Constituição Federal e as recentes alterações do novo Código Florestal

03/06/2016 às 09:07
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O presente ensaio tem por finalidade discorrer sobre o novo Código Floresta Brasileiro. Objetiva-se analisar a Constituição Federal e as recentes alterações do novo Código Florestal.

A interferência do Meio Ambiente nas relações humanas é latente, vez que o desenvolvimento econômico e a preocupação com a preservação ambiental tem trazido frequentes embates em todos os campos, como não poderia ser diferente acaba por influenciar a ciência do Direito. A legislação ambiental deve ponderar e conciliar interesses diversos, portanto vem acirrando discussões entre ruralistas e ambientalistas. Enquanto os primeiros buscam ampliar a produção agrícola, a outra parte preocupa-se com o retrocesso na legislação de proteção ao Meio Ambiente. As principais divergências estão relacionadas na transformação de áreas produtivas em áreas de preservação permanente.   

A Constituição federal de 1988, foi quem deu status constitucional à preservação ambiental, atribuindo a todos o dever de preservá-lo e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Segundo preceitua o art. 23 VII da CF/88, a competência administrativa para preservar a floresta é comum a todos os entes federativos. A união tem competência para legislar sobre normas gerais em conformidade com o art. 24 VI e § 1º da CF/88.

Devido a incontestável autonomia da preservação do meio ambiente natural na manutenção da vida terrestre, o Estado viu-se na obrigação de garantir sua proteção através de mecanismos legais. O nosso país sempre foi conhecido pela sua enorme biodiversidade, bem como pela exploração desenfreada da mesma, desde sua colonização pela Coroa Portuguesa. Portanto, a criação de normas internas salvaguardando tal característica passou a ter papel de gritante importância.

O Código Florestal de 1943 teve caráter de proteção básica, não se aprofundando o suficiente para reprimir os abusos dos proprietários como era esperado que o fizesse. Por esse motivo foi necessário que ocorresse uma alteração o que só veio a acontecer em 1965, que culminou na criação de um novo Código Florestal, através da Lei 4.771. O Código Florestal de 1965 mostrou-se menos dúbio que o seu precursor, o que lhe conferiu melhor aplicabilidade e consequentemente a efetividade desejada. Nota-se que este código se apresentou com conteúdo mais intervencionista na propriedade rural agrária particular, limitando o uso dos recursos naturais nas propriedades privadas, por entender que estes são de interesse comum a todos os brasileiros. Após sua entrada em vigor, o mesmo passou a ser alterado, através de medidas provisórias, sempre que necessário devido as transformações ocorridas no meio social e jurídico.

A Constituição Federal de 1988 deixa expresso a importância do patrimônio ecológico em seu artigo 225, concedendo proteção constitucional à mesma:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

A regra ditada pela nossa Carta Magna vigente é a da sustentabilidade, a da exploração dos recursos naturais feita para atender os interesses econômicos do Estado, bem como o do proprietário, atendendo sempre ao princípio da função social da propriedade, sem se desprender da obrigação de preservá-lo, conforme afirma Cavedon Motta:

“Função social e proteção ambiental passam a integrar a próprio natureza do direito de propriedade. O uso da propriedade no desenvolvimento de atividades econômicas deverá, além de atender às necessidades particulares do proprietário, coadunar-se aos interesses da sociedade e equilibra-se com a preservação dos recursos ambientais nela existentes. O direito à livre iniciativa da atividade econômica é limitado no interesse da coletividade e da utilização racional dos recursos ambientais”.

A partir de 1999 passou-se a discutir uma nova alteração no Código Florestal de 1965, por conta das reiteradas vezes em que o mesmo foi reformado e por questões de mudanças no cenário interno do país.

Foi apenas em 2009 que essas discussões ganharam destaque, criando-se a Comissão Especial de Reforma do Código Florestal Brasileiro, responsável pelo debate e apreciação das novas propostas de normas protetivas, resultando na criação da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, qual seja, o novo Código Florestal Brasileiro.

AS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL

            A principal preocupação dos ambientalistas com as alterações do Código Florestal é a conservação e preservação permanente das florestas.  Para os ruralistas, a principal preocupação é a econômica, pois o custo elevado para regularizar as propriedades rurais em conformidade com os percentuais e metragens exigidas para reserva legal e áreas de preservação permanente pode inviabilizar a produção dos pequenos proprietários, além de reduzir consideravelmente ás áreas hoje utilizadas para lavoura.

            Na tentativa de conciliar a preservação ambiental com a produção agrícola e a realidade rural e o respeito às normas jurídicas, o novo Código Florestal trouxe uma gama de princípios que devem ser respeitados. Dentre eles estão o reconhecimento das florestas e demais formas de vegetação como bens de interesse comum a todos os habitantes do país; a preservação das florestas, demais formas de vegetação, biodiversidade e recursos hídricos é compromisso soberano do Brasil; o reconhecimento da função estratégica da produção rural na manutenção e recuperação das florestas e o papel destas na sustentabilidade da produção agropecuária; o compromisso do País com o modelo de desenvolvimento ecologicamente sustentável; a ação governamental de proteção e uso sustentável das florestas; a responsabilidade comum dos entes federativos em colaboração com a sociedade civil na criação de políticas públicas para a preservação e restauração da vegetação nativa e suas funções ecológicas e sociais nas áreas urbanas e rurais; o fomento à inovação para o uso sustentável, recuperação e preservação das florestas e a criação e mobilização de incentivos jurídicos e econômicos para promover a preservação e a recuperação da vegetação nativa e para favorecer o desenvolvimento de atividades produtivas sustentáveis.

O Código Florestal também incluiu em seu texto menção expressa à natureza real das obrigações nele previstas, transmitidas ao sucessor de qualquer natureza, no caso de transferência do domínio ou posse do imóvel rural conforme art. 2º, §2º. Algumas definições foram alteradas, como a pequena propriedade ou posse rural familiar, que encontra regulamentação no art. 3º da Lei 11.326/06, não podendo a área ser maior do que quatro módulos fiscais. A definição das áreas de preservação permanente não foi modificada, mas tão somente a de Reserva Legal, antes excluía da sua contagem as APP e agora não há mais essa limitação. O rol de atividades consideradas como de utilidade pública e de interesse social foi ampliado. Isso é significativo, pois atividades de utilidade pública e interesse social permitem a supressão de APP, sendo esta uma vitória da bancada dos ruralistas.

Muitas definições foram incluídas, dentre elas, a área rural consubstanciado, sendo área de imóvel rural com ocupação antrópica preexistente, uso alternativo do solo, sendo a substituição da vegetação nativa por outras coberturas do solo, como atividades agropecuárias, industriais e de geração de energia, mineração e transporte, assentamentos urbanos, e também o manejo sustentável, que é a administração da vegetação natural para a obtenção de benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando os mecanismos de sustentação do ecossistema objeto de manejo, atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental, área verde urbana, sendo espaços públicos ou privados, com predomínio de vegetação, previstos no Plano Diretor e nas Leis de Zoneamento Urbano e de Uso do Solo do Município, dentre outras definições técnicas.

A redação do Código anterior era bem mais restritiva, pois só permitia a supressão de vegetação em APP em casos de utilidade pública ou interesse social, devidamente caracterizados e motivados por procedimento administrativo autônomo, em caso de inexistência de alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto. Havia também previsão para a extinção de vegetação em APP em casos de supressão eventual ou de baixo impacto ambiental, mas deveria haver autorização do órgão ambiental competente. Ademais, o antigo Código determinava a necessidade de adoção de medidas mitigadoras e compensatórias pelo empreendedor. O novo Código Florestal foi mais sintético e não mencionou procedimentos administrativos ou medidas mitigadoras e compensatórias a serem estabelecidas pelo órgão ambiental competente, o que preocupa os ambientalistas.

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As APP não foram reduzidas como temiam os ambientalistas. Pelo contrário, o novo Código trouxe mais hipóteses de APP, ampliando a relação de áreas instituídas de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo. Em contrapartida, para o lado dos ruralistas, o novo Código ampliou o rol de atividades que permitem a supressão da vegetação em APP ao aumentar a lista de atividades consideradas como de utilidade pública e interesse social e ao criar as atividades de baixo impacto ambiental, que também passaram a admitir a supressão da vegetação nativa em APP (art. 8º).

Quanto à Reserva Legal, o Código previu casos em que não será exigida a

Reserva Legal, como para empreendimentos de abastecimento público de água e tratamento de esgoto ou para áreas adquiridas ou desapropriadas com o objetivo de implantação e ampliação da capacidade de rodovias e ferrovias, e casos em que o Poder Público poderá reduzir o percentual da Reserva Legal para até 50%, quando o Município tiver mais de 50% da área ocupada por unidades de conservação da natureza de domínio público e por terras indígenas homologadas, o mesmo valendo para os Estados com zoneamento ecológico e econômico aprovado, e no percentual de 65% (art. 12, §§ 4º e 5º). Nesse sentido, o Poder Público Federal poderá reduzir, para fins de regularização de imóveis rurais consolidados situados em área de floresta na Amazônia Legal, para 50% a área de Reserva Legal. Por outro lado, o Poder Público Federal poderá ampliar as áreas de Reserva Legal em até 50% dos percentuais previstos pelo novo Código, para cumprimento de metas nacionais de proteção à biodiversidade ou de redução de emissão de gases de efeito estufa (art. 13, II). A possibilidade de manejo em área de Reserva Legal não é novidade, pois já estava prevista no Código anterior.

CONCLUÃO

                Como se nota, as alterações promovidas pelo Código Florestal Brasileiro foram bastante realistas, na tentativa de equilibrar, da melhor maneira possível, a preservação e a exploração ambiental. Em uma escala os danos de uma exploração irresponsável dos recursos são evidentes, pois por serem individualizados, permitem facilmente sua percepção por cada um. A vantagem para um agricultor que possa substituir a mata ciliar nativa por suas plantações é evidente. No entanto, o efeito disso sobre a qualidade da água, embora existente, não será tão óbvio, e terá que ser sustentado por toda a coletividade que se vale daquele curso d'água, afetando também a produção. Dentro de certo tempo, perceberá o agricultor o tiro que deu no próprio pé.

            Parece que uma única norma que trate da preservação e da exploração denota a possibilidade da conjugação dos dois fatores, permitindo a sua compatibilização. Especificidades surgirão com o tempo, mas é isso que leva à evolução legislativa. Nesse primeiro momento, parece que o Novo Código Florestal emergiu como um avanço, tanto em matéria de preservação, quanto em matéria de exploração ambiental sustentável.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

MOTTA, Maurício Cavedon Apud. Função Social do Meio Ambiente. 2009. Rio de Janeiro

FONSECA, Beatriz da Costa Reis Valladares. As Principais Alterações Trazidas Pelo Novo Código Florestal Brasileiro. 2012. Rio de Janeiro

PAIM, Eline Luque Teixeira. Mudanças introduzidas pelo novo Código Florestal brasileiro: DisponÍvel em < https://jus.com.br/artigos/36954/mudancas-introduzidas-pelo-novo-codigo-florestal-brasileiro> acesso em: 02. Jun. 2016.

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Sobre o autor
Edney Moura Gonçalves

Estudante de direito da Faculdade Paraíso do Ceará.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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