Eu pago o IPVA em dia, mas a estrada está cheia de buracos!

Será que existe relação entre a espécie tributária e a malha asfáltica?

23/02/2016 às 08:31
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É muito comum as pessoas quererem vincular as receitas de impostos à manutenção das vias públicas e outras obras. Este texto tem o fim de apresentar essa situação narrada à luz do princípio da não vinculação ou não afetação dos impostos.

É muito comum ouvirmos os seguintes comentários: “Eu pago o IPVA do meu carro para ter uma estrada bem cuidada!”, “O carnê do IPTU nunca deixa de chegar lá em casa, mas a rua está cheia de buracos”. Mas será que as receitas adquiridas com a cobrança dos referidos impostos são vinculadas à manutenção da malha asfáltica das rodovias e das ruas? Esta pergunta será respondida daqui a pouco. Antes, para uma boa compreensão do texto, faremos um breve estudo de temas de Direito Tributário.

O Direito Tributário é um ramo do estudo das relações jurídicas entre os entes públicos e os contribuintes. De um lado estão os entes públicos, quais sejam: União, Estados, Distrito Federal e Municípios, enquanto titulares da Competência Tributária, que é um direito-dever conferido a eles pela Constituição Federal para que possam instituir, arrecadar, fiscalizar e legislar sobre tributos de suas respectivas competências. Do outro estão os contribuintes, que são as pessoas físicas e jurídicas, de direito privado e também de direito público, ou seja, até mesmo aqueles que cobram tributos também os pagam.

Necessário ainda se faz destrinchar o conceito de tributo, que, segundo o art. 3º do Código Tributário Nacional (CTN), é: “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. Depreendem-se desse conceito muitas informações, no entanto, vamos nos ater à informação de que o “tributo” é um gênero, enquanto o “imposto” é uma espécie.

Além dos impostos também são tributos: as taxas, por exemplo as taxas para liberação de alvará de funcionamento de estabelecimentos comerciais; as contribuições especiais, como a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das empresas (CSLL); o empréstimo compulsório, que somente pode ser exigido pela União em casos de despesas extraordinárias, como calamidade pública e guerra externa e, também, para investimento público de caráter urgente; e, por fim, as contribuições de melhorias que são cobradas em decorrência da valorização de imóveis em virtude de obras públicas.

Dentre as espécies tributárias acima expostas, o imposto é uma que se subordina ao chamado princípio da não afetação ou vinculação, que está previsto na Constituição Federal, em seu artigo 167, inciso IV, que veda a vinculação das receitas dos impostos a órgão, fundo ou despesa. Sendo assim, não pode, por exemplo, ser instituído um imposto que tenha como finalidade arrecadar fundos para construção de casas populares a pessoas em condição de rua, por melhor que fosse a ideia.

Sendo assim, voltando àquela pergunta que foi o fio condutor desta breve digressão: será que as receitas adquiridas com a cobrança dos referidos impostos (IPVA e IPTU) são vinculadas à manutenção da malha asfáltica das rodovias e das ruas? Agora ficou fácil entender que a resposta é negativa, pois os impostos, conforme o artigo 167, inciso IV, da Constituição Federal e, também, o artigo 16 do CTN não podem ser vinculados.

Cumpre dizer que este breve texto não tem a intensão de justificar ou defender o mau cuidado com as vias públicas em nosso país, mas, sim, levar o conhecimento de que as obras públicas devem se basear no orçamento, que é elaborado por iniciativa do Poder Executivo, tomando como base as previsões de receitas, mas não podem ser vinculadas aos impostos, como muitos pensam ser.

Então, a partir de agora, lembre-se: você, além de pagar os tributos, é que define quem irá administrar as receitas deles, então, para ter boas ruas, estradas, escolas, hospitais etc., escolha bem seus candidatos.

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Sobre o autor
Murilo Alberto Budaz Rezende

Graduado em Direito pelo Centro de Ensino Superior de Catalão - GO, atualmente é advogado e trabalha na Secretaria da Fazenda do Estado de Goiás.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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