CONCLUSÃO
Colhe-se das opiniões autorizadas trazidas á reflexão neste escorço, que a exigência da conclusão do inquérito policial para pagamento das verbas indenizatórias oriundas dos contratos de seguro figura-se como conduta flagrantemente abusiva praticada pelas seguradoras, uma vez que não havendo qualquer comprovação ou vestígio de conduta ilícita capaz de retirar do segurado ou beneficiário o direito à percepção da indenização, ultrapassa o limite da razoabilidade a imposição de tal exigência.
Além do que, é de se constatar a referida condição usualmente não se faz inserida nos contratos de seguro, e a imposição fundamentada nas cláusulas gerais dos pactos, não traz elementos técnicos ou fáticos acolhidos pelo ordenamento civil, atuando desconforme os comandos interpretativos dos artigos 28, 47 e 51, IV do Código de Defesa do Consumidor.
Oportuno relembrar que a essência do contrato de seguro reside justamente na assunção dos riscos, com interpretações restritivas de suas cláusulas.
Repete a lição a ponderação de Arnaldo Wald ao asseverar que cabe ao juiz "apreciar, em cada caso concreto, se a eventual infração do segurado é ou não suscetível de impedir o recebimento da indenização, exonerando de qualquer responsabilidade o segurador."( Curso – Obrigações e Contratos, p. 389).
A pratica abusiva adotada pelas Companhias Seguradoras merece atenção, pois sugere o descumprimento dos contratos, uma vez que, sabidamente os inquéritos policiais em razão da grande demanda de fatos investigados, deficiência técnica e de pessoal, têm os prazos para conclusão prorrogados por anos, podendo não alcançar sequer a identificação da autoria.
Ademais, visando unicamente servir de fonte de informação para o Ministério Público prosseguir no oferecimento de denúncia criminal, tendo que não havendo qualquer indício de que o segurado ou beneficiário filia-se ao ato ilícito, não há amparo legal na recusa no pronto pagamento da verba indenizatória.
Como já dito alhures, neste mesmo sentido, também não é causa de prejudicialidade para provocar a suspensão de processo civil em andamento, uma vez que não é contemplado pelo digesto processual no artigo 265.
Assim, como ressalta o Des. Henrique Carlos de Andrade Figueira na Apelação Cível nº 2002.002.27238, "a atuação da seguradora não pode de forma alguma depender da ação de terceiros para definir sobre a cobertura do Seguro. A inércia da seguradora não se justifica, até pelo fato de não encontrar amparo na lei ou no contrato."
Por fim, pode-se concluir que a conduta abusiva empreendida na execução dos contratos merece ser afastada da prática adotada pelas Seguradoras, merecendo atenção dos julgadores na interpretação dos contratos de seguro e demais órgãos de fiscalização diante da conduta lesiva que aniquila a finalidade dos contratos da espécie sob pena de se fomentar o enriquecimento ilícito.
BIBLIOGRAFIA
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, Orlando, "Contratos", 16ª edição, 1995, Rio de Janeiro, Editora ForenseMARTINS,
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, Julio Fabbrini, "Processo Penal"1996, São Paulo, Ed. Atlas.RANGEL
, Paulo, "Direito Processual Penal", 4ª edição, 2001, Rio de Janeiro, Ed. Lumen Juris.Notas
1 Contrato de direito marítimo da época da Antigüidade.
2 Seria inerente ao ser humano que está passando por dificuldades, fundado no sentimento de auto-preservação.
3 Classificação conforme Pedro Alvim, in "O contrato de Seguro" – 3ª edição, 1999, Ed. Forense.
4 São características do contrato: a) ser bilateral; b) aleatório ( o ganho ou perda depende de evento futuro e incerto – o risco); c) consensual ( é consensual, porque pode ser comprovado por outros meios: correspondência epistolar, lançamento contábil etc., não apenas pelo recibo de pagamento do prêmio).- in "Curso de Direito Civil – Contratos" Luiz Roldão de Freitas Gomes, pag. 314, Ed. Renovar, 2002.
5 GOMES, Orlando, in "Contratos "16ª edição, 1995, Editora Forense, pág. 411.
6 JÚNIOR, Nelson Nery, in "Código de Processo Civil Comentado"2ª edição.1996. Ed. Revista dos Tribunais.
7 RANGEL, Paulo, in "Direito Processual Penal", 4ª edição, 2001, ED. Lumen Juris, pág. 57.
8 MARTINS, Pedro Baptista, in"O Abuso do Direito e o Ato Ilícito" 3ª edição, 2002, Ed. Forense, pág. 92.
9 NEVES, Castanheira "Questão de facto- Questão de Direito, I, pág. 513 e segs. Apud FREITAS, LuizRoldão de, "Curso de Direito Civil, Novos Contratos e o Atual Código Civil", ed. Renovar, 2002, pág.21