O controle de constitucionalidade pelo juiz de primeiro grau no Direito Brasileiro

23/06/2016 às 09:27

Resumo:


  • O controle de constitucionalidade no sistema brasileiro é obrigatório para todos os juízes, que devem verificar a compatibilidade das leis com a Constituição.

  • Os juízes de primeiro grau podem realizar o controle de constitucionalidade de forma incidental, limitando sua decisão ao caso concreto.

  • Além disso, o juiz pode declarar a inconstitucionalidade de leis por omissão legislativa quando houver ofensa aos princípios fundamentais da Constituição.

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Qualquer juiz, no sistema brasileiro, tem a obrigação de controlar a constitucionalidade da lei. Diante disso, torna-se importante verificar os parâmetros e controles da constitucionalidade da norma jurídica.

  • Resumo

  • Qualquer juiz, no sistema brasileiro, tem a obrigação de controlar a constitucionalidade da lei. Diante disso, torna-se importante verificar os parâmetros e controles da constitucionalidade da norma jurídica. Com base nisso, é justamente sobre este estudo que o artigo visa tratar, abordando as circunstâncias deste controle.

  • Palavras – Chaves: Juiz – Controle – Constitucionalidade.

  • Abstract

  • Any judge in the Brazilian system is required to control the constitutionality of the law . Therefore , it is important to check the parameters and controls the constitutionality of the rule of law . Based on this, it is precisely on this study that the article seeks to address , addressing the circumstances of this control. Key - words : Judge - Control - Constitutionality .

  • Sumário

  • Introdução. 1 O juiz de primeiro grau e o controle de constitucionalidade. 2.Limites do controle de constitucionalidade 3 O juiz na omissão legislativa pode realizar controle de constitucionalidade? Conclusão. Referências.

  • Introdução

  • Controlar a constitucionalidade significa a verificação da compatibilidade/adequação da lei com o bloco de constitucionalidade, confirmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como as normas e os princípios expressos e implícitos constitucionais.

  • Muito embora o STF seja o guardião da Constituição, é certo a admissibilidade pelo nosso sistema constitucional do controle difuso, permitindo que o juiz de primeiro grau possa analisar e verificar, incidentalmente, a compatibilidade de uma legislação infraconstitucional com as normas constitucionais.

  • Qualquer juiz, no sistema brasileiro, tem a obrigação de controlar a constitucionalidade da lei. Para isso, é importante estabelecer os parâmetros. Isso porque o controle no Brasil pode surgir em qualquer forma de busca de uma solução de conflitos de interesses.

  • 1 O juiz de primeiro grau e o controle de constitucionalidade

  • Do Estado Liberal até o Estado Constitucional, verifica-se a evolução da atividade jurisdicional e da figura do juiz, bem como da forma de interpretar a norma jurídica. Passou-se de uma legalidade formalista para uma legalidade substancial (material), com a constitucionalização do ordenamento jurídico.

  • No Brasil, temos as técnicas de controle de constitucionalidade formal direta e indireta, difuso e concentrada (ADI e ADC), ação de descumprimento de preceito fundamental, ADI por omissão e interventiva, e, ainda, pelas técnicas conforme a Constituição e a declaração parcial de nulidade sem redução de texto. Há ainda a possibilidade do Mandado de Injunção.

  • Neste sentido, dispõe o art. 102 e 103 da CF de 1988, in verbis: “ Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal (…) III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. § 1.º A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. § 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal (…) Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V o Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional

  • Diante disso, a atividade do juiz no Estado Constitucional teve sua adaptação às necessidades sociais, falando-se hoje, principalmente, no ativismo judicial. E, ainda, o constitucionalismo contemporâneo depende do controle de constitucionalidade da lei.

  • O juiz, visto com desconfiança, logo após a Revolução Francesa, e que passou a ser “controlado” pelo império da lei e pelos ditames da Escola Exegética, começou, paulatinamente, com a migração do Estado Liberal para o Estado Constitucional a ter um papel mais ativo no sistema jurídico, inclusive, com o controle das normas legais frente à “Lei Maior”.

  • Neste sentido, destacou Marinono (2016; p. 67): “O juiz não é mais a boca da lei, como queria Montesquieu, mas o projetor de um direito que toma consideração a lei à luz da Constituição e, assim, faz os devidos ajustes para suprir as suas imperfeições ou encontrar uma interpretação adequada, podendo chegar a considerá-la inconstitucional no caso em que a sua aplicação não é possível diante dos princípios da justiça e dos direitos fundamentais”.

  • Com base nisso, o juiz pode analisar a constitucionalidade da lei limitada a sua decisão ao caso concreto. Isso significa que não existe a nulidade da lei com efeitos gerais, mas apenas limitado para aquele processo em específico, como regra. Daí porque se diz que o controle é incidental quando tratada por um juiz de primeiro grau. Na verdade, somente será apreciada no STF, mediante a subida de recursos daquela decisão, quando se tratar de recurso extraordinário e desde que se preecha o requisito da repercussão geral.

  • Perceba-se que a ideia de recurso extraordinário vem sofrendo redefinição no cenário jurídico brasileiro com objetivo de converir maior compatibilidade das decisões judiciais, afastando interpretações divergentes e insegurança jurídica.

  • Isso significa que, muito embora, o juiz de primeiro grau, considere a norma inconstitucional, fa-lo naquele feito, maas sem qualquer repercussão em processos apreciados e julgados por outros juízos de primeira instância. Ressalte-se que também já ficou pacificado no STF a possibilidade deste controle incidental também no bojo de uma ação civil pública, do qual se destaca julgado recente (2015): EMENTA Direito Processual Civil e Constitucional. Ação civil pública. Legitimidade da Defensoria Pública para ajuizar ação civil pública em defesa de interesses difusos. Interpretação do art. 134 da Constituição Federal. Discussão acerca da constitucionalidade do art. 5º, inciso II, da Lei nº 7.347/1985, com a redação dada pela Lei nº 11.448/07, e do art. 4º, incisos VII e VIII, da Lei Complementar nº 80/1994, com as modificações instituídas pela Lei Complementar nº 132/09. Repercussão geral reconhecida. Mantida a decisão objurgada, visto que comprovados os requisitos exigidos para a caracterização da legitimidade ativa. Negado provimento ao recurso extraordinário. Assentada a tese de que a Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de ação civil pública que vise a promover a tutela judicial de direitos difusos e coletivos de que sejam titulares, em tese, pessoas necessitadas. (RE 733433 / MG - MINAS GERAIS RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. DIAS TOFFOLIJulgamento: 04/11/2015Órgão Julgador: Tribunal Pleno)

  • Observe-se que houve o cuidado de afirmar acima que o controle do juiz de primeiro seria incidental e apenas em relação ao caso concreto. Isso porque já existe precedente no STF sobre a possibilidade de efeito vinculante em relação aos fundamentos determinantes quando a decisão for tomada em recurso extraordinário no Plenário da Corte.

  • Isso porque o Supremo Tribunal Federal, dispensou a aplicabilidade do art. 97 da Constituição Federal de 1988 (Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público).

  • 2 Limites do controle de constitucionalidade

  • Os limites do controle de constitucionalidade para o juiz de primeiro grau, primeiramente, refere-se à sua competência absoluta para a apreciação de determinada lide, bem como no que se refere às decisões já decididas pelo Supremo Tribunal Federal de efeito vinculante, inclusive, as súmulas vinculantes, pois elas vinculam todos os órgãos do Poder Judiciário, sob pena de reclamação junto ao STF. Desta feita, quando a decisão do STF for de caráter vinculante, não pode o juiz de primeiro grau decidir de forma diversa. É um dos seus mais atuais limites. Não pode, por exemplo, declarar constitucional algo dito pelo STF como inconstitucional e vice-versa.

  • Alguns questionam que isso barraria ou seria um entrave ao poder criativo dos magistrados de 1o grau, ferindo o que se denomina de independência funcional e formação do seu convencimento. Porém, a questão não passa por este prisma. Não se trata de retrocesso, mas sim de uniformização das decisões dentro do país, para fins de garantir melhor segurança jurídica a todos. Isso porque, realmente, cabe ao STF a última palavra sobre as discussões mais importantes do país, até porque tem-se a necessidade de uma decisão superior para nortear o sistema e que porque o sistema jurídico brasileiro adota o sistema recursal.

  • Sendo assim, o efeito vinculante das decisões do STF limitam o controle de constitucionalidade incidental. Sobre o tema, ressalta-se a posição de Marinoni (2016; p. 71): “Esclareça-se que a eficácia vinculante das decisões proferidas em recurso extraordinário dá força obrigatória aos motivos determinantes ou à ratio decidendi da decisão, viabilizando o alcance da estabilidade imprescindível à racionalidade de qualquer sistema que dá aos seus juízes o poder de realizar o controle de constiticionalidade diante dos casos concretos. Não há como atribuir esse poder aos juízes sem vinculá-los às decisões da Suprema Corte. O controle difuso exige que os precedentes da Corte que dá a última palavra acerca da questão constitucional que sejam obrigatórios”

  • 3 O juiz na omissão legislativa pode realizar controle de constitucionalidade?

  • Registre-se que o juiz pode declarar de ofício a inconstitucionalidade no bojo dos autos. Isso está sedimentado em jurisprudência nacional sobre o tema, atestando a inexistência de vícios no procedimento do juiz. Até porque se pode considerar que este comportamento é para resguardar a ordem pública ou que seja mesmo matéria de ordem pública, sendo, portanto, o “passaporte” para o juiz poder aplicar de ofício a declaração de inconstitucionalidade.

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  • E no caso de omissão legislativa? Quando existir ofensa aos princípios da República Federativa do Brasil e, ainda, os direitos e garantias fundamentais dos indivíduos será possível ao juiz, incidentalmente, declarar a constitucionalidade por omissão, isso porque a ausência legislativa não pode ser considerada mera liberalidade do Poder Legislativo à medida que o juiz deve apreciar qualquer situação de ofensa à Constituição no que se refere aos direitos e garantias fundamentais, pois se assim não fosse, não se poderia considerar a força aberta e normativa da Constituição Federal de 1988.

  • Sabe-se que o STF considera a força normativa constitucional, ocasião em que as omissões legislativas são inconstitucionais. Tal permissivo ainda se encontra na própria Constituição quando se admite a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão.

  • A inconstitucionalidade por omissão, neste caso, ocorre no caso concreto. Assim, o juiz não pode “ficar de braços cruzados” verificando uma situação clara de ofensa aos direitos e garantias fundamentais do indivíduo, pois considerar desta forma seria um inegável retrocesso.

  • Obviamente, isso tem limite, ou seja, esta omissão deve ser ocasionada quando existe comando constitucional expresso para legislar e tal não é feito, ocasião em que, numa visão concretista e de efetividade, para garantir o patamar civilizatório mínimo, o juiz pode declarar, nesta hipótese, a inconstitucionalidade por omissão.

  • Neste sentido, Marinoni (2016; p. 73): “Ora, se o juiz deve controlar a atividade legislativa, analisando a sua adequação à Constituição, é pouco mais do que evidente que a sua tarefa não deve ser ater apenas à lei que viola um direito fundamental, mas também à ausência de lei que não permite a efetivação de um direito deste porte. As omissões que invalidam direitos fundamentais evidentemente não podem ser vistas como simples opções do legislador, pois ou a Constituição tem força normativa ou força para impedir que o legislador desrespeite os direitos fundamentais, e, assim confere ao juiz o poder de controlar a lei e as omissões do legislador, ou constituirá apenas proclamação retórica e demagógica”.

  • Com base nisso, não é qualquer omissão que gera o poder do juiz de declaração de inconstitucionalidade por omissão, mas sim quando for o caso de ausência de proteção que era tarefa do legislador e isso ofende a afetivação de um direito fundamental. E, mesmo assim, o juiz deve estar ciente que a sua atividade e controle deve ser apenas para garantir o direito, não podendo ir além disso.

  • Em suma, o controle de constitucionalidade incidental pelo juiz de primeiro grau não é algo irrestrito e absoluto e quando se trata de omissão legislativa, deve-se ter máxima cautela, pois é mais limitado o controle em caso de omissão.

  • A supressão desta omissão pelo controle judicial tanto pode ser no que se refere à norma material como processual.

  • Sem dúvida, esta possibilidade aos magistrados gera uma considerável conquista para o cidadão brasileiro que terá seus direitos fundamentais resguardados tanto em caso de lesão direta como indireta, como, por exemplo, nas omissões legislativas.

  • Conclusão

  • No nosso sistema brasileiro, é permitido o controle de constitucionalidade das leis pelo juiz de primeiro grau que pode, inclusive, declarar de ofício. Porém, tal poder não é absoluto à medida que o juiz tem limites, entre eles, as súmulas vinculantes do STF.

  • Com base nisso, não se pode considerar que a súmula vinculante ou os efeitos vinculantes das decisões do STF sejam chamados como entraves do processo criativo do juiz ou ofensa à indepedência funcional dos magistrados. Isso porque cabe realmente ao STF, como guardião da Constituição, dar a última palavra sobre os assuntos mais controvertidos e importantes do ponto de vista social do país.

  • Isso porque é preciso evitar situações conflitantes e, principalmente, criar instabilidades jurídicas.

  • Além disso, o poder dos juízes nesta sistemática atinge também as omissões legislativas, principalmente, quanto esta omissão agride os direitos e garantias fundamentais dos indivíduos e até os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. Ocorre que estas omissões só podem ser declaradas quando oriundas de um comando constitucional para legislar e tal não é feito.

  • Referências

  • Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

  • Ferraz, Junior Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. 2 a edição. São Paulo: Atlas, 1980

  • Marinoni, Luiz Guilherme. Novo curso de processo civil, volume 1 – 2a edição revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

  • Martins, Nelson Juliano Schaefer. Poderes do juiz no processo civil. São Paulo: Dialética, 2004.

  • Mendes, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional. 3 a edição. São Paulo: Saraiva, 1999.

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Sobre o autor
Maria Rafaela de Castro

Juíza do Trabalho da 7a Região. Trabalhou como Juíza no TRT da 14a Região e como promotora de Justiça no Ministério Público do Estado de Rondônia. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade do Porto, em Portugal. Professora de Cursos Preparatórios.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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