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A privatização do setor de saneamento básico no Brasil

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4. Pendências judiciais

A não existência de normas sólidas no setor gera uma série de conflitos entre o setor privado e entidades do setor público, em especial o Ministério Público, o qual vem atuando principalmente na esfera judicial, a fim de discutir diversos aspectos legais atinentes ao setor de saneamento básico e ao próprio regime de concessões.

Diversas foram as medidas judiciais movidas em face de empresas do setor privado, de municípios e estados, dentre as quais destacamos:

  • Competência para outorga de concessão
  • : O Estado do Rio de Janeiro havia aprovado a Lei Complementar n.º 87/97, a qual criou a região metropolitana do Rio de Janeiro, conferindo ao Estado o poder concedente do serviço de saneamento. O Partido Democrático Trabalhista (PDT) ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal, requerendo a declaração de inconstitucionalidade de referida lei. Em julgamento de 06 de maio de 1998, o Tribunal Pleno do STF decidiu, por votação majoritária, não conhecer da ação indireta.
  • Dispensa de licitação para contratação
  • : Em ação popular movida na Comarca de Mairinque (SP), o município de Alumínio (SP) obteve decisão em primeira instância, determinando a dispensa de licitação para contratação da empresa estadual SABESP para a continuação das obras de saneamento básico. Referida decisão, ainda não transitada em julgado, favoreceu a atuação do Estado no setor.
  • Cobrança de taxas ou tarifas
  • : Ação Civil Pública movida no município de Limeira (SP), em face da Águas de Limeira, discutindo a forma de cobrança do serviço de saneamento básico. O Ministério Público alega que a cobrança deve se dar por meio de taxa, de forma a quantificar exatamente o valor da prestação do serviço. Por outro lado, o Tribunal de Justiça de São Paulo já emitiu decisões no sentido de que a cobrança deve se dar mediante tarifa, sendo calculado o valor da prestação do serviço através de uma porcentagem do valor da conta de água. Ação ainda em andamento.
  • Reversibilidade de bens
  • : Decisão de primeira instância (ainda passível de recurso) determinou o cancelamento da concorrência pública feita em 1994 e do contrato de concessão do SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) de Limeira (SP). A Justiça entendeu que, no edital de licitação, deveria constar todos os bens reversíveis da SAAE após o fim do prazo de concessão, o que não ocorreu.

5. Agência Reguladora de Águas

Após a criação das Agências Reguladoras de energia elétrica, de petróleo e de telecomunicações, o Governo Federal prepara a criação da Agência Nacional de Águas. Uma das principais missões de referida Agência será a organização da rede nacional de recursos de água e esgoto, bem como dar continuidade à privatização do setor.

Portanto, é fundamental que a nova Agência seja uma entidade independente, a fim de promover a estabilidade das políticas de saneamento, sem sofrer influência de interesses políticos contrários ao interesse público.

A própria Associação Brasileira das Concessionárias de Serviços Públicos de Água e Esgoto (ABCON) defende que:

  • seja formulada uma política clara e abrangente para o Setor de Saneamento, que suporte a concepção de um Marco Regulatório e de uma Agência Reguladora;
  • a Agência Reguladora se estabeleça com absoluta independência jurídico-administrativa do Poder Concedente;
  • a Agência Reguladora se estabeleça exclusivamente em regime Regional (dentro de um Estado, ou conjunto de municípios) a fim de eliminar as limitações do municipalismo e os riscos políticos da grandiosidade dos Estados;
  • haja participação equilibrada na composição da Agência Reguladora dos representantes das três entidades: Poder Concedente, Provedores de Serviços e da Sociedade Civil (representante dos usuários);
  • haja uma clara distinção de funções e atribuições entre o Poder Concedente e a Agência Reguladora;
  • a Agência Reguladora seja detentora de recursos financeiros próprios independentes.

6. Conclusão

Verifica-se, pois, que já existem condições concretas para a entrada de capitais privados no setor e para que o poder público exerça suas funções de regulador e fiscalizador, assegurando à população a excelência na prestação dos serviços e a melhoria dos indicadores de saúde pública.

Em que pese a existência de medidas judiciais atinentes ao setor de saneamento básico, é fato de que se trata da casos isolados, não devendo comprometer as metas existentes para a expansão e melhoria das condições de saneamento básico no Brasil.


NOTAS

  1. Fonte: Jornal "Gazeta Mercantil" de 19 de novembro de 1999.
  2. Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios de 1996.
  3. Dado fornecido pelo BNDES em setembro de 1998.
  4. Segundo o Jornal "Gazeta Mercantil" de 19 de novembro de 1999, serão necessários investimentos da ordem de R$ 3,2 bilhões por ano até 2010 para o desenvolvimento do setor.
  5. Fonte: Jornal "Gazeta Mercantil" de 19 de novembro de 1999.
  6. Conforme exposição de motivos do PLS 560/99.
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Sobre os autores
Oscar Petersen

advogado e economista em São Paulo (SP)

Paulo Brancher

advogado em São Paulo (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PETERSEN, Oscar ; BRANCHER, Paulo. A privatização do setor de saneamento básico no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 40, 1 mar. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/450. Acesso em: 29 mar. 2024.

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