Criminologia: a sua importância para o estudo atual do Direito Penal

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17/07/2016 às 21:14
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A presente pesquisa aborda a matéria “Criminologia e o estudo com foco no criminoso”

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa aborda a matéria “Criminologia e o estudo com foco no criminoso”. Para que possamos compreender melhor o assunto se faz necessário esclarecer que Direito Penal, Criminologia e Política Criminal são pilares sobre os quais se apoiam as denominadas “ciências criminais”, compondo um modelo associado de ciências. O Direito Penal examina os aspectos que se ligam aos temas jurídico-penais, em sua visão dogmática, com decisões baseadas no que diz o texto das leis, em que se verifica o legalismo formal amparado pelos princípios. A Política Criminal oferece aos poderes públicos as opções científicas concretas mais adequadas para o controle do crime, é a essência investigativa que aponta um conjunto sistemático dos princípios fundados na investigação científica das causas do crime e dos efeitos da intervenção punitiva. Já a Criminologia tem por objeto a análise do delito, do delinquente, da vítima e do controle social, com a finalidade de prevenir o crime e intervir na pessoa do infrator, ou seja, é uma ciência que busca informações diretas em que se aproxima do fenômeno delitivo, buscando explicações em consideração as condições sociais, culturais, políticas, econômicas vingadas tempo a tempo, em períodos determinados e culturas diferenciadas.

A punição é o meio pelo qual a sociedade exerce sua defesa por direitos usurpados por indivíduos sem legitimidade. Assegurar a vida do individuo e impor as devidas sanções é dever do Estado, que deve afirmar seu poder imperativo por meio de leis que reprimirão essas condutas. Pensar sobre teorias jurídicas através de leis, pode ajudar a resolver alguns problemas sociais pelos quais a sociedade passa, sem, no entanto, ser omisso quanto às modificações sociais ou a flexibilizações jurisdicionais que justifiquem a intervenção mínima estatal. O excesso de jurisdicionalização de políticas do Estado, torna a sociedade mais preconceituosa, se não frágil, e sensível a incidência de infrações. Todavia, o julgador deve analisar as questões jurídicas a luz dos princípios morais para se determinar efetivamente a Justiça. Não devemos negar a concepção conservadora ou até mesmo formalista, aprimorada na concepção progressista da democracia. Com este propósito, os princípios e regras, hoje estabelecidas pela Constituição da República estão ligados à materialização do Estado Democrático de Direito, calcado na base de todo o ordenamento Jurídico. O objeto do estudo além do Direito Penal é também de Direitos Humanos e Constitucional. Assim, delimita-se como objetivo principal o estudo da Criminologia sob a ótica da sociedade nos ramos da Política Criminal, visando formar uma consciência sobre condutas sociais.


1. Criminologia e o estudo com foco no criminoso

A pesquisa visa apresentar e descrever as bases da Escola Penal Positiva, suas novidades quando comparada à Escola Clássica e seu papel principal nas orientações legislativas de diversos países, incluindo o Brasil. O foco, até então inexistente no criminoso, em suas “anormalidades” psíquicas, no meio em que ele habita e em suas características antropológicas, genéticas e sua periculosidade, fundamentou o desenvolvimento de institutos como o Exame Criminológico e das Medidas de Segurança que ainda são presentes no ordenamento jurídico-penal brasileiro. Deste modo, o texto almeja ilustrar a origem dos institutos para compreender sua forma de funcionamento e sua utilização na atividade jurídica atual. 3

1.1. Conceito

Segundo o mestre espanhol Antonio García-Pablos de Molina4, a Criminologia é uma ciência baseada na experiência interdisciplinar, que se toma da disciplina do crime, da pessoa do transgressor, da vítima e do domínio social da conduta delitiva, e que discute abastecer uma comunicação verdadeira, contrariada, sobre a gênese, ativa e variáveis basilares do delito, considerando como problema particular e social, assim como sobre os planejamentos de prevenção eficaz e técnicas de intervenção positiva no indivíduo delinquente e nos múltiplos modelos ou sistemas de revide o delito. 5

A Criminologia por seu objeto, qual seja a abordagem específica nos agentes – paciente e delinquente – e por se preocupar em esclarecer o fenômeno de crime – que reflete em vários campos sociais – possui desde a sua formação íntima, ajuntamento com diferentes áreas do conhecimento humano, tais quais o Direito Penal, Direito Processual Penal, Antropologia, Sociologia, Psicologia, Biologia, Vitimologia e Criminalística, utilizando-se e apresentando métodos e elementos interdisciplinares para a exploração do seu objeto. Embora sempre coexistindo com o crime, a humanidade, em seu desenvolvimento, indicou conceitos cada vez mais eficazes tendendo não a abster-se da prática do crime, que como revelado é algo que se encontra em nível imaginário, mas sim a resguardar a vítima e oferecer meios adequados para se tornar plausível a vida e a coexistência social. Primitivamente, nas sociedades mais simples, valia o método de solução de conflito da autotutela, em que era válido ao mais forte, ou ao seu bando, impor sua vontade às dos mais anêmicos. Não havia a figura do Estado e a determinação de condutas e operava-se exclusivamente pela força. Com o desenvolvimento da vida social, verificou-se o aparecimento das primeiras atividades definidas por lei, ainda que simples, e os comportamentos sociais censuráveis passaram a ser antecipados em ordenamentos, ficando a transgressão da paz social atribuída a uma sanção.

Assim, com o passar do tempo, nasceram estatutos, como o Código de Hamurabi (por volta de 1.700 a.C.), cuja principal característica era a adoção da lei de Talião (olho por olho, dente por dente), Código de Manu – Verdade, Justiça e Respeito (por volta de 1500 a.C.), até as Leis das Doze Tábuas Romanas, esclarecendo direitos civis (por volta do ano 451 a.C.) e o Corpus Iuris Civilis – Código de Justiniano (tornou-se base do Direito Civil moderno), entre os anos 529 e 534 d.C.. Tais normas formalizaram a realidade de cada sociedade e quase todos admitiam a cominação de morte ao agente que ferisse a paz pública.

Na idade média, cada Estado propunha o seu ordenamento jurídico e visava, especialmente, a proteção dos interesses da Monarquia e das camadas que a apoiavam com destaque à nobreza. Hodiernamente, com a configuração contemporânea dos Estados Modernos, cada qual descreve sua legislação própria para o combate à criminalidade e a imputação de valor social a cada bem jurídico, procedimento originário resultante de longo processo de evolução de cada povo, variando de cultura para cultura.6

1.2. Histórico sobre o estudo da criminologia

A Criminologia Clássica surgiu com o intuito de explicar as causas do crime abarcando três escolas: a Escola Clássica, a Positivista e a Sociologia Criminal. 7 Para a primeira escola o crime é fruto de uma opção racional – livre vontade do homem – determinada pelo agente, que ponderando os riscos da sua atividade, os admite para si e pratica o comportamento delituoso. Nesse contexto, a pena teria caráter punitivo e imperioso para a coibição da criminalidade. Tem como fundamental defensor Marquês de Beccaria (1738-94), um aristocrata milanês considerado o principal representante do Iluminismo Penal. 8

Para a segunda corrente (Escola Positivista), que tem como basilar divulgador Cesare Lombroso, médico italiano que viveu entre 1835-1909, autor do livro L’uomo Delinquente, e principal expoente da Antropometria Criminal, baseava-se em investigações para definir o sujeito potencialmente criminoso. A partir de estudos sobre a dimensão do crânio e do cérebro de sujeitos presos, Lombroso buscou provar a existência de um criminoso nato, cujo destino imutável era delinquir sempre que certas condições ambientais se apresentassem. Segundo o estudioso, o comportamento humano criminoso não é obra de livre-arbítrio ou opção deliberada e premeditada, mas sim de particularidades congênitas à própria pessoa do criminoso. Assim, o estudo do crime careceria se pautar na forma do criminoso, analisando-o para se chegar a uma solução categórica para a criminalidade. Para seus admiradores, a aplicação de pena seria inócua, vez que a atividade delituosa é uma enfermidade e como tal deveria ser combatida.

Para a Escola Positiva, essa doutrina é bastante estudada, sobretudo sob o prisma das vertentes Bioantropológica (que condiciona a conduta criminosa do agente à sua predisposição, estrutura orgânica), Psicodinâmica (que indica que o comportamento criminoso tem o seu nascedouro em desvios no método de socialização e de aprendizado do agente) e Psicossociológica (que estuda a conduta social de grupos, organizações e comunidades em situações do dia-a-dia). 9

A Sociologia Criminal busca esclarecer as causas do crime no próprio seio social. Para os seus simpatizantes a própria sociedade cria condições favoráveis ao aparecimento do crime e apenas uma mudança em sua origem seria útil ao domínio da criminalidade. Atualmente o enfoque a essa escola se faz pelo estudo de três teorias. A primeira, a Teoria da Desorganização Social, apoia que a criminalidade é natural da própria ruptura das estruturas sociais de controle ao crime, como os valores familiares. A segunda, Teoria da Subcultura Delinquente, estabelece que a criminalidade germine a partir da conscientização ética que torna necessária a conduta delituosa. Por fim, a Teoria da Anomia (ausência de lei) expõe o crime como algo normal e intrínseco ao funcionamento do sistema. 10

1.2.1. Escola Positiva ou Escola Italiana

Baseado na obra "O Homem Delinquente", de Cesare Lombroso, a doutrina positiva foi implantada e estabeleceu o início da criminologia científica. Lombroso utilizou-se da metodologia indutiva e empírica inerente das ciências biológicas para a análise do fenômeno criminal. Diversamente do conceito da Escola Clássica, que afirmava que os elementos exógenos e endógenos não influenciavam na conduta delituosa do indivíduo, a Escola Positiva justifica as fontes do delito tendo como base fatores biológicos e psicológicos do agente. Neste aspecto Calhau entende "que foi o grande equívoco dos positivistas, que acreditaram que poderiam descobrir uma causa biológica para o fenômeno criminal". 11

Molina12, ao citar Ferri, ensina que há diversos fatores que influenciam inteiramente no comportamento criminoso. O delito, para Enrico Ferri, não é fruto de nenhuma patologia singular (o que contraria a tese antropológica de Lombroso), senão – como qualquer outro evento natural ou social – consequência de subsídios de múltiplos fatores individuais, físicos e sociais. Apontou, assim, fatores antropológicos ou individuais (compleição orgânica do indivíduo, sua coordenação psíquica, características pessoais como raça, idade, sexo, estado civil etc.), fatores físicos ou telúricos (clima, estação do ano, temperatura etc.) e fatores sociais (densidade da população, opinião pública, famílias, moral, religião, educação, alcoolismo etc.). Abrange, pois, que a criminalidade é um fenômeno social como outros, que se rege por sua própria dinâmica […].

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Conforme o posicionamento de Lélio Calhau, os estudos da Escola Francesa de Lyon confrontam as ideias de Lombroso, pois existem diferentes fatores que colaboram à conduta delituosa.

Cezar Roberto Bitencourt, em Tratado de Direito Penal – Parte Geral, destaca que alguns valores, porém, lhe são reconhecidos. Sob o ponto de vista político-criminal, a exemplo, é razoável apoiar o fito de cautela especial, não como um fim em si próprio, mas, sim, voltada à ressocialização do sujeito durante o tempo de cumprimento da pena. Desta forma, ao mesmo tempo em que na execução da pena se cumprem os objetivos de cautela geral de advertência, com a pena privativa de liberdade busca-se a chamada reintegração do delinquente na sociedade, não sendo vista sob a perspectiva terapêutica.13

O debate sobre a prevenção especial destaca Feijoo Sánchez, está muito mais preocupado em impedir as sequelas dessocializadoras da pena privativa de liberdade (o estigma da pena, a perda de chances de trabalho, isolamento social etc.), do que propriamente com a ressocialização a qualquer custo do criminoso aprisionado. “[...] O meio social cumpre papel relevante e se junta com a predisposição criminal particular concentrada em certas pessoas. Em outras palavras: a predisposição pessoal e o meio social fazem o criminoso". 14

1.2.2. Escola Crítica

A Criminologia Crítica é um movimento que se iniciou na segunda metade do século XX, opondo-se à criminologia “tradicional”. Este modelo teve origem no trabalho de Taylor, Walton e Young, "The New Criminology", de 1973, o qual busca discutir a ordem social, investir contra os fundamentos da penalidade aplicada às minorias, e por consequência, a não punição do Estado, diferentemente da Escola Clássica, que tinha suas disciplinas voltadas ao livre arbítrio, e da Escola Positiva, que direcionou seus esforços na imagem do delinquente como base na individualidade patológica, psíquica ou moral. A criminologia crítica tem como fundamental característica o amparo de reformas estruturais na coletividade, visando à equidade e consequentemente a diminuição da criminalidade. Foi nestes aspetos que a Escola Crítica desenhou seu caminho. 15

Jason Albergaria cita Lacassagne: "A sociedade tem o criminoso que merece. É a miséria que produzirá o maior número de criminosos. As anomalias anímicas ou corporais procedem de um estado social defeituoso". Assim, o atípico não é a existência do delito, ou apenas um repentino aumento ou diminuição dos dados medianos ou das percentagens da delinquência, já que certa quantidade de delitos gera elementos fáticos a toda a coletividade e, uma sociedade livre de comportamentos desiguais significaria uma sociedade duvidosa. 16

1.2.3. Teoria do Etiquetamento

Labelling Approach ou Criminologia Interacionista – a Teoria do Etiquetamento –, tem por princípio ponderar questões primordiais da teoria e da prática criminológica, não necessitando aplicar-se ao delito e ao criminoso, mas, especificamente, ao mecanismo de comando seguido pelo Estado na área preventiva, normativa e na escolha das formas de resposta à criminalidade. São os critérios ou estruturas de seleção das instâncias de domínio que influem, e não a preferência aos motivos do crime. 17

Consoante à doutrina de Rogério Greco, "encontra suas raízes na obra de Emile Durkhein, que se referiu à construção da delinquência e a normalidade dela". Esta matéria conduz sua atenção aos procedimentos de modificação dos indivíduos em desviados ou os processos de criação dos desvios. 18 O labelling approach é considerado a doutrina de conflito. Essa teoria rompeu padrões e modificou a forma de análise do crime. Nesse período, "o foco dos estudos deixou de ser o fenômeno delitivo e passou a ponderar a reação social originada por determinado delito", conforme Calhau. 19

1.3. Cifras Criminais e a Seletividade Penal

As cifras criminais foram denominadas pelo renomado sociólogo estadunidense Edwin H. Sutherland20, que ganhou enorme notoriedade pelo desenvolvimento da Teoria Criminal da Associação Diferencial (explica a formação do comportamento criminoso apenas pelo âmbito social) e pela introdução do termo “crime do colarinho branco”, dentre outras. Sabe-se que muitos são os delitos que não chegam ao conhecimento policial em linhas gerais, outros que são praticados apenas por tipos específicos de criminosos, a exemplo do punguista contumaz, e ainda aqueles em que a vítima viabiliza o ambiente para o crime (“jogo de tampinhas”), onde, em determinados casos, talvez por vergonha, sequer chegam ao conhecimento das autoridades para o devido processamento dos boletins de ocorrência, ficando excluídos e, consequentemente, não contabilizados nas estatísticas criminais, objeto de suma importância para que se possa verificar o índice da demanda criminal, e assim dispor dos recursos necessários para que o Estado intervenha e coíba condutas criminosas. Foi desenvolvido, para cada conduta, um conceito que a distingue das demais, podendo ser classificadas da maneira mais direta, detalhando a singularidade de cada uma das cifras.

1.3.1. As especificidades das cifras na criminologia

O estudo das cifras criminais possui diversas particularidades, observando, em cada uma delas, o que lhes é designado pelas circunstâncias, vítima e autoria. Tais Cifras tiveram origem designadas pela Teoria da Associação Diferencial, Edwin H. Sutherland, demonstrando a visão da sociedade em relação aos crimes que, por desconhecimento, não se pode afirmar a existência.

Da ausência de registro resulta a diferença entre o montante de crimes praticados e o número de delitos que os órgãos do sistema penal tomam conhecimento, ou seja, existem crimes que não entram para as estatísticas consideradas oficiais da criminalidade. Os motivos dessa informalidade criminal são diversos, dentre eles a diminuição de crédito da população com o aparato do Estado, avaliado como ineficiente e burocrático, demonstrando preferir relevar os delitos sofridos e permanecer no anonimato.

1.3.1.1. Cifras Negras

Entende-se por cifra negra, também denominada cifra oculta ou zona obscura, a parcela de crimes ocorridos cotidianamente e não conhecidos das autoridades (polícias civil e militar, Ministério Público e Poder Judiciário). Talvez a de maior notoriedade, pode-se presumir que a Cifra Negra é a genitora das demais pelo fato de que englobam os conceitos de todas, sendo determinada pelos crimes que não são de conhecimento policial, seja por serem praticados por pessoas de “alto escalão” ou contra meio ambiente, além dos que, em determinados casos, chegam ao conhecimento das autoridades e, embora registrados, não alcançam o processo ou a respectiva ação penal.

Em 1835, o matemático e estatístico social Adolphe Quételet trata, pela primeira vez, do conceito de “cifra negra”. Em seu trabalho, formulou a ideia de “homem médio” entendendo ser um tipo ideal e abstrato de sujeito, visto como um padrão para diversas análises sociológicas.

Para o cientista criminólogo Louk Hulsman, o maior índice dos crimes que compõe a cifra negra é o que o próprio sistema penal menospreza ou ignora. São avaliados como corriqueiros e ponderados por agentes e vítimas como naturais, ficando em segundo plano e não compondo estatísticas. Certos delitos, de acordo com seu conceito, facilmente deixam de ser alvos da atividade estatal de prevenção e coerção, além de pessoas que, da mesma forma, não são alvos de tal atividade.21

Como crítica a este sentido, Raúl Eugenio Zaffaroni, o Ministro da Suprema Corte Argentina cita:

“Se todos os furtos, os adultérios, todos os abortos, todas as defraudações, todas as falsidades, todos os subornos, todas as lesões, todas as ameaças, etc. fossem concretamente criminalizados, praticamente não haveria habitante que não fosse, por diversas vezes, criminalizado”. 22

A partir dessa conclusão, o jurista argumenta que o mecanismo repressivo está estruturalmente edificado no sentido de que as leis não operam no caso concreto, mas que, em verdade, admite certa discricionariedade sugerida a setores sociais mais vulneráveis. Tal entendimento explicaria a maioria absoluta dos encarcerados serem originários de camadas sociais economicamente frágeis ou de segmentos discriminados e vulneráveis, o que não é um privilégio do Brasil.

1.3.1.2. Cifras Douradas

Termo criado por Edwin H. Sutherland, relaciona-se aos crimes que são praticados por pessoas do alto escalão pertencentes às camadas mais altas da sociedade, que praticam delitos, distinguindo dos demais criminosos. Na doutrina criminológica, especificamente quanto à criminalidade das classes sociais privilegiadas, faz-se alusão à chamada “cifra dourada” que representa a criminalidade de “colarinho branco”, definida como prática antissocial impune do poder político e econômico (nacional e internacionalmente), em prejuízo da coletividade e dos cidadãos.23 Fazer parte desse “auto escalão” da sociedade, onde a maioria dos delitos são fraudes, desvios de verbas públicas ou privadas, sonegações fiscais, é atuar em determinadas áreas cujos conhecimentos especializados, habilidades e informações privilegiadas, com o fim de utilizar de maneira desviante a legislação vigente em favor próprio ou alheio.

1.3.1.3. Cifras Cinza

São resultados das ocorrências que são registradas mas não se chegam ao processo ou ação penal por serem esclarecidas na própria Delegacia de Polícia, seja pela possibilidade de conciliação entre as partes, evitando futuro processo, seja por desistência da própria vítima em razão da falta de interesse na representação. Para a atuação do Delegado seja concretizada é imprescindível que atue consubstanciado ao poder discricionário, que segundo Celso Antônio Bandeira de Mello:

“margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica, diante do caso concreto, segundo critérios subjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal”. 24

Essa liberdade de atuação, dentro dos limites legais, definido como poder discricionário é que faz com que cada atuação do Delegado de Polícia seja ímpar, respeitando a peculiaridade e necessidade de cada caso concreto.

1.3.1.4. Cifras Amarelas

Cifras Amarelas referem-se às pessoas que sofreram alguma forma de violência cometida por um funcionário público e deixam de denunciar o fato aos órgãos responsáveis por medo de represália. Refere-se à hipótese de que há uma cifra amarela, um número considerável de violência praticada por policiais contra a sociedade que, por temor de retaliações, não as denunciam. Seria uma espécie de somatória entre as denúncias feitas à Corregedoria da Polícia Militar e/ou Ministério Público e o número de ações violentas cometidas pela polícia contra a sociedade e não explicitadas. 25

1.3.1.5. Cifras Verdes

Consiste nos crimes não chegam ao conhecimento policial onde a vítima direta é o meio ambiente, por exemplo, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domesticados, assim como pichações em muros, monumentos históricos e prédios públicos. Quando se nota o dano causado, consumado, há muita dificuldade em identificar a autoria por não se localizar o indivíduo no local dos fatos, restando impune pelo crime praticado.

1.3.2. Os objetos das cifras criminais da criminologia moderna

Das contribuições após a definição das diversas cifras, tornou-se possível verificar a existência de alguma falha nos dados estatísticos criminais, permanecendo, necessariamente, nesta ordem:

1. Furtos, roubos, crimes de rua e estupros representam, de maneira global, os crimes que não chegam ao conhecimento policial;

2. Sonegação fiscal, fraudes, desvios de verbas públicas e crimes próprios;

3. Crimes que até chegam ao conhecimento policial, há registro da ocorrência, porém não seguem para os tribunais por motivos alheios;

4. Crimes próprios praticados por policiais que não chegam ao conhecimento da autoridade policial, tampouco às Corregedorias, pelo fato das vítimas temerem represálias;

5. Delitos praticados contra o Meio Ambiente.

Desta forma, conclui-se que os dados estatísticos criminais oficiais poder estar contaminados por dados equivocados, constituindo em uma disparidade real, simulando uma sensação de segurança desmedida, pois ao notar que muitos são os crimes que acontecem sem que as autoridades da Segurança Pública tenham o conhecimento, isto ocasiona situações desfavoráveis à população, pela sociedade permanecer sofrendo com a criminalidade e pelo fato de as autoridades ficarem desprovidas de recursos humanos, financeiros e estratégicos, pois os dados estatísticos oficiais demonstram que a criminalidade estaria nos parâmetros demonstrados e, para tanto, que não haveria necessidade de ampliar os investimentos em tal área. 26

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Sobre o autor
André Soares de Carvalho

Advogado, Bacharel em Direito pela Faculdade Processus de Brasília/DF; Aluno pesquisador da Faculdade Processus. Atuação na área de Direito, com ênfase em Direito Público. Graduado em 2006 pela Universidade Católica de Brasília, Vigilância Sanitária.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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