Impostos sobre a propriedade urbana e rural.

Uma análise frente ao critério espacial da regra-matriz de incidência

Leia nesta página:

O presente trabalho apresenta a construção teórica que dá a base da regra-matriz de incidência proposta por Paulo de Barros Carvalho.

1 INTRODUÇÃO

Segundo o Código Tributário Nacional, em seu artigo terceiro, “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. Levando em consideração os elementos objetivos previstos, podemos descartar diversas prestações repassadas ao Estado, como a multa, prestação pecuniária, compulsória, e outras. Todos os fatos geradores de tributos possuem natureza lícita. Tributos são, segundo o artigo 5º, CTN, impostos, taxas e contribuições de melhoria. No presente trabalho, serão trabalhadas duas espécies de tributo: o IPTU, Imposto Predial e Territorial Urbano, e ITR, Imposto sobre Propriedade Territorial Rural.

Paulo de Barros Carvalho, grande jurista brasileiro, em sua obra intitulada Curso de Direito Tributário, apresenta a regra-matriz de incidência tributária, onde esmiúça uma teoria baseada em critérios que estão presentes nas espécies de tributos, como o critério material, temporal e espacial, a título de exemplo. Sua teoria leva em consideração o construtivismo lógico-semântico, como apresentado por Aurora Tomazini de Carvalho, em Curso de Teoria Geral do Direito: o construtivismo lógico-semântico, na compreensão da estrutura desses tributos, por exemplo. A intenção do autor é fazer uma relação entre os conceitos, a partir da desconstrução e reconstrução, para que haja uma forte ligação entre eles. Por exemplo, analisando os critérios material, temporal e espacial do IPTU, há um liame entre eles, que, juntos, caracterizam esse imposto específico.

No Brasil, onde há uma extensa área territorial, podemos decompô-la em área urbana e rural. E os impostos anteriormente apresentados vão incidir sobre uma área específica. A área massiva do território brasileiro e a presença de enormes áreas rurais em contraste com as igualmente extensivas áreas urbanas, é bastante relevante ser realizada uma melhor distinção sobre os critérios utilizados para classificá-las, uma vez que, assim como outras formas de tributo, o imposto sobre a propriedade tem medidas diferentes de abordagem, como, por exemplo, analisando quando e onde será cabível haver essa cobrança de tributo, quando será passível de isenção e etc.

O conhecimento sobre essa abordagem nos permite conhecer, de forma profunda, sobre essa tributação que afeta a todos que possuem propriedades, seja no meio urbano ou rural. Aliado a isto também podemos destacar uma maior influência, por meio de análise e interpretação, da obra de Paulo de Barros e sua tese sobre a regra-matriz de incidência ao utilizá-la de forma expandir o conhecimento acadêmico a respeito da matéria.

2 ASPECTOS TEÓRICOS DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA

           

     Dentre as diversas teorias que podem ser encontradas no Direito Tributário a regra-matriz de incidência tributária, apresentada pela doutrinador Paulo de Barros Carvalho, é sem dúvidas uma das que merecem atenção e um estudo mais detalhado uma vez que, através da sua compreensão, é possível entender por meio de um esquema o funcionamento da norma jurídica. Comentando especificamente da norma tributária em sentido estrito Paulo de Barros afirma que ela é quem:

define a incidência fiscal. Sua construção é obra do cientista do Direito e se apresenta, de final, com a compostura própria dos juízos hipotético-condicionais. Haverá uma hipótese, suposto ou antecedente, a que se conjuga um mandamento, uma consequência ou estatuição. (2012, p. 524)

           

Nessa afirmação do autor é possível extrair um aspecto da relação entre a norma tributária e sua teoria a respeito da regra-matriz de incidência tributária: a relação estabelecida entre a hipótese e a consequência. Para Paulo de Barros a hipótese virá correlacionada a um fato, fazendo uma alusão a este, enquanto que a consequência irá prescrever os fatos jurídicos que aquele acontecimento irá ensejar. No esquema apresentado em sua obra é possível perceber que a norma juridica tributária irá ramificar-se entre hipótese e consequência, ou ainda como é classificada, como descritor e prescritor, referindo-se a cada uma respectivamente. (CARVALHO, 2012). As relações de cada um desses ramos da norma jurídica tributária serão trabalhadas mais a frente ao longo deste tópico.

Entrando especificamente no tema da regra-matriz de incidência, os ensinamentos de Aurora Tomazini de Carvalho, que tem por base a obra de Paulo de Barros, é bastante esclarecedora. Comenta a autora que:

chamamos de “regra-matriz de incidência” as normas padrões de incidência, aquelas produzidas para serem aplicadas em casos concretos, que se inscrevem entre as regras gerais e abstratas, podendo ser de ordem tributária, previdência social, penal, administrativa, constitucional, civil, trabalhista, comercial, etc., dependendo das situações objetivas para quais seu vetor semântico aponta. (2009, p. 284)

           

Basicamente, o que pode ser compreendido do conceito apresentado pela autora, remete às demais teorias que tratam a respeito da construção das normas jurídicas e um dos seus aspectos principais: elas precisam ser construídas de forma abstrata, ou seja precisam ser generalizações, e assim englobar um número de situações hipotéticas que podem vir a ocorrer, na forma de um fato concreto. Este conceito é particularmente importante pois, dentro da construção da regra-matriz de incidência, a hipótese (descritor) possui três critérios que são eles: o material, temporal e espacial. Cada um destes poderá ser melhor identificado (de forma mais evidente) considerando-se o vetor semântico com o qual a norma fora planejada.

Se consideramos que toda classe delineada pela hipótese normativa aponta para um acontecimento, que se caracteriza por ser um ponto no espaço e no tempo. Logo, como conceito identificativo, ela deve, necessariamente, fazer referência a: (i) propriedades da ação nuclear deste acontecimento; (ii) do local; e (iii) do momento em que ele ocorre; caso contrário, é impossível identificá-lo precisamente. (CARVALHO, 2009, p. 285)

Estes três pontos apontados por Aurora Tomazini de Carvalho (2009) dizem respeito aos três critérios da hipótese dentro da regra-matriz de incidência dentro do conceito de Paulo de Barros. De uma forma geral é preciso notar que a norma jurídica tributária precisa fazer a referência a matéria para a qual se destina, o local onde ela irá incidir e em qual tempo ela ocorrerá.

2.1 Critério material

Sobre o critério material, o primeiro critério abordado por Paulo de Barros em sua obra, é preciso pontuar, que como o autor afirma há certa dificuldade em sua análise pois, para que a mesma seja feita em caráter satisfatório é preciso realiza-la de forma particular, não realizando vínculos com os demais critérios (espacial e temporal) que acabam tornando-se um contexto que dificulta este isolamento. (2012, p. 569)

Essa menção é importante pois, como destaca o autor, a falha em conseguir realizar esta separação de critérios ocasionalmente leva a uma interpretação errônea e por consequência uma classificação errada quanto ao critério material da regra-matriz de incidência. (CARVALHO, 2012, p. 569)

De toda forma, o critério material, como pontua Aurora Tomazini, pode ser visto como “a expressão, ou enunciado, da hipótese que delimita o núcleo do acontecimento a ser promovido à categoria de fato jurídico”. (2009, p. 289)

Assim, pode-se compreender que ao considerar o critério material é preciso levar em consideração o ato do agente que eventualmente promoverá a subsunção do fato a norma jurídica tributária. Logo, para fins de análise do critério material é preciso sempre levar em consideração a existência de um verbo, seguido de um complemento que, uma vez associados a ideia de um quesito temporal e também espacial irão, eventualmente, criar a descrição normativa de um fato, de forma completa. (CARVALHO, 2012, p. 569)

2.2 Critério temporal

O segundo critério trabalhado dentro da formulação teórica de Paulo de Barros sobre a hipótese na regra-matriz de incidência é o critério temporal. No Direito Tributário se faz necessário estabelecer, de forma precisa, quando efetivamente o elo que liga o contribuinte e o Estado é de fato iniciado – momento este analisado e mencionado aqui do ponto de vista do início das obrigações e/ou deveres das partes em caráter especifico com relação a norma trabalhada e não no conceito geral de obrigação de cumprimento das normas estatais que o cidadão tem o dever, de uma perspectiva mais geral. O próprio autor faz uma menção a esta fato que ajuda a elucidar um pouco mais sobre a matéria em questão quando afirma que o critério temporal trata-se de um “grupo de indicações, contidas no suposto da regra, e que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra devedor e credor, em função de um objeto”. (2012, p. 583).

Além dos já mencionados critérios material e temporal há ainda o terceiro critério, o espacial, que será abordado de forma mais aprofundada no tópico final deste trabalho.

2.3  Critério espacial

Além dos critériso mencionados anteriormente, Paulo de Barros Carvalho complementa a regra-matriz de incidência tributária com o critério espacial, oferecendo as três hipóteses que o conduzem:

Acreditamos que os elementos indicadores da condição de espaço, nos supostos das normas tributárias, hão de guardar uma dessas três formas compositivas, diretriz que nos conduz a classificar o gênero tributo na conformidade do grau de elaboração do critério espacial da respectiva hipótese tributária:

a) hipótese cujo critério espacial faz menção a determinado local para a ocorrência do fato típico; (CARVALHO, 2012, p. 578)

 A primeira possibilidade é quando há menção expressa do local onde ocorrerá o fato gerador. Nesse caso, não há dúvidas quanto à possibilidade de incidência do tributo, visto que ao especificar o lugar em que o fato gerador ocorre, pressupõe-se que ele existe e, portanto, havendo a presença dos outros critérios, o indivíduo está apto a pagar este tributo.

b) hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver geograficamente contido; (CARVALHO, 2012, p. 578)

O segundo ponto apresentado por Paulo de Barros Carvalho (2012) é bem próximo ao primeiro, visto que também se trata de fazer referência a uma área específica.

c) hipótese de critério espacial bem genérico, onde todo e qualquer fato, que suceda sob o manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos peculiares. (CARVALHO, 2012, p. 578)

 Esta última hipótese se trata de uma menção genérica, ou até mesmo não menção a uma área específica, caso em que esse critério ainda existirá, porém, será subsidiário a área de vigência territorial da lei que criou o tributo.

Mais características sobre esse critério serão abordadas posteriormente ao relacionar os impostos ITR e IPTU e a regra-matriz de incidência, em relação ao critério espacial.

3 IMPOSTOS SOBRE PROPRIEDADE URBANA E RURAL

A origem da palavra tributo tem por base tanto as palavras em latim tribuere (tributar) que seria dividir por tribos, distribuir, quanto a palavra tributum que seria o tributo propriamente dito, nada mais do que é a demonstração da ação estatal, apontando um ônus distribuído entre os membros daquela sociedade (AMARO, 2010, p. 36).

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Tendo como base o disponível no texto do Código Tributário Nacional (Lei Nº 5.172/66), especificamente em seu artigo terceiro, sua “sede legal” como destaca Ricardo Alexandre em sua obra (2013, p. 8), podemos conceituar tributos como “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”

Os impostos são espécies de tributos que não estão vinculados a atuação do Estado, pois esse não atua positivamente na configuração do seu fato gerador – fato realizado pelo contribuinte – e a não vinculação à uma destinação específica.

Previstos no artigo 16, do Código Tributário Nacional, “imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte”. No presente trabalho será detalhado conceitos e características de duas espécies de impostos: Imposto sobre Propriedade Territorial Rural e o Imposto Predial e Territorial Urbano.

3.1 IPTU

Descrito na seção II do CTN a partir do Artigo 32, está o Imposto Predial e Territorial Urbano. O dispositivo dispõe que o mesmo é “imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município”.

A tributação referente a esse imposto ocorre em relação aos imóveis situados na zona urbana municipal. Para o CTN, “zona urbana é aquela definida por lei municipal, observado o requisito mínimo da existência de dois melhoramentos públicos referidos no § 1º, do artigo 32 do CTN” (HARADA, 2006, p. 443).

O IPTU pode ser progressivo, fiscal ou extrafiscal. A fiscal está prevista no art. 145 da Constituição Federal, e afirma que o imposto será majorado de acordo com a capacidade financeira do contribuinte. O STF, contudo, durante muito tempo, discutiu a admissão dessa progressão, visto que se trataria de um imposto de natureza real e, portanto, não caberia essa interpretação. Entretanto, já não é mais possível classificar os tributos quanto a serem pessoais ou reais, o que se deve levar em consideração é o seu fato gerador. A progressão extrafiscal, por outro lado, fundamenta-se no poder de polícia, previsto no artigo 78 do CTN.

3.2 ITR

Já o Imposto sobre Propriedade Territorial Rural, ITR, está disposto no art. 29 do CTN que afirma que “o imposto, de competência da União, sobre a propriedade territorial rural tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localização fora da zona urbana do Município”.

Segundo Kiyoshi Harada (2006, p. 413) “propriedade rural é aquela zona situada na zona rural que, por exclusão, é aquela sita fora da zona urbana do Município, cujo conceito acha-se estabelecido no § 1º do artigo 32 do CTN”. Há discussões ainda sobre a sua inconstitucionalidade, visto que, por se tratar de direito imobiliário não seria possível tributar a posse. Quem não acolhe esse entendimento justifica que a propriedade expressa no artigo não deve ser entendida de forma literal.

Além disso, o ITR tem tido um papel importante na reforma agrária, graças ao deslocamento da competência dos Municípios para a União, pois a extrafiscalidade deixou de ser facultativa, passando a ser obrigatória, garantindo, então a sua função social.

4 A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA E SEU CRITÉRIO ESPACIAL VINCULADO A COBRANÇA DE IPTU E ITR

Uma vez conceituados o IPTU e ITR, é preciso então estabelecer a conexão destes impostos com a regra-matriz de incidência. Como fica claro, pelas classificações destes impostos e levando se em consideração que suas previsões no texto legal fazem referência a localidade onde a propriedade objeto da tributação encontra-se, o critério apropriado para sua análise é sem dúvidas o critério espacial. A teoria de Paulo de Barros leva em consideração o construtivismo lógico-semântico. A intenção do autor é fazer uma relação entre os conceitos, a partir da desconstrução e reconstrução, para que haja uma forte ligação entre eles.

Entrando particularmente no que tange ao critério espacial da regra-matriz de incidência o próprio Paulo de Barros comenta sobre o assunto:

Há regras jurídicas que trazem expressos os locais em que o fato deve ocorrer, a fim de que irradie os efeitos que lhe são característicos. Outras, porém, nada mencionam, carregando implícitos os indícios que nos permitem saber onde nasceu o laço obrigacional. É urna opção do legislador. Aquilo que de real encontramos, no plano do direito positivo brasileiro, é urna dose maior ou menor de esmero na composiçao dos critérios espaciais, de tal modo que alguns são elaborados com mais

cuidado que outros. Todavia, ainda que aparentemente pensemos ter o político se esquecido de mencioná-Io, haverá sempre um plexo de indicações, mesmo tácitas e latentes, para assinalar o lugar preciso em que aconteceu aquela ação, tomada como núcleo do suposto normativo. (2012, p. 575)

O que o autor menciona é que, os critérios da regra-matriz de incidência estão presentes na constituição de todos os tributos. Em alguns, como no IPTU e no ITR, esse critério é o determinante para a sua aplicação, enquanto em outros, pode não ter tanta importância a sua delimitação, podendo ainda fazer com que o legislador pareça ter esquecido de delimitá-lo, caso em que haverão indicativos que motivem o lugar de incidência de tal tributo.

É impossível não traçar ainda um paralelo com a vigência espacial da legislação tributária e a regra-matriz de incidência em seu aspecto espacial pela determinação que ambas utilizam-se para tratar a respeito dos impostos e taxas devidas ao Estado. Sobre esta, comenta Ricardo Alexandre que:

O estudo da vigência espacial da legislação tributária tem por objetivo revelar qual o âmbito territorial em que cada norma integrante da legislação tributária vigora, sendo de observância obrigatória.

A regra fundamental aqui é a da territorialidade. Tal regra é bastante simples de se entender. Cada ente federado possui um território claramente demarcado. As normas expedidas por um ente só têm vigência dentro do seu respectivo território, não sendo aplicáveis aos fatos ocorridos nos territórios dos demais entes. (2013, p. 219)

Uma ressalva porém com relação a esta afirmação: como bem pontua Aurora Tomazini (2009, p. 294-296) muitas das vezes acontece que, o critério espacial abordado na norma jurídica tributária coincide e interliga-se com a vigência espacial da legislação, entretanto é preciso destacar que embora pela repetição de casos isso possa acabar passando como regra, de forma alguma o é: é perfeitamente possível que a vigência espacial da norma tributária acabe por divergir do critério espacial utilizado na mesma, embora, como afirmado anteriormente isto acaba não ocorrendo tanto pela forma como se dá as competências legislativas quando se trata da criação de leis, onde os municípios criam suas leis, os estados também o fazem e o liame da norma, seu direcionamento quanto ao quesito espacial acaba guiando-se por estas mesmas “fronteiras”.

Os modelos trazidos à colação propõem uma inferência que vemos iluminada com forte claridade metodológica: o cri­tério espacial das normas tributárias não se confunde com o campo de vigência da lei. As coincidências, até certo ponto frequentes, devem ser creditadas à opção do legislador, entre os esquemas técnicos de que dispõe, sempre que pretenda apanhar, com a percussão tributária, uma quantidade inominável de eventos. Daí ser, entre as fórmulas conhecidas, a menos elaborada e, por decorrência, a mais elástica (CARVALHO, 2012, p. 579)

Retomando o pensamento anterior, como a proposta da análise gira em torno construção/reconstrução dos conceitos um primeiro ponto de destaque é o isolamento do critério espacial, tal qual fora feito para analisar o critério material anteriormente. Brevemente “ignora-se” os demais critérios com a finalidade de observar a manifestação do critério espacial em sua totalidade o que, no caso do IPTU e ITR pode ser facilmente visualizado: como visto, o critério espacial faz referência ao local onde aquele fato jurídico deverá ocorrer e isso fica claro na diferenciação de tributação com base na localidade daquela propriedade em questão.

Estruturalmente falando, uma propriedade em área urbana e outra em rural podem ser fisicamente iguais, entretanto, o contexto onde estas estão inseridas, irá ensejar uma tributação de forma diferenciada para cada uma destas propriedades, evidenciando de forma clara o critério espacial no que tange a regra-matriz de incidência.

Ainda dentro da concepção estabelecida por Paulo de Barros, podemos ainda extrair três hipóteses, anteriormente apresentadas no tópico 2.3, a respeito do critério espacial que são elas:

a) hipótese cujo critério espacial faz mençao a determinado local para a ocorrencia do fato típico;

b) hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver geograficamente contido;

c) hipótese de critério espacial bem genérico, onde todo e qualquer fato, que suceda sob o manto da vigencia territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos peculiares. (2012, p. 578)

Para efeito de análise aqui, podemos compreender que ambos, IPTU e ITR acabam por enquadrar-se na terceira hipótese dentro do critério espacial. Ora, como bem descreve a legislação, a caracterização da tributação do imposto sobre a propriedade está diretamente relacionada ao local onde encontra-se o imóvel como visto anteriormente no segundo tópico deste trabalho. Por ser tributação de competência dos Municípios, no caso do IPTU quanto o ITR, que é de competência da União, ficam vinculados, no que diz respeito ao critério espacial, a previsão do texto legal que apenas faz a menção que os imóveis serão taxados de acordo com sua localização (dentro ou fora do município / dentro ou fora da área urbana) de forma completamente geral, de acordo com o previsto no item c.

Entrando no aspecto principal, podemos estabelecer algumas peculiaridades a respeito do IPTU e do ITR quando analisados sob a perspectiva do critério espacial da regra-matriz de incidência, uma delas diz respeito ao IPTU:

A análise da regra-matriz de incidencia do IPTU mostra o desencontro, com precisão geométrica. O tributo grava, privativamente,os imóveis localizados dentro do perímetro urbano do Município. Inobstante isso, a lei municipal efunde sua eficácia por toda à extensão do território correspondente, atingindo as zonas rurais, excluídas do impacto tributário (CARVALHO, p. 581)

                             

Aqui é possível observar um dos casos onde, o critério espacial acaba por não coincidir com limitações da vigência espacial, como mencionado anteriormente, daí a importância da ressalva feita anteriormente.

Tratando-se especificamente do ITR, “o aspecto espacial da hipótese de incidência do ITR é o território nacional, pois se trata de imposto da competência da União, e não há norma alguma em sentido contrário” (PAULSEN, 2012, p. 402).

Estes dois pontos apresentados são importantes pois, no que diz respeito a discussão sobre o IPTU e o ITR há uma importante discussão a respeito da definição de zona urbana e a repercussão desta com a vontade do legislador e efetiva vigência da norma, no seu quesito territorial. A questão aqui é que há divergência entre o que diz o CTN e outras legislações, como no caso da Lei Nº 8.629/93. Esta lei afirma, em seu art. 4º que:

Para os efeitos desta lei, conceituam-se:

I- Imóvel Rural - o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agro-industrial;

Aqui há clara divergência com o conceito de zona urbana/zona rural estabelecido pelo CTN, uma vez que a Lei Nº 8.629/93 leva em consideração, não apenas a localização do imóvel, mas sim a função social da propriedade como forma de classificação. Com base nessa classificação a propriedade localizada dentro dos limites estabelecidos como urbano, mas que tivesse como função social, a prática de atividades agrícolas seria considerada como zona rural e dessa forma, passível de cobrança de ITR e não IPTU.

Diante desta divergência e aparente conflito entre normas, cabe apontar a menção disposta no Art. 182 da Constituição Federal de 1988 que ao tratar da política urbana dispõe que: “A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.”

Assim pode-se compreender que a competência para dispor do desenvolvimento urbano, e por consequência seus objetos inerentes como a propriedade, é do Município. Logo, uma vez que o Código Tributário Nacional faz menção ao Município como órgão competente para dispor sobre a matéria, no caso do IPTU ou União, no caso do ITR, fica claro que uma disposição em contrário ao previsto neste código – que trata da matéria tributária de forma especifica – irá ensejar a quebra da autonomia dos municípios, uma vez, se respeitada a previsão da Lei Nº 8.629/93 a classificação proposta por Municípios no que diz respeito principalmente as propriedades dentro da zona urbana iriam ser desfeitas, caso a função social destas fosse de caráter agrícola.

5 CONCLUSÃO

Conforme o apresentado, as ramificações do regra-matriz de incidência tributária são bastante extensivas e verifica-se que há muito espaço ainda a ser trabalhado com relação ao seu estudo. No que tange a matéria referente aos impostos sobre a propriedade, a rica legislação que dispõe sobre o assunto pode chegar ao ponto de ser confusa em certos pontos, uma vez que ao utilizar-se de vários conceitos bem como previsões legais diferentes acaba por criar divergências aparentes com relação a norma jurídica tributária.

     Porém, através da análise mais detalhada, e fazendo uso dos conceitos e interpretações, no processo de construção e desconstrução da norma jurídica como vislumbrado por Paulo de Barros Carvalho em sua obra, é possível olhar sob uma perspectiva diferente e assim extrair um “conteúdo extra” a partir desta.

Assim, pode-se notar que, através da aplicação dos preceitos da regra-matriz de incidência, em conjunto com as disposições do Código Tributário Nacional, em conjunto a Constituição Federal e demais textos legais, é possível trabalhar e compreender o funcionamento da norma jurídica tributária, com base na relação previamente trabalhada de hipótese e consequência, de forma não apenas a trabalhar a norma já pronta, mas utilizar-se de tal conhecimento para compreender o sistema tributário como um todo a partir destes conceitos básicos e importantes.

Com base no critério espacial, por exemplo, objeto do presente trabalho, tivemos a oportunidade de perceber a importância de tais teorias – o construtivismo lógico semântico e a regra-matriz de incidência tributária – na demarcação de incidência dos impostos ITR e IPTU, na distinção de áreas de incidência de cada um; em que a competência para a cobrança do tributo, valores a serem devidos, delimitações territoriais e legitimidade do indivíduo contribuinte serão determinadas por essa distinção – que é obtida graças ao critério espacial.

REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 7ª Edição. Editora Método. São Paulo. 2013

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16ª Edição. São Paulo. Editora Saraiva. 2010.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988.

_______. Lei Nº 5.172, de 25 de Outubro de 1966.

_______. Lei Nº 8.629/93, de 25 de Fevereiro de 1993.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 24 Edição. São Paulo. Editora Saraiva. 2012.

CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico semântico. São Paulo: Noeses, 2009.

HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 15ª edição. São Paulo. Editora Atlas. 2006.

PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário. 4ª Edição. Ed. Livraria do Advogado. Porto Alegre. 2012

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4ª Edição. São Paulo. Editora Saraiva. 2012.

CHIMENTI, Ricardo Cunha; PIERRI, Andréa de Toledo. Teoria e Prática do Direito Tributário. 3ª Edição. São Paulo. Editora Saraiva. 2012

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Sobre os autores
Matthews Barbosa Martins

Graduando em Direito, pela Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

Yarah Marla Saraiva Rolim

Graduanda em Direito, pela Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

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