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A greve do servidor público federal

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30/03/2004 às 00:00
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8 – INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO 1480/95.

O Presidente da República editou o Decreto n. 1.480, de 03.05.1995 (DOU 04.05.1995), que disciplina as faltas do servidor público federal decorrentes da sua participação nos movimentos de paralisação.

Tal decreto, que se reveste de regulamento de greve no serviço público, determina que, em nenhuma hipótese, poderão ser objeto de abono, compensação ou cômputo para fins de contagem de tempo de serviço ou de qualquer vantagem que o tenha por base o salário. Na realidade é um decreto que regulamenta uma lei inexistente - a lei de greve no serviço público, cuja mora é do próprio Poder Executivo.

O equívoco é tamanho que as autoridades governamentais estabeleceram sérias restrições e até sanções aos servidores que participarem de greve, o que é incompatível com o fundamento dessa espécie de direito fundamental do trabalhador brasileiro.

Eivados de vícios insanáveis, esse Decreto é de duvidosa constitucionalidade, pois determina até mesmo a exoneração ou dispensa de servidores, discriminando os ocupantes de cargos em comissão e os que percebam função gratificada.

A Constituição cidadã de 1988 não fez qualquer distinção entre os servidores públicos civis efetivos e os servidores ocupantes de cargos em comissão, sendo certo que as funções de confiança devem ser, por força da Emenda Constitucional n. 19/98, ocupadas, exclusivamente, por servidores ocupantes de cargos efetivos o que, também, não vem ocorrendo no seio da Administração Pública, desgraçadamente, ocupados por estranhos à própria administração.

A Constituição Federal de 1988 não admite ser regulamentada por decreto, daí poder-se afirmar que tal decreto é inconstitucional.


9 - CONCLUSÃO:

Conclui-se que, enquanto não existir lei que regulamente o art. 37 especificamente quanto à relação institucional da greve no serviço público, visto que a mora está no poder público representado pelo Poder Executivo Federal, o servidor que participar de paralisação (greve) de suas atividades funcionais, desde que, devidamente convocados pelas entidades sindicais representativas, por analogia à lei de greve existente, não poderá sofrer nenhuma penalidade pecuniária, seja multa ou descontos dos dias em que deixou de exercer suas funções laborais.

Deixar de executar suas atividades sem se ausentar do seu local de trabalho ou, quando tiver que se fazê-lo, mediante deslocamento a local de concentração para pressão ao próprio Poder Público na solução mais rápida dos motivos que ensejaram a greve, não são passíveis de sansão administrativa por inexistir norma legal que permita a Administração tal desiderato.

Qualquer punição, sob pena de nulidade absoluta, só poderá ocorrer mediante o competente processo disciplinar administrativo, com a liturgia do devido processo legal e o contraditório, conforme amparo constitucional esculpido no art. 5º, inciso LV, da Carta Magna de 1988.

O ônus maior de quem participa ativamente de um movimento de greve no Serviço Público é, ao fim do movimento, exercitar sua atividade funcional, de forma extraordinária, de modo a colocar em dia todas as tarefas pertinentes a sua rotina de trabalho normal, sem a percepção pecuniária extra por isso.

Caso venha a sofrer penalidade, pelo desconto pecuniário pelos dias de greve, não poderá ser compelido a trabalhar extraordinariamente, para colocar o serviço em dia, pois há vedação legal para o pagamento de horas extras no serviço público. A norma, neste caso, autoriza a reposição nos termos do parágrafo único do art. 45 da lei 8112/90.

Assim, deve ser praxe nesses movimentos, que o servidor cumpra, fielmente, os horários de trabalho tanto na entrada como na saída, bem como, que assinem o ponto de presença, seja o oficial, da própria repartição, seja o paralelo, ofertado pela entidade organizadora do evento, pois, para uma eventual demanda administrativa ou judicial haverá de ser comprovado que o servidor compareceu ao serviço deixando, apenas, de executar suas atividades laborais pertinentes, pois estava à disposição de sua entidade sindical em movimento de reivindicação por melhores condições de trabalho, cujo direito está, ampla e devidamente, amparado pela Carta Constitucional Cidadã de 1988.


NOTAS

  1. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 6ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 436.
  2. MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 13ª edição. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 239.
  3. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 6ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 436.
  4. 12 TÁCITO, Caio. Temas de direito público. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 1487.
  5. In Curso de Direito Administrativo, 10ª Ed. Ed. Malheiros editores, 1998, São Paulo, pg 63
  6. In Direito Constitucional, 7ª ed. Ed. Atlas, 2000, São Paulo, pg. 279
  7. Cf. Arnaldo Süssekind, Direito Constitucional do Trabalho, Rio de Janeiro, Renovar, 1999, p. 434-435. Nesse sentido decidiu a 6ª Turma do STJ no ROMS 4531/SC (1994/0018896-0), Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 22.8.95

BIBLIOGRAFIA:

A greve no contexto democrático, in Revista Síntese Trabalhista, n. 82, abril/96, Porto Alegre,

A liberdade sindical / trad. Edilson Alkmim Cunha. Brasília, DF: Organização Internacional do Trabalho; São Paulo: LTr, 1994,

Arnaldo Süssekind, Direito Constitucional do Trabalho, Rio de Janeiro, Renovar, 1999,

Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 6ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000,

Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 12ª edição. São Paulo: Atlas, 2000

Friede, Roy Reis, Curso de Direito Administrativo, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1993

Laranjeiras, Aline Daniela Florêncio. Direito de greve no serviço público. Jus Navigandi, n. 63, mar. 2003.

Leite, Carlos Henrique Bezerra. A greve do servidor público civil e os direitos humanos. Jus Navigandi, n. 54, fev. 2002.

Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 25ª edição. São Paulo: Malheiros, 2000, (atualizada por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burlem Filho).

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Mello, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 13ª edição. São Paulo: Malheiros, 2001,

Mozart Victor Russomano, Princípios gerais de direito sindical, 2ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1997,

Souto, Marcos Juruena Villela. Desestatização – privatização, concessões e terceirizações, 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 283.

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Sobre o autor
Carlos Augusto Jorge

advogado, professor universitário, policial federal aposentado, pós-graduado "lato sensu" em Direito Processual Civil, Direito Administrativo e Constitucional

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JORGE, Carlos Augusto. A greve do servidor público federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 266, 30 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5018. Acesso em: 5 nov. 2024.

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