Juiz criminal e a paz social

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A finalidade dessa pesquisa é de análise sobre a pessoa do juiz criminal dentro de suas atribuições na busca da paz social. Além de discorrer sobre temas pertinentes que se encontram constantemente ligados ao âmbito processual penal do cotidiano, o trabalho persiste na busca da definição de paz e na possibilidade de que a mesma venha ser estabelecida.

RESUMO: A finalidade dessa pesquisa é de análise sobre a pessoa do juiz criminal dentro de suas atribuições na busca da paz social. Além de discorrer sobre temas pertinentes que se encontram constantemente ligados ao âmbito processual penal do cotidiano, o trabalho persiste na busca da definição de paz e na possibilidade de que a mesma venha ser estabelecida.

Palavras-chave: Juiz criminal, Paz social, Direito Processual Penal, Lide

1 INTRODUÇÃO

O conflito de interesses existe desde a irracionalidade do mais simples ser vivo até mesmo a inteligência alcançada do Homo Sapiens. Os animais disputam por uma questão de sobrevivência e nós humanos persistimos na mesma questão, porém de forma mais socialmente menos instintiva, isto é, houve um aprendizado de convivência civilizada.

Era completamente comum nossos ancestrais da pré-história entrarem em conflito seja por uma caça, por um território, pela reprodução; e, atualmente também ocorrem os mesmos conflitos, visando de uma maneira menos grosseira a aquisição de alguma pretensão; e portanto o conflito está intrínseco a nós. 

A ciência em tela, a qual denominamos  Direito possui grande complexidade de definições e uma gama de finalidades diversas que podem ser cumuladas em um bem comum : a paz social. Na esfera processual penal essa característica jurídica se manifesta de forma marcante uma vez que esse ramo se encarrega de ser o instrumento pelo qual o direito material poderá ser aplicado de forma eficiente visando a soluções dos problemas, denominado pela doutrina processual como lide.   

A lide é o confronto de pretensões queridas e resistidas pelas partes, a existência desse fenômeno invoca com urgência alguém que o solucione. A ideia da Lei de Talião “olho por olho, dente por dente’’ foi se mostrando ineficaz no decorrer da história jurídica a ponto que em certo momento fosse estabelecido o que Thomas Hobbes chamava de Leviatã, ou seja, uma força que pudesse retirar do homem seu estado de natureza evitando que uma injustiça sempre gerasse outra. Comentando  sobre o pensamento desse contratualista escreveu Macpersnon (1979, p.30):

 O estado de natureza retrata a maneira pela qual os indivíduos, sendo o que são, se comportariam inevitavelmente se não houvesse nenhuma autoridade para obrigar ao cumprimento da lei ou de um contrato. (...) Esse comportamento seria inevitavelmente uma luta incessante dos indivíduos, uns contra os outros, uma luta de cada um deles pelo poder sobre os outros. A intenção de Hobbes, claro, é mostrar que essas condições frustrariam inevitavelmente o anseio de todos os seres por ‘’viver comodamente’’ e de evitar a morte violenta, e que portanto todo o indivíduo ponderado deveria fazer o que fosse preciso para se proteger contra essas condições e que só a aceitação, por todos os indivíduos, de um poder  soberano absoluto é suficiente para proteger contra elas.

O Estado, portanto, necessitou estabelecer uma força coercitiva, que promovesse através da pessoa do juiz o chamado ius puniendi, esse seria o direito garantido de a pátria intervir em um confronto de interesses retirando da competência do cidadão a liberdade de proporcionar justiça a seu bel-prazer.

2 A PESSOA IMPARCIAL DO JUIZ

O magistrado dentro da relação jurídica processual é o ente imparcial, o que significa  dizer que não se deve encontrar contaminado por nenhuma das partes da lide, visando assim um julgamento justo. Essa ideia advém do fato de que se a pessoa do magistrado for corrompida em seu julgamento logo o mesmo não chegará perto do ideal de justiça e legitimidade prestando, portanto, um desserviço aos cidadãos que o provocaram e ao Estado que o impôs jurisdição.

O assunto é de suma relevância e está apresentado em nossa Lei Magna no Titulo II que consiste em descrever os direitos e garantias fundamentais:

Art. 5º, XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; e Art 5º, LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.

A doutrina processual penal cogitou na essencialidade desse dispositivo para a eficiência da Justiça dentro do Estado Democrático de Direito e o elencou como princípio do Juiz Natural desde a Constituição do Império datada de 1824.

Por esse postulado, fica sujeito a nulidade qualquer tipo de inclinação,  favoritismo ou preferencia pelo juiz a alguma das partes, vedando também o tribunal ex post factum, que demonstrava  clara tendência a injustiças.

A imparcialidade do magistrado é uma contribuição a Justiça não somente por garantir ao cidadão um ente que não estará tendencioso, mas também pela segurança jurídica de não poder possuir nenhum  vínculo  sanguíneo  ou afetivo com as partes. Na questão de relevância quanto à imparcialidade do julgador descreve o doutrinador Fernando Capez (2008, p.18):

O juiz situa-se na relação processual  entre as partes e acima delas (caráter substitutivo), fato que , aliado  à circunstância  de que ele não vai ao processo em nome próprio, nem em conflito de interesses com as partes, torna essencial a imparcialidade do julgador.

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2.1 As influências personalíssimas do magistrado

A pessoa do juiz não é de forma alguma um ser estranho às experiências humanas corriqueiras. É preciso recordar que o magistrado possui os mesmos direitos e prerrogativas como qualquer outro cidadão, o que não o faz alguém segregado da sociedade. Partindo dessa premissa, é perceptível notar que o julgador possui uma vida intima da qual ele pode ter seus princípios morais, éticos, religiosos e culturais como bem entender.

Por uma questão lógica, esses fatores direta ou indiretamente podem intervir em algumas decisões de forma mais aparente, no entanto, não deve desnaturar a imparcialidade como togado no processo.

2.1.1 O juiz criminal

O juiz está investido de jurisdição, expressão que etimologicamente  significa que  tem a missão de  ‘’dizer o direito’’, o que já é uma grande tarefa. A circunstância se elenca de gravidade uma vez que esse está investido do poder de julgar e fazer valer as leis penais, tanto de direito material quanto da vertente processual.

A razão disso estaria na ideia de que o ramo penal é a secção do Direito que lida com as áreas mais extremas da vida, tendo o caráter de ‘’ultima ratio’’ que decorre do princípio da intervenção mínima nas soluções de conflito; exigindo de  quem atua nesse área maior estabilidade para lidar com situações peculiares.

O juiz criminal preenche uma posição importantíssima para o Direito Processual Penal e  deve ter consigo conscientemente que a justiça deve estar atrelada a  busca pela paz social uma vez que exercendo suas  funções representa  o martelo do Estado que ora inocenta, ora condena fundamentado nas Leis em lato sensu , nas provas, nos postulados também conhecidos como princípios e na jurisprudência.

Em sua decisão, não cabe ao juiz criminal, veredictos tomados infundadamente, porém guardado pelo principio do livre convencimento poderá utilizar-se de mecanismos oferecidos seja pelo Ministério Publico, seja pela defensoria para averiguar e então proferir seu entendimento.

Fica derrotada a ideia de que o juiz assume simplesmente a ação de ser um mero ‘’escravo da lei’’ não levando em consideração outras circunstâncias que possam influenciar de maneira relevante ao final do processo.

3. A busca pela paz social

A paz social de forma plena pode ser vista como uma maneira utópica e falaciosa de enxergar o mundo, mas a contribuição para que esse bem possa se fazer cada vez mais presente recai na sociedade como um todo e inclusive nos atos de um juiz criminal.

O direito processual penal tem como finalidade imediata a realização da pretensão punitiva que por uma correlação lógica tem o objetivo de dar surgimento a sua finalidade mediata que é um dos objetos de estudo discutidos nessa pesquisa: a paz social.

Os tempos de crise social, política e econômica no Brasil preocupam a população em todos os aspectos e também no âmbito da criminalidade. O crime sempre foi o mal que toda a sociedade, ou pelo menos grande parte dela, desejou combater. O juiz criminal, dentro do seu poder de agir tem  todas as atribuições para contribuir mesmo que de forma discreta para que essa paz seja mais observada.

A via que o magistrado deve utilizar não se trata de impunidade geral ou de condenação total e sim de uma forma justa conseguir perceber quais as melhores circunstâncias judiciais para que, uma vez comprovada a culpabilidade, o réu possa vivenciar o duplo caráter da pena : a reeducação e a punição.

Faz-se necessário que, ao experimentar a punição do Estado, o réu consiga perceber as consequências severas de atentar contra um bem jurídico alheio e ao mesmo tempo dê condições para que o mesmo possa reintegrar a sociedade.

É relevante levar em conta que o Brasil possui um sistema penitenciário que afronta todos os possíveis objetivos de uma decisão justa, uma vez que não oferece a reabilitação social, fazendo do cárcere um aprendizado para novos e mais graves delitos.

Essa questão acaba sendo alienígena para o magistrado por não poder colaborar com toda uma reestruturação penitenciária, apenas podendo decidir e lamentar pela piora do cidadão.

A questão da superlotação carcerária não é de competência do Judiciário, no entanto, o juiz criminal pode, quando lhe parecer conveniente e de acordo com a lei penal, oferecer ao réu outros meios de se cumprir a pena, afastando assim daqueles que possuem uma culpabilidade menor, a oportunidade de terem suas penas mais coerentes com o que é objetivado pelo Direito.

4. Os atos jurisdicionais que viabilizam a paz

É sabido que a impunidade pode levar ao aumento da violência de maneira ferrenha e suavizar os julgamentos tomando uma atitude mais inerte e omissa a situação caótica e perigosa de maneira alguma auxiliaria na busca pela paz. O juiz criminal deve ser o ente que tem a capacidade de viabilizar a maneira mais correta de mudar os rumos jurídicos de um processo, evidenciando algumas provas que venham a ser mais coerentes e valiosas ao caso. A disputa de interesses entre as partes pode levar o magistrado a perceber que nem sempre tudo aquilo que está no processo pode ser a verdade propriamente dita. Nesse sentido é que a doutrina processual penal conceitua a verdade real diferenciando da verdade formal.

A verdade formal seria os fatos transportados ao processo, isto é, aquilo que pode ser lido nos autos; enquanto a verdade real seria o fato realmente ocorrido no caso.  A busca por essa ultima verdade é crucial para a promoção da paz social pelo simples fato de que o magistrado extrairia de todo o caminho processual as tendências das partes e permitiria que  fosse julgado o caso de forma mais equilibrada.

O ato de condenar e inocentar portanto, estaria de acordo com a mais visível integridade possibilitando a sociedade a oportunidade de confiar na Justiça Criminal como um eficiente órgão, trazendo segurança jurídica a coletividade e por consequência disso a paz.

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É válido salientar que dentro da prática forense penal existe um órgão que foi idealizado com o escopo de facilitar a resolução de conflitos e a cima de tudo amenizar os danos e custos que um processo penal pode causar na vida de um cidadão. O denominado JECRIM (Juizado Especial Criminal) surgiu para  que os casos em que houvesse a presença de infrações de menor potencial ofensivo fossem de maneira mais pacífica solucionados.

Esse órgão jurisdicional possui algumas condições para que os fatos delituosos possam ser adequados a sua jurisdição principalmente no tocante ao período de pena previsto no tipo; delitos que não ultrapassam 2 anos de pena são considerados de menor potencial ofensivo e podem ser introduzidos nessa sistemática.

A ideia é de muito boa intenção, uma vez que retirando as infrações em que o agente mereça menor severidade do Estado da grande gama de ações das varas criminais, ocorre maior celeridade e permite em tese, eficiência.

Infelizmente, muitos órgãos não contam com magistrados exclusivos para atuarem nesse âmbito fazendo com que o mesmo julgador da vara criminal exerça jurisdição também no Juizado Especial Criminal. Essa questão envolve além do desgaste maior do  togado criminal, uma contraposição do que era realmente querido: celeridade e maior eficiência.

Através dessa análise é possível conceber que o Juizado Criminal Especial seria uma tentativa razoável de se tentar solucionar as lides sem a necessidade do formalismo de um processo, sendo o desenvolvimento dessa prestação jurisdicional mais conciliadora e pacífica juridicamente.  

Houve portanto, um esforço do legislador brasileiro em possibilitar que em situações de delitos potencialmente menos agressivos aos bens jurídicos ou de bens considerados menores, ocorresse uma paz social mais evidente.

5. Justiça restaurativa e o sua contribuição

Surge no pensamento internacional jurídico a ideia concebida primeiramente pela criatividade da polícia neozelandesa, da chamada justiça restaurativa ou também denominada terapêutica.

O método foi aplicado em adolescentes que não se sujeitavam as leis, e por conta disso tornaram-se delinquentes. A solução foi que ao invés da punição severa ou do indiferentismo, fosse tida uma conversa com os pais dos adolescentes infratores para que junto com a família pudesse a policia encontrar a melhor forma de reverter o caso. Essa atitude sensibilizou a sociedade tanto que esse pensamento foi introduzido no Poder Judiciário francês que realizou a tentativa de praticar o mesmo procedimento com os adultos por meio dos colegiados de vitimas e colegiados de juízes aposentados. Dessa forma, os infratores eram acompanhados pelos respectivos colegiados em busca da solução que os tiraria da vida criminosa.

É, sem dúvida, revolucionário de se pensar que uma porção de pessoas de bem, possam, voluntariamente,  querer auxiliar no reestabelecimento de um ente da social que feriu um bem jurídico alheio. Outrossim, é preciso recordar que a atitude só é plenamente revolucionária no momento em que o agente aceita o auxilio, uma vez que se houver a recusa do mesmo, o processo criminal seria interposto.

A possibilidade de se enxergar um aspecto mais pacífico nesse modo de prestar reintrodução  social é gigantesca e de forma séria, pode se tornar uma alternativa aceita mundialmente.

No Brasil essa maneira de se fazer Justiça ainda é  relativamente nova, vigorando há cerca de 10 anos e tem sido amplamente apoiada pelo Conselho Nacional de Justiça.

3 CONCLUSÃO

É plenamente possível concluir que o juiz criminal e a paz social são imprescindíveis para um Estado Democrático de Direito e estão em extrema ligação. Portanto torna inadmissível que a situação processual penal seja exercida por um magistrado sem que não seja observada a finalidade mediata da matéria de promover a paz na sociedade.

O caráter visionário da temática não pode estar simplesmente em um futuro distante e incerto e sim na vida prática forense, exercido da maneira mais rápida. É necessário que se esteja atento que a lentidão jurídica somente atrapalha a pretensão punitiva, aumenta a insegurança jurídica e ainda torna deficiente todo Poder Judiciário. Além de essa morosidade  ferir o principio da duração razoável do processo previsto pela nossa Magna Carta no Art. 5° , inciso LXXVIII:

A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

O juiz criminal tem a valiosa tarefa de conciliar por meio de uma pena justa a pretensão punitiva e a o sentimento de fé em sua jurisdição, sendo ele um representante do Estado e  refúgio de decisões aos cidadãos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. – 15. Ed. Ver. E atual. – São Paulo : Saraiva, 2008

MACPERSON. A teoria política do individualismo possesivo: de Hobbes a Locke.  -   Paz e Terra – Rio de Janeiro, 1979


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Sobre os autores
Giovanna Ferrari Rodrigues

Discente do 3º ano do curso de Direito do Centro Universitário “Antonio Eufrásio de Toledo” de Presidente Prudente.

Fernando Henrique de Aguiar Souza

Discente do 3º ano do curso de Direito do Centro Universitário “Antônio Eufrásio de Toledo” de Presidente Prudente.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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