A constante relativização ao princípio da não ingerência

06/06/2016 às 22:16
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O presente artigo traçará os pontos mais relevantes sobre a frequente ingerência dos Estados e Organizações Internacionais nos assuntos internos do país.

Este insituto já esteve presente em assuntos já ocorridos dentro do contexto geo político internacional, como no caso da adaptação a Declaração Universal dos Direitos do Homem alterada em 10 de dezembro de 1948. A URSS e cinco democracias populares recusaram votá-la, a África do Sul e a Arábia Saudita também(1). O texto foi reduzido estritamente ao mínimo, comportando disposições sacrílegas aos olhos destes governos. Exemplo é exposto pelo artigo 15, que estipula:

''Ninguém pode arbitrariamente ser privado da sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade''

Tal reação denota um nacionalismo impregnado nestes países que se recusavam a adotar determinados princípios consagrados no bojo da carta. 

 

O princípio da não ingerência ou princípio da autonomia, é um dever que os Estados possuem para com os outros, da não intromissão nos assuntos interno do próprio estado, o qual está unica e exclusivamente relacionado a ele.(2) Noutros termos, o país possui autonomia pra tratar de seus próprios interesses, porquanto tem em seu resguardo a sua própria soberania reflexo do princípio da igualdade soberana entre os estados(3), tal qual lhe confere a convenção de viena sobre direito dos tratados de 1969, em seu preâmbulo dispõe:

Conscientes dos princípios de Direito Internacional incorporados na Carta das Nações Unidas, tais como os princípios da igualdade de direitos e da autodeterminação dos povos, da igualdade soberana e da independência de todos os Estados, da não-intervenção nos assuntos internos dos Estados, da proibição da ameaça ou do emprego da força e do respeito universal e observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos. (grifo nosso)

 

Necessária e fundamental a visão trazida pela carta da OEA que trata em seu artigo 19 sobre o tema:

''Nenhum Estado ou grupo de Estados tem o direito de intervir, direta ou indiretamente, seja qual for o motivo, nos assuntos internos ou externos de qualquer outro. Este princípio exclui não somente a força armada, mas também qualquer outra forma de interferência ou de tendência atentatória à personalidade do Estado e dos elementos políticos, econômicos e culturais que o constituem''

Atualmente, vê-se uma total flexibilização dessa regra, principalmente em países como Iugoslávia, Iraque, Líbia e Afeganistão, que têm em seu solo uma constante intrusão de diversos estados (4). Não há direito absoluto, embora posições isoladas na doutrina discordem, por isso o direito da não interferência deve ser relativizado quando o estado passa por situações caóticas, como guerras civis, que seus próprios cidadãos necessitam do auxílio de outros estados. É o que tem feito os Estados Unidos no caso da Síria(5). 

Tal princípio não pode servir de guarda chuva para o abuso de Direitos fundamentais conquistados. É de notar-se que a ingerência dá-se num contexto extraordinário, excepcional, figurando como regra ainda o princípio da não ingerência, como bem demonstrou a Aseembleia Geral da ONU:

Convinced that the strict observation observance by States of the obligation not to intervence in the affairs of any other State is an essential condition to ensure that nation live together in peace with one another, since the practice of any form the intervention not only violates the spirit and the letter of the charter, but also leads to the creation of situations which threaten international peace and the security. 

 

Os tipos de intervenção classificam-se em: Diplomática, armada, individual e oculta. A primeira ocorre quando apoiada ostensivamente por forças armadas; a segunda quando ocorre quando parte da inciativa de um só Estado e a terceira quando levada à feito por várias potências, embora, às vezes estas se ponham de acordo para delegar poderes a uma só, como agente de execução(7). 

Exceções ao princípio da não intervenção

1) Intervenção estabelecida em nome do Direito de defesa e do estado, sempre que um estado, se sinta com razão, ameaçado por um Estado inimigo, sua interveção não será considerada ingerência indevida no Estado agressor(8). 

2) A fim de salvaguardar a segurança coletiva, visa a proteger a civilização, combatendo determinados estados cuja conduta extrapola a sua esfera de competência internacional, sendo contrária à ordem pública(9). O caso atual mais emblemático, é o combate ao terrorismo na síria pelos EUA e os demais países, o qual ainda perdura. 

3) Proteção e promoção dos Direitos Humanos os quais são protegido por tratados internacionais de caráter regional ou global. 

Salutar a transcrição da carta da ONU que dispõe sobre o tema, resguardando a proteção que os estados têm de seus assuntos, a fim de que as Nações Unidas não intervenham em suas próprias questões(10), assim proclama o artigo 2 § 7 da carta: 

''Nenhum dispositivo da presente Carta autorizará as Nações Unidas a intervirem em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição de qualquer Estado ou obrigará os Membros a submeterem tais assuntos a uma solução, nos termos da presente Carta''

Portanto, quis-se diante dum plano primo, trabalhar o arcabouço jurídico normativo que envolve o tema da não ingerência, e assim, demonstrar que, como em nenhum estado que vigora sobre a égide da democracia, não há que se falar em Direitos ou princípios absolutos, embora erroneamente hajam cátedras que preguem o contrário. 

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1 - BETTATI, Mario. O Direito De Ingerência - mutação da ordem internacional. pg. 20.

2 - VARELLA, Marcelo. Direito Internacional Público. pg. 37-38.

3 - MAZZUOLI, Valério De Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. pg 573.

4 - Disponível em: https://abrildenovomagazine.wordpress.com/2016/03/16/america-latina-os-eua-intensificam-a-sua-sistematica-ingerencia/.

5 - Disponível em: http://brasil.elpais.com/brasil/2014/09/23/internacional/1411439901_479666.html

6 - Resolution 2625 (XXV) Assembleia Geral da ONU.

7  - Sobre a intervenção para a salvaguarda dos direitos humanos Parte VI, Capítulo I, Seção III, item n. 3

8 - RUSSOMANO MEYER, Gilda Maciel Correa. Direito Internacional Público, pg. 362.

9 - ITUASSÚ, Oyama Cesar. Curso de Direito Internacional Público pg. 232.

10 - BETTATI, Mario. O Direito De Ingerência - mutação da ordem internacional. pg. 20.

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