O abuso no exercício do direito da estabilidade gestante e a orientação jurisprudencial 399 TST

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19/04/2016 às 11:47

Resumo:

Resumo:



  • O escopo do trabalho é verificar abuso de poder na estabilidade gestante;

  • Legislação e jurisprudência protegem a gestante contra demissão arbitrária;

  • Discussão sobre a demora na promoção da reclamatória trabalhista após o término da estabilidade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O entendimento do TST poderá ensejar abuso no exercício de direitos das gestantes, eis que a OJ 399 concederá direito mesmo com ingresso da reclamatória após do decurso do prazo de estabilidade.

  1. NTRODUÇÃO

O escopo do presente trabalho é o de constatar a ocorrência, ou não, de abuso de poder no exercício da estabilidade gestante.

Isso porque, existem muitas situações onde o empregador demite a empregada que está gestante, sem ter conhecimento da gravidez da empregada. Nessa esteira, ao invés de reclamar seus direitos dentro do período de estabilidade (do conhecimento do estado gravídico até 05 meses após o parto), aguarda o decurso deste prazo para então reclamar perante juízo o recebimento das verbas referentes ao período em que teria estabilidade.

Ou ainda, podemos vislumbrar a hipótese de que a própria empregada não tinha conhecimento de seu estado gravídico quando de sua demissão e, após seu conhecimento, aguarda premeditadamente o decurso do prazo de estabilidade para então reclamar perante juízo o recebimento das verbas referentes ao período que teria estabilidade.

Nestes casos, o que faremos? Qual a posição a ser adotada?

Assim, o objeto deste trabalho é de suma importância, vez que inexiste na legislação – seja na CF/88, CLT ou legislação extravagante – posicionamento expresso quanto à existência ou não de prazo prescricional, ou mesmo decadencial, sobre o exercício do direito relativo à estabilidade de emprego da gestante.

De todo o modo, temos a recente Orientação Jurisprudencial (OJ) 399 do TST, a qual servirá – de certo modo – de norte para o tema, a qual dispõe que “o prazo para promoção de ação pleiteando os direitos decorrentes da estabilidade gestante é de dois (02) anos, vez que inexiste previsão dispondo diversamente”.

Na mesma esteira, segue a Juíza Kátia Liriam Pasquini Bariani. Destacamos posicionamento doutrinário contrário de Sergio Pinto Martins, citado na obra da Juíza Kátia Liriam Pasquini Bariani.

Assim, faremos uma análise da situação posta, declinando situações pós e contra a recente OJ 399 do TST.

2. PREVISÃO LEGAL E CONTEXO HISTÓRICO.

A previsão legal da estabilidade gestante, num contexto histórico, é antecedente a Constituição Federal de 1988, em razão da ratificação da Convenção 103 da OIT pelo Decreto Legislativo 20 de 30/04/1965, o qual veda a dispensa da empregada durante a licença maternidade.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) dispõe sobre o tema em seu art. 392:

“Art. 392. A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário. (Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)

§ 1o A empregada deve, mediante atestado médico, notificar o seu empregador da data do início do afastamento do emprego, que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto e ocorrência deste. (Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)

§ 2o Os períodos de repouso, antes e depois do parto, poderão ser aumentados de 2 (duas) semanas cada um, mediante atestado médico.(Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)

§ 3o Em caso de parto antecipado, a mulher terá direito aos 120 (cento e vinte) dias previstos neste artigo. (Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002)

§ 4o É garantido à empregada, durante a gravidez, sem prejuízo do salário e demais direitos:(Redação dada pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999)

I - transferência de função, quando as condições de saúde o exigirem, assegurada a retomada da função anteriormente exercida, logo após o retorno ao trabalho;  (Incluído pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999)

II - dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e demais exames complementares. (Incluído pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999)”.

Nessa esteira, o art. 7º da Constituição Federal de 1988 prevê a impossibilidade de demissão de empregada gestante sem justo motivo, confirmada pelo art. 10 da ADCT prescreve que:

“Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;

XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;”

“Art. 10 - Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o Art. 7º, I, da Constituição:

II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”

Diante das previsões legais acima, temos claro que o escopo do legislador é o de proteger o emprego da gestante.

3. DO ESCOPO PROTECIONISTA DA ESTABILIDADE GESTANTE.

Como dito alhures, a estabilidade gestante é reconhecida antes mesmo da promulgação da Carta Constitucional de 1988 (ratificação da Convenção 103 da OIT pelo Decreto Legislativo 20 de 30/04/1965), estendendo-se – sem qualquer sombra de dúvidas – à empregada doméstica (Lei 11.324/2006).

Contudo, diante de todas as previsões citadas, podemos extrair que o escopo do legislador é o de vedar a demissão arbitrária da gestante nesta fase tão singular da vida, contudo sem colocar qualquer óbice à demissão por justa causa na ocorrência das situações elencadas no art. 482 da CLT, a constar:

“Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

a) ato de improbidade;

 b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;

d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;

 e) desídia no desempenho das respectivas funções;

f) embriaguez habitual ou em serviço;

g) violação de segredo da empresa;

h) ato de indisciplina ou de insubordinação;

i) abandono de emprego;

 j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

 l) prática constante de jogos de azar.

 Parágrafo único - Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional. (Incluído pelo Decreto-lei nº 3, de 27.1.1966)”

Assim, temos que tal impedimento legal tem como escopo central a possibilidade real da futura genitora poder contar com o recebimento do seu salário no período em que necessita doar seus préstimos diuturnamente ao recém-nascido.

A proteção ao emprego neste caso não tem apenas o condão de assegurar materialmente (pecúnia) a subsistência da mamãe e seu filho recém-nascido, mas possibilitar que durante toda sua gestação não sofra pressões psicológicas ante a possibilidade de uma demissão imotivada.

A Excelentíssima Juíza Federal do Trabalho Kátia Liriam Pasquini Bariani[1], com acuidade que lhe é peculiar, ao estudar o tema descreveu:

“A gravidez é uma fase que provoca profundas modificações na mulher. Modificações de ordem física e psicológica. No período gestacional a mulher fica mais sensível, mais vulnerável, sujeita a variações constantes de humor. Podem surgir nela dúvidas, medos, fantasias. Afinal, ela é diretamente responsável por uma nova vida. A situação é às vezes tão difícil que a mulher pode sofrer de depressão pós-parto, chegando mesmo a rejeitar o recém-nascido.

Por outro lado, está comprovado que as situações vivenciadas pela gestante provocam interferências no nascituro, motivo pelo qual, quanto mais tranqüila a gestação, melhor para a criança. A saúde (física e mental) do futuro bebê está diretamente ligada à situação vivenciada pela mãe durante toda a gravidez.

Assim, a estabilidade conferida à empregada gestante tem por objetivo proteger a maternidade, assegurando o bem-estar da futura mãe e, por conseqüência, do nascituro e do infante.”

Nesse sentido, aliás, pronunciou-se o Supremo Tribunal Federal ao analisar o tema:

“EMPREGADA GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (ADCT, ART. 10, II, “b”). PROTEÇÃO À MATERNIDADE E AO NASCITURO. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO DO ESTADO DE GRAVIDEZ AO EMPREGADOR. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. - A empregada gestante tem direito subjetivo à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, “b”, do ADCT/88, bastando, para efeito de acesso a essa inderrogável garantia social de índole constitucional, a confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao empregador, revelando-se írrita, de outro lado e sob tal aspecto, a exigência de notificação à empresa, mesmo quando pactuada em sede de negociação coletiva (STF-AI 448572/SP – Relator: Ministro Celso de Mello. DJ 22/ 03/2004, p. 00053)”

As alterações físicas e psicológicas causadas pela gestação são incontestáveis, tanto que o legislador, em 1940[2], concedeu pena diferenciada (privilegiada) à parturiente que, em estado puerperal, mata o filho recém-nascido:

“Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após:

Pena - detenção, de dois a seis anos.”

Estes motivos nos levam, com segurança, a realçarmos a importância do instituto em comento, e que daremos ênfase a seguir esmiuçando especificamente a estabilidade prevista no art. 392 CLT c/c art. 10 da ADCT, e a estabilidade da empregada doméstica, prevista no art. 4° da Lei 11.324/2006.

4. DA ESTABILIDADE PREVISTA NO ART. 392 DA CLT, ART. 7° DA CF/88 E ART. 10 DA ADCT, E A EXTENSÃO DO DIREITO ÀS EMPREGADAS DOMÉSTICAS.

Já dito anteriormente, a legislação pátria veda, com veemência, a demissão da empregada durante a gravidez até cinco (05) meses após do parto, salvo em caso de demissão por justa causa, previsto no art. 482 da CLT.

Entretanto, ocorrendo dispensa da gestante durante a gestação, ou mesmo no prazo de estabilidade, esta tem assegurado o direito a sua reintegração no emprego, valendo-se de ação judicial para tanto.

Vejamos alguns julgados.

“Ementa: GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. A legislação pertinente à matéria, garante a reintegração ao emprego, preservando, desta forma, o vínculo existente entre as partes. Quando não recomendável a reintegração, defere-se a indenização decorrente da estabilidade provisória. Postulada apenas a indenização substitutiva pela autora e não sua reintegração, retira-se a base do pedido indenizatório, que lhe é conseqüente e não pode ser deferido diretamente. (TRT 2ª Região - Processo: 00891200604402001 - Relator: MARIA APARECIDA DUENHAS).”

“EMENTA: ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO DO ESTADO GRAVÍDICO AO EMPREGADOR. INEXIGÊNCIA. A ausência de comunicação do estado gravídico ao empregador não retira da empregada o direito à estabilidade provisória. Proteção constitucional objetiva contra a despedida arbitrária. (TRT 4ª Região - Acórdão 00451-2006-122-04-00-4 RO - Número do processo: 00451-2006-122-04-00-4 (RO)   Juiz: MARIO CHAVES - Data de Publicação: 25/05/2007)” 

“Ementa: ESTABILIDADE GESTANTE. DESPEDIDA ARBITRÁRIA. CONDENAÇÃO PATRONAL AO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS CORRESPONDENTES. POSSIBILIDADE Uma vez confirmada a gravidez, tem-se assegurado, constitucionalmente, o emprego da gestante, que, se, inobstante, sofrer despedida injusta ou arbitrária, deverá ser reintegrada, preservando-se-lhe o status quo ante. A condenação ao pagamento dos salários correspondentes ao lapso estabilitário não se acha respaldado em lei, nem razoável se afigura à luz da conformação textual da letra b do Inciso II do Art. 10, da Carta Federal. Em verdade, não assiste ao temporariamente estável, o direito de optar entre a reintegração imediata e a percepção dos salários garantidos pela estabilidade, até porque, se tal lhe fosse facultado, não se falaria mais em reintegração, pois nenhuma empregada, especialmente grávida, propugnaria o retorno ao trabalho, quando bem mais vantajoso, em caso de despedida, seria o prêmio da sinecura. (TRT 7ª Região - Processo:   00312/2002-023-07-00-9  - Data de Publicação:  6/5/2003  - Relator:   ANTONIO MARQUES CAVALCANTE FILHO).”

“Ementa: EMPREGADA GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INDENIZAÇÃO. A Constituição Federal confere, na alínea "b", inciso II, art. 10 do ADCT, garantia de emprego à empregada gestante, desde a confirmação da gravidez, até cinco meses após o parto. Assim, comprovado que a reclamante foi dispensada quando se encontrava em estado gravídico, faz jus ao pagamento de indenização equivalente ao período estabilitário compreendido da data do rompimento do contrato de trabalho até cinco meses após o parto. (TRT 10ª Região – Processo: 01018-2006-103-10-00-5 RO - Data de julgamento: 28/2/2007 - Relator: Juíza Relatora : MARIA REGINA MACHADO GUIMARÃES).”

“Ementa: Gestante - estabilidade provisória - reintegração - conversão em obrigação de indenizar. 1. Restando incontroversos nos autos a vigência de contrato por prazo indeterminado, sua rescisão imotivada pelo empregador, bem como, o estado gravídico da empregada, tem ela o direito à estabilidade provisória (art. 10, II, ?b?, do ADCT). Contudo, quando se mostra materialmente impossível e não recomendável a reintegração da reclamante, deve ser convertida em obrigação de indenizar. 2. Recurso conhecido e provido. (TRT 21ª Região - Processo: 00217-2008-004-21-00-6 - Relator: Carlos Newton Pinto - Data de publicação: 17/7/2008).”

“Ementa: Estabilidade provisória: estado gravídico. Garantia constitucional. Restando configurado o estado gravídico da reclamante, quando da ruptura do pacto contratual, deve ser reconhecido o seu direito à estabilidade provisória. (TRT 21ª Região - Processo: 01211-2008-013-21-00-7 - Relator: Joaquim Sílvio Caldas - Data de julgamento: 12/8/2009).”

Mesmo estando definida em legislação diversa, a jurisprudência maciça do E. Tribunal Superior do Trabalho já dava guarida à empregada doméstica gestante demitida sem justa causa durante a gravidez, ou durante o período de estabilidade, a constar:

“RECURSO DE REVISTA – EMPREGADA DOMÉSTICA GESTANTE – VEDAÇÃO DE DISPENSA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA – 1. A vedação de despedida prevista no art. 10, inciso II, alínea "b", do ADCT não contempla a empregada doméstica, porquanto a proteção não se inclui entre os direitos assegurados pelo artigo 7º, parágrafo único, da Constituição da República aos trabalhadores domésticos. 2. Embora a Lei não resguarde a empregada doméstica gestante da despedida arbitrária ou sem justa causa, deve o empregador pagar, a título de indenização, o equivalente ao salário-maternidade, visto que, com a denúncia do contrato, obsta o gozo da licença a que a trabalhadora teria direito, consoante disposição contida no art. 7º, XVIII, da Constituição da República, combinada com o parágrafo único do mesmo dispositivo. Recurso de Revista conhecido e parcialmente provido. (TST – RR 426347 – 5ª T. – Rel. Min. Conv. Darcy Carlos Mahle – DJU 11.10.2002).”

"RECURSO DE REVISTA – EMPREGADA DOMÉSTICA – SALÁRIO-MATERNIDADE – Embora a Lei não resguarde a empregada doméstica gestante da despedida arbitrária ou sem justa causa, deve o empregador pagar, a título de indenização, o equivalente ao salário-maternidade, visto que, com a denúncia do contrato, obsta o gozo da licença a que a empregada teria direito. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST – RR 758692 – 5ª T. – Relª Min. Conv. Rosita de Nazaré Sidrim Nassar – DJU 08.08.2003).”

“1. AGRAVO DE INSTRUMENTO RECURSO DE REVISTA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO-CARACTERIZAÇÃO – [...]. 2. TRABALHADORA DOMÉSTICA LICENÇA GESTANTE ART. 7°, PARÁGRAFO ÚNICO, DA Constituição Federal – Consoante o disposto no art. 7°, parágrafo único, da Constituição Federal, as trabalhadoras domésticas têm direito à licença-gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias. Nesse contexto, e nos termos de precedentes desta Turma, conquanto não haja previsão legal no sentido de resguardar a doméstica gestante da despedida arbitrária ou sem justa causa, por certo que o Empregador deve pagar, a título de indenização, o equivalente ao salário-maternidade, tendo em vista que com a despedida da Obreira, restou obstado o gozo da licença a que a trabalhadora doméstica teria direito. Agravo de instrumento desprovido. (TST – AIRR 921/2001-004-17-00.4 – 4ª T. – Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho – DJU 11.03.2005).”

"RECURSO DE REVISTA – EMPREGADA DOMÉSTICA – SALÁRIO MATERNIDADE – INEXISTÊNCIA DOS RECOLHIMENTOS PREVIDENCIÁRIOS – Tendo em vista que a ausência de assinatura na carteira de trabalho da empregada atua como fato impeditivo de a autora perceber o benefício previdenciário relativo ao salário-maternidade, cabe ao empregador o pagamento de indenização correspondente ao salário-maternidade devido a empregada doméstica gestante, quando este a dispensa sem justa causa. Recurso não conhecido. (TST – RR 783.140/2001.1/5ª R. – 1ª T. – Rel. Min. Vieira de Mello Filho – DJU 26.05.2006).”

Não deixando pairar qualquer sombra de dúvidas quanto a aplicação do referido instituto, a Lei 11.324/2006 alterou o art. 4° da Lei 5.859/1972, estendendo de forma clara e direta a estabilidade às empregadas domésticas, a constar:

“Art. 4º. A Lei no 5.859, de 11 de dezembro de 1972, que dispõe sobre a profissão de empregado doméstico, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 4o-A. É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto.”

A jurisprudência, que já era consolidada antes do advento da Lei 11.324/2006, tem conferido guarida às empregadas domésticas gestantes demitidas imotivadamente durante a gestação ou do prazo de estabilidade:

 Ementa: LICENÇA MATERNIDADE. EMPREGADA DOMÉSTICA. DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA. INDENIZAÇÃO. DIREITO. Sendo garantido à empregada doméstica o direito à licença maternidade e sendo-lhe obstada sua fruição ante a demissão injusta, faz jus à indenização correspondente. Recurso Ordinário a que se dá provimento, no aspecto. (TRT 2ª Região - Processo: 02264200650102008 – Relator: ANELIA LI CHUM – Publicação 15/03/2007)”

“Ementa: RECURSO ORDINÁRIO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. EMPREGADA DOMÉSTICA. A proteção concedida à empregada gestante contra a despedida arbitrária e sem justa causa, instituída pelo art. 10, II, b , do ADCT, não decorre do direito à licença-maternidade e, dessa forma, não se aplica à empregada doméstica, cuja relação de emprego tenha se findado em data anterior ao advento da Lei nº 11.324/2006, haja vista que à época não havia qualquer previsão legal ou constitucional conferindo tal direito às domésticas. Recurso ordinário a que se nega provimento. (TRT 2ª Região - Processo: 02627200102902005 - Relator:   MARIA DORALICE NOVAES – Publicação – 17/06/2009)”.

“Ementa: Despedida sem justa causa. Data. Ônus da prova. Em que pese os graves problemas de saúde por que passa a reclamada, não é possível inverter, por tal razão, o ônus da prova, que se estabelece por força e na forma da lei processual. No caso, era seu o ônus de provar a data da despedida de sua empregada, considerando que, mesmo reconhecendo o vínculo, omitiu-se em cumprir a obrigação de proceder na anotação do contrato na CTPS. Não se desincumbindo do ônus de provar a data da despedida alegada na contestação, passa a recair sobre a data informada na petição inicial presunção de verdade.  Recurso não-provido. Empregada doméstica gestante. Garantia provisória no emprego. Aviso prévio indenizado. Cômputo no tempo de serviço. O aviso prévio indenizado integra o tempo de serviço da empregada para todos os efeitos, de modo que a concepção ocorrida nesse período enseja o direito à garantia provisória de emprego prevista no artigo 4º-A da Lei nº 5.859/1972, cuja redação foi dada pela Lei nº 11.324/2006. Recurso provido em parte. (TRT 4ª Região - Processo: 00064-2007-611-04-00-6 - Relator: CARMEN GONZALEZ - Data Julgamento: 26/3/2009).” (grifamos)

“Ementa: EMPREGADA DOMÉSTICA. SALÁRIO- MATERNIDADE. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. Comprovado nos autos estar a reclamante regularmente inscrita no Instituto Nacional de Previdência Social, lhe é assegurada a percepção do salário-maternidade, não havendo de se falar em responsabilidade da reclamada pelo pagamento do benefício à autora, responsabilidade essa, na hipótese dos autos, da Previdência Social. Recurso parcialmente conhecido e não provido. (TRT 10ª Região – Processo: 01202-2006-001-10-00-4 - Data de julgamento: 16/5/2007 - Juíza Relatora: MÁRCIA MAZONI CÚRCIO RIBEIRO).”

A bem da verdade não seria possível outra interpretação, senão a de que a garantia constitucional resguarda direito à relação de emprego (o posto de trabalho) desde a confirmação do estado de gravidez até cinco (05) meses após o parto, sendo doméstica ou não.

Em miúdos, a garantia versa exclusivamente na impossibilidade de demissão sem justa causa durante a gravidez e seus cinco (05) meses subseqüentes ao parto. Caso assim ocorra, a empregada deve – por meio de ação judicial – requerer sua reintegração ao emprego em sede liminar ou requerer indenização correspondente.

Essa é a interpretação da Carta Constitucional!

Nessa esteira, aliás, nos ensina Amauri Mascaro Nascimento[3], a propósito do teor do Enunciado 244 do TST diz que:

“Foi aprovado em 1985, antes da Constituição de 1988, com a qual não se harmoniza e para isso deveria considerar nula a dispensa da gestante, em razão da estabilidade, assegurar-lhe, diante da nulidade do ato do empregador, a continuidade do contrato de trabalho, com reintegração, se oportuna. O pagamento de todos os valores devidos pelo contrato sem a reintegração é forma substitutiva utilizada quando não é possível o restabelecimento da relação de emprego, como ocorre quando a decisão judicial é proferida depois do termo final da estabilidade”. (Grifamos)

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A garantia de estabilidade absoluta à empregada em razão da maternidade já decorria, como mencionado acima, desde a Convenção 103 da OIT.

Nos ensina Arnaldo Süssekind[4]:

“Não basta, porém, determinar o pagamento dos salários e demais vantagens concernentes ao período de licenciamento compulsório, como anuncia o Enunciado 244 do TST. A Convenção ratificada, que é lei no Brasil, tal como a Carta Magna, afirma a ilegalidade da despedida até o término do prazo fixado para a licença remunerada.”

Contudo, caso a reintegração não possa ocorrer por conta do esvaziamento do prazo de estabilidade face a morosidade processual, está se converterá em indenização referente ao recebimento dos salários e reflexos legais que teria direito durante o período de estabilidade. Nada mais justo em razão da morosidade contumaz do judiciário trabalhista brasileiro.

Note-se que, em ocorrendo a dispensa ilegal/arbitrária da gestante, esta terá agasalhado seu direito desde que o pleiteie judicialmente.

Não é possível se cogitar outro modo para a reintegração ao emprego, ao menos que informe ao seu ex-empregador seu estado gravídico - até então desconhecido - para que se reintegre ao seu emprego.

Contudo, como dito no problema posto em discussão, o decurso do prazo ocorreu pela inércia da empregada que aguardou seu esvaziamento para ulterior manifestação.

Assim, daremos sequência ao estudo do tema analisando o prisma das duas situações postas em discussão.

5. DA DEMORA PREMEDITADA NA PROMOÇÃO DA RECLAMATÓRIA.

Chegando especificamente no objeto central do presente trabalho, iremos verificar a seguinte situação:

“a empregada que demitida sem justa causa, cujo o estado gravídico era desconhecido pela empresa, promove ajuizamento da reclamatória trabalhista após aguardar o esvaziamento integral do prazo de estabilidade assegurado em lei, mas antes do prazo prescricional de 02 anos, tem direito ao recebimento da indenização correspondente aos salários e seus reflexos que seriam percebidos durante o período estabilitário?”

Tal situação causa polêmica no mundo jurídico, convergindo para duas correntes.

A primeira é do entendimento de que a empregada gestante, demitida sem justa causa, tem direito ao recebimento da indenização desde que a reclamatória tenha sido promovida antes do prazo prescricional de 02 anos. Nessa esteira se manifestou o E. Tribunal Superior do Trabalho, por meio da Orientação Jurisprudencial OJ 399, a constar:

“OJ-SDI1-399. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. AÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA APÓS O TÉRMINO DO PERÍODO DE GARANTIA NO EMPREGO. ABUSO DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. (DEJT divulgado em 02, 03 e 04.08.2010) O ajuizamento de ação trabalhista após decorrido o período de garantia de emprego não configura abuso do exercício do direito de ação, pois este está submetido apenas ao prazo prescricional inscrito no art. 7º, XXIX, da CF/1988, sendo devida a indenização desde a dispensa até a data do término do período estabilitário.”

Outro posicionamento, do qual compartilho, é do entendimento que a inércia contumaz e premeditada da empregada gestante demitida sem justa causa, cujo estado gravídico era desconhecido pela empresa, não coaduna no atendimento de sua pretensão exclusiva no recebimento da indenização constante do recebimento dos salários e seus respectivos reflexos do período de estabilidade.

As referidas situações postas serão estudadas individualmente a seguir.

5.1. DO RECEBIMENTO DA INDENIZAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO À REINTEGRAÇÃO – POSICIONAMENTO RECENTE DO E. TST POR MEIO DA OJ 399.

A questão posta em análise é:

“a empregada que demitida sem justa causa, cujo o estado gravídico era desconhecido pela empresa, promove ajuizamento da reclamatória trabalhista após aguardar o esvaziamento integral do prazo de estabilidade assegurado em lei, mas antes do prazo prescricional de 02 anos, tem direito ao recebimento da indenização correspondente aos salários e seus reflexos que seriam percebidos durante o período estabilitário?”

A corrente que defende o recebimento tem como base 02 dois argumentos principais:

“(i) pelo simples fato da demissão ser arbitrária, contrariando o art. 10 da ADCT; e

 (ii) existência de omissão legislativa quanto à existência de prazo prescricional, ou mesmo decadencial, para a promoção de reclamatória da gestante desde que respeitada o prazo do art. 7º, XXIX, da CF/1988.”

Sobre este prisma, de certo modo, entendo existir exatidão na conclusão. Como visto, a demissão nos moldes postos em discussão é arbitrária.

Ainda, fazendo leitura minuciosa da Carta Constitucional, não se verifica expressamente a existência de tal situação, quando muito da previsão de prazo prescricional, ou decadencial, no caso em análise.

Nesse sentido, destacamos o posicionamento da Juíza Kátia Lirim Pasquim Bariani[5]:

“A nossa opinião é de que o fato da empregada ajuizar a ação após o término do período de estabilidade não lhe retira o direito à indenização. Para extrairmos tal conclusão, primeiramente lembremos que, dispensada de forma arbitrária ou sem justa causa e sendo detentora de estabilidade, o ato da dispensa praticado pelo empregador é ilegal, fere, pois, os limites objetivos da lei (artigo 10, inciso II, “b”, do ADCT).

Tal situação confere à empregada o direito de ajuizar ação postulando a declaração de nulidade do ato praticado. Para o exercício do direito da ação, conforme já dito, a empregada tem o prazo de até dois anos após o término do contrato de trabalho (artigo 7º, inciso XXIX, da CF). Dessa forma, se a empregada ajuizar a ação trabalhista postulando a nulidade da dispensa e a sua reintegração no emprego ou a indenização correspondente ao período de estabilidade já escoado, sua atitude estará acobertada pela legalidade objetiva.”

Não é de hoje que o referido posicionamento tinha respaldo jurisdicional. Demonstramos a existência de acórdãos sobre o tema após análise do E. Tribunal Superior do Trabalho:

“RECURSO DE REVISTA. GARANTIA DE EMPREGO. GESTANTE. CONFIRMAÇÃO DA GRAVIDEZ. ABUSO DE DIREITO INEXISTENTE. A vedação de dispensa arbitrária ou sem justa causa de empregada gestante prevista no artigo 10, II, b , do ADCT da Constituição Federal impõe ao empregador uma obrigação de não fazer. Praticado o ato, pode a empregada dele exigir que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado perdas e danos (art. 883 c/c art. 1056, ambos do Código Civil). Ainda que tenha a autora ingressado com a presente reclamação, denunciando o estado gravídico, dois meses após o parto e nove meses após a dispensa, encontrava-se ela já com dois meses de gravidez, quando da resilição contratual o que, aliado ao fato de que efetivada a resilição sem qualquer assistência do sindicato, descaracteriza qualquer abuso de direito e autoriza a aplicação do entendimento jurisprudencial cristalizado nas Orientações Jurisprudenciais nºs 88 e 116 da SBDI-1/TST. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST-RR- 439.208/98.3,Turma, Rel. Juíza Convocada Maria de Lourdes Sallaberry, DJ – 21/02/2003).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. REINTEGRAÇÃO OU CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO. PROVIMENTO. Demonstrada a contrariedade à Súmula n.º 244 do TST, dá-se provimento ao Agravo de Instrumento para determinar o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento provido. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. REINTEGRAÇÃO OU CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO. Segundo se extrai do teor da Súmula n.º 244 do TST, item II, parte final, a garantia à gestante restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. Assim, não há de se falar em abuso de direito a demora no ajuizamento da ação em busca da garantia de emprego, desde que proposta no biênio prescricional e, em conseqüência, não há porque se restringir os direitos decorrentes da estabilidade da gestante a contar somente da data do ajuizamento da ação. Inteligência da Súmula n.º 244 do TST. Recurso de Revista conhecido e provido. (Processo: RR - 259040-67.2006.5.02.0088 Data de Julgamento: 24/09/2008, Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 10/10/2008).”

A polêmica instalada gerou recente posicionamento do E. Tribunal Superior do Trabalho, o qual se pronunciou sobre o tema editando a Orientação Jurisprudencial OJ 399:

“OJ-SDI1-399. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. AÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA APÓS O TÉRMINO DO PERÍODO DE GARANTIA NO EMPREGO. ABUSO DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. (DEJT divulgado em 02, 03 e 04.08.2010) O ajuizamento de ação trabalhista após decorrido o período de garantia de emprego não configura abuso do exercício do direito de ação, pois este está submetido apenas ao prazo prescricional inscrito no art. 7º, XXIX, da CF/1988, sendo devida a indenização desde a dispensa até a data do término do período estabilitário.”

Sob esta ótica, temos que o posicionamento do E. Tribunal Superior do Trabalho possibilitará que os juízes singulares, ou os Tribunais Regionais passem a valer-se do novel entendimento em decisões de casos parecidos.

5.2.DA IMPOSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO DA INDENIZAÇÃO – ABUSO DE DIREITO – DEFESA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA ISONOMIA.

O título acima pode causar estranheza, principalmente quando se menciona “defesa ao princípio constitucional da isonomia”.

Contudo, respeitando a veneranda Orientação Jurisprudencial (OJ) 399 do E. Tribunal Superior do Trabalho, divergimos do seu posicionamento quanto ao tema central do presente trabalho, demonstrando os fundamentos que lhe alicerçam e dão norte.

Inicialmente, combatemos o posicionamento sob entendimento de que a Orientação Jurisprudencial não tem a “força normativa” de uma Súmula, ou no caso do Tribunal Superior do Trabalho, Enunciado.

A Orientação Jurisprudencial não possui o caráter de definição, comum aos Enunciados, que espelham uma consolidação mais ampla da posição do E. TST sobre determinado tema.

A diferença entre Enunciado e OJ torna-se mais clara quando se verifica que a primeira é deliberada pelo Pleno (reúne todos os ministros do Tribunal) e a segunda é criada pela Comissão de Jurisprudência, como define a Resolução Administrativa 1295/2008 do Tribunal Superior do Trabalho[6].

Quanto ao mérito, colocamos contrariedade à Orientação Jurisprudencial (OJ) 399:

“(i) por entender que a demissão pode ter ocorrido com desconhecimento da gravidez, o que não tornaria arbitrária;

(ii) pelo fato de tal situação causar enriquecimento sem causa;

(iii) por impossibilitar a compensação tributária do salário maternidade; e

(iv) a demora premeditada na promoção da ação demonstra que o interesse é o recebimento do valor da indenização, e não o de ter assegurado direito ao emprego.”

Seguindo no tema, temos que o aguardo premeditado e contumaz do prazo de estabilidade tem caráter abusivo.

Como exposto pelo problema que se analisa, existe a real possibilidade de o empregador desconhecer da gravidez da empregada demitida.

Neste caso, combate-se a “arbitrariedade” da demissão, pois o desconhecimento da gravidez impossibilita tal compreensão. Se não se tinha conhecimento da gravidez é como se grávida não estava, sendo legal a demissão naquela oportunidade e situação.

A notícia da gravidez ao empregador, ou melhor, o ajuizamento da ação dentro do prazo de estabilidade assegura a empregada e ao nascituro a garantia ao emprego e salários correspondentes, bem como o empregador que poderá fazer uso de sua força de trabalho.

Ora, poderia se questionar: “mas por qual motivo a empresa utilizaria da mão-de-obra da empregada demitida?”

A resposta seria a mais sensata e correta possível: “por determinação legal!”

Não se pode deixar de mencionar que essa atitude demonstra claramente que a empregada não tem intenção de ter seu emprego assegurado, mas sim de receber os salários do período de estabilidade à título de indenização.

Esse comportamento contraria a interpretação sistemática do dispositivo constitucional, ocasionando enriquecimento sem causa.

Não obstante, demonstramos abaixo julgados de diversos Tribunais Regionais do Trabalho[7] compartilhando deste entendimento. Veja:

“ESTABILIDADE GESTANTE. TRANSCURSO DO PRAZO ESTABILITÁRIO. Entendendo a autora que detém direito à estabilidade gestacional, deveria ter ajuizado a sua reclamatória dentro do período estabilitário e postulado sua reintegração. Mas não o fez. Somente ajuizou sua ação mais de um ano  após a dispensa, quando já ultrapassado em dois meses o período destinado à estabilidade, visando à obtenção da indenização, impedindo a reclamada de cumprir, a tempo e modo, sua obrigação legal de reintegrar a gestante. Assim, de acordo com o lastro de razoabilidade da norma ora examinada, não há como interpretá-la senão no sentido de que a obreira incorreu em abuso de direito, buscando transformar a estabilidade provisória no emprego em vantagem pecuniária. (TRT 2ª R. – RO – 20080882271(00723200700202005) – Rel. Juíza Maria Aparecida Duenhas – Julgamento 30.09.2008)”. (Grifamos)

“ESTABILIDADE OU GARANTIA DE EMPREGO – REINTEGRAÇÃO – PRAZO PARA SE PROPOR AÇÃO VISANDO REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO OU INDENIZAÇÃO DO PERÍODO DE ESTABILIDADE GESTANTE – O prazo prescricional de 02 (dois) anos previsto no art. 7º, inciso XXIX, alínea b da Constituição Federal, é para o ajuizamento de ação quanto a créditos resultantes das relações de trabalho e não para qualquer direito do empregado. A Constituição Federal, no art. 10, inciso II, alínea b, assegura estabilidade no emprego à empregada gestante e não o pagamento de salários sem a contraprestação de serviços. O ajuizamento de reclamação posterior ao período de estabilidade fere o direito do empregador de se beneficiar dos serviços da empregada. Expirado o prazo da estabilidade, sem embargo da gestante, cessa a obrigação do empregador. (TRT 2ª R. – RO 20000471539 – (20010785226) – 4ª T. – Rel. Juiz Paulo Augusto Camara – DOESP 08.01.2002)” (Grifamos)

“EMENTA - ESTABILIDADE GESTACIONAL - GRAVIDEZ NO CURSO DO AVISO PRÉVIO - AJUIZAMENTO DA AÇÃO APÓS O PERÍODO ESTABILITÁRIO - Não se acolhe o pedido de indenização substitutiva relativa ao período da estabilidade gestacional se a Reclamante, a despeito de ter engravidado no curso do aviso prévio trabalhado, foi dispensada após a confirmação da gravidez, mas fruiu dos haveres decorrentes da dispensa sem justa causa e, somente cerca de 14 meses após a dispensa, alguns meses após o término do período estabilitário, ajuizou reclamação trabalhista, evidenciando intuito de obter vantagem pecuniária sem a contraprestação laboral que deveria se efetivar fora do período de licença-gestante. (TRT 3ª Ro - Processo 01326-2006-152-03-00-9 RO  Data de Publicação 14/09/2006 - Órgão Julgador Sexta Turma - Juiz Relator Emília Facchini - Juiz Revisor Maria Cecília Alves Pinto)”  (Grifamos)

“EMENTA: ESTABILIDADE DA GESTANTE. REINTEGRAÇÃO. SALÁRIOS E SEUS REFLEXOS. INDENIZAÇÃO. Deixando a empregada terminar o período de garantia de emprego para só depois ajuizar a ação, não faz jus a reintegração, muito menos a indenização. Recurso não provido. (TRT 4ª Região – Processo 00523.2006.011.04.00.1 – Relator: LEONARDO MEURER BRASIL - Data de Publicação: 07/08/2007)” (Grifamos)

“ESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE – DIREITO À ESTABILIDADE E NÃO INDENIZAÇÃO – RENÚNCIA – Os princípios da lealdade e da boa fé que devem reger as relações jurídicas, não permitem in casu, reconhecer o direito da autora aos salários decorrentes da estabilidade provisória, prevista no artigo 10, inciso II, alínea b do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, porque a garantia constitucional à obreira é quanto a estabilidade no emprego e, sucessivamente a indenização, que será deferida somente em caso de impossibilidade de retorno da obreira ao trabalho. Constata-se na hipótese, a mora na propositura da reclamação trabalhista, veja-se, que a autora foi demitida em 20.04.99, teve a confirmação da gravidez em 25.08.99, o filho nasceu em 08.01.2000, e só ajuizou a ação em 10.07.2000, ou seja, após o encerramento do prazo da estabilidade provisória que era detentora. A norma constitucional menciona a confirmação da gravidez, que deve ser entendido como critério objetivo para a garantia do emprego. – Recurso a que se nega provimento. (TRT 9ª R. – RO 02651-2001 – (01113-2002) – 1ª T. – Rel. Juiz Ubirajara Carlos Mendes – DJPR 25.01.2002)”. (Grifamos)

“ESTABILIDADE PROVISÓRIA-GESTANTE - Não basta a comprovação a gravidez, pois se a autora entendia que tinha direito à estabilidade deveria ter ajuizado a reclamatória trabalhista dentro do período destinado à mesma e postulado, prioritariamente, a reintegração ao emprego. Todavia, como se observa, não o fez. Somente ajuizou sua ação após transcorrido totalmente o período destinado a estabilidade. Traduz em abuso de direito a postulação de reintegração no emprego, fundada em estabilidade de gestante, mais de dezesseis meses após a ruptura do contrato. O acolhimento da pretensão nos moldes descritos com a inicial desvirtuaria a finalidade social do instituto da estabilidade à gestante que visa, como é sabido, tutelar a subsistência do nascituro através da garantia de emprego dada à mãe. (TRT 9ª R. - RO 10382-2001 - (08353-2002) - 4ª T. - Rel. Juiz Sergio Murilo Rodrigues Lemos - DJPR 19.04.2002).” (Grifamos)

“Ementa: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MAJORAÇÃO. Restando caracterizado nos autos que a empregada fora vítima de assédio sexual, a indenização pelos danos morais sofridos é medida que se impõe. Entretanto, se o julgador fixou o quantum indenizatório observando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a sentença deve permanecer inalterada. ESTABILIDADE DA GESTANTE. REINTEGRAÇÃO. Ao habilitar-se ao recebimento do seguro-desemprego e só ajuizar a demanda após o recebimento da última parcela do benefício, a recorrente praticou ação incompatível com o direito que veio a postular posteriormente, em inconfundível renúncia à proteção estatuída no art. 10, inc. II, letra b, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. Recurso não- provido. (TRT 14ª Região – Processo 00239.2006.031.14.00.5  - Relator: MARIA DO SOCORRO COSTA MIRANDA).” (Grifamos)

“Ementa: GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. É indevido o pagamento dos salários pertinentes ao período estabilitário quando a propositura da ação se dá apenas quando expirado tal lapso temporal. A interposição de reclamatória visando apenas o recebimento de indenização compensatória demonstra que o interesse da autora não foi o de manter-se no emprego (vontade da lei), mas sim buscar uma reparação pecuniária sustentada apenas na tese da responsabilidade objetiva que como é óbvio esbarra em restrições quando não haja boa-fé por parte de quem a invoca. Não se pode olvidar que nos contratos bilaterais há exigência jurídica no sentido de que a parte deva cumprir antes sua obrigação para depois exigir o implemento do outro. Incabível, portanto, a concessão de vantagens pecuniária a quem e esquiva de eventual reintegração ao emprego. (TRT 15ª Região - ACÓRDÃO 006303/2000- 5a Turma - Processo 02796-1996-004-15-00-0 - Relator:   ANDREA GUELFI CUNHA)” (Grifamos)

“Ementa: Gestante. Estabilidade. Finalidade. O direito conferido à gestante de permanecer no emprego tem por finalidade a proteção à maternidade e ao nascituro, de modo que, ocorrida a dispensa em violação à Constituição, cabe à empregada requerer, enquanto perdurar a estabilidade, o seu retorno ao trabalho e conseqüente indenização. Restando inerte a beneficiária da norma, descabe o reconhecimento do direito, quando já exaurido o lapso temporal da estabilidade. (TRT 21ª Região - Processo:00204-2002-001-21-00-2  - Relator:   Joseane Dantas dos Santos  - Data de publicação:10/12/2003)”. (Grifamos)

“ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. DEMISSÃO. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO DO PERÍODO DE ESTABILIDADE. O objetivo do Legislador Constituinte Originário de 1988, quando da edição, tanto do art. 6º, 7º, inciso XVIII, da CF/88, quanto do art. 10, II, 'b', do ADCT, da mesma Carta Magna, foi o de proteger a maternidade e a infância. Contudo, a boa exegese determina que referidos dispositivos sejam aplicados de forma racional, a não possibilitar o cometimento de abusos desvirtuadores do fim teleológico instituídos pela lei. O objetivo dos referidos artigos foi o de garantir à empregada gestante o direito à manutenção de seu emprego no período gestacional, tendo o direito de ser reintegrada no seu trabalho sempre que haja despedida imotivada ocorrida naquele período, sendo devida a indenização em substituição à reintegração ao emprego, tão somente nos casos em que o retorno ao trabalho se torne inviável, vez que o bem maior a ser tutelado é o emprego e não a indenização substitutiva, a qual não pode ser pleiteada diretamente, mas alternativamente. (TRT 23ª região. Processo 01701.2003.005.23.00-3. Desembargador Osmair Couto. Data da publicação: 20/09/2004)”.

Corroborando integralmente com o posicionamento lançado pelos Tribunais Regionais, o E. Tribunal Superior do Trabalho pronunciou-se em alguns acórdãos reconhecendo o abuso de direito da gestante, e declarando como indevido o pagamento da indenização substituta referente aos salários do período de estabilidade e reflexos legais:

“GESTANTE – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – INDENIZAÇÃO – DEMORA NO AJUIZAMENTO DA AÇÃO – ABUSO DE DIREITO – EFEITOS. Quanto aos direitos decorrentes da gestação, as obrigações do empregador, firmadas sob responsabilidade objetiva, têm gênese com a concepção, ao tempo em que perdurava a relação de seu emprego, independentemente de seu conhecimento e , até mesmo, ciência da Obreira. As normas constitucionais (art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b) buscam resguardar os direitos do nascituro. Esta é a inteligência da O.J. 88/SDI desta Corte. No entanto, a demora injustificada na propositura da ação traduz abuso de direito, fazendo jus a ex-empregada somente as salários do período restante da estabilidade, contados a partir da data da citação do empregador. Precedente . Recurso de revista desprovido. (TST – RR- 463.953/98.0 – 2ª Turma , Rel. Juiz Convocado Alberto Luiz Bresciani de Fontana Pereira – DJ. 10/08/2001)”. (Grifo e destaque nosso)

“GESTANTE - DESPEDIDA SEM JUSTA CAUSA - DESCONHECIMENTO DO ESTADO GRAVÍDICO POR PARTE DO EMPREGADOR - ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO - DELONGA INJUSTIFICADA NO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. A delonga injustificada por parte da empregada no ajuizamento da ação, ocorrida após o decurso do período estabilitário, configura abuso do direito de ação, não fazendo jus a empregada à indenização decorrente da estabilidade provisória gestacional. Não há falar, pois, em violação de dispositivo da Constituição, contrariedade à Súmula desta Corte ou em divergência jurisprudencial. Recurso de revista não conhecido. (RR - 224/2003-121-15-00 PUBLICAÇÃO: DJ - 22/10/2007- Rel. Min. Vantuil Abdala)”. (Grifo e destaque nosso)

Olha, fazendo um paralelo com a estabilidade decorrente de acidente do trabalho, que é indiscutivelmente de pleno conhecimento do empregador, colacionamos alguns julgados do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região e do Superior Tribunal do Trabalho, ambos reconhecendo como indevido o recebimento da indenização substituta constante dos salários do período de estabilidade e reflexos legais, face a inércia contumaz e premeditada do postulante:

"Acidente do Trabalho. Despedido imotivadamente no curso de 12 meses após a cessação do auxilio-doença acidentário, o empregado perde os salários do tempo em que permanecer inerte sem propor a ação. A lei quer a manutenção do emprego com trabalho e salários. Não protege a malícia de quem aguarda escoar o prazo de reintegração para pleitear apenas os salários. (TRT/SP - Ac. 02960095981- Rel. VALENTIN CARRION - DOE 05.03.96.)” (Grifo e destaque nosso)

“DOENÇA PROFISSIONAL. ESTABILIDADE. ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO - DELONGA INJUSTIFICADA NO AJUIZAMENTO DA RECLAMAÇÃO TRABALHIASTA. É certo que o objetivo do legislador, ao editar a norma prevista no artigo 118 da Lei 8.213/91, foi a proteção ao trabalho, garantindo ao empregado que sofreu acidente do trabalho a estabilidade no emprego pelo período mínimo de um ano, após a cessação do auxílio-doença acidentário. Disso resulta que o empregado dispensado sem justa causa no período estabilitário tem o direito de ser reintegrado. Note-se, entretanto, que a lei assegura a estabilidade no emprego e não o pagamento de salários sem a contraprestação de serviços, ou seja, o ócio remunerado, valendo ressaltar que a indenização correspondente ao período estabilitário somente se justifica no caso do empregador frustar o direito do obreiro à reintegração ao emprego. Recurso a que se dá provimento, a fim de excluir da condenação a reintegração e o pagamento de indenização correspondente. (TRT/SP - 02508200505902008 - RO - Ac. 2ªT 20100672943 - Rel. ODETTE SILVEIRA MORAES - DOE 03/08/2010)”. (Grifo e destaque nosso)

“ESTABILIDADE. DOENÇA PROFISSIONAL. Tendo em vista que o fundamento peremptório para não se reconhecer a estabilidade por doença profissional foi o de que a delonga no ajuizamento da ação, ocorrida após o decurso de eventual período estabilitário (caso considerassem presentes os requisitos do artigo 118 da Lei nº 8.213/91), configurou abuso do direito de ação, deve o debate da revista circunscrever-se a tal premissa, o que não socorre a recorrente. Não se configura violação do artigo 11 da CLT nem a pretensa divergência jurisprudencial. Recurso de revista não conhecido. (TST - Processo: RR - 161800-89.2004.5.02.0010 Data de Julgamento: 26/03/2008, Relator Ministro: Vantuil Abdala, 2ª Turma, Data de Publicação: DJ 18/04/2008.)”. (Grifamos)

Dos julgados trazidos à baila extraímos, em seu aspecto basilar, que a demora injustificada na promoção da reclamatória, ou mesmo da busca extrajudicial de seu direito, configura abuso de direito.

Extraímos, também, que os acórdãos demonstram que o direito tutelado é a “manutenção no emprego”. Daí concluímos que o recebimento dos salários devem ocorrer mediante a contraprestação da gestante, ou seja, tem de trabalhar para receber o pagamento de seu salário.

Não conseguimos compreender de outro modo.

O legislador constituinte, quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, atendendo o escopo da aclamada Constituição Cidadã, dispôs no inciso VXIII do art.7º:

“Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além dos outros que visem à melhoria de sua condição social.

VXIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de cento e vinte dias.”  (Grifo e destaque nosso)

Constou ainda na alínea “b”, inciso II do art. 10º dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias:

“Art. 10 – Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:

II – Fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

b – da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.” (Grifamos)

 O referido texto legal visa garantir condições para que a mulher leve a bom termo sua gravidez, e que após o parto desfrute de tempo para se dedicar a seu filho recém–nascido, mas não o recebimento dos salários sem que tenha de trabalhar.

Fazendo uma interpretação sistemática dos artigos acima descritos da Constituição Federal de 1988, temos claramente 03 figuras: “(i) vedação da dispensa imotivada ou sem justa causa (ii) emprego e (iii) salário”.

Novamente, voltando para a questão posta em discussão, desconhecendo do estado gravídico da emprega inexistente é a arbitrariedade do ato demissionário!

Temos adiante interpretação sobre emprego e salário. Mais especificamente sobre o salário temos que seu recebimento depende da prestação do trabalho da empregada demitida.

Veja o significado da palavra salário no dicionário[8]:

“Salário - sa.lá.rio - sm (lat salariu) 1 Estipêndio ou remuneração por um serviço prestado, principalmente por dia e por hora; jornal, soldada, soldo. 2 Castigo, recompensa. S.-hora, Dir e Com: aquele que o empregado ganha por hora de trabalho. S. mínimo: o mínimo que deve ser legalmente pago aos trabalhadores de uma região. S. misto: o que é pago parte em dinheiro e parte em sustento, como o de empregados domésticos. S. por tarefa ou por peça: pagamento estipulado por peça produzida ou trabalhada.”. (Grifo e destaque nosso)

Não bastasse a interpretação pormenorizada no vernáculo, temos que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê o pagamento do salário mediante a contraprestação do empregado:

“Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.” (Grifo e destaque nosso)

Não deixando por menos, o Jurista e Desembargador do Trabalho da 2ª Região Sérgio Pinto Martins[9], citado na publicação do TRT da 15ª Região[10], se posiciona:

Entretanto, passados alguns meses da dispensa e pedindo a empregada reintegração, entendo que deve ser desconsiderado o período que vai da dispensa até a data do ajuizamento da ação, em razão da inércia da empregada na sua proposição e de ter direito ao emprego e não a receber sem trabalhar. No caso de a empregada deixar terminar o período de garantia de emprego e só depois ajuizar a ação, penso que não faz jus nem a reintegração, muito menos a indenização, pois o seu ato impediu o empregador de reintegrá-la, mostrando seu desinteresse em voltar a trabalhar na empresa. O direito previsto na Constituição é o emprego e não à indenização.” (Grifo e destaque nosso)

Diante do posicionamento acima defendido, concluímos pela não aplicabilidade da OJ 399 do TST no caso posto em discussão.

Contudo, não paramos por aqui.

Aponto-lhes um caso concreto[11] patrocinado por este subscritor, o qual demonstra a vontade da empregada gestante em receber os salários do período de estabilidade sem ter de trabalhar.

 Em apertada síntese, a reclamante foi demitida em 04/04/2008, oportunidade em que ela e seu empregador não sabiam de sua gravidez.

A ex-empregada, então reclamante, constatou via exame médico que estaria grávida, e que a concepção ocorreu em meados de março/2008.

Não procurou a empresa/reclamada.

Constituiu advogado em agosto/2008, tendo seu procurador datado a petição inicial em 23/08/2008. Contudo, distribuiu a inicial em 02/06/2009, cerca de 16 meses após sua demissão.

Agora questiona-se: esta atitude deve ser admitida pelo Poder Judiciário como correta?

Pede-se vênia para trazer resposta deste caso concreto, onde o E. Tribunal Regional do Trabalho decidiu, com extremo acerto, não admitindo tal situação, cujo o acórdão transcreve-se:

“EMENTA: “Para fazer jus aos direitos decorrentes da estabilidade legal, a gestante deve ingressar em Juízo dentro do período de garantia de emprego.”

(...)

Estabilidade provisória:

(...).

Não podem ser conhecidos os documentos trazidos intempestivamente aos autos. Deve ser destacado que o período contratual foi de 21/01/08 a 04/04/08 e que esta ação somente foi distribuída em 02/06/09, sendo evidente que, se estivesse grávida a autora quando demitida, a criança já teria nascido ao tempo em que processou a ré.

Considerando apenas o documento de fls. 16, único tempestivo, um leigo não pode concluir que se trata de exame comprobatório de gravidez. Ainda que assim não fosse, por ter transcorrido por inteiro o prazo de estabilidade provisória ao tempo da distribuição da ação, não é cabível o pedido de reintegração e, menos ainda, a indenização substitutiva. Isto porque nada prova que a reclamada estivesse ciente da gravidez da reclamante quando a demitiu.

Esta relatora entende que a gravidez é fato que gera, por si mesmo, a garantia da estabilidade. Há muito se avançou, no direito do trabalho, para dispensar-se o requisito da ciência da empregadora deste fato, para que a empregada tivesse tal proteção. Mesmo quando a própria gestante desconhece seu estado ao ser despedida não é perdida tal garantia.

Entretanto, não se trata de direito incondicionado e sobre o qual possa existir abuso por parte da empregada. Esta deve demonstrar interesse na reintegração se demitida nocurso da estabilidade, não cabendo vir a Juízo, de forma maliciosa, pretender apenas indenização substitutiva após o vencimento do prazo legal de garantia de emprego.

Neste sentido:

“Não faz jus aos direitos decorrentes da estabilidade provisória concedida à empregada getante a obreira que deixa transcorrer in albis o período estabilitário, para somente depois pleitear em Juízo os salários do período, uma vez que o objetivo da norma constitucional é garantir o emprego à  gestante e não o recebimento de salários sem a devida contraprestação.” - TRT/SP - Ac. 4ª. T. 02960356734 - Rel. SONIA MARIA DE OLIVEIRA P. R. FRANZINI - DOE 19/07/96.

Assim sendo, reformo a r. sentença, para absolver a reclamada da condenação de piso, julgando improcedente a ação, inclusive quanto à retificação em CTPS. (TRT 2ª Região - 17ª TURMA - Relatora: MARIA DE LOURDES ANTONIO - PROCESSO N° 01760.2009.201.02.00-2 - RECORRENTE: ENGEPAR ENGENHARIA LTDA., Adv.: DELI JESUS DOS SANTOS JUNIOR - OAB/SP 253.242 - RECORRIDA: ELISÂNGELA BARBOSA DOS REIS, Adv.:ROSELI RAMOS BRAZ - OAB/SP 140.681 - ORIGEM: 01ª VT DE BARUERI-SP – Julgamento em 25/08/2011). (Grifo e destaque nosso)

Aos defensores da aplicabilidade da Orientação Jurisprudencial (OJ) 399 do TST, mantemos a tese que a promoção da reclamatória após o decurso do prazo de estabilidade contraria seu escopo principal: “a proteção ao emprego da gestante”.

Entendemos deste modo, pois a busca da mulher em obter espaço no mercado de trabalho é de um passado recente, necessitando, inclusive, de descrição expressa na Constituição de 1988 para combater preconceitos:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;”

Deste modo, ao admitirmos o entendimento e aplicação da Orientação Jurisprudencial (OJ) 399 do TST estaremos, ao menos implicitamente, ferindo de morte a previsão constitucional e, dificultando muito, a luta das mulheres por um espaço no mercado de trabalho.

O empregador, valendo-se do poder diretivo atinente do risco empresarial[12] poderá optar, ainda mais, pelo uso da mão-de-obra de homens ao invés de mulheres. Assim, a “busca” da defesa da mulher gestante, a teor da Orientação Jurisprudencial (OJ) 399 do TST pode acarretar efeitos colaterais que irão prejudicar um número indeterminado de mulheres que terão plena desvantagem na concorrência de uma ocupação no mercado de trabalho.

Imagine que o empregador seja obrigado à efetuar o pagamento dos salários correspondentes ao período de estabilidade e seus reflexos legais, sem que em contrapartida tenha a contraprestação do labor da gestante.

Dessa construção pode-se ter, inclusive, afronta ao direito de defesa do empregador, que foi impedido de oferecer a reintegração à empregada gestante que fora demitida. Nesse sentido já decido os Tribunais Regionais do Trabalho:

“EMENTA: ESTABILIDADE GESTANTE. RECUSA INJUSTIFICADA À REINTEGRAÇÃO. PERDA DO DIREITO ESTABILITÁRIO. Empregada grávida que recusa injustificadamente a reintegração, espontaneamente, oferecida pela reclamada, abdica do direito à estabilidade gestante. Conquanto a maternidade tenha proteção especial, não cabe à empregada escolher entre a reintegração ou a indenização gestacional. Estando a tempo a reclamatória, primeiro, há de perquirir acerca da possibilidade do labor, pois, via de regra, a gravidez não impede o trabalho, eis que não é doença, embora altere o estado físico, mental e espiritual da parturiente. A negativa da prestação de serviço se justifica, quando prejudicial à gestação, mediante atestado médico (art. 394, CLT). Compete ao juiz, no caso concreto, converter a reintegração em indenização, mormente sendo aquela desaconselhável por incompatibilidade pessoal ou decorrente de impossibilidade material (decurso do prazo da estabilidade). Inteligência do art. 10, II, "b", do ADCT-CF, art. 496 da CLT e Súmula 244 do C. TST. (TRT 15ª Região - PROCESSO : 01502-2003-093-15-00-1 RO (47373/2004-RO-5) Relator:  EDISON dos Santos PELEGRINI – Julgamento 21/10/2005)”

“Ementa:ESTABILIDADE GESTANTE. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. OFERTA DE EMPREGO À AUTORA. RECUSA DESMOTIVADA.Empregada que recusa a reintegração que lhe fora proposta, ingressando na Justiça para pedir tão-somente a indenização substitutiva, é medida que deve ser repelida em face da finalidade social de garantia do emprego visada pelo legislador. (TRT 5ª Região - Processo: 0168500-26.2007.5.05.0032 - Relator(a): VÂNIA CHAVES - Publicação: DJ 26/11/2008)”

O E. Tribunal Superior do Trabalho já analisou caso análogo:

“Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. RECUSA À REINTEGRAÇÃO. INTERESSE EXTRACONTRATUAL. LIMITAÇÃO DO DIREITO À INDENIZAÇÃO. Não viola a literalidade do art. 10, II, b, do ADCT, acórdão regional que limita o direito à indenização correspondente ao período estabilitário garantido à gestante, em caso de recusa à oferta de reintegração no emprego, decorrente de interesse exclusivamente pessoal e extracontratual da empregada. O empregador não pode ser responsabilizado por ato extracontratual da empregada que inviabiliza o cumprimento da estabilidade que lhe é garantida, mormente se evidenciada a intenção do empregador em dar cumprimento à estabilidade, mediante a oferta de reintegração ao emprego. Incidência da Súmula 221, II/TST. Agravo de instrumento desprovido. (TST - AIRR 9828800272003504 – Julgamento 21/05/2008 – Relator Maurício Godinho Delgado)”

Ao fundamentar seu voto no acórdão supra citado, o Ministro do Tribunal Superior do Trabalho Maurício Godinho Delgado fundamentou:

“...Conforme expressamente consignado no v. acórdão regional, após dispensada, a Reclamante recusou a proposta de reintegração no emprego ofertada pela Reclamada, com fundamento em circunstância exclusivamente pessoal e extracontratual atribuída à empregada, consistente na sua mudança para outra cidade, em momento posterior à sua dispensa, para acompanhar seu cônjuge.

Ora, nesse caso, entendo que não pode o empregador ser responsabilizado por ato extracontratual praticado pela empregada, mormente se se verifica que, da parte do empregador, houve a tentativa de se dar efetivo cumprimento à estabilidade garantida à gestante, mediante a oferta de reintegração da empregada ao emprego...” 

Inegável é a proteção à gravidez e ao nascituro. Do mesmo modo, não pode o empregador arcar com despesas sem sua contraprestação devida, e muito menos sem abater créditos do salário maternidade perante o INSS[13].

Em momento algum se discute o posicionamento pró-ativo do E. Tribunal Superior do Trabalho em buscar solucionar uma situação que não está prevista expressamente na Constituição Federal.

A bem da verdade, essa postura, denominada por muitos como ativismo judicial[14], se faz necessário pelos Tribunais do país. Todavia, o que se impugna é o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, valendo-se do problema posto em discussão.

Se assim não fosse, imagine na hipótese da mãe que adota um filho. Como o empregador poderia saber desta situação?

A Consolidação das Leis do Trabalho confere à mãe que adota um filho as prerrogativas da gestante[15]. Todavia, condiciona à apresentação do termo judicial de guarda ou adoção.

Ora, a teor da referida OJ 399, tal comunicação seria dispensável!

Ainda sob este prisma, caso própria gestante não tenha conhecimento da gravidez quando da demissão, seria arbitrária a demissão efetivada pelo empregador naquela oportunidade em que o estado gravídico era desconhecido pela própria gestante?

Esses pontos demonstram, de forma conclusiva, que o entendimento da OJ 399 não deve ser aceito. Assim, caso a gestante aguarde premeditadamente o decurso do prazo de estabilidade para só então promover ação judicial, seu pedido, cujo o escopo é o recebimento da indenização substituta aos salários do período de estabilidade e reflexos legais, deve ser rejeitado.

6.CONCLUSÃO.

As situações postas em discussão são as seguintes: “o empregador demite a empregada gestante sem ter conhecimento da gravidez da empregada. Nessa esteira, ao invés de reclamar seus direitos dentro do período de estabilidade (do conhecimento do estado gravídico até 05 meses após o parto), aguarda o decurso deste prazo para então reclamar perante juízo o recebimento das verbas referentes ao período que teria estabilidade”.

Ou ainda, “podemos vislumbrar a hipótese de que a própria empregada não tinha conhecimento de seu estado gravídico quando de sua demissão, e após seu conhecimento aguarda premeditadamente o decurso do prazo de estabilidade para então reclamar perante juízo o recebimento das verbas referentes ao período que teria estabilidade.”

Diante das referidas situações efetuamos as seguintes indagações: “Nestes casos, o que faremos? Qual a posição a ser adotada?”

Nos valemos, inicialmente, do posicionamento recente do E. Tribunal Superior do Trabalho que, por meio da Orientação Jurisprudencial (OJ) 399, que é do entendimento de que são devidos os valores referentes aos salários e reflexos legais como indenização substituta.

Sustentam que mesmo sendo movida ação judicial após o prazo de estabilidade, mas antes de dois anos da demissão, o pagamento é devido ante a inexistência de estipulação legal contrária.

Todavia, com todo o devido e merecido respeito, discordamos integralmente do referido posicionamento.

Como defendido, existem situações em que o empregador, ou mesmo a própria gestante, não têm conhecimento da gravidez quando da demissão.

Por este motivo estaria ausente a arbitrariedade da dispensa prevista literalmente na Carta Constitucional, bem como a não obrigação em efetuar o pagamento da indenização.

A contraposição do salário - vislumbrado pela gestante no pedido de condenação na indenização substituta - é o labor da obreira. Não há como exigir um (salário) sem a ocorrência do outro (trabalho).

De outra banda, não se pode deixar passar aos olhos que tal entendimento teria efeito reverso ao esperado. Enquanto sua intenção inicial é a de proteção à gestante, temos que tal interpretação coloca a mulher em desvantagem ao homem perante o mercado de trabalho.

Tal situação fará com que o empregador evite contratar mulheres para composição de seu quadro de funcionários, vez que tais implicações além de parecerem demasiadamente abusivas, ocasionam situação de desvantagem do lado operacional e financeiro.

Operacional, pois o empregador fica sem a força de trabalho por certo tempo, tendo muitas vezes de contratar mão-de-obra substituta. Financeiro, pois terá de pagar sem ter a contraprestação (trabalho), bem como ficará impossibilitado de fazer uso do crédito do pagamento do salário maternidade para compensação tributária perante o INSS.

A inexistência de previsão específica sobre o tema, tanto na Constituição Federal de 1988, Atos das Disposições Constitucionais Contraditórias ou legislação infraconstitucional, não justifica que tal atitude coadune com o recebimento da indenização do período de estabilidade.

Não se pode perder de vista a defesa da gestante e seu nascituro. Contudo, aceitar o texto da Orientação Jurisprudencial (OJ) 399 do E. TST é o mesmo que coadunar com o exercício do abuso de poder, má-fé processual, dentre outros pontos que ferem de morte a legislação brasileira, destacando que tal entendimento ensejará um precedente inóspito à contratação da força de trabalho feminina.

7.BIBLIOGRAFIA.

- BRAIANI, Kátia Lirim Pasquini. - In “A estabilidade da empregada gestante e o abuso do direito” - Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, São Paulo, n. 27, p. 167-177, 2005. Disponível em: <http://www.trt15.jus.br/escola_da_magistratura/Rev27Art9.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2008

- MÁSCARO NASCIMENTO, Amauri - citado por Nei Frederico Cano Martins in “Estabilidade Provisória no Emprego”. - LTr Editora, SP, 1995.

- SÜSSEKIND, Arnaldo - in “Instituições de Direito do Trabalho”. - LTr Editora, SP, 2005, 18a  Edição, volume 1, página 723.

- MARTINS, Sérgio Pinto – in “ Direito do Trabalho” – 14ª ed., rev. ampl. – Ed. Atlas, São Paulo/2001 – pgs. 368/369 –.

- COELHO, Fábio Ulhôa. – in “Curso de Direito Comercial”, v.1. 6ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

- SAAD, Eduardo Gabriel – in “Consolidação das Leis do Trabalho comentada – 39ª. Ed. Atualizada e ampliada por  José Eduardo Duarte Saad e Ana Maria Saad Castelo Branco, SP, LTr Editora, SP, 2006.

- Dec. Lei 2.848/1940 – Código Penal.

- Dec. Lei 5.452/1943 – Consolidação das Leis do Trabalho.

- Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

- www.planalto.gov.br.

- www.tst.jus.br.

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Sobre o autor
Deli Junior

Advogado, inscrito na OAB/SP 253.242.Atuação contenciosa e consultiva em Direito Imobiliário, Consumidor, Empresarial e Trabalhista. e-mail: [email protected]. - 11-97327-4363

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho apresentado no Curso e Pós-Graduação em Direito do Trabalho Lato Sensu do Centro Universitário FIEO – UNIFIEO, como requisito para a obtenção do título de Especialista em Direito do Trabalho. - Orientador: Osvaldo Dias de Andrade. Dezembro/2010.

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