Vieses da redução etária da imputabilidade penal: breve análise da PEC 171 e a (im)possibilidade de repercussão na criminalidade brasileira

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A PEC 171 introduz a discussão sobre a hipótese de impacto da redução da maioridade penal na criminalidade e segurança pública nacional. Analisa-se a possibilidade jurídica e constitucional da redução etária e de repercussões na criminalidade.

INTRODUÇÃO

            Com a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 171/1993 pela Câmara de Deputados em julho de 2015 é reaquecida a discussão sobre o redução da maioridade penal no Brasil. A Proposta tem por objeto a alteração do artigo 228 da Constituição Federal, visando reduzir a maioridade penal para dezesseis anos, de modo a permitir a imputabilidade do menor de dezoito anos em casos específicos.

            Em que pesem as discussão já decorrerem de longa data, inclusive sendo tema de debates nos mais diversos campos da sociedade civil, viu-se nos últimos tempo o surgimento do clamor público no sentido de punirem-se infratores atualmente inimputáveis por questão etária. Em resposta à fragilidade da segurança pública nacional, e do suposto crescimento da ocorrência de crimes cometidos por menores de idade, o legislativo, através da Câmara de Deputados, fez, então, ressurgir o debate, com a aprovação da PEC nº 171.

            Entretanto, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, enquanto norma fundamental superior do ordenamento jurídico, há que se verificar a possibilidade de alterar a proteção por ela consubstanciada ao menor de idade. A maioridade penal aos dezoito anos é mais do que um parâmetro objetivo, mas uma ênfase na mens legis constituinte, voltada para os anseios sociais e resultados almejados.

            Mais do que isso, urge esclarecer se a redução da imputabilidade penal de fato acarreta alguma resposta em termos de redução da criminalidade, ou ainda, se o já esgotado sistema carcerário brasileiro possuiria condições efetivas de reintegrar os menores de dezoito anos à sociedade, ou se apenas agravaria a segregação social desses jovens.

            Nesse sentido, cabe analisar as causas de aumento da criminalidade entre os menores de idade. Destaca-se, aqui, o problema social envolto na miséria e pobreza da maioria dos brasileiros, o que ocasiona aumento do número de menores à margem da sociedade. Esse cenário explicaria a razão pela qual a maioria dos menores envolvidos em atos infracionais encontram-se entre aqueles de baixa renda, estabelecendo uma relação direta entre pobreza e criminalidade.

            Por outro lado, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê medidas protetivas e, até certo ponto, punitivas para o menor infrator. Portanto, parece incorreto o argumento de que os menores infratores caminham à margem do ordenamento jurídico, isentos de qualquer reprimenda por seus atos infracionais. Pelo contrário, uma possível saída para a redução da precoce marginalização do menor poderia, segundo alguns, ser encontrada na efetividade da aplicação das medidas protetivas previstas no Estatuto.

            Mais ainda, o Estatuto da Criança e do Adolescente atribui responsabilização especial aos menores de idade, distinta daquela atribuída aos imputáveis, mas ainda assim existentes, e permeados por conteúdo restritivo de direito. Nesse sentido, apesar de as medidas restritivas referirem-se a aspectos educacionais e sociais, é preciso que haja clareza de sua natureza, pois o ato infracional oferece uma legitimidade ao Estado para invadir a autodeterminação do infrator, representando uma consequência jurídica de interferência no seu arbítrio, sendo, portanto, de fato consequências de atos típicos, antijurídicos, e culpáveis.

            Por fim, é possível vislumbrar a discussão em torno da redução da maioridade penal como uma resposta ao clamor público, baseado na crença da impunidade e na fé no direito penal supostamente vingativo e/ou reintegrativo, e que protegeria do aliciamento de recorrentes práticas infracionais, fatos que, supostamente, uma vez enfrentados culminariam na diminuição da criminalidade no Brasil.

1. DOS VIÉSES E DAS PROBLEMÁTICAS ENVOLVIDAS NA REDUÇÃO DA MENORIDADE PENAL

            Em que pese o clamor público quando noticiado um crime cometido por menores de dezoito anos, há que se levantar algumas discussões. A principal questão a ser aprofundada, quando se trata de redução etária da imputabilidade penal é a sua efetividade em termos de represamento da criminalidade. Mais ainda, discute-se a capacidade estatal em reintegrar os infratores dado a crise atual do sistema penitenciário. E, como premissa para todas essas discussões, a possibilidade constitucional de alterar a imputabilidade penal para dezesseis anos no Brasil.

            É possível concluir, de antemão, que não existem pesquisas concretas no Brasil que possam associar a insegurança pública ou os índices de criminalidade à inimputabilidade dos menores de idade. Mais ainda, o Brasil já adotou ao longo de sua história idades penais entre nove e dezoitos anos, o que, por si só, não é suficiente para afirmar se as alterações etárias causaram mudanças efetivas na incidência da criminalidade brasileira.

            Sob o ponto de vista jurídico e psicológico, o debate envolvido na maioridade penal permeia a decisão legislativa que define o momento em que o indivíduo adquire a denominada maturidade indispensável para que possa discernir as consequências dos seus atos, e, consequentemente, possa responder pela prática do ato que atenta contra as normas do direito penal.

            Some-se, ainda, que diante da aprovação do Projeto de Emenda Constitucional nº 171 pela Câmara de Deputados, reascendeu-se a discussão sobre a redução da maioridade penal no Brasil. Aqueles que defendem a redução da imputabilidade penal argumentam que o menor entre dezesseis e dezoito anos tem discernimento o suficiente para responder por seus atos, sustentando, principalmente, que já detém capacidade eleitoral ativa, e ainda, que a impunidade de menores gera apenas mais violência. Aduzem ainda que muitos países desenvolvidos adotam maioridade penal abaixo dos dezoito anos e que as punições atuais para o menores são muito brandas.

            Já, aqueles que negam a redução da maioridade penal como resposta ao nível de criminalidade sustentam que seria mais eficiente investir em educação do que em punições. Mais ainda, observam que o sistema prisional brasileiro não contribui para a reinserção social dos jovens. Ainda, aduzem que adolescentes não estão em um patamar de desenvolvimento psicológico de adultos, sendo uma fase de transição e maturação do indivíduo e que, por isso, nessa fase de desenvolvimento, devem ser protegidos por meio de políticas públicas. Aqueles contrários à redução da imputabilidade penal defendem que a redução da maioridade penal afeta principalmente jovens em condições sociais vulneráveis, e que a tendência mundial é estabelecer a maioridade penal aos dezoito anos.

            Nesse cenário, em que a discussão sobre o momento ideal na vida dos indivíduos para que possam ser considerados responsáveis e conscientes pelos seus atos infracionais vem recorrentemente à tona, tanto no Brasil quanto no plano internacional, ainda mais por não haver qualquer resposta científica e objetiva sobre a adoção de um critério rígido de responsabilização ou de proteção.

2. DA (IM)POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

            A Proposta de Emenda Constitucional nº 171, aprovada pela Câmara de Deputados, levantou a discussão sobre a possibilidade jurídica de alteração da maioridade penal para dezesseis anos de idade. Tal debate surge frente ao entendimento de alguns doutrinadores de que se trata de cláusula pétrea, vez que o artigo 228 da Constituição Federal, que versa sobre a inimputabilidade penal dos menores de dezoito anos, trataria de direito individual previsto constitucionalmente, logo, cláusula pétrea com fundamento no artigo 60, §4º, inciso IV do texto constitucional.

            Essa adequação da maioridade penal às cláusulas pétreas passou a ser destaque em julgamento do Supremo Tribunal Federal, que aponta o entendimento de que a idade penal de dezoito anos pode ser modificada.

            Inicialmente, cabe destacar que o critério puramente biológico nem sempre foi utilizado para determinar a maioridade penal no Brasil. No período das Ordenações Filipinas, o Brasil adotou o caráter biológico e psicológico. Já, o Código Criminal do Império de 1830 adotou o sistema do discernimento, determinando a maioridade penal absoluta a partir dos quatorze anos, sendo que os menores abaixo de quatorze anos poderiam ser considerados penalmente responsáveis se agissem conscientes do caráter ilícito do seu ato, e nesse caso, poderiam receber qualquer espécie de pena, até mesmo perpétua. Adotou-se, portanto, no Código de 1830 o caráter psicológico. Posteriormente, com a Proclamação da República, surge  Código Penal Republicano de 1890, no qual se vislumbra um complexo sistema para a idade penal, fundado em três orientações: são inimputáveis os menores de nove anos de idade, e os maiores de nove e menores de quartorze anos seriam inimputáveis se agissem sem discernimento; ainda, aqueles entre nove e quatorze anos que agissem com discernimento seriam recolhidos a estabelecimentos disciplinares (AZEVEDO NETO, 2012).

            Já em 1940, o Código Penal estabeleceu a imputabilidade penal a partir dos dezoito anos, adotando o critério puramente biológico. Segundo Menezes (2005, p. 5), para Nelson Hungria, principal autor do projeto do Código Penal,

em torno da menoridade nada mais deve subsistir que lembre Lombroso e sua teoria de que todas as tendências para o crime têm o seu começo na primeira infância; nada mais ainda com a ideia de condenação penal que pode arruinar uma existência inteira. É preciso renunciar à crença no fatalismo da delinquência e assumir o ponto de vista de que a criança é corrigível por métodos pedagógicos.

            Por fim, em 1988, a Constituição Federal, no artigo 228, corroborou a imputabilidade penal a partir dos dezoito anos, adotando o critério biológico. Uma vez previsto na carta magna, cabe discorrer sobre a possibilidade de alteração desse limite etário, enquanto critério puramente biológico.

            Dentro do sistema positivo de normas, a Constituição Federal possui o papel precípuo de conceber fundamento de validade às demais normas. Ocorre que parte da doutrina entende que o artigo 228 trata de cláusula pétrea, por se tratar de verdadeira garantia individual constitucionalmente protegida, de sorte que jamais poderia ser reduzida, apenas ampliada. Trata-se portanto, de limite material imposto pelo legislador constituinte originário ao reformador.

            Nesse sentido, preconizam Kist e Molin (2007, p. 8):

É nesse contexto que também se insere o artigo 2008 da Constituição Federal, no qual o legislador estabeleceu o início da maioridade penal aos 18 anos completos, considerando-se, portanto, inimputáveis penalmente as crianças e adolescentes até 18 anos incompletos. Na linha de raciocínio exposta, trata-se de outra dessas garantias individuais das pessoas que, até completarem 18 anos, incorrem nas conditas tipificadas na li penal como crimes e contravenções, e consistente em vedação de que a persecução criminal seja feita nos termos da legislação penal comum, somente podendo sê-lo na forma instituída em legislação especial.

            Rangel (2015, p. 283), por sua vez,  preleciona que a cláusula do artigo 228 da Constituição é caracteristicamente uma cláusula de barreira, isto é, não pode ser objeto de deliberação qualquer proposta de emenda tendente a abolir a "menor idade" penal. Seria possível em uma nova Carta Constitucional estabelecer-se novos parâmetros de "menor idade" penal, mas não na atual.

            Para reforçar o entendimento de que o artigo 228 da Constituição Federal é garantia individual, logo, cláusula pétrea, Piovesan (2013, p. 225) ratifica a natureza material constitucional dos direitos fundamentais resultantes de documentos e tratados internacionais, como é o caso da proteção às crianças e adolescentes:

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O reconhecimento se faz explícito na Carta de 1988, ao invocar a previsão do art. 5º, §2º. Vale dizer, se não se tratasse de material constitucional, ficaria sem sentido tal previsão. A Constituição assume expressamente o conteúdo constitucional dos direitos constantes dos tratados internacionais dos quais o Brasil é parte. Ainda que esses direitos não sejam anunciados sob forma de tratados internacionais, a Carta lhe confere o valor jurídico de norma constitucional, já que preenchem e complementam o catálogo de direitos fundamentais previstos pelo Texto Constitucional.

                      Coaduna-se com o exposto, a linha seguida por Gomes (2005), o qual entende que a menoridade penal no Brasil foi incorporada ao rol dos direitos fundamentais, através da Convenção dos Direitos da Criança pela Organização das Nações Unidas (ONU):

(...) do ponto de vista jurídico é muito questionável que se possa alterar a Constituição brasileira para o fim de reduzir a maioridade penal. A inimputabilidade do menor de dezoito anos foi constitucionalizada (CF, art. 228). Há discussão sobre tratar-se (ou não) de cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4.º). Pensamos positivamente, tendo em vista o disposto no art. 5.º, § 2.º, da CF, c/c arts. 60, § 4.º e 228. O art. 60, § 4º, antes citado, veda a deliberação de qualquer emenda constitucional tendente a abolir direito ou garantia individual. Com o advento da Convenção da ONU sobre os direitos da criança (Convenção Sobre os Direitos da Criança, adotada pela Resolução I.44 (XLIV), da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20.11.1989. Aprovada pelo Decreto Legislativo 28, de 14;09.1990, e promulgada pela Decreto 99.710, de 21.11.1990. Ratificada pelo Brasil em 24.09.1990), que foi ratificada pelo Brasil em 1990, não há dúvida que a idade de 18 anos passou a ser referência mundial para a imputabilidade penal, salvo disposição em contrário adotada por algum país. Na data em que o Brasil ratificou essa Convenção a idade então fixada era de dezoito anos (isso consta tanto do Código Penal como da Constituição Federal - art. 228). Por força do § 2º do art. 5º da CF esse direito está incorporado na Constituição. Também por esse motivo é uma cláusula pétrea. Mas isso não pode ser interpretado, simplista e apressadamente, no sentido de que o menor não deva ser responsabilizado pelos seus atos infracionais.

 Sobre o tema também manifestou-se Mirabete (2004, p. 217), ao aduzir que

Ninguém pode negar que o jovem de 16 a 17 anos, de qualquer meio social, tem hoje amplo conhecimento do mundo e condições de discernimento sobre a ilicitude de seus atos. Entretanto, a redução do limite de idade no direito penal comum representaria um retrocesso na política penal e penitenciária brasileira e criaria a promiscuidade dos jovens com delinquentes contumazes.

            Em consonância com a doutrina deste autor, há que mencionar outro fator dentro da discussão da inconstitucionalidade da redução da maioridade penal, qual seja, a vedação ao retrocesso social. Segundo Sarlet (2015, p. 469),

Com efeito, reitera-se nesta quadra a nossa posição em prol da possibilidade de aplicação da proibição de retrocesso a todos os direitos fundamentais, de tal sorte que a designação 'proibição de retrocesso social', que opera na esfera dos direitos sociais, especialmente no que diz com a proteção 'negativa' (vedação da supressão ou diminuição) de direitos a prestações sociais, além de uma ideia-força importante, poderia ser justificada a partir de algumas peculiaridades dos direitos sociais, o que importa sempre frisar, não se revela incompatível com a complementaridade entre direitos sociais (positivos e negativos) e os demais direitos fundamentais.

            Conforme lições de Sarlet (2015), pode-se afirmar que o direito à segurança jurídica trata de um incremento do direito fundamental à segurança, formando uma amplitude de direitos antes não observados e compreendidos nos direitos fundamentais, tratando esses direitos como imutáveis e como direito à proteção contra atos do governo, do poder público e de particulares violadores dos direitos pessoais.

            Nesse diapasão, o princípio da vedação ao retrocesso social impede seja reduzido o limite etário para a responsabilização criminal. Segundos os defensores da aplicação do princípio da vedação do retrocesso, seria um contrassenso a tentativa de reduzir a maioridade penal diante do conteúdo da norma constitucional, pois uma série de direitos são assegurados a partir de uma perspectiva protetiva, uma vez que os menores de dezoito anos não possuem capacidade plena a realização de atos da vida civil. Dessa forma, a possibilidade de acesso e exercício de direitos se constituiu elemento essencial ao exercício da liberdade, e os menores de dezoito anos sequer gozam de plenos direitos civis (OLIVEIRA, 2015).

            Também Dallari (2015) apregoa que qualquer proposta no sentido de aplicar leis penais aos menores de dezoito anos significará a abolição de seu direito ao tratamento diferenciado, previsto em lei, e por esse motivo será inconstitucional.

            Há, entretanto, autores que sustentam a possibilidade de alteração da maioridade penal, apregoando que, a exemplo de Capez (2007, p. 79):

Estamos 'vendando' os olhos para a realidade que se descortina: o Estado está concedendo uma carta branca para que indivíduos de 16, 17 anos, com plena capacidade de entendimento e volição, pratiquem atos atrozes, bárbaros. Ora, no momento em que não se propicia a devida punição, garante-se o direito de matar, de estuprar, de traficar, de ser bárbaro, de ser atroz.(...)

 Mesmo considerando-se aspectos da realidade educacional e a omissão do Estado em prover a orientação adequada para os jovens, ainda assim, a redução da maioridade penal é medida justa. Até porque, se ponderarmos esses fatores, aquele que praticou um crime com 18, 20, 21 anos, o fez porque não teve oportunidade, também, de emprego, estudos, etc. Por isso, tal argumento não pode ser levado em consideração para afastar  a redução da maioridade penal.

            Lenza (2015),  por sua vez, defende que, ainda que seja cláusula pétrea, a redução da maioridade penal é possível, pois a Constituição permite alterações, reprimindo apenas a sua completa abolição. O renomado autor preconiza que é perfeitamente possível a redução da maioridade penal de dezoito para dezesseis anos, uma vez que a Constituição, ao estabelecer os limites materiais ao poder de reforma, apenas não admite a proposta de emenda tendente a abolir direito e garantia individual.  Aduz o autor que

Essa previsão de limites materiais, à exceção dos textos de 1824 e 1937, é constante em todas as constituições pátrias: a) 1891: fixando pela primeira vez, não admitia projetos tendentes a abolir a forma republicana-federativa, ou a igualdade da representação dos Estados no Senado; b) 1934, 1946, 1967, EC n. 1/69: n]ao admitiam projetos tendentes a abolir a Federação ou a República; c) 1988: ampliou as hipóteses das denominadas cláusulas pétreas.

Interessante observar que em todas Constituições não se admitiam as PECs que “tendessem a abolir” as matérias ali indicadas e não as que tratassem dos temas.

Nesse sentido já interpretou o STF ser possível a alteração de matéria definida como cláusula pétrea desde que seja mantido o seu núcleo essencial (…).

            Barroso (apud Lenza, 2015) enfatiza que a locução “tendente a abolir” deve ser interpretada com equilíbrio, pois “deve servir para que se impeça a erosão do conteúdo substantivo das cláusulas protegidas”, bem como, “não deve prestar-se a ser uma inútil muralha contra os ventos da história, petrificando determinado status quo”. Ainda,

A Constituição não pode abdicar da salvaguarda de sua própria identidade, assim como da preservação e promoção de valores e direitos fundamentais; mas não deve ter a pretensão de suprimir a deliberação majoritária legítima dos órgãos de representação popular, juridicizando além da conta o espaço próprio da política. O juiz constitucional não deve ser o prisioneiro do passado, mas militante do presente e passageiro do futuro. (…)

            Por fim, entende Lenza (2015), que não se pretende nesse momento analisar o papel da pena em si, ou das penitenciárias no Brasil, como defende a corrente que preconiza pela impossibilidade da redução da maioridade penal; a bem da verdade, o que se busca sustentar nessa corrente é a possibilidade de redução da maioridade penal por emenda, sem que isso afronte à Carta Magna, uma vez que seu núcleo central estará preservado. A defesa é de que a adequação do texto constitucional deve ser compatível com a evolução social, sendo sempre possível a rejeição da proposta pelo legislativo, através de uma análise que não será jurídica.

            Também nesse mesmo sentido, entendem alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal atualmente, a exemplo do Ministro Teoria Zavascki, o qual é signatário da corrente que atribui uma interpretação restritiva das cláusulas pétreas, a fim de favorecer uma interpretação mais dinâmica à Constituição, de forma a adaptá-la às mudanças sociais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Conforme se denota do exposto, em que pese as divergências sobre a possibilidade jurídica e constitucional em torno da redução da maioridade penal no Brasil, há que se considerar se de fato a redução da imputabilidade etária impactaria na criminalidade nacional. Ao que tudo indica, não se trata de uma forma efetiva de controle de criminalidade. Antes disso, a efetividade dos meios judiciais ou o incentivo em outras áreas tornaria mais eficiente a repressão à criminalidade.

            Pode-se concluir, por todo a retro apresentado, que, por si só, como medida única e paliativa, a redução da imputabilidade penal etária não apresentaria efeitos permanentes na redução da criminalidade. Antes, entretanto, estudos mais aprofundados devem ser realizados, tratando-se o presente trabalho, apenas de uma breve análise, a qual merece estudo mais criterioso e, quiçá, análises quantitativas e qualitativas existentes no mundo até então, a fim de respaldar o estudo em tela.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SARLET, Ingo W. A eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 12ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015.

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Sobre as autoras
Daiane Londero

Analista processual do MPF, doutoranda em Políticas Públicas na UFRGS, Graduada em Direito e Economia pela UFSM.

Sabrina Oliveira Fernandes

Advogada, Analista Jurídica da Procuradoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul, Pós-graduada em Direito Ambiental e pós-graduanda em direito ambiental nacional e internacional pela UFRGS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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