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Um crime de lesão corporal grave

25/07/2016 às 10:13
Leia nesta página:

O presente artigo traça os principais aspectos relacionados ao crime de lesão corporal grave a partir da análise de caso concreto.

O empresário Rômulo Lemos foi condenado a três anos de reclusão por lesão corporal grave cometida contra a advogada Rhanna Diógenes, que teve seu braço direito quebrado por ele em 2011 numa boate de Ponta Negra, na zona Sul de Natal. Na época, a vítima tinha 19 anos e sofreu o atentado após recusar beijar o homem.

Rômulo, que teve a pena imposta pelo juiz Alceu José Cicco, deverá ficar, inicialmente, em regime aberto. Para o magistrado, a atitude do empresário foi reflexo de um “comportamento machista e antiquado”. Da decisão ainda cabe recurso.

Rhanna teve o braço quebrado em dois lugares e precisou se submeter a procedimento cirúrgico. Além da agressão contra a advogada, o empresário já respondia por outras acusações contra mulheres.

O crime de lesão corporal tem sua objetividade jurídica em ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem (artigo 129).

O dano à integridade física trazido pelo crime deve ser juridicamente apreciável. Como dano à integridade corporal entende-se a alteração anatômica ou funcional, interna ou externa que lese o corpo, como ferimentos, cortes, luxações, fraturas etc. O dano à saúde compreende a alteração seja fisiológica ou ainda a psíquica. Assim a dor física ou a crise nervosa, sem comprometimento físico ou mental, não configura lesão corporal, podendo caracterizar um crime de tortura, como bem disseram Celso Delmanto, Roberto Delmanto, Roberto Delmanto Junior, Fábio M. de Almeida Delmanto.[1]

É crime comum quanto ao sujeito, doloso, culposo (artigo 129, § 8º do Anteprojeto) ou preterdoloso (nas suas diversas figuras), comissivo ou omissivo, material, instantâneo e de resultado, sendo necessário o exame de corpo delito(artigo 158 do CPP).

Está a lesão corporal, na redação do Anteprojeto do Código Penal, na seguinte forma:

- lesão corporal grave em primeiro grau, se resulta (parágrafo primeiro): 

a) incapacidade para as ocupações habituais por mais de quinze dias;

b) dano estético ou

c)  enfermidade grave.

- lesão corporal grave em segundo grau, se resulta (parágrafo segundo):

a) perigo de vida;

b) enfermidade grave e incurável;

c) incapacidade permanente para o trabalho que a vítima exercia;

d) debilidade permanente de membro, sentido ou função ou

e) aceleração do parto.

- lesão corporal grave em terceiro grau, se resulta (parágrafo terceiro):

a) perda ou inutilização do membro;

b) aborto, desconhecendo o agente a gravidez da vítima;

c) incapacidade para qualquer trabalho ou

d) deformidade permanente.

O Código Penal em seu parágrafo primeiro registra:

Lesão corporal de natureza grave

§ 1º Se resulta:

I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

II - perigo de vida;

III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

IV - aceleração de parto:

Pena - reclusão, de um a cinco anos.

§ 2° Se resulta:

I - Incapacidade permanente para o trabalho;

II - enfermidade incuravel;

III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função;

IV - deformidade permanente;

V - aborto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

As consequências de maior gravidade previstas no parágrafo primeiro, e ainda segundo e terceiro, do artigo 129, não são elementos constitutivos de um crime autônomo de lesões corporais graves, mas, sim, condições de maior punibilidade como ensinou Heleno Cláudio Fragoso[2] ao analisar o crime de lesões corporais.

Não é necessário que esses resultados mais graves sejam dolosos. Nos casos de perigo de vida e aborto, exige-se que o agente não tenha querido, nem mesmo eventualmente, o resultado mais grave, pois cometeria outro crime (tentativa de homicídio ou aborto).

O resultado mais grave é assim imputado ao agente em vista  de seu propósito de causar ofensa física à vítima e da evidente possibilidade de resultar uma lesão mais grave de qualquer violência pessoal, aplicando-se o princípio vulnera non dantur ad mensuram.

Por certo a duração da enfermidade ou da incapacidade para o trabalho é o critério antigo para o reconhecimento da gravidade das lesões. Embora tenha sido a vadiagem o lapso de tempo adotado pelas leis penais, deve haver uma incapacidade física ou psíquica para as ocupações habituais, e não somente para o trabalho. Estamos diante de um conceito funcional.

Já o perigo de vida não se presume. Não basta que um ferimento por sua sede ou extensão, apresente, em regra, perigo de vida. Mas não basta a simples afirmação dos peritos, pois é importante que os peritos indiquem se realmente há um perigo de vida com a lesão. É indispensável que os peritos indiquem os sintomas que os determinaram (RF 205/349).

A lesão será igualmente grave se resultar debilidade permanente do membro, sentido da função. Debilidade será redução na capacidade funcional e membros, os apêndices do corpo.

A debilidade permanente deve ser estável, perene, continuada, indefinida, pelo tempo afora (RTJ 72/25).

Ainda, as razões do crime indicam que há indicativo da agravante de que foi por motivo fútil, razão por que correta a condenação.

O acusado agiu de forma totalmente desproporcional, pois investiu contra a vítima, agredindo-a, em razão de um simples desentendimento, tornando a incidência da agravante do motivo fútil imperiosa. 

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Notas

[1] DELMANTO, Celso; DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; DELMANTO, Fábio M. de Almeida. Código penal comentado, São Paulo, Renovar, 6ª edição, pág. 272.

[2] Fragoso, Heleno Cláudio. Lições de direito penal, 7º edição, parte especial, pág. 132. 

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Um crime de lesão corporal grave . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4772, 25 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50847. Acesso em: 23 dez. 2024.

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