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Análise jurídica a respeito do filme “Doze homens e uma sentença” de 1957

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O filme "Doze Homens e uma Sentença" questiona o sistema judiciário e os preconceitos latentes. Devemos formar cidadãos críticos e analíticos.

Resumo: Este estudo tem como objetivo analisar os questionamentos implícitos feitos pelo filme “Doze homens e uma sentença” com relação aos procedimentos processuais penais, frisando as falhas e os acertos do sistema democrático brasileiro e comparando-o, em certos momentos, com o estadunidense. Os temas discutidos são relevantes para a vida em sociedade por ser cada vez mais importante formar cidadãos com capacidade crítica e analítica, a fim de que haja uma melhora ao longo dos tempos dos institutos hoje estabelecidos. Todos devem ter uma noção de como seu país funciona e de como atuam os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), afinal ninguém pode alegar o desconhecimento da lei, sendo fundamental que cada um saiba quais as garantias, direitos e deveres definidos.

Palavras-chave: Processo Penal; Princípio da não-culpabilidade; Tribunal do Júri.


1. Introdução

O filme “Doze homens e uma sentença”1 consiste em uma das melhores obras cinematográficas de todos de tempos, na opinião de críticos da área e de profissionais do Direito. Com base nisso, torna-se mister fazer uma abordagem aprofundada dos vários aspectos relevantes que são levantados no decorrer da composição artística.

Alguns temas, como o Princípio da Presunção de Inocência (ou não-culpabilidade), o poder da argumentação, o sistema de júri e os preconceitos latentes são tratados com maestria em um filme que em nada fica ultrapassado (sendo de 1957), pelo contrário, nos mostra o quanto certas problemáticas continuam fortes mesmo em pleno século XXI.

De tal maneira, é relevante não deixar que tais assuntos sejam esquecidos e deixados sem discussão. Necessário se faz tentar incessantemente conscientizar as pessoas de que elas são as responsáveis pela realidade em que vivem, e se não estão satisfeitas com algo, é preciso lutar, afinal, sem luta não há vitória.

A formação dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) é reflexo da organização da sociedade, e sem seu apoio não há comunidade que conviva em harmonia. Inicialmente, os diplomas normativos advêm de costumes e princípios criados paulatinamente, como, nesse caso específico, os americanos, já que o filme se passa na cidade de Nova Iorque nos Estados Unidos da América.

Tal cultura impôs, naquele caso concreto, que a pena em caso de condenação seria a morte na cadeira elétrica ao réu condenado por unanimidade pelos doze jurados escolhidos aleatoriamente dentre os cidadãos, que conversam entre si em uma sala reservada e trancada por fora, logo depois das considerações do advogado, do promotor de justiça e das testemunhas, até chegarem a uma conclusão pela inocência ou culpabilidade dos acusados, desde que na forma unânime.

Para esclarecer parte das questões levantadas, será utilizado o método de abordagem indutivo, cujo foco é partir de ideias particulares para constatar verdades generalizadoras, que confirmem e fundamentem as teses. Com o advento do Positivismo esse método foi considerado o mais correto para a análise das ciências sociais. Como técnica de pesquisa tem-se a revisão doutrinária.


2. O contexto do filme

O filme foi dirigido por Sidney Lumet, um cineasta estadunidense que sempre buscou demonstrar como a justiça e a polícia são instituições frágeis. A partir desses conceitos pessoais, ele transformou um programa de televisão da época em um filme de grande sucesso que seria eternizado por conter atores brilhantemente talentosos e cenas feitas de modo a envolver o espectador em todos os minutos (close ups), desenvolvendo até certo suspense.

A obra se inicia com uma breve passagem de imagens do Tribunal (fora e dentro da sala principal), mostrando em alguns minutos o juiz e o réu. Logo após, os jurados se dirigem a uma sala reservada e começam a discutir e votar o destino do jovem rapaz pobre, e porto-riquenho de 18 anos que, teoricamente, havia assassinado premeditadamente o pai a facadas. Praticamente todo o filme se passaria ali, mas na verdade, aquele já era o sexto e último dia de discussões entre o advogado de defesa e o promotor de justiça.

Nos Estados Unidos, onde se passava a obra, aplicava-se a sentença de morte, portanto, para se decidir pela culpabilidade ou inocência de alguém era necessário haver uma unanimidade de opiniões. Diferencia-se do Brasil, por aqui só há previsão de pena de morte em caso de guerra declarada, bem assim o júri deve ser formado por apenas sete pessoas (homens e mulheres) que, inclusive, não podem conversar entre si durante suas reflexões, apenas marcam sim ou não para questionamentos postos em uma folha de papel, de modo secreto.

Em um primeiro momento, sob a presidência do jurado nº 01, uma votação preliminar foi realizada para que fosse verificada a posição de cada um. O resultado foi 11x1. O jurado nº 08, mais tarde identificado como o arquiteto “Davis”, foi o único a levantar dúvidas sobre a real culpa do suspeito. Em nenhum momento ele expôs ter certeza da sua inocência, mas queria discutir com os demais algumas dúvidas razoáveis acerca dos fatos postos.

A partir daí cada personagem foi revelando uma personalidade distinta, nenhum deles tinha o nome relevado durante os trabalhos, mas isso não impedia que fossem caracterizados. Alguns eram irresponsáveis, não tinham compromisso com a vida humana que ali estava em jogo. Cada um queria cuidar da sua própria vida, ficavam com má vontade e se utilizavam do senso comum para decidir. Além disso, o dia era extremamente quente, o que gerou ainda mais tensão/incômodo. Apesar disso, o jurado nº 08 propôs fazer uma sucinta reconstituição de uma das cenas do crime, o que fez com que ainda mais dúvidas surgissem e mais jurados ficassem intrigados sobre a possível inocência do rapaz.

Com base nisso e nos vários outros calorosos debates realizados em toda a trama, que relativizaram tudo o que foi dito no Tribunal, a cada votação mais e mais integrantes do júri acreditavam que não havia a comprovação da autoria do crime, razão pela qual, ao final, apesar de toda relutância, todos foram éticos e se conseguiu o 12x0 em prol da inocência.


3. O Princípio da Presunção de Inocência (ou não-culpabilidade) no ordenamento jurídico brasileiro

Para que se possa situar o estudo, se faz necessária uma referência histórica ao pensamento iluminista do século XVIII e à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 17892, promulgada no início da Revolução Francesa, em meio à inclinação ao Absolutismo Político. Nessa época, a mesma pessoa que fazia as leis julgava os acusados, era um poder concentrado nas mãos de poucos. Apesar disso, desde tais primórdios, vigorava o Princípio da Presunção de Inocência.

O Princípio da Presunção de Inocência está entre as principais garantias constitucionais e é expressamente trazido pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal3 “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, assegurando o Estado Democrático de Direito.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos elaborada pela Organização das Nações Unidas em 1948 também o prevê em seu artigo 114. Com base nessa premissa, ninguém poderá ser considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença, pelo contrário, deve ser tido como inocente e lhe ser assegurado o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório.

Em regra, o réu deve responder ao processo em liberdade, por ser este um bem individual amplamente tutelado no Brasil, só abaixo do direito à vida. A exceção é quando há forte interesse processual, perdurando a prisão até que sejam cessados seus motivos. Configura o duelo entre o jus libertatis do cidadão e o jus puniendi do Estado, sendo preciso preservar o equilíbrio.

Nas palavras de José Andrade da Silva5:

As garantias constitucionais configuram-se como princípios supra-legais que devem sempre ser observados na aplicação da legislação, tendo em vista se orientarem diretamente à Carta Magna e às bases de formação do Estado Democrático de Direito. Isso porque o papel central encontra-se nas ideias positivadas como princípios e direitos fundamentais, os quais almejam uma concepção de justiça e igualdade.

Como é de se prever, tal princípio influencia decisivamente na atuação do Direito Processual Penal. Os operadores do Direito não podem atuar fora dos limites fixados pelo legislador nos diplomas normativos a fim de que não haja o desrespeito à Dignidade da Pessoa Humana, nem sejam aplicadas sanções injustas.

Isso tudo ocorre hoje porque o Direito Penal, em tempos remotos, era utilizado com má-fé, como instrumento de perseguição pelos que estavam no Poder, de modo que pessoas eram condenadas por causa de interesses particulares, por simples boatos etc.

Eis o entendimento de José Nabuco Filho6:

Assim, surge uma questão de grande valor e importância que diz respeito quanto a capacidade do ser humano em compreender o fato de poder afirmar a existência de uma verdade, sendo que a imperfeição humana pode levar a uma interpretação errônea da realidade. E tais erros conduzem à dissonância entre o juízo que se faz de um fato, e como este fato foi realmente praticado. Motivo este que levam a inúmeros erros judiciários com enorme repercussão, nos quais a sociedade tinha certeza de estar punindo o autor de um fato. No entanto, essas certezas causaram os maiores erros judiciários. Mesmo que o crime praticado seja considerado repugnante pela coletividade, este fato não implica que o acusado perderá seus direitos concedidos pela Constituição Federal. Todavia, o suspeito pela prática do crime poderá ser considerado inocente ao final da persecução penal. Não pode ser deixado de lado a hipótese de um erro judiciário. Ou seja, o réu pode ser condenado pela prática de uma infração penal que não cometeu.

Por isso é que foram criados os recursos, para que possa haver a revisão de tais decisões, a fim de os erros judiciários sejam diminuídos, já que os seres humanos são tão falhos.

Todavia, e quando a pena de morte é admitida, como em alguns Estados dos EUA?

A chance de erro é atrelada à terrível possibilidade de que se retire a vida de um inocente pela falta de comprometimento ou poder de análise minuciosa dos fatos por parte do corpo de jurados. Consiste em um dilema institucional.

O Código de Processo Penal de 19417, ao longo de seu artigo 386, traz as hipóteses em que o juiz deva absolver o acusado. Relativo ao tema em debate, vejamos o caput e seu inciso VI:

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

(...)

VI - existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).

Concernente à parte final do dispositivo citado, pode-se observar a previsão da dúvida razoável acerca da materialidade ou da autoria do fato típico, esta última exatamente a que ocorreu no filme, razão pela qual o indicado a fazer é absolver o réu, pois da pior das hipóteses é melhor libertar um culpado do que condenar um inocente. É a configuração do in dubio pro reo (na dúvida, interpreta-se a favor do réu).

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Estes são os dizeres de Juarez Maynart Pereira e Dora Maynart Pereira8:

O mestre italiano Luigi Ferrajoli, por sua vez, menciona que a presunção de inocência é um princípio fundamental de civilidade, fruto de uma opção garantista a favor da tutela da imunidade dos inocentes, mesmo que isto acarrete na impunidade de algum culpado, pois, ao corpo social, basta que os culpados sejam geralmente punidos, sob o prisma de que todos os inocentes, sem exceção, estejam a salvo de uma condenação equivocada.

A culpabilidade é o elemento mais importante do crime. É o juízo derivado de uma conduta tida como típica e antijurídica que recai sobre a pessoa acusada. Nesse sentido, existem discrepâncias entre a culpa presumida e a culpa materialmente comprovada. Presumir a culpa de um indivíduo é relativamente fácil diante do encontro de simples indícios, mas para se condenar alguém é preciso mais, é imprescindível que a acusação, por meio do Ministério Público, demonstre forte comprovação material do que afirma.


4. O poder da argumentação e sua relação com a falha na defesa técnica e no depoimento das testemunhas

Normas e princípios sempre devem ser interpretados de maneira conjunta mediante o caso concreto, razão pela qual é constituída a Hermenêutica Jurídica. Um fator de suma relevância em um julgamento entre a defesa (advogado privado ou público) e a acusação (Ministério Público) é o jogo de argumentos dentro do âmbito desse ampliado rol de interpretação possível.

É substancial que se tenha poder de convencimento/persuasão nas palavras, a fim de que o juiz singular, na primeira instância; os juízes de instâncias elevadas; ou o Tribunal Popular, se convençam do que é defendido.

Contudo, ao retornarmos ao filme em questão se observa é que os argumentos que mais geravam dúvida sobre a culpabilidade do réu deixaram de ser apresentados pelo advogado e foram levantados apenas pelo júri popular, que não são especialistas no assunto.

Vamos a eles: 01. O Ministério Público alegou ser difícil encontrar o tipo de faca utilizada no homicídio em tela. No entanto, o jurado nº 8 adquiriu uma idêntica para demonstrar o quanto é fácil ter acesso a um instrumento daquele modelo; 02. Algumas testemunhas acharam estranho que o acusado não se lembrasse do filme que assistiu no período da autoria do crime, nem de seus atores. Os jurados chegaram à conclusão que a grande pressão enfrentada pelo acusado pode fazer com que o mesmo se esquecesse dessa vulgaridade; 03. Uma das principais testemunhas era um idoso que disse ter chegado até a porta da frente em torno de 13 segundos após ouvir um barulho e presenciou o rapaz em fuga. Mas uma vez, os jurados chegaram ao entendimento que um idoso não conseguiria realizar tal deslocamento nesse período, até porque o idoso já havia sofrido um derrame e possuía uma grande dificuldade de deslocamento; 04. Outra testemunha, “a mulher”, mencionou que no momento do crime estava deitada, pronta para dormir, quando olhou pela janela e viu o rapaz cometendo o crime entre os vagões do trem que passavam naquele momento. Novamente, os jurados chegaram a um entendimento de que seria difícil existir certeza, pois a mesma não estava usando óculos naquele momento e que fica difícil reconhecer alguém à distância e entre vagões. Enfim, estes e outros argumentos levantados por alguns dos jurados foram cruciais para a decisão final.

No Brasil, as testemunhas, em regra, têm o dever de depor, de comparecimento, de comunicar alteração de endereço por um ano e de prestar o compromisso de dizer a verdade. Porém, este último requisito é puramente formal, não existe nada que garanta que o indivíduo não minta perante a autoridade, a não ser sua própria consciência.

Não existem verdades absolutas, situações fáticas podem ser distorcidas dependendo do ponto de vista e do momento vivido por cada um. Isso não acontece necessariamente por má-fé do indivíduo, mas simplesmente pelos seres humanos estarem longe de serem perfeitos. Pessoas erram e testemunhos são falhos. A memória é um mecanismo em que é difícil confiar. Na seara penal, como é de se imaginar, esse assunto é ainda mais delicado de se lidar. Eis a fala de Guilherme Rosa9:

Nos últimos anos, uma série de estudos se debruça sobre a forma como recordações ilusórias podem incriminar pessoas inocentes. Pesquisadores mostraram que o trabalho de policiais e juízes pode influenciar o depoimento das vítimas de crimes a ponto de elas fabricarem memórias falsas, acreditarem nas mesmas e incriminarem inocentes.

No Brasil, recentemente foi realizada uma pesquisa por uma psicóloga chamada Lilian Stein10, através do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), ouvindo policiais, juízes, defensores públicos e privados e promotores de justiça, que constatou o seguinte:

Os dados mostraram que 90,3% deles dão muita importância ao testemunho durante a condução dos processos, enquanto 69,2% preferem privilegiar o reconhecimento dos criminosos. Esse desequilíbrio, afirma a psicóloga, pode levar os oficiais da lei a se basearem nas falsas recordações que eles mesmos ajudaram a criar.

Para compreender melhor esta realidade, vejamos as informações a seguir11:

Nos Estados Unidos, a organização Innocence Project se dedica a inocentar pessoas presas injustamente por causa de erros na condução da investigação. O grupo usa exames de DNA que comparam o material genético dos acusados com o material encontrado na cena do crime. Até hoje, a organização já liberou 333 detentos. Desses, 20 estavam no corredor da morte e seriam executados se a organização não provasse sua inocência.

Existem inúmeros casos assim no mundo todo, de inocentes na cadeia, seja por falha nas investigações, nos testemunhos, na defesa técnica ou em todas essas perspectivas conjuntamente. Às vezes o defensor, atarefado demais, não tem o devido cuidado ao analisar os autos e tempo suficiente para procurar soluções eficientes ao problema vivido. Talvez até por nem acreditar na inocência de seu cliente.


5. Os preconceitos implícitos e explícitos no julgamento humano

As pessoas que têm mais chances de serem presas são as que têm um “estereótipo” pré-determinado pela sociedade, aplicado em quase todo o mundo. A maior parte dos presos são pobres e negros, mas não impreterivelmente porque são os que mais cometem infrações penais, e sim porque são facilmente apontados na rua como suspeitos. Do percentual de pessoas inocentes que o projeto citado no final do tópico anterior retirou das prisões dos Estados Unidos, 70% (setenta por cento) eram negros e latinos. Não pode ser coincidência.

No filme, fica claro o preconceito que alguns jurados tinham com as características do jovem suspeito. Um jovem rapaz latino (nascido em Porto Rico), pobre, advindo de um cortiço, ficando entregue à marginalização, se tornando um “selvagem”, segundo as suas próprias palavras.

O problema de quem é xenofóbico12, racista13 ou detém qualquer outro “pré-conceito”14 concebido é não compreender o ser julgado como ele realmente é em seu interior, nas suas peculiaridades, e pensar que ele pode ser resumido a um modelo universal sem nenhum fundamento científico, afirmando que são seres inferiores.

Tal situação constitui um problema somente do preconceituoso, talvez este não tenha uma vida feliz, provavelmente tem problemas psicológicos e precisa de ajuda, pois ofender os outros nunca deve ser considerado normal. Quem é do bem quer viver em paz.

Além do exposto, o acusado também sofria com a violência doméstica advinda de seu próprio pai, sendo agredido fisicamente de forma recorrente, o que podia tê-lo levado, ou não, a decidir planejar a morte do pai.

Em algumas culturas essa forma de “educar” é considerada válida, é plenamente aceita pela comunidade, principalmente quando se refere a crianças e adolescentes, como uma maneira de tentar controla-los. Um dos participantes do júri chegou a comentar “que se tivesse um filho assim também o faria”.

Desse modo, tanto na ficção, quanto na realidade, verifica-se como a sociedade, como um todo, ainda é injusta, condena algumas atitudes ou características e aceita outras que deveriam ser repugnantemente reprovadas, deixando de denunciar, porém é substancial recordar que a prática de tortura é equiparada aos crimes hediondos.

Importante frisar o entendimento de Patrícia Janaína Hornburg15:

Justificamos nossa postura utilizando as crenças, os escritos antigos, desfavorecendo nossa vivência como seres humanos, o olhar o outro como olhas a ti perde força, e como não sabemos lidar com o diferente passo a segregá-lo, como sempre foi na história e será até o momento pelo qual a forma como lido, sinto e ajo mudar, quando perceber que o outro é para a vida tão importante quanto eu mesmo e tão necessário para que entendamos a nós mesmos, pois tudo o que enxergo no outro e conceituo já existe ou existiu em mim mesmo. Justamente esta parte inaceitável em mim gera a segregação do outro a nível inconsciente, me reconheço nele.

Como um meio de alertar as pessoas do quanto é arriscado fazer um julgamento precipitado sobre qualquer assunto, a obra cinematográfica trouxe em meio à cena um ventilador que estava aparentemente quebrado em um dia muito quente, o que fez com que parte dos jurados quisessem encerrar rapidamente a votação e consequentemente votassem pela condenação.

Sucede-se que, mais ao final do filme, quando já escurecia, ligaram as luzes da sala, quando então o ventilador também começou a funcionar. Ou seja, ele não estava quebrado, só precisava ser descoberto como seria feito para liga-lo (o que não era muito claro), como o próprio caso em julgamento. O diretor quis com isso mostrar o quanto as aparências enganam.

Nesse diapasão, conclui-se que16:

O magistrado não pode deixar-se contaminar pela ignorância e princípios equivocados de justiça por vezes difundidos pela mídia e formadores da opinião pública. O Estado juiz deve ser técnico quando da análise de um fato para ser justo e aplicar a norma jurídica conforme seu espírito, e desta maneira expressar a vontade popular que foi positivada por meio de seus representantes.

O preconceito se torna um tormento tão grande que nas últimas cenas da obra, ao ouvirem o discurso do jurado nº 10, todos os outros membros se levantam e se viram de costas para ele, recusando qualquer argumento de tão baixo nível. Essa exclusão dos preconceituosos deveria ser adotada por todas as pessoas sábias até que aqueles entendam que todos são iguais perante a lei de Deus e que não faz nenhum sentido pregar qualquer perfil de diferenciação.

No Brasil, segundo a estudiosa Maíra Streit17 acontece o seguinte fenômeno:

O respeitado sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995) costumava dizer que os brasileiros têm “preconceito de ter preconceito”, no sentido de que existe um esforço maior em negar o preconceito no País do que, efetivamente, em buscar soluções para combatê-lo.

Tal maneira de pensar e agir do brasileiro não resolve em nada a situação, somente “varre para debaixo do tapete” a sujeira que deveria ser jogada para bem longe dos lares dos cidadãos de qualquer país, antes que mais pessoas fossem prejudicadas física e/ou psicologicamente.

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Sobre os autores
Leonardo Barreto Ferraz Gominho

Graduado em Direito pela Faculdade de Alagoas (2007); Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina (2010); Especialista e Mestre em Psicanálise Aplicada à Educação e a Saúde pela UNIDERC/Anchieta (2013); Mestre em Ciências da Educação pela Universidad de Desarrollo Sustentable (2017); Foi Assessor de Juiz da Vara Cível / Sucessões da Comarca de Maceió/AL - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Foi Assessor do Juiz da Vara Agrária de Alagoas - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Conciliador do Tribunal de Justiça de Alagoas. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito das Obrigações, das Famílias, das Sucessões, além de dominar Conciliações e Mediações. Advogado. Professor da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Professor e Orientador do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Responsável pelo quadro de estagiários vinculados ao Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF - CCMA/FACESF, em Floresta/PE, nos anos de 2015 e 2016. Responsável pelo Projeto de Extensão Cine Jurídico da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF, desde 2015. Chefe da Assessoria Jurídica do Município de Floresta/PE. Coautor do livro "Direito das Sucessões e Conciliação: teoria e prática da sucessão hereditária a partir do princípio da pluralidade das famílias". Maceió: EDUFAL, 2010. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico I: discutindo o direito por meio do cinema”. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821832; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito civil e direito processual civil”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821749; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821856. Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 02. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558019. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico II: discutindo o direito por meio do cinema”. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558002.

Aline Ferraz

2011 - 2015: Graduada em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF. 2015: Estagiária nos Escritórios de Advocacia: "Pedrosa Monteiro Advocacia" e "Lustosa & Gominho Advogados Associados". 2016 - 2017: Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade Unyleya. 2016 - atualmente: Advogada (autônoma). 2017: Autora de artigos publicados nos livros: * Coletânea de Artigos Relevantes ao Estudo Jurídico: Direito Civil e Direito Processual Civil (Vol. 1), Ed. Lexia; * Cine Jurídico I: Discutindo o Direito por meio do Cinema, Ed. Lexia. Contato: [email protected]

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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