5 PRINCIPAIS ESPÉCIES DE ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO
A classificação do assédio moral pode variar de acordo com o critério metodológico adotado por cada autor. Entretanto, no campo do mobbing, costuma-se visualizar três modalidades, a saber: vertical descendente, vertical ascendente e horizontal.
5.1 Assédio Moral Vertical Descendente
É uma das modalidades mais frequentes de assédio. É aquele em que a agressão é praticada pelo superior hierárquico em desfavor de seu subordinado.
A desigualdade dos sujeitos na relação jurídica é um fator predominante para a ocorrência do assédio moral. Com efeito, a condição de sujeição do empregado, somada ao medo constante de perder o emprego, favorece a adoção de medidas autoritárias por parte do empregador, que dotado de um poder que acredita possuir, menospreza e maltrata seus empregados.
Além disso, outra característica desencadeadora do assédio moral é a própria mentalidade preconceituosa que muitos empregados têm em relação ao trabalho. O inconveniente comum que caminha na sociedade e, muitas vezes leva o sujeito ativo a praticar o assédio moral é a noção equivocada, aderida por acaso inconscientemente, de que o trabalho é uma atividade menor, e até mesmo degradante.
5.2 Assédio Moral Vertical Ascendente
O assédio moral vertical ascendente é aquele em que o sujeito ativo é o subordinado e o sujeito passivo é o superior hierárquico.
Os casos mais comuns são aqueles com multiplicidade no pólo ativo, em que os subordinados se manifestam contra chefe recém contratado, cujos métodos de trabalho incomodam os subordinados, ou ainda na hipótese do superior hierárquico ser ex-colega dos agressores, caso em que a inveja pode ser considerada o fator preponderante para a discriminação da vítima.
5.3 Assédio Moral Horizontal
O assédio moral horizontal é praticado entre sujeitos no mesmo nível hierárquico, sem qualquer tipo de relação de subordinação. Frequentemente é manifestada entre os próprios colegas de trabalho, não havendo restrição quanto ao número de integrantes.
6 CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DA PRÁTICA DO ASSÉDIO MORAL
No Brasil, efetivamente, não existe legislação federal tratando especificamente do assédio moral, não havendo, portanto, lei específica tutelando o fenômeno nas relações de trabalho, haja vista que a competência legislativa para tratar de direito do trabalho é da União, conforme art. 22, I, da Constituição Federal de 1988.
Contudo, isso não significa que inexistam meios de defesa jurídica contra o fenômeno, sendo possível o seu combate por meio da aplicação das normas dispostas na Consolidação das Leis do Trabalho, como, por exemplo, a incidência dos institutos da rescisão indireta e da justa causa do contrato de trabalho, além da reparação de danos morais e materiais, com fundamento na violação do direito à intimidade, assegurado no art. 5º, X, da Constituição Federal de 1988.
O contrato de trabalho deve respeitar, assim como qualquer outro negócio jurídico, o princípio da boa-fé, que impõe a ambos os contratantes, em todas as fases contratuais, o comprimento de direitos e obrigações de acordo com a ótica da probidade e da lealdade.
Délio Maranhão (2005), assevera:
“Cada contratante, é obrigado pelo mesmo contrato, “a levar ao seu co-contratante toda a ajuda necessária para assegurar a execução de boa-fé do contrato. A solidariedade estabelecida, em vista da utilidade social, pelo vinculo contratual, proíbe, a cada uma das partes, de se desinteressar pela outra. Ambas devem, mútua e lealmente, fornecer todo o apoio necessário para conduzir o contrato a bom termo”. À diligência, obediência e fidelidade do empregado é preciso que corresponda a compreensão do empregador de que seu “colaborador” é uma criatura humana “dotada de cérebro e coração”, que como tal deve ser tratado, e não como uma máquina.” (MARANHÃO, 2005, p. 258).
Com isso, evidencia-se a necessidade de considerar-se como obrigação fundamental do empregador o respeito à personalidade moral das pessoas que lhe prestam serviços.
A subordinação ligada ao contrato de trabalho não implica submissão da dignidade e personalidade do empregado ao poder diretivo do empregador, já que está limitada às exigências necessárias para satisfazer a perfeita prestação do trabalho, de modo que o desrespeito à integridade moral do empregado infringe um dever básico patronal e um direito fundamental da pessoa humana, possibilitando a rescisão indireta do contrato de trabalho com base no artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho.
“Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.”
Considera-se a prática do assédio moral motivo para a rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no descumprimento da obrigação patronal de preservação da personalidade moral de seus empregados (alínea “d”), a conduta assediante, por ser caracterizada como atentatória à dignidade da vítima, produzindo-lhe na maioria dos casos resultados gravosos à saúde, também pode ser enquadrada nas hipóteses “a”, “b”, “c” e “e” do referido artigo da Consolidação das Leis do Trabalho.
6.2 Rescisão do Contrato de Trabalho por Justa Causa
Nem sempre a conduta assediadora tem iniciativa patronal, podendo ser praticada pelo próprio empregado nos casos de assédio moral horizontal ou vertical ascendente.
Nesses casos, cabe ao empregador, investido do poder disciplinar, aplicar a punição ao empregado, hipótese em que, presente uma das situações previstas no artigo 482 da CLT, poderá ocorrer a rescisão do contrato de trabalho por justa causa.
Com relação à justa causa, cita-se o posicionamento de Délio Maranhão (2005):
“Como sabemos, do contrato de trabalho derivam para o empregado as obrigações fundamentais de obediência, diligencia e fidelidade. Constituem, portanto, justa causa para a resolução do contrato todos os atos do empregado que importarem violação dessas obrigações especificas. Por outro lado, existem atos, que se referem à conduta geral do empregado, estranhos ao emprego e à prestação de trabalho, e que, entretanto, são capazes de destruir os pressupostos fiduciários da relação, ou tornar, por motivos de ordem moral, impossível a continuação do contrato [...].” (MARANHÃO, 2005, p. 258).
Os atos aos quais o autor acima se refere, são os elencados na lei, especificamente no artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho, que assim dispõe:
“Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:
a) ato de improbidade;
b) incontinência de conduta ou mau procedimento;
c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
e) desídia no desempenho das respectivas funções;
f) embriaguez habitual ou em serviço;
g) violação de segredo da empresa;
h) ato de indisciplina ou de insubordinação;
i) abandono de emprego;
j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
l) prática constante de jogos de azar.”
Visualizadas as situações capazes de gerar a dispensa do empregado por justa causa, cabe verificar qual delas podem ser aplicadas como decorrência do assédio moral. São elas: alíneas “b”, “j” e “k”.
Com relação à alínea “b”, importante salientar que a incontinência de conduta não se confunde com o mau procedimento, sendo que apenas este pode guardar em seu conceito o assédio moral.
Na verdade, enquanto a continência de conduta possui conotação sexual, caracterizando-se pela falta de pudor do empregado; o mau procedimento possui conotação mais ampla, capaz de abrigar todos os atos desrespeitosos, não só à lei e aos regramentos da empresa, como também a aspectos morais, inclusive no que toca à prática do mobbing.
A respeito do mau procedimento, Alice Monteiro de Barros (2005), expõe:
“O traço distintivo do mau procedimento em relação a outras justas causas é a sua amplitude. O mau procedimento caracteriza-se quando evidenciado comportamento incorreto do empregado, traduzido pela prática de atos que firam a descrição pessoal, as regras do bom viver, o respeito, o decoro, ou quando a conduta do obreiro configurar impolidez ou falta de compostura capazes de ofender a dignidade de alguém, prejudicando as condições do meio ambiente de trabalho.” (BARROS, 2005, p. 843).
Com isso, além da alínea “b”, o assédio moral também pode ser enquadrado nas hipóteses previstas nas alíneas “j” e “k” do art. 482, da Consolidação das Leis do Trabalho. As duas situações dizem respeito ao ato lesivo à honra, boa fama ou ofensas físicas, diferenciando-se apenas pelo fato da alínea “k” não restringir a aplicação do dispositivo, quando se tratar de conduta praticada contra o empregador ou superior hierárquico, ao meio ambiente de serviço.
7 MEDIDAS DE PREVENÇÃO E COMBATE AO ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO
Além da necessidade de se combater o assédio moral após a verificação da sua prática, por se tratar de fenômeno que ofende diretamente o meio ambiente de trabalho da empresa, a sua prevenção, como princípio essencial do direito ambiental, assume caráter de extrema relevância.
Assim, tratando-se de assédio moral, deve a empresa adotar medidas preventivas, como a conscientização dos trabalhadores por meio da realização de palestras e da elaboração de um código de ética e conduta, bem como a abertura do canal de comunicação com os trabalhadores para recebimento de denúncias, devendo haver ainda uma integração com a CIPA e com o Sindicato Profissional.
Sobre o tema, Roberto Heloani (2005, p. 105), expõe:
“Além dos códigos de ética, podem-se criar mecanismos, por meio do departamento de Recursos Humanos da organização, para dar ao trabalhador agredido o direito de denunciar a agressão de que tenha sido vítima, por escrito e sigilosamente; com esse fim, o indivíduo agredido pode utilizar caixas postais e mesmo “urnas” em dependências isoladas dentro da organização, para que, em tese, possa ter seu anonimato garantido. São passos para amenizar o problema, mas não bastam.” (HELOANI, 2005, p. 105).
Com efeito, levando-se em consideração que muitas vezes a conduta assediante ocorre de forma velada, para que o empregador tenha ciência do que efetivamente ocorre no ambiente da empresa, principalmente naqueles estabelecimentos com número considerável de empregados, é fundamental a abertura do canal de comunicação com seus empregados, para que estes sintam-se encorajados para pedir ajuda.
A mencionada abertura deverá ocorrer mediante a instalação de urnas para a coleta de denúncias ou por meio da criação de ouvidorias, cujo acesso pode ocorrer inclusive pela internet. Em ambos os casos, para que se tenha um mecanismo eficiente, é imprescindível que se assegure o sigilo da identidade do denunciante.
As denúncias deverão ser coletadas por pessoas imparciais, sendo recomendável a participação da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho (CIPA), cuja composição conta com trabalhadores representantes dos empregados e do empregador.
As denúncias deverão ser encaminhadas ao Setor de Recursos Humanos da empresa, para que haja a comunicação direta aos dirigentes e encarregados, com o objetivo de apurar a veracidade dos fatos e, se necessário, promover a advertência, suspensão, ou dispensa do agressor.
Além da comunicação interna ora mencionada, é importante que a empresa permita a aproximação da entidade sindical que representa os empregados, já que os sindicatos, além de possuírem acesso direto aos trabalhadores, é considerável entidade confiável para receber as denúncias e repassá-las à empresa.
Sobre a importância da CIPA e dos sindicatos, destacam-se as palavras de Homero Batista Mateus da Silva (2015):
“A entidade sindical pode estar presente em qualquer empresa, grande ou pequena, com atividade econômica de risco elevado ou moderado, desfrutando seus dirigentes de algumas prerrogativas e proteções contra atos de conduta antissindical. Porém, não deve ser confundida com o segundo canal de comunicação, como é o caso da CIPA, que somente se forma no âmbito de uma empresa em particular, não envolvendo toda a categoria profissional ou econômica, e se destina prioritariamente às empresas de risco acentuado ou, sendo a atividade econômica de risco moderado, somente se instala em casos de empresa de grande dimensão. Sindicato e CIPA são parceiros na promoção e na defesa dos interesses dos trabalhadores, ainda que a segunda tenha um grau maior de especificidade, ou seja, uma limitação quanto ao foco de sua abrangência. Jamais se deveria cogitar de embate ou de cisma entre esses dois canais de atuação dos trabalhadores, muito embora não seja rara a percepção de boicote de uns em relação aos outros, por temores infundados de perda de prestígio ou de poder. Na realidade, os trabalhadores não deveriam ter apenas um canal de comunicação com o empregador, sendo louváveis as iniciativas de vários níveis de debate e de oitiva de seus anseios.” (SILVA, 2015, p. 43).
Ressalta-se que, se a empresa se negar a adotar as medidas necessárias para prevenir a prática do assédio moral, poderá ser alvo de denúncia ao Ministério Púbico do Trabalho, instituição que poderá exigir essas obrigações por meio de Termo de Ajustamento de Conduta ou mediante o ajuizamento de ação civil pública.
8 CONCLUSÃO
Como o assédio moral corresponde a um fenômeno complexo capaz de ofender a saúde física e psíquica das vítimas e repercutir negativamente nas condições do meio ambiente de trabalho da empresa, é indubitável a necessidade de se combater e prevenir o fenômeno como forma de minimizar as suas consequências nocivas.
Em que pese não existir uma legislação específica no Brasil sobre o assédio moral, isso não significa a impossibilidade de tutela jurídica com base no arcabouço jurídico trabalhista existente.
Com efeito, verificada a prática do assédio moral, deverá o empregador punir o agressor, seja mediante advertência ou suspensão, seja por meio da dispensa com justa causa, com fulcro no art. 482 da CLT.
Por outro lado, caso o empregado, vítima do assédio moral, não consiga mais conviver no seu ambiente de trabalho, poderá pleitear a rescisão indireta do contrato de trabalho com base no artigo 483 da CLT.
Independentemente da forma de ruptura do contrato de trabalho, a vítima do assédio moral poderá ainda ingressar com ação trabalhista pleiteando o pagamento de indenizações por eventuais danos morais e materiais sofridos.
No entanto, como o assédio moral possui relação direta com o meio ambiente de trabalho, deverá a empresa, com base no princípio da prevenção, adotar as medidas necessárias para evitar a prática da conduta assediante. Entre as medidas possíveis, destacam-se a conscientização dos empregados por meio de palestras e da elaboração de um código de ética e conduta, bem como a abertura de canais de comunicação para recebimento de denúncias sobre o assédio moral, recomendando-se a participação da CIPA e do Sindicato Profissional para garantir maior eficiência na apuração dos fatos e punição do agressor.
Pelo que, aqui foi relatado pode-se concluir que a prevenção à conduta perversa do assédio moral no ambiente de trabalho é de extrema importância, já que promove a criação de um meio ambiente de trabalho sadio e agradável, evitando graves danos aos empregados e, consequentemente favorecendo a produção da empresa.
9 REFERÊNCIAS
BARROS, A. M. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2005.
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 30 set. 2015.
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MARANHÃO, D. et al. Instituições de direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: LTr, 2005.
SCHIMIDT, M. H. F. M. O assédio moral no direito do trabalho. Revista de Direito do Trabalho nº.103, jun/set. 2001.
SILVA, H. B. M. da. Curso de Direito do Trabalho Aplicado: saúde e segurança do trabalho. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.