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As modificações introduzidas em sede de embargos infringentes pela Lei n° 10.352/01

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26/02/2004 às 00:00
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2. Conclusões

Neste tópico versamos sobre os embargos infringentes e as modificações trazidas pela Lei nº 10.352. Para tanto, urge demonstrarmos o seu conceito e finalidade. Trata-se de recurso interponível contra acórdãos proferidos em grau de apelação e em ação rescisória, quando houver reforma da decisão de piso por maioria de votos. Tem por intuito revisar e harmonizar as decisões anteriores, por terem sido estas proferidas em sentidos apostos.

Muito se discute sobre a necessidade de manutenção do recurso de embargos infringentes em nosso sistema. Muitas são os juristas que propugnam pela sua retirada, estando tal proposta consignada na exposição de motivos da lei reformadora do recurso. Entendemos ser viável a manutenção dos embargos infringentes, uma vez que a prática nos demonstra a importância de suas decisões para o aprimoramento do direito.

Outra discussão que não poderíamos nos olvidar de citar é sobre o cabimento dos Embargos Infringentes em Mandado de Segurança e em Remessa Necessária. Somos contra a parcela da doutrina que entende não serem cabíveis nos dois casos apontados. No mandado de segurança, temos a aplicação subsidiária das normas do CPC, desde que não sejam incompatíveis, o que ocorre. Isso já seria suficiente para aceitar o cabimento. Quanto à remessa necessária, não se trata propriamente de recurso, por não ser voluntário, mas faz as vezes daquele, possuindo em sua essência a possibilidade de se propiciar um reexame do que foi decidido. Por isso, possível é o cabimento dos embargos infringentes contra acórdão que julga remessa necessária.

Uma nova etapa da reforma processual foi iniciada com a edição das Leis nº 10.352, 10.358 e 10.444, as duas primeiras de 2001 e a último do ano de 2002. As modificações trazidas por estas, em especial a primeira, alvo de nosso estudo, mostraram-se importantes para a melhora de institutos importantes no âmbito recursal, facilitando a movimentação dos recursos nos meandros dos Tribunais. Mas não pensamos que as micro-reformas realizadas foram suficientes. Outras ainda estão por vir.

A análise do direito intertemporal faz-se importante para esclarecer quais normas serão aplicadas aos feitos, em especial os já pendentes. O direito intertemporal analisará, no concernente ao cabimento dos embargos infringentes, se a parte possui direito adquirido a pleitear a reforma da decisão em situação não mais contemplada pela lei nova.

Temos que a atual redação do art. 530 do CPC em muito se assemelha à redação original do Código de Processo Civil de 1939, depois modificado em 1946. As duas redações tratam da dupla conformidade quanto ao cabimento dos embargos infringentes. Não basta apenas o voto por maioria no acórdão para a interposição do recurso. Deve haver também a reforma da sentença ou a procedência da ação rescisória.

Ponto muito debatido pela doutrina no que tange à modificação trazida no art. 530 do CPC versa sobre a expressão "em grau de apelação". Diferentemente do que pretendia o legislador, a expressão acima referida nos leva a crer que os embargos infringentes tiveram as suas hipóteses de cabimento estendidas a todos os recursos julgados em grau de apelação, e não somente ao recurso de apelação.

Conforme podemos perceber, a art. 530 do CPC nos traz muitas dúvidas e inquietações. Mais uma vez encontramos algo a ser debatido. Nos atemos agora à expressão "sentença de mérito". Entendemos que o correto seria o legislador ter utilizado a expressão "acórdão de mérito", pois a primeira não explica o cabimento dos embargos infringentes quando do julgamento do mérito pelo tribunal de apelação interposta contra sentença terminativa. A análise da lei nos faz crer que não há direito ao recurso quando a sentença for terminativa, ou seja, não for de mérito, o que não nos parece correto, pois propugnamos pelo cabimento.

Também são cabíveis embargos infringentes nos casos de anulação de sentença, por ser a anulação uma espécie de reforma. Não se pode interpretar restritivamente o art. 530 quanto ao cabimento neste caso.

No que diz respeito ao cabimento de embargos infringentes contra decisão denegatória no juízo de admissibilidade, somos no sentido do não cabimento, uma vez que a reforma ou anulação da sentença presume juízo de admissibilidade positivo.

Quando falamos em ação rescisória, devemos distinguir dentre aqueles que possuem por condão apenas a rescisão do julgado e aquelas que possuem, além dessa característica, o pedido de novo julgamento pelo tribunal. No primeiro caso, são cabíveis os embargos infringentes quando a mesma for julgada procedente. No segundo caso, somente são cabíveis os embargos quando o pedido de novo julgamento for procedente. Caso o tribunal considere plausível a desconstituição do julgado, mas pugna pela mesma decisão, não há que se falar na interposição de embargos infringentes, pois nesse caso a divergência deve dar-se no pedido de novo julgamento.

No tocante ao procedimento dos embargos infringentes tivemos uma grande e importante modificação no juízo de admissibilidade feito pelo relator do acórdão embargado. Pela nova redação, a admissibilidade somente será analisada após a juntada das contra-razões do embargado, pois desta forma terá o relator maiores e melhores condições de analisar a existência ou a falta dos pressupostos recursais.

Por último, atemo-nos ao disposto nos art. 533 e 534 do CPC, que transferem para os Regimentos Internos dos Tribunais as normas atinentes ao processamento dos embargos infringentes, inclusive a escolha de novo relator, caso esteja previsto no referido regimento. Tal modificação deu-se em virtude da grande dificuldade de adequação dos tribunais aos procedimentos estabelecidos pelo CPC reformado, tendo em vista as diferenças existentes na formação de cada tribunal.


NOTAS

01. DINAMARCO, Candido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 8 ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.159.

02. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Processual Civil. V. 1. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.47/48.

03. JORGE, Flavio Cheim. DIDIER JR, Fredie. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A Nova Reforma Processual. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.186.

04. MARTINS, Pedro Batista. Recursos e Processos de Competência Originária dos Tribunais. Rio de Janeiro: Forense, 1957. p. 241-242.

05. DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.198.

06. JORGE, Flavio Cheim. DIDIER JR, Fredie. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A Nova Reforma Processual. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 189.

07. Op. Cit. p.190.

08. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.149.

09. DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.201-202.

10. JORGE, Flavio Cheim. DIDIER JR, Fredie. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A Nova Reforma Processual. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.187.

11. SHIMURA, Sérgio. Embargos Infringentes e seu novo perfil in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.503.

12. SHIMURA, Sérgio. Embargos Infringentes e seu novo perfil in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 504-505

13. DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.200.

14. SHIMURA, Sérgio. Embargos Infringentes e seu novo perfil in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.506.

15. Op. Cit. p. 507.

16. THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. V. 1. 24 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.p.634-635.

17. JORGE, Flavio Cheim. DIDIER JR, Fredie. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A Nova Reforma Processual. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.189.

18. Op. Cit. p. 189.

19. DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.206.

20. DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.206.

21. JORGE, Flavio Cheim. DIDIER JR, Fredie. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A Nova Reforma Processual. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 191.


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Sobre o autor
Bruno Avila Guedes Klippel

Advogado, Mestre em Direito pela FDV/ES, Professor da UNIVIX e UNIVILA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KLIPPEL, Bruno Avila Guedes. As modificações introduzidas em sede de embargos infringentes pela Lei n° 10.352/01. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 233, 26 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4899. Acesso em: 26 abr. 2024.

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