medida que exige o pagamento diferenciado de alíquota, tudo, como o fito de “equilibrar a concorrência de vendas”.
Todavia, com a nova prática adota pela chamada: emenda e-commerce alterou todo o sentido proibitivo da anterior norma, agora, ampliando seus efeitos, possibilidade inclusive, que os entes estaduais criem suas normas, com assim o fez o estado do Ceará aos idos de novembro do corrente ano, o que repercutirá efeitos já incidentes para o ano de 2016.
Por esse estudo, apontamos também, a impropriedade constitucional em que o poder executivo não poderia traçar ações fora de sua competência, em especial, ao próprio texto constitucional, quando lhe falta capacidade, competência e materialidade para tal interpelação serviram de base para se declarar a inconstitucionalidade da norma inserida no chamado: Protocolo 21.
O presente estudo apresentou-se como tema de extrema importância, albergado de decisões recentes em favor do objetivo de estudo, as atualizações normativas a nível constitucional e normas infra legais, que no primeiro plano, posicionou-se pela ilegalidade da cobrança pelo Estado do Ceará, fulminando por complete a inconstitucionalidade do Protocolo 21/2011, ao observá-lo com patente mecanismo de confisco tributário a exigência que se vinha adotando, que agora, deixa de ser válido a todas as federações.
Ao contrário do que nos espera já para os próximos meses, a exigibilidade anteriormente questionada, agora, sobre uma conjectura de “emenda ao petitório inaugural” passará a ter efeitos concretos que imperará sobre todo o comércio nacional, especialmente, afetando diretamente, ao consumidor final.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988 e atualizações Emenda Constitucional nº 87/2015.
_______, Código Tributário Nacional. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
_______, Decreto nº 29.560/08 do Estado do Ceará (ICMS).
_______, Decreto nº 30.542/2011 do Estado do Ceará (ICMS) – Protocolo 21 da CONFAZ.
_______, Lei Estadual nº 15.863 de 13 de outubro de 2015 do Estado do Ceará.
DOCUMENTOS JURÍDICOS:
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 15ª Edição, Malheiros Editores, p. 344
MACHADO. Hugo de Brito, Comentários ao Código Tributário Nacional, Volume I, Atlas, p. 108.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 27ª Edição, Malheiros, p. 66.
JURISPRUDÊNCIAS:
ADI 4628 – Supremo Tribunal Federal. Relator: Min. Luix Fux. – Decisão: 14 de fevereiro de 2014.
ADI – 4713- Recurso Extraordinário em Repercussão Geral nº 680.089 - Supremo Tribunal Federal – Relator: Min. Gilmar Mendes. Decisão: 17 de setembro de 2014.
Processo nº: 0132250-35.2012.8.06.0001. 2º Vara da Fazenda Pública no Estado do Ceará. Impetrante: Palimanan Comercio de Pisos e Revestimentos Ltda. (Adv. Átila Gomes Ferreira) Impetrado: Secretário Adjunto da Fazenda do Estado do Ceará.
[1] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 27ª Edição, Malheiros, p. 66.
[2] Processo nº: 0132250-35.2012.8.06.0001. 2º Vara da Fazenda Pública no Estado do Ceará. Impetrante: Palimanan Comercio de Pisos e Revestimentos Ltda. (Adv. Átila Gomes Ferreira) Impetrado: Secretário Adjunto da Fazenda do Estado do Ceará.
[3] CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 15ª Edição, Malheiros Editores, p. 344.
[4] MACHADO. Hugo de Brito, Comentários ao Código Tributário Nacional, Volume I, Atlas, p. 108.
[5] “Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.”