6. Discricionário
A autoridade policial possui amplos poderes para realizar diligências de acordo com a conveniência e necessidade das investigações, buscando atingir o melhor resultado direcionado para a finalidade do inquérito: “buscar autoria e materialidade”, com a análise dos artigos 6º e 7º do CPP, que apresentam um rol de diligências a dispor do delegado.
Tanto o indiciado quanto a vítima podem requerer diligências para a autoridade policial, nos termos do art. 14. do CPP: “O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade” fica latente o entendimento de que a autoridade poderá ou não realizar as diligências de acordo com sua convicção, se a autoridade negar, poderá haver recurso administrativo para o superior hierárquico por analogia ao art. 5º, §2º do CPP, mas, não haverá nenhum remédio judicial a ser utilizado.
O art. 7º, XXI, “a” do Estatuto da OAB, afirma que o advogado também poderá apresentar razões e quesitos, porém, esta alínea deve ser lida em conjunto com o art. 14. do CPP, com o seguinte entendimento: “as diligências continuam a ser realizadas de forma discricionária, em regra, e a defesa pode fazer apontamentos sobre elas, as quais serão recebidas pelo delegado, mas, somente, providenciará as diligências requeridas se achar oportuno”.
A discricionariedade encontra mitigação:
No exame de corpo de delito, quando a infração deixar vestígio;
Nas requisições determinadas pelo Ministério Público e Magistrados de acordo com o art. 13, II do CPP: “Incumbirá ainda à autoridade policial: (omissis) II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público” e de forma específica no art. 54, II da Lei de Drogas:
Recebidos em juízo os autos do inquérito policial, de Comissão Parlamentar de Inquérito ou peças de informação, dar-se-á vista ao Ministério Público para, no prazo de 10 (dez) dias, adotar uma das seguintes providências: (omissis) II - requisitar às diligências que entender necessárias.
Cabe ressaltar que requisição é ordem fundamentada na lei, não existe hierarquia entre juiz, Ministério Público e delegado, não podendo haver nenhuma arbitrariedade por parte destas autoridades em realizar requisições desprovidas de fundamento legal. Caso ocorra requisições ilegais a autoridade policial poderá fundamentar a sua negativa e oficiar o órgão que a requisitou.
7. Oficial
A investigação com apoio do aparato estatal é feita por órgãos oficiais, isto não impede que particulares realizem investigações e apresentam elementos diretamente ao Ministério Público, mas, a utilização do aparato estatal em busca de autoria e materialidade encontra-se sob o encargo de autoridades públicas. A regra é que a autoridade policial instaure o procedimento de ofício e quem preside o inquérito é o delegado de polícia de carreira nos termos do art. 144, §4º da CF:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(omissis)
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
Este parágrafo deve estar combinado com o art. 2º caput e §1º da Lei 12.830/13:
Art. 2º: “As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado”. § 1o Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.
Quanto à presidência das investigações for feita por autoridade policial que em tese encontra-se em alguma situação descrita no art. 252. do CPP (impedimentos) ou art. 254. do CPP (suspeição), pergunta-se: “Pode ser alegada a suspeição ou impedimento da autoridade policial?”.
Não existe a instauração de incidente processual de suspeição ou impedimento relacionado à autoridade policial, por outro lado, a autoridade poderá declarar-se suspeita nos termos do art. 107. do CPP: “Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal”.
Se a autoridade se recusar a declarar-se suspeita, pode a parte interessada fazer requerimento para o superior hierárquico solicitando a avocação ou redistribuição, desde que exista interesse público, só podendo ocorrer o deferimento do pedido se o ato estiver fundamentado, art. 2º, §4º:
O inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei em curso somente poderá ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico, mediante despacho fundamentado, por motivo de interesse público ou nas hipóteses de inobservância dos procedimentos previstos em regulamento da corporação que prejudique a eficácia da investigação.
8. Unidirecional
Não pode a autoridade policial emitir nenhum juízo de valor na apuração dos fatos, como, por exemplo, que o indiciado agiu em legítima defesa ou movido por violenta emoção ao cometer o homicídio, de acordo com o entendimento de Paulo Rangel (2014, p. 97).
Apesar da nobre opinião doutrinária apresentada, entende-se neste artigo de forma diversa. A autoridade policial deve emitir juízo sobre eventuais causas excludente de ilicitude e culpabilidade, a fim de fazer com que o inquérito sirva não apenas para subsidiar eventual peça acusatória, mas, para levantar hipóteses que poderão ser devidamente trabalhadas pela defesa durante a instrução processual, com a finalidade de assegurar maior credibilidade jurídica ao procedimento do inquérito, o delegado é autoridade pública que deve agir de forma imparcial e servir à justiça sem, praticar atos que atendam apenas ao interesse de uma das eventuais partes.
Não existe polêmica quanto ao juízo de tipicidade, emitido pela autoridade, que se faz necessário para guiar suas investigações, pois, é na avaliação da tipicidade que se define a pena em abstrato, o que consequentemente influencia diretamente em alguns institutos aplicados na fase de investigação, como por exemplo: a) Fiança; b) Lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência; c) Representação por Prisão Preventiva e Temporária, dentre outros. De forma excepcional existe a determinação do art. 52, I da Lei de Drogas:
Art. 52. Findos os prazos a que se refere o art. 51. desta Lei, a autoridade de polícia judiciária, remetendo os autos do inquérito ao juízo: I - relatará sumariamente as circunstâncias do fato, justificando as razões que a levaram à classificação do delito, indicando a quantidade e natureza da substância ou do produto apreendido, o local e as condições em que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação e os antecedentes do agente.
Neste caso em apreço é necessário que o relatório da autoridade policial apresente maiores detalhes, para poder definir a capitulação no crime de posse de drogas para uso próprio (art. 28, Lei. 11.343/06) ou tráfico de drogas (art. 33, Lei 11.343/06).
Considerações Finais
As características do inquérito policial delineiam suas diferenças com a instrução processual penal e demonstram suas respectivas semelhanças com este, pois, na fase investigatória não há processo de forma propriamente dita, portanto, as peculiaridades do inquérito devem ser observadas para que este não se torne um processo criminal anterior ao inicio da ação penal, fazendo com que a justiça criminal fique ainda mais lenta, distanciando-se do principio da eficiência.
O inquérito policial é ferramenta do Estado, para assegurar à efetiva e hígida persecução penal, pois, tem a função de buscar autoria e materialidade para subsidiar com o elemento “justa causa” a exordial acusatória do titular da ação penal e por outro lado assegurar direitos e garantias individuais, evitando que inocentes tenham que se apresentar no polo passivo de um indevido processo penal.
Referências Bibliográficas
AVENA, Norberto Pâncaro. Processo Penal Esquematizado, 6ª edição. Método, 02/2014.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: legislação penal especial, v. 4. 7ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 22ª Ed. São Paulo: Atlas, 2014.
MARCÃO, Renato. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2014.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.