Há previsão legal de prazo decadencial para requisição do Ministro da Justiça nas hipóteses de ação penal pública condicionada?

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O presente artigo apresenta a discussão de um aspecto da ação penal pública condicionada, que trata-se da possível previsão de prazo decadencial para requisição do Ministro da Justiça.

 

             Quando se fala em ação penal, fala-se no direito de invocar do Estado-Juiz a prestação da tutela jurisdicional. Em outras palavras, quer-se a atuação do Estado para a aplicação de uma sanção decorrente de uma infração penal. Vale salientar que a ação é um direito somente atendível pelo Estado.

            A ação penal é classificada de acordo com a titularidade para sua propositura, subdividindo-se em ação penal privada e ação penal pública, sendo que esta última, por sua vez, pode ser incondicionada ou condicionada. Assim, o titular da ação penal pode variar, pois pode ser tanto a vítima (ou representante legal), sendo que neste caso ter-se-ia uma ação penal privada, como o titular pode ser o Estado, através do Ministério Público, caso em que se configuraria uma ação penal pública, que, conforme veremos, poderá ser condicionada ou não.

            A ação penal privada, assim impropriamente denominada, visto que todas as ações são públicas (o Estado é que presta a jurisdição), é aquela proposta pelo ofendido ou por seu representante legal. Ela inicia-se pela queixa-crime, e deverá conter os mesmos requisitos da denúncia. Como já mencionado, o Estado é quem tem o direito de punir (jus puniendi), e o ofendido, em nome próprio, defende o direito do Estado na repressão dos delitos.

            Nos casos de ação penal privada, o ofendido, ou se representante legal, deverá propor a ação por meio de advogado inscrito na OAB, pois a capacidade postulatória é pressuposto de admissibilidade para a ação. Vale ressaltar, ainda, que nos casos de propositura de ação penal privada, o prazo para o ajuizamento da queixa-crime é decadencial (não se interrompe nem se suspende), sendo de seis meses, contados da data de conhecimento da autoria delitiva.

            Por outro lado, a ação penal pública é notoriamente dividida em ação penal pública incondicionada e ação penal pública condicionada. Por ação incondicionada, diz-se aquela que é de iniciativa do Ministério Público, que pode iniciá-la, ou requisitar a instauração de inquérito policial, sem prévia condição. Em outras palavras, a iniciativa da ação é do Ministério Público, sendo que este independe da vontade da vítima para atuar (a vontade da vítima é irrelevante). A ação penal pública incondicionada é a regra geral das infrações penais, tendo em vista que o artigo 100, do Código Penal, prevê que “a ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do indivíduo”.

            Entretanto, há determinadas infrações penais para as quais a legislação penal exige a manifestação da vontade da vítima ou de seu representante legal para que o Ministério Público possa iniciar a ação em juízo de acordo com  sua pretensão penal. Nestes casos, há deve, necessariamente, haver a representação do indivíduo ou de seu representante legal, isto é, a manifestação de vontade dos mesmos no sentido de possibilitar ao MP a apuração dos fatos narrados, a fim de iniciar a ação penal pública. A representação não possui fórmula específica, podendo ser oral ou escrita, bastando que esteja clara a manifestação de vontade do ofendido, que, apresentando a representação, não poderá voltar atrás acerca de sua vontade, uma vez que esta é irretratável.

            Ressalta-se, aqui, a semelhança existente entre as ações penais privadas e as ações penais públicas condicionadas. É notório que ambas dependem da vontade da vítima para iniciarem-se, porém, vale frisar que enquanto as primeiras são propostas por advogados, as demais são sempre, necessariamente, propostas por um membro do MP.

            No que tange ao prazo para a apresentação da representação, o código penal e o código de processo penal, por meio de seus artigos 103 e 38, respectivamente, são claros ao apresentar que trata-se de prazo decadencial, no qual a vítima, ou o seu representante legal, tem seis meses para a manifestação de vontade (representação), contados da data de conhecimento da autoria delitiva. Assim, decorrido este prazo sem que seja exercido este direito, a punibilidade do infrator estará extinta pela decadência (artigo 107, IV, CP).

            Ainda dentro do âmbito das ações penais condicionadas, a legislação prevê, em certos casos, que estas estão condicionadas à requisição do Ministro da Justiça para a sua promoção. Ou seja, há certos casos nos quais deve haver a requisição, um ato político, ou, melhor dizendo, uma conveniência política a que fica condicionada a persecução penal de determinados delitos. Ressalta-se, aqui, que a ação continua tendo como titular o Ministério Público, mas que fica condicionado, em certos casos, à requisição do Ministro da Justiça.

            As exceções, previstas em lei, são as seguintes, conforme ensinado por Luiz Regis Prado, em sua obra:

                        “nos crimes cometidos por estrangeiro contra brasileiro, fora do Brasil (artigo 7, parágrafo 3o, CP);  nos crimes contra a honra cometidos contra o presidente da República ou contra chefe de governo de estrangeiro (atigo 141, I, c/c artigo 145, parágrafo único, CP)”.

            Nestes casos há um grande interesse político a ser observado, e , para muitos a representação seria uma “representação política”.

            No que tange ao prazo de propositura da requisição ministerial, é notório que há certas divergências doutrinarias. Para a maioria, sendo a legislação penal omissa, como é o caso, o prazo seria indeterminado, desde que não extinta a punibilidade do delito. Desta maneira, não se aplicaria o prazo decadencial previsto pela lei para a representação do ofendido, ou de seu procurador, de seis meses contados da data de conhecimento da autoria do delito. Este entendimento faz parte dos ensinamentos dos doutrinadores Fernando Capez, Paulo José da Costa e Mirabete, como se segue:

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                   “O código de processo penal é omisso a respeito. Entende-se, assim, que o Ministro da  Justiça poderá oferece-la a qualquer tempo, enquanto não estiver extinta a punibilidade do  agente.” – Fernando Capez

                   “Como a lei não esclarece o prazo dentro do qual deverá ser feita a requisição, será lícito sustentar que pode ser realizada a qualquer tempo, enquanto não estiver extinta a punibilidade.” – Paulo José  da Costa

                  “No silêncio da lei, entende-se que a requisição pode ser feita a qualquer tempo, enquanto não extinta a punibilidade do agente.” Júlio Mirabete

                       Por outro lado, há uma corrente minoritária citada na obra de  André Estefam que defende a ideia de que, por analogia, poder-se-ia aplicar o prazo decadencial previsto para a propositura da representação, tendo em vista que a lei é omissa e que os artigos 103 e 38 do código penal e do código de processo penal, respectivamente, já preveem um prazo para as ações penais públicas condicionadas à representação do ofendido (vale ressaltar que o referido autor não faz é adepto a esta corrente). Desta maneira, o Ministro da Justiça teria um prazo de seis meses para requerer a instauração da ação por parte do Ministério Público, prazo pelo qual seu direito decairia, isto é, não seria mais passível de ser exercido.

            Logo, mesmo sendo um assunto bastante divergente, crê-se que não teria um prazo decadencial para o Ministro da Justiça apresentar a requisição, uma vez que a lei é omissa e não apresenta solução para esta questão. A analogia não seria, neste caso, a melhor a ser aplicada, visto que este o prazo de seis meses é apresentado para representação do indivíduo, e que, caso fosse ser proposto um prazo a critério de vontade própria, este prazo deveria ser, ao menos, maior que o prazo de representação do ofendido, visto que trata-se de um Ministro da Justiça, um funcionário de alto cargo público que possui diversas competências e casos a serem analisados.

            Ainda, há a discussão acerca do caráter irretratável, ou não, da requisição ministerial. Por mais que a representação possua um caráter irretratável, por decorrência da lei, isto é, uma vez apresentada a representação pelo indivíduo não pode voltar atrás, sendo a lei omissa, não teria como se conferir este caráter irretratável à requisição. Porém, para muitos, ambos, a representação e a requisição, possuem esta característica.          

            Por fim, é importante mencionar que tanto a requisição ministerial, assim como a representação do ofendido, não tornam obrigatória a atividade do Ministério Público, que após o seu oferecimento, poderá, ou não, intentar a ação penal.

 

Bibliografia

 

Greco, Rogério. Curso de Direito Penal. 16a Edição. Rio de Janeiro. Impetus, 2014 – pgs. 701 a 703.

 

Costa Jr., Paulo José da. Curso de Direito Penal. 12a Edição revisada e atualizada. São Paulo. Saraiva, 2010 – pgs. 314 e 315.

 

Mirabete, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal – Volume 1: parte geral, arts. 1o ao 120. 30a Edição revisada e atualizada. São Paulo. Atlas, 2014 – pg. 368.

 

Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal brasileiro, volume 1: parte geral, arts. 1o a 120. 10a Edição revisada, atualizada e ampliada. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2010 – pgs. 692 a 694.

 

Jesus, Damásio de. Direito Penal, volume 1: parte geral. 35a Edição. São Paulo. Saraiva, 2014 – pgs. 712 a 714.

 

Capez, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 1: parte geral, arts. 1o a 120. 18a Edição. São Paulo. Saraiva, 2014 – pg. 578.

 

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, parte geral 1. 20a Edição revisada, atualizada e ampliada. São Paulo. Saraiva 2014 – pgs. 873 a 875.

 

Estefam, Andre. Direito Penal, 1: parte geral. 3a Edição. Saraiva, 2013 – pgs. 486 e 487.

 

Santos, Christiano Jorge. Direito Penal: parte geral. Rio de Janeiro. Elsevier, 2007 – pgs. 196 a 200. 

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O presente artigo foi elaborado em decorrência de discussão acadêmica acerca de prazos nas ações penais públicas incondicionadas.

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