3. ESTADO LAICO
Na abordagem da liberdade religiosa é imprescindível o estudo do principio do Estado laico. Segundo o dicionário Aurélio, “o termo laico tem origem no latim laicus, e em uma palavra quer dizer leigo.” Então pode se dizer que a palavra laico tem acepção a aquele que não pertence ao clero nem a ordem religiosa.
A origem do Estado laico de acordo Pierucci (2006, p. 5),
Foi exatamente no contexto das chamadas ‘guerras de religião’ do século XVII, quase dois séculos após a Reforma Protestante, que surgiu de modo claro e urgente à necessidade, nos países onde havia católicos e protestantes, de que o Estado fosse um árbitro neutro e isento. Uma espécie de ‘juiz de fora’.
Portanto, a ideia de um Estado Laico é a ideia de um Estado neutro e imparcial, o qual não se declara pertencer a nenhuma ideologia religiosa e até mesmo não religiosa. Nas palavras de Oliveira (2007, p.67), “a importância do Estado Laico alcança não apenas aqueles que não possuem nenhuma religião, mas principalmente atinge aqueles que professam algum credo”.
Para Ávila (2009, p.17) “A instituição do Estado Laico é resultado de uma luta política e social pela construção da democracia.” Ou seja, falar de Estado Laico é falar de um Estado que promove a liberdade, a justiça e a igualdade, portanto logo se remete ao um Estado Democrático de Direito. Então, para concretizar uma sociedade livre, justa e solidária só será possível por meio da tolerância à diversidade de manifestações, enquanto um direito fundamental. (OLIVEIRA, 2007, p.69)
Nesse sentindo conclui Pierucci (2006, p. 5),
Diversidade religiosa legítima, diferenciação ativa de crenças, tradições, dogmas e práticas, bem como de figuras e entidades religiosas (santos, santas, anjos, demônios, deuses e deusas), só é possível haver de forma sustentável se o Estado for laico.
A principal característica do Estado laico é a acentuada separação da igreja e o Estado. Nas palavras de Ventura (2006, p. 13) “O Estado Laico significa a separação entre poder político e as instituições religiosas, e a não admissão de interferência direta de um determinado poder religioso nas questões do Estado”.
A reivindicação por um sistema de separação entre a igreja e o Estado formou-se sobre um pressuposto de que os poderes públicos não utilizassem modos coercitivos, como meio compulsória de conversão, aniquilando uns dos fundamentos básicos da própria ideia de religião, que é a conversão interior pela fé e não por força coercitiva. (OLIVEIRA, 2007)
Sobre separação da igreja e o Estado Schwarz (2006, p.8), pondera “que somente cabe à igreja definir e estabelecer questões sobre a heresia, usando a palavra e nunca mecanismo de repreensão. Por outro lado o Estado, autoridade secular, cuidar dos direitos das pessoas”. Conclui a autora que o Estado Laico não toma partido por nenhuma religião. Na mesma vertente,
Diz-se que o Estado moderno é um Estado laico quando - ao não tomar partido por uma religião e afastando-se por igual de todas elas - pode, eventualmente arbitrar de modo imparcial, e na forma da lei, conflitos entre grupos religiosos particulares, evitando que esses conflitos se transformem em guerras religiosas fratricidas. (PIERUCCI, 2006, p.5)
Desta forma, um Estado que se declare Laico, deve concretamente agir como um, proporcionando então aos seus indivíduos uma harmonia mesmo que possuam convicções conflitantes. Aduz Oliveira (2007, p. 69) que é “no entanto, inconcebível em um Estado democrático e pluralista é a imposição a toda a sociedade de uma forma especifica de conduta por ser esta a aceita pela Igreja dominante”. Explica Ventura (2006 p. 15),
A questão central, portanto, nos Estados laicos será o de como limitar a interferência dessas instituições no delineamento de políticas públicas de modo que possam acarretar algum tipo de constrangimento a outras pessoas que não professam aquela fé religiosa.
Finalmente, para que uma sociedade seja de forma efetivamente livre, justa e solidária, é preciso que Estado haja de forma neutra, respeitando a pluralidade e as diversidades. Sendo que a religião não deva conduzir o rumo das politicas públicas, nem o Estado ignorar o fato religioso do seu povo. (OLIVEIRA, 2007, p.70)
3.1. O Estado Laico, Ateu, Pagão ou confessional
Uma das questões que sempre remete a um Estado Laico é se ele é um Estado ateu ou pagão por não se declarar pertencente a nenhuma religião. Explica Sarmento (2007, p.3) que “a laicidade não significa adoção pelo Estado de uma perspectiva ateísta ou refratária à religiosidade. Na verdade, o ateísmo, na sua negativa da existência de Deus, é também uma crença religiosa”.
A neutralidade de um Estado não denota a irreligiosidade ou hostilidade estatal às religiões, pois isso seria uma afronta à liberdade individual de crença e descrença. Posiciona Soriano (2007, p. 1) que,
Não há dúvida de que o Estado ateu e hostil às religiões pode ser inimigo das liberdades individuais, principalmente em relação às liberdades de crença, consciência e culto. A própria Revolução Francesa levou, num primeiro momento, a uma série de desatinos contra os religiosos da época. Felizmente essa fase foi superada e a revolução acabou por contribuir para a ideia da separação entre o Estado e as confissões religiosas.
O Estado Ateu ou pagão ele nega a existência de Deus, ou prega a divinização do ocupante do poder, sendo essa a diferença para o Estado Laico, o qual protege a liberdade de consciência e de crença de seus cidadãos, permitindo a coexistência de vários credos, no que seja o pluralismo religioso. (MARTINS, 2007, p. 1).
Desta forma, ainda sobre o Estado Ateu ou Pagão, lembra Martins (2007, p. 1),
Nero lançou no ano 64 feroz perseguição aos cristãos, que se seguiu ao longo do século dois para a preservação do culto pagão aos imperadores. Hitler, com políticas de extermínio do povo judeu -e de cristãos, ciganos e deficientes físicos- sustentou um Estado ateu em que o "führer" era o senhor supremo da vida e da morte.
Percebe-se então que quando o Estado se posiciona seja como um Estado Ateu ou Pagão, ou como um Estado confessional, gera desatinos e atrocidades. Portanto se faz necessário que o Estado seja neutro, completa Soriano (2007, p.1), “sempre que o Estado tentou definir o que é o bem comum por meio de leis, ocorreram graves confrontos, barbáries, genocídios e guerras”.
Destarte, o Estado deve visar o bem comum protegendo a liberdade religiosa para os crentes e os para os descrentes, não restringindo o direito da minoria por conta das suas crenças. Afirma Sarmento (2007, p. 4),
Em uma sociedade pluralista como a brasileira, em que convivem pessoas das mais variadas crenças e afiliações religiosas, bem como indivíduos que não professam nenhum credo, a laicidade converte-se em instrumento indispensável para possibilitar o tratamento de todos com o mesmo respeito e consideração. Neste contexto de pluralismo religioso, o endosso pelo Estado de qualquer posicionamento religioso implica, necessariamente, em injustificado tratamento desfavorecido em relação àqueles que não abraçam o credo privilegiado.
Tal assertiva torna mais claramente valida o posicionamento de Schwarz (2006, p. 8) que esclarece,
A questão vai para além do fato de se lutar por um Estado laico. Além disso, o Estado precisa ser democrático, dentro da definição de Ivone Gevara, de que democracia não é o voto da maioria, mas a possibilidade de todas as pessoas, de uma ou outra forma, serem incluídas.
3.2. O principio da Laicidade
Liberdade e igualdade são conceitos essenciais ao principio da laicidade. Onde só podem ser construídos em um Estado democrático, o qual dar potencia publica a todos sem distinção. Assim explica Sarmento (2007, p. 4),
O princípio do Estado laico pode ser diretamente relacionado a dois direitos fundamentais que gozam de máxima importância na escala dos valores constitucionais: liberdade de religião e igualdade. Em relação ao primeiro, a laicidade caracteriza-se como uma verdadeira garantia institucional da liberdade religiosa individual.
Segundo o Samento (2007, p.8), ”Com efeito, a correta leitura da laicidade deve compreendê-la como uma garantia da liberdade religiosa, e não como um princípio que a ela se oponha”. Então o principio da laicidade é arma para garantir a liberdade de crença aos indivíduos, porém aduz o autor que,
Do outro lado, a laicidade também protege o Estado de influências indevidas provenientes da seara religiosa, impedindo todo o tipo de confusão entre o poder secular e democrático, em que estão investidas as autoridades públicas, e qualquer confissão religiosa, inclusive a majoritária. (SARMENTO, 2007, p.4)
Dessa forma, o principio da laicidade não protege somente a liberdade do individuo, mas também protege o Estado da religião, evitando que religiões majoritárias venham influenciar de tão forma a ferir o principio da igualdade. Nas palavras de Ranquetat Junior (2008, p. 64) “o principio da laicidade leva a imparcialidade estatal, fazendo com que o Estado necessite tratar igual às diversas religiões”.
Embora o principio da laicidade e o laicismo pareçam termos iguais, são totalmente diferentes no modo de agir do Estado. Faus faz essa distinção citando as palavras do Papa João Paulo II sobre o laicismo,
Uma ideologia que leva gradualmente, de forma mais ou menos consciente, à restrição da liberdade religiosa, até promover o desprezo ou a ignorância de tudo o que seja religioso, relegando a fé à esfera do privado e opondo-se à sua expressão pública. (FAUS, 2005, p.4)
Por outro lado à laicidade, defende e respeita o pluralismo. Cada cidadão pode expor suas ideias e defende-las, sejam elas crenças religiosas ou convicções ideológicas. (FAUS, 2005)
4. LIBERDADE RELIGIOSA
O direito a liberdade religiosa é um direito muito amplo que abrange a liberdade de crença, a liberdade de escolha de religião, e de não aderir a nenhuma. Sobre essa amplitude explica Moraes (2011, p. 127),
A abrangência do preceito constitucional é ampla, pois sendo a religião o complexo de princípios que dirigem os pensamentos, ações e adoração do homem para Deus, acaba por compreender a crença, o dogma, a moral, a liturgia e o culto. O constrangimento a pessoa humana, de forma a constrangê-lo a renunciar sua fé, representa o desrespeito à diversidade democrática de ideias e filosofia e a própria diversidade espiritual.
A liberdade de crença está ligada a liberdade de consciência, e evidentemente a livre opção religiosa, fazendo com que assuma um desdobramento de ordem positiva e negativa. Silva Neto (2013, p. 47) pontua essa diferença discorrendo,
Exercitar a liberdade positiva de crença significa incorporar o direito quanto a crer naquilo que mais bem atenda as necessidades espirituais do ser humano. A liberdade negativa de crença significa simplesmente o direito que tem o individuo de não acreditar em rigorosamente nada em termos de divindade, ser superior, vida após a morte, etc.
É de suma importância ressaltar que a liberdade de religião tem um efeito tripartite, que subdivide em liberdade de crença, liberdade de culto e liberdade de organização religiosa. A liberdade de crença como já foi citado, se dar tanto para o individuo que crê, como para o que não aderi a nenhuma crença ou seguimento religioso.
A liberdade de culto é assegurada pela a Constituição hodierna garantindo que os credos possam adorar suas divindades, desde que a opção de liturgia não ofenda a incolumidade física, o interesse público e os bons costumes (SILVA NETO, 2013). E por último a liberdade de organização religiosa que confere a pessoa, ou ao grupo o direito de criar um seguimento religioso.
Enfim, a Constituição assegura o direito de aderir ou recusar uma crença religiosa, de seguir uma corrente filosófica, ou ate mesmo exprimir o agnosticismo, baseado na ideia do bom-senso, prudência e razoabilidade.
4.1. Antecedentes Históricos
Na antiguidade em um sistema totalmente monista entre o poder politico e a religião, conforme Weingartner (2007, p.27) “manifestava-se em duas variantes: a teocracia, em que o elemento religioso predomina sobre o politico, e o cesarismo, em que o elemento politico prevalece sobre o religioso”.
Apesar do dualismo nascido a partir da frase “Dar a Deus o que é Deus e a Cesar o que é de Cesar”, a formalização jurídica da liberdade religiosa teria de esperar mais um pouco. Pois o paradigma teocêntrico da Idade Média tornou mais problemática à delimitação das esferas, o poder politico e a religião. (WEINGARTNER, 2007)
Nesse período, em que havia um ambiente politico-confessional, ou seja, o direito subordinado as concepções teológicas especificas, surge um grande defensor deste sistema monista. Como lembra o citado autor,
Tomás de Aquino, ao conceber a Igreja e a sociedade como um corpo unitário (corpus christianum), reforçaria a ideia de liberdade eclesiástica, certo que, em sua concepção, os indivíduos poderiam ser sacrificados ao todo, aos interesses superiores da sociedade. (WEINGARTNER, 2007, p. 28)
Sobre esse contexto afirma Neidsonei Oliveira (2007, p.36), “o homem não tinha escolha de crenças. Devia acreditar e submeter-se à religião da cidade”. Período em que foi criada a Inquisição, justificada como forma de combater as heresias, que seriam toda forma de culto que não fosse à estabelecida pela a Igreja Católica. Observa Weingartner (2007, p. 29),
Dito de outro modo, a aceitação de uma única doutrina abrangente significa que o uso opressivo do poder estatal será necessário para manter a comunhão politica. Na sociedade da Idade Média, mais ou menos unida na afirmação da fé católica, a Inquisição não foi um acidente; a supressão da heresia era necessária para preservar aquela fé religiosa compartilhada.
Mesmo em um período de grande perseguição, ainda sim era possível encontrar em algum lugar, Estados que já se falava em Liberdade Religiosa, como observar Soriano (2004, p. 2),
A expressão "liberdade religiosa" foi utilizada, provavelmente, pela primeira vez no segundo século da era cristã. Tertuliano, um advogado convertido ao cristianismo, usou essa expressão na sua obra intitulada Apologia (197 d.C.), para defender os cristãos que passavam por uma feroz perseguição religiosa empreendida pelo Império Romano.
Enquanto em Roma, o imperador Constantino converte ao cristianismo e a religião Católica Apostólica Romana se torna a religião oficial do Estado (OLIVEIRA, 2007). A igreja se torna perseguidora, e qualquer seguimento religioso que não seja aquela posta pelos ordenamentos católicos eram severamente castigada.
De acordo com Silva Neto, (2013, p.42) “As perseguições se mantiveram, e até recrudesceram, especialmente a partir das incisivas contestações de Martin Lutero e João Calvino.” Sobre Lutero e Calvino explica Oliveira (2007, p. 38) que,
Em síntese, além de defenderem a doutrina da justificação pela fé (oposta à doutrina católica que pregava a salvação pelas obras) e a Bíblia como única fonte de autoridade nos assuntos de fé, o Luteranismo negava a infalibilidade do Papa, sustentando a necessidade da instituição de Igrejas nacionais e a rejeição das ambições políticas do papado, enquanto que o Calvinismo também pregava a separação entre Igreja e Estado.
Embora longe de se concretizar o principio da liberdade religiosa, a Reforma Protestante foi um marco para o fim da Idade Média. Como explica Weingartner (2007, p. 31),
Quanto a libertas ecclesiae, pode se apresentar como um topos que dominou os espaços jurídicos e políticos durante toda a Idade Média, até que a Reforma Protestante quebrou a unidade da cristandade, embora a fissura anterior da Igreja Ortodoxa (dai que se diga que a data mais relevante para a Europa Ocidental, a demarcar o fim da Idade Média, não está na queda de Constantinopla, mas cerca de cinquenta anos depois, com as 95 teses de Martinho Lutero).
Com o fim da Idade Média, inicia um período de grandes movimentos que influenciaram na construção da liberdade religiosa, movimentos sócio-políticos tais como Iluminismo, Renascimento, Revoluções francesa e americana. Pontifica Oliveira (2007, p. 38),
Esses movimentos propagavam a ideia de que o homem devia ser senhor de si, pensar por si mesmo. Tal ideologia era contrária à vigente, segundo a qual, só a Igreja (Católica) poderia interpretar as Escrituras Sagradas, não cabendo ao homem comum tal ato. Ocorre então um rompimento da unidade religiosa.
No Iluminismo a liberdade de consciência ganhou uma grande importância no campo politico. Com esse pensamento corrobora Canotilho (1993, p. 503),
A quebra de unidade religiosa da cristandade deu origem à aparição de minorias religiosas que defendiam o direito de cada um à ‘verdadeira fé’. Esta defesa da liberdade religiosa postulava, pelo menos, a ideia de tolerância religiosa e a proibição do Estado em impor ao foro íntimo do crente uma religião oficial. Por este facto, alguns autores, como G. JELLINEK vão mesmo ao ponto de ver na luta pela liberdade de religião a verdadeira origem dos direitos fundamentais. Parece, porém, que se tratava mais da ideia de tolerância religiosa para credos diferentes do que propriamente da concepção da liberdade de religião e crença, como direito inalienável do homem, tal como veio a ser proclamado nos modernos documentos constitucionais.
Inspirada nas ideias do Iluminismo a Revolução Francesa, já pregava a separação da igreja e o Estado e o livre exercício de crença. Explana Weingartner (2007, p.33) “Dai ao momento subsequente, de constitucionalização do direito a liberdade religiosa e do principio da separação Igreja/Estado, faltava pouco tempo”.
Os Estados Unidos e a França nas suas Constituições inspiradas pelo o liberalismo, já estabelecia a liberdade de crença. Mas foi décadas seguintes que outros países passaram a adotar o principio da separação do Estado e Igreja e a liberdade religiosa. (OLIVEIRA, 2007)
Enfim, no século XX há o reconhecimento da liberdade religiosa nas legislações nacionais e nos tratados Internacionais. A liberdade de religião não seria somente como ideia de tolerância religiosa, mas passaria a ser reconhecida como um direito fundamental universal.
4.2. Noções conceituais de Liberdade e Religião
4.2.1. Liberdade
Liberdade significa o direito de agir, o livre arbítrio desde que não prejudique o outro. Como conceitua Figueiredo Jr (1979, p. 7), “A liberdade é, portanto um ato de consciência voluntária, que apesar de condicionado, do ponto de vista da intensidade da vontade livre, existe.” Conforme a filosofia a liberdade é a interdependência do ser humano, o poder de ter autonomia e espontaneidade.
Portanto a liberdade é um poder de autodeterminação, onde cada individuo escolhe qual o seu comportamento pessoal. Para Berlin, existem dois tipos de liberdade, a liberdade negativa e a liberdade positiva, como assim leciona,
O primeiro desses sentidos políticos de liberdade individual ou liberdade institucional, o qual (com base em muitos precedentes) chamarei de sentido “negativo”, vem incorporando na resposta a pergunta “ Qual é área em que o sujeito- uma pessoa um grupo de pessoas – deve ter ou receber para fazer o que pode fazer, ou ser o que pode ser, sem que as outras pessoas interfiram? O segundo que chamei de sentindo positivo , vem incorporando na resposta a pergunta “ O que ou quem é a fonte de controle ou de interferência que pode determinar que alguém faça ou seja tal coisa não a outra? (BERLIN, 1997, p. 136)
Então pode se extrair que a liberdade negativa seria a ausência de impedimentos à ação do individuo, e a liberdade positiva a presença de condições para que os indivíduos ajam de modo a atingir os seus objetivos. No entanto a liberdade de cada individuo, a qual é denominada liberdade “negativa”, é uma liberdade limitada. Ou seja, na esfera individual há uma necessidade de haver uma interferência do poder publico. Corroborando com esse pensamento Figueiredo Jr. (1979, p. 9) explica,
Desse modo é importante ressaltar o fato de que mesmo a liberdade humana se manifesta em seu grau mais forte, isto é como criação relativa, trata-se de uma “liberdade de situada” no mundo real, liberdade “sob condição”, que não pode criar senão apoiada sobre uma série de pontos de referência representados pelo determinismo e que sofre limitações pelo o poder em decorrência do interesse coletivo.
A liberdade no sentido lato sensu está inserida no artigo 5º da Constituição Federal, como um direito inviolável. Deste modo, a liberdade é um direito, mas também é um principio norteador, prevista também como objetivo fundamental da República no inciso I do artigo 3º da nossa Constituição.
As normas constitucionais que estabelecem a liberdade, explica Silva (2001, p. 271),
O legislador constituinte deu normatividade suficiente aos interesses vinculados à matéria de que cogitam. Vale dizer, não dependem de legislação nem de providência do Poder Público para serem aplicadas. Algumas normas podem caracterizar-se como de eficácia contida, mas sempre de aplicabilidade direta e imediata, caso em que a previsão de lei não significa que desta dependem sua eficácia e aplicabilidade, visto que tal lei não se destina a integrar lhes a eficácia (que já têm amplamente), mas visa restringir-lhes a plenitude desta, regulando os direitos subjetivos que delas decorrem para os indivíduos ou grupos. Enquanto o legislador, neste caso, não produzir a normatividade restritiva, sua eficácia será plena.
A Declaração do Homem e do cidadão de 1789, também fala sobre a liberdade, no sentido em que a liberdade de um individuo começa quando a do outro termina. Assim estabelece a citada declaração no seu artigo 4º: “a liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique a outrem. Assim, o exercício dos direitos naturais do homem não tem limites, senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esse limite somente à lei poderá determinar”.
De acordo com Oliveira (2007, p 43), “a liberdade dos homens, de forma geral, sempre foi desrespeitada em maior ou menor grau em toda a sua história.” Sendo proclamada nas democracias a liberdade nunca foi efetivamente plena, havendo uma luta constante para garantir a sua efetivação material.
4.2.2. Liberdade Religiosa
O direito a liberdade religiosa é um direito muito amplo que abrange a liberdade de crença, a liberdade de escolha de religião, e de não aderir a nenhuma. Sobre essa amplitude explica Moraes (2011, p. 127),
A abrangência do preceito constitucional é ampla, pois sendo a religião o complexo de princípios que dirigem os pensamentos, ações e adoração do homem para Deus, acaba por compreender a crença, o dogma, a moral, a liturgia e o culto. O constrangimento a pessoa humana, de forma a constrangê-lo a renunciar sua fé, representa o desrespeito à diversidade democrática de ideias e filosofia e a própria diversidade espiritual.
A liberdade de crença está ligada a liberdade de consciência, e evidentemente a livre opção religiosa, fazendo com que assuma um desdobramento de ordem positiva e negativa. Silva Neto (2013, p. 47) pontua essa diferença discorrendo,
Exercitar a liberdade positiva de crença significa incorporar o direito quanto a crer naquilo que mais bem atenda as necessidades espirituais do ser humano. A liberdade negativa de crença significa simplesmente o direito que tem o individuo de não acreditar em rigorosamente nada em termos de divindade, ser superior, vida após a morte, etc.
É de suma importância ressaltar que a liberdade de religião tem um efeito tripartite, que subdivide em liberdade de crença, liberdade de culto e liberdade de organização religiosa. A liberdade de crença como já foi citado, se dar tanto para o individuo que crê, como para o que não aderi a nenhuma crença ou seguimento religioso.
A liberdade de culto é assegurada pela a Constituição hodierna garantindo que os credos possam adorar suas divindades, desde que a opção de liturgia não ofenda a incolumidade física, o interesse público e os bons costumes. (SILVA NETO, 2013) E por último a liberdade de organização religiosa que confere a pessoa, ou ao grupo o direito de criar um seguimento religioso.
Enfim, a Constituição assegura o direito de aderir ou recusar uma crença religiosa, de seguir uma corrente filosófica, ou ate mesmo exprimir o agnosticismo, baseado na ideia do bom-senso, prudência e razoabilidade.
4.2.2.1. Antecedentes Históricos
Na antiguidade em um sistema totalmente monista entre o poder politico e a religião, conforme Weingartner Neto (2007, p.27) “manifestava-se em duas variantes: a teocracia, em que o elemento religioso predomina sobre o politico, e o cesarismo, em que o elemento politico prevalece sobre o religioso”.
Apesar do dualismo nascido a partir da frase “Dar a Deus o que é Deus e a Cesar o que é de Cesar”, a formalização jurídica da liberdade religiosa teria de esperar mais um pouco. Pois o paradigma teocêntrico da Idade Média tornou mais problemática à delimitação das esferas, o poder politico e a religião. (WEINGARTNER NETO, 2007)
Nesse período, em que havia um ambiente politico-confessional, ou seja, o direito subordinado as concepções teológicas especificas, surge um grande defensor deste sistema monista. Como lembra o citado autor,
Tomás de Aquino, ao conceber a Igreja e a sociedade como um corpo unitário (corpus christianum), reforçaria a ideia de liberdade eclesiástica, certo que, em sua concepção, os indivíduos poderiam ser sacrificados ao todo, aos interesses superiores da sociedade. (WEINGARTNER, 2007, p. 28)
Sobre esse contexto afirma Oliveira (2007, p.36), “o homem não tinha escolha de crenças. Devia acreditar e submeter-se à religião da cidade”. Período em que foi criada a Inquisição, justificada como forma de combater as heresias, que seriam toda forma de culto que não fosse à estabelecida pela a Igreja Católica. Observa,
Dito de outro modo, a aceitação de uma única doutrina abrangente significa que o uso opressivo do poder estatal será necessário para manter a comunhão politica. Na sociedade da Idade Média, mais ou menos unida na afirmação da fé católica, a Inquisição não foi um acidente; a supressão da heresia era necessária para preservar aquela fé religiosa compartilhada. (WEINGARTNER NETO, 2007, p. 29)
Mesmo em um período de grande perseguição, ainda sim era possível encontrar em algum lugar, Estados que já se falava em Liberdade Religiosa, como observar Soriano (2004, p.2),
A expressão "liberdade religiosa" foi utilizada, provavelmente, pela primeira vez no segundo século da era cristã. Tertuliano, um advogado convertido ao cristianismo, usou essa expressão na sua obra intitulada Apologia (197 d.C.), para defender os cristãos que passavam por uma feroz perseguição religiosa empreendida pelo Império Romano.
Enquanto em Roma, o imperador Constantino converte ao cristianismo e a religião Católica Apostólica Romana se torna a religião oficial do Estado (OLIVEIRA, 2007). A igreja se torna perseguidora, e qualquer seguimento religioso que não seja aquela posta pelos ordenamentos católicos eram severamente castigada.
De acordo com Silva Neto, (2013, p.42) “As perseguições se mantiveram, e até recrudesceram, especialmente a partir das incisivas contestações de Martin Lutero e João Calvino.” Sobre Lutero e Calvino explica Oliveira (2007, p.38) que,
Em síntese, além de defenderem a doutrina da justificação pela fé (oposta à doutrina católica que pregava a salvação pelas obras) e a Bíblia como única fonte de autoridade nos assuntos de fé, o Luteranismo negava a infalibilidade do Papa, sustentando a necessidade da instituição de Igrejas nacionais e a rejeição das ambições políticas do papado, enquanto que o Calvinismo também pregava a separação entre Igreja e Estado.
Embora longe de se concretizar o principio da liberdade religiosa, a Reforma Protestante foi um marco para o fim da Idade Média. Como explica Weingartner Neto (2007, p. 31),
Quanto a libertas ecclesiae, pode se apresentar como um topos que dominou os espaços jurídicos e políticos durante toda a Idade Média, até que a Reforma Protestante quebrou a unidade da cristandade, embora a fissura anterior da Igreja Ortodoxa ( dai que se diga que a data mais relevante para a Europa Ocidental, a demarcar o fim da Idade Média, não está na queda de Constantinopla, mas cerca de cinquenta anos depois, com as 95 teses de Martinho Lutero).
Com o fim da Idade Média, inicia um período de grandes movimentos que influenciaram na construção da liberdade religiosa, movimentos sócio-políticos tais como Iluminismo, Renascimento, Revoluções francesa e americana. Pontifica Oliveira (2007, p.38) que,
Esses movimentos propagavam a ideia de que o homem devia ser senhor de si, pensar por si mesmo. Tal ideologia era contrária à vigente, segundo a qual, só a Igreja (Católica) poderia interpretar as Escrituras Sagradas, não cabendo ao homem comum tal ato. Ocorre então um rompimento da unidade religiosa.
No Iluminismo a liberdade de consciência ganhou uma grande importância no campo politico. Com esse pensamento corrobora J.J Canotilho (1993,p.503),
A quebra de unidade religiosa da cristandade deu origem à aparição de minorias religiosas que defendiam o direito de cada um à ‘verdadeira fé’. Esta defesa da liberdade religiosa postulava, pelo menos, a ideia de tolerância religiosa e a proibição do Estado em impor ao foro íntimo do crente uma religião oficial. Por este facto, alguns autores, como G. JELLINEK vão mesmo ao ponto de ver na luta pela liberdade de religião a verdadeira origem dos direitos fundamentais. Parece, porém, que se tratava mais da ideia de tolerância religiosa para credos diferentes do que propriamente da concepção da liberdade de religião e crença, como direito inalienável do homem, tal como veio a ser proclamado nos modernos documentos constitucionais.
Inspirada nas ideias do Iluminismo a Revolução Francesa, já pregava a separação da igreja e o Estado e o livre exercício de crença. Explana Jayme Weingartner Neto (2007, p.33) “Dai ao momento subsequente, de constitucionalização do direito a liberdade religiosa e do principio da separação Igreja/Estado, faltava pouco tempo”.
Os Estados Unidos e a França nas suas Constituições inspiradas pelo o liberalismo, já estabelecia a liberdade de crença. Mas foi décadas seguintes que outros países passaram a adotar o principio da separação do Estado e Igreja e a liberdade religiosa. (OLIVEIRA, 2007)
Enfim, no século XX há o reconhecimento da liberdade religiosa nas legislações nacionais e nos tratados Internacionais. A liberdade de religião não seria somente como ideia de tolerância religiosa, mas passaria a ser reconhecida como um direito fundamental universal.
4.2.2. Noções conceituais de Liberdade e Religião.
4.2.2.1. Liberdade
Liberdade significa o direito de agir, o livre arbítrio desde que não prejudique o outro. Como conceitua Figueiredo Jr (1979, p. 7), “A liberdade é, portanto um ato de consciência voluntária, que apesar de condicionado, do ponto de vista da intensidade da vontade livre, existe.” Conforme a filosofia a liberdade é a interdependência do ser humano, o poder de ter autonomia e espontaneidade.
Portanto a liberdade é um poder de autodeterminação, onde cada individuo escolhe qual o seu comportamento pessoal. Para Isaiah Berlin, existem dois tipos de liberdade, a liberdade negativa e a liberdade positiva, como assim leciona,
O primeiro desses sentidos políticos de liberdade individual ou liberdade institucional, o qual (com base em muitos precedentes) chamarei de sentido “negativo”, vem incorporando na resposta a pergunta “ Qual é área em que o sujeito- uma pessoa um grupo de pessoas – deve ter ou receber para fazer o que pode fazer, ou ser o que pode ser, sem que as outras pessoas interfiram? O segundo que chamei de sentindo positivo , vem incorporando na resposta a pergunta “ O que ou quem é a fonte de controle ou de interferência que pode determinar que alguém faça ou seja tal coisa não a outra? (BERLIN, 1997, p. 136)
Então pode se extrair que a liberdade negativa seria a ausência de impedimentos à ação do individuo, e a liberdade positiva a presença de condições para que os indivíduos ajam de modo a atingir os seus objetivos. No entanto a liberdade de cada individuo, a qual é denominada liberdade “negativa”, é uma liberdade limitada. Ou seja, na esfera individual há uma necessidade de haver uma interferência do poder publico. Corroborando com esse pensamento Figueiredo Jr (1979, p.9) explica,
Desse modo é importante ressaltar o fato de que mesmo a liberdade humana se manifesta em seu grau mais forte, isto é como criação relativa, trata-se de uma “liberdade de situada” no mundo real, liberdade “sob condição”, que não pode criar senão apoiada sobre uma série de pontos de referência representados pelo determinismo e que sofre limitações pelo o poder em decorrência do interesse coletivo.
A liberdade no sentido lato sensu está inserida no artigo 5º da Constituição Federal, como um direito inviolável. Deste modo, a liberdade é um direito, mas também é um principio norteador, prevista também como objetivo fundamental da República no inciso I do artigo 3º da nossa Constituição.
As normas constitucionais que estabelecem a liberdade, explica Afonso da Silva (2001,p. 271),
O legislador constituinte deu normatividade suficiente aos interesses vinculados à matéria de que cogitam. Vale dizer, não dependem de legislação nem de providência do Poder Público para serem aplicadas. Algumas normas podem caracterizar-se como de eficácia contida, mas sempre de aplicabilidade direta e imediata, caso em que a previsão de lei não significa que desta dependem sua eficácia e aplicabilidade, visto que tal lei não se destina a integrar lhes a eficácia (que já têm amplamente), mas visa restringir-lhes a plenitude desta, regulando os direitos subjetivos que delas decorrem para os indivíduos ou grupos. Enquanto o legislador, neste caso, não produzir a normatividade restritiva, sua eficácia será plena.
A Declaração do Homem e do cidadão de 1789, também fala sobre a liberdade, no sentido em que a liberdade de um individuo começa quando a do outro termina. Assim estabelece a citada declaração no seu artigo 4º: “a liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique a outrem. Assim, o exercício dos direitos naturais do homem não tem limites, senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esse limite somente à lei poderá determinar”.
De acordo com Oliveira (2007, p 43), “a liberdade dos homens, de forma geral, sempre foi desrespeitada em maior ou menor grau em toda a sua história.” Sendo proclamada nas democracias a liberdade nunca foi efetivamente plena, havendo uma luta constante para garantir a sua efetivação material.
4.2.2.2. Religião
A conduta do ser humano sempre foi determinada pelo o “juiz de valor”, com normas extraídas a partir da moral, da ética do direito e religião. São parâmetros que estabelecem o “dever-ser”, o simples descumprimento dessas regras geram sanções. Sanções estas que poderá ser desde a reprovação social até a punição religiosa, se não aqui em outra vida, no caso de religião. (OLIVEIRA, 2007)
Difícil é definir um conceito para religião. Para Durkheim (2003, p.5), “a religião seria, portanto, uma espécie de especulação sobre tudo o que escapa a ciência e, de maneira mais geral, ao pensamento claro”. Para outros ligam o conceito de religião ao da divindade.
Dessa forma, percebe-se que é uma tarefa nada fácil conceitua-la. Contudo, a religião sempre esteve presente na vida do ser humano desde a antiguidade, como assenta Silva Neto (2013, p. 30),
Há registros de pintura e desenhos dos agrupamentos primitivos que habitavam cavernas nos quais se representava o sol e a lua, presumivelmente como as mais antecedentes manifestações de religiosidade da espécie humana. Traduzia-se nesses astros a tentativa do homem primitivo de neles buscar proteção contra intempéries e os animais predadores.
Indiscutível é a importância da religião para uma determinada sociedade. Pois a história sempre relata homens que por ela deram a sua vida e até mesmo morreram. Silva Neto (2013, p.137) menciona que, “Os primórdios do Cristianismo foram caracterizados pelas perseguições do Estado romano aos cristãos, quando, não raro, eram presos e devorados por leões como atração patrocinada pelos os Imperadores”.
A relevância da religião também é enfatizada por Jung (1978, p. 1), assim descrevendo,
Visto que a religião constitui, sem dúvida alguma, uma das expressões mais antigas e universais da alma humana, subentende-se que todo o tipo de psicologia que se ocupa da estrutura psicológica da personalidade humana deve pelo menos constatar que a religião, além de ser um fenômeno sociológico ou histórico, é também um assunto importante para grande número de indivíduos.
Sendo a religião um assunto de total relevância pra maior parte dos indivíduos, é imprescindível a liberdade religiosa, a qual se desdobra da liberdade de pensamento. O Estado, portanto não pode simplesmente ignorar as convicções do seu povo, mas levar em conta as suas crenças, respeitando a religião de cada individuo.
4.3. Liberdade Religiosa na Constituição federal
4.3.3.1. Liberdade religiosa como um direito fundamental
Os direitos fundamentais são aqueles direitos inerentes ao Homem, que devem está previsto nas Constituições como forma de garantir a limitação do poder estatal. Sobre o Direito fundamental conceitua Moraes (2011, p. 20) que é,
O conjunto de institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal, e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana, poder ser definido como direitos fundamentais.
Esses direitos são garantia de não ingerência do Estado na esfera individual e para a consagração da dignidade humana. Completa o autor outrora citado “A previsão desses direitos coloca-se em elevada posição hermenêutica em relação aos demais direitos previstos no ordenamento jurídico”. (MORAES, 2011, p. 21)
A imprescritibilidade, inalienabilidade, irrenunciabilidade, e a inviolabilidade são características dos direitos fundamentais. As normas que consubstancia os direitos fundamentais individuais são em regra de eficácia e aplicabilidade imediata. (MORAES, 2011)
A liberdade religiosa está consagrada como um direito fundamental na Declaração Universal de Direitos Humanos no seu artigo XVIII que estabelece:
Toda pessoa tem direito a liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo o ensino, pela a prática, pelo o culto e pela a observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular. (Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948).
A Constituição brasileira vigente estabelece no seu artigo 5º o rol dos direitos fundamentais, reza o inciso VI que: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. Sendo, portanto a liberdade religiosa um direito fundamental e inerente a qualquer ser humano.
Ressalte que as características desse direito fundamental, é que primeiramente possuem aplicação imediata, são cláusulas pétreas, por força do artigo 60, paragrafo 4º da Constituição Federal, por isso não podem ser abolidos nem mesmo por emendas. Esses direitos possuem hierarquia constitucional, ou seja, se houver alguma outra lei que dificultar ou não assegurar esses direitos será considerada inconstitucional. (MARMELSTEIN, 2011)
Por fim o direito de liberdade de religião é um direito inviolável, imprescritível e irrenunciável, intimamente ligado à ideia de dignidade humana e positivado no plano constitucional. O Estado é, portanto, limitado para agir na área da liberdade religiosa de cada cidadão, não podendo agir de forma arbitrária, mas sim garantir cada vez mais essa liberdade no plano individual e coletivo.
4.3.1.1. Liberdade Religiosa e o principio da dignidade humana
O principio da dignidade humana está consagrado como um fundamento do Estado brasileiro na Constituição Federal de 1988, no artigo 1º. Sobre esse principio Afonso da Silva conceitua (2012, p.105), “Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito a vida”.
A dignidade da pessoa humana é o principal de todos os demais princípios, pois estes devem ser aplicados com observâncias naquele. Como assim explica Silva Neto (2013, p. 118)
Mas firmar como fundamento do Estado brasileiro a dignidade da pessoa humana deixa a mostra a obrigatoriedade de pôr no núcleo central das atenções o individuo, quer seja para torná-lo efetivamente destinatário dos direitos de cunho prestacional, quer ainda para demarcar, com precisão, a ideia de que o mais elevado e sublime proposito cometido a sociedade politica é o enaltecimento da dignidade das pessoas que compõe.
A liberdade religiosa está ligada ao principio da dignidade humana, pois para exercer essa liberdade o Estado deve garantir o mínimo possível para cada individuo como ser humano. Nesse sentindo o autor citado anteriormente explica (2013, p.120), “Sem duvida, a opção religiosa está tão incorporada ao substrato de ser humano que o seu desrespeito provoca idêntico desacato a dignidade da pessoa humana”.
4.3.1.2 O principio da igualdade em matéria religiosa
A Constituição brasileira constitui no seu artigo 3º, inciso IV, que é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Logo, a norma mãe repudia toda e qualquer discriminação, enaltecendo o principio da igualdade.
A igualdade é fundamental para a democracia, onde não se admite os privilégios e distinções que um regime simplesmente liberal consagra. O principio da igualdade prevê a possibilidade de tratamento isonômico para cada cidadão. Segundo Afonso da Silva (2012, p. 211), “As constituições só tem reconhecido a igualdade no seu sentindo jurídico-formal: igualdade perante a lei”. Conforme com o que estabelece o artigo 5º, caput, sendo que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.
O Aristóteles atrelou a ideia de igualdade com a ideia de justiça, relativizando, ou seja, cada um com o seu, tratando o legislador os iguais de maneira igual e os desiguais de maneira desigual. (SILVA, 2012)
O principio da igualdade atua em duas vertentes: perante a lei e na lei. A igualdade perante a lei compreende a aplicação da lei no caso concreto, diferente da igualdade na lei prevendo que as normas não devem fazer distinção, exceto quando constitucionalmente autorizadas. Afonso da Silva (2012, p.213) esclarecendo sobre a justiça formal e a justiça material leciona,
A justiça formal consiste em um principio de ação, segundo o qual os seres de uma mesma categoria essencial devem ser tratados da mesma forma. Ai a justiça formal se identifica com a igualdade formal. A justiça concreta ou material seria, para Perelman, a especificação da justiça formal, indicando a característica constitutiva da categoria essencial, chegando-se as formas: a cada segundo a sua necessidade; a cada um segundo seus méritos; a cada um a mesma coisa.
O direito a igualdade, contudo não é absoluto. É preciso ser observado o principio da proporcionalidade, completa Marmelstein (2011, p. 441), “Portanto o que a Constituição proíbe não é a discriminação em si, mas a discriminação desproporcional”. O importante é que as discriminações estabelecidas em lei sejam constitucionalmente justificadas, caso contrario poderá ser objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Para Afonso da Silva, há duas formas de cometer essa inconstitucionalidade (2012, p.228) “Uma consiste em outorgar beneficio legitimo a pessoas ou grupos, discriminando-os favoravelmente em detrimento de outras pessoas ou grupos em igual situação”. Na liberdade religiosa, todos sem distinção têm o direito de aderir ou não uma crença, e o Estado não pode beneficiar ou propagar só um tipo de religião, discriminando as demais. Caso em que isso aconteça, será inconstitucional.
Conclui o mencionado autor que,
A outra forma de inconstitucionalidade revela-se em se impor obrigação, dever, ônus, sanção ou qualquer sacrifício a pessoas ou grupos de pessoas, discriminando-as em face de outro na mesma situação que, assim, permaneceram em condições mais favoráveis. (SILVA, 2012, p. 229)
Em matéria religiosa o principio da igualdade tem um papel importante para concretizar a democracia. O Estado, portanto tem que agir na esfera religiosa no sentido de promover o bem-estar social, a tolerância e o respeito. O Estado dever de abolir a discriminação e de não discriminar, além disso, o dever de proteção, conforme explica Marmelstein (2011, p. 446),
Por força do dever de proteção, o Estado deve adotar medidas capazes de impedir que particulares violem esse mandamento constitucional, até porque o particular também tem o dever ético-jurídico de respeitar o seu semelhante.