8. DOS DIREITOS INDIVIDUAIS DO ADOLESCENTE EM CUMPRIMENTO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
O adolescente, quando submetido ao cumprimento de medidas socioeducativas é sujeito ativo de direitos inerentes a sua condição de menor infrator. Tais direitos buscam a sua proteção, de forma a obedecer ao comando constitucional de tratamento prioritário àqueles seres humanos que possuem a condição peculiar de ainda estarem em desenvolvimento físico, psicológico, moral e social. É por este motivo que se exige trato especial, no tocante os direitos, cujo caráter é indisponível, assegurados aos adolescentes submetidos a alguma medida socioeducativa. Frisa-se que a decisão judicial relativa à execução de medida socioeducativa apenas será proferida após manifestação do defensor e do Ministério Público. O rol de direitos do adolescente infrator encontra-se disposto do artigo 49 e seguintes do SINASE.
Um dos direitos indisponíveis do adolescente, quando submetido a uma medida socioeducativa, é o acompanhamento por seus pais ou responsável e por seu defensor, em qualquer fase do procedimento administrativo ou judicial. Isto assegura a ampla defesa do menor, evitado abusos e violências bem como impõe a presença da família em todo o procedimento pelo qual perpassa o menor, atuando também como instrumento essencial e auxiliar à reestruturação e ressocialização do adolescente.
Além disso, é direito do adolescente ser incluído em programa de meio aberto quando inexistir vaga para o cumprimento de medida de privação da liberdade, exceto nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa, quando o adolescente deverá ser internado em Unidade mais próxima de seu local de residência. Tal direito reflete o fato de que o adolescente não pode ter punição mais grave do que aquela referente, de forma proporcional, à infração cometida, atuando tal direito como medida de justiça. Nesse sentido, a oferta irregular de programas de atendimento socioeducativo em meio aberto não poderá ser invocada como motivo para aplicação ou manutenção de medida de privação da liberdade.
Com efeito, é importante mencionar que a direção do programa de execução de medida de privação da liberdade poderá autorizar a saída, monitorada, do adolescente nos casos de tratamento médico, doença grave ou falecimento, devidamente comprovados, de pai, mãe, filho, cônjuge, companheiro ou irmão, com imediata comunicação ao juízo competente.
O adolescente também deve ser respeitado em sua personalidade, intimidade, liberdade de pensamento e religião e em todos os direitos não expressamente limitados na sentença que estabelecer a medida socioeducativa. Ademais, tem o direito de peticionar, por escrito ou verbalmente, diretamente a qualquer autoridade ou órgão público, devendo, obrigatoriamente, ser respondido em até 15 (quinze) dias, fato que reflete a prioridade de atendimento conferido pela própria Magna Carta em seu artigo 227.
Outrossim, deve o adolescente ser informado, inclusive por escrito, das normas de organização e funcionamento do programa de atendimento e também das previsões de natureza disciplinar, as quais será submetido. Também é direito do infrator receber, sempre que solicitar, informações sobre a evolução de seu plano individual, participando, obrigatoriamente, de sua elaboração e, se for o caso, reavaliação, para aplicação de medida menos gravosa sempre que possível. Por fim, também é direito do menor receber assistência integral à sua saúde, bem como ter atendimento garantido em creche e pré-escola aos seus filhos de 0 (zero) a 5 (cinco) anos.
9. DO PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO (PIA)
O cumprimento das medidas socioeducativas, em regime de prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade ou internação, dependerá de Plano Individual de Atendimento (PIA), instrumento de previsão, que tem por objetivo o registro e gestão das atividades a serem desenvolvidas com o adolescente. O PIA deverá contemplar a participação dos pais ou responsáveis, os quais têm o dever de contribuir com o processo ressocializador do adolescente, sendo esses passíveis de responsabilização administrativa, conforme art. 249 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), civil e criminal. O PIA tem suas disposições contidas nos artigos 52 a 59 do SINASE.
O Plano Individual de Atendimento será elaborado sob a responsabilidade da equipe técnica do respectivo programa de atendimento, com a participação efetiva do adolescente e de sua família, representada por seus pais ou responsável. São requisitos mínimos do PIA os resultados da avaliação interdisciplinar; os objetivos declarados pelo adolescente; a previsão de suas atividades de integração social e/ou capacitação profissional; atividades de integração e apoio à família; as formas de participação da família para efetivo cumprimento do plano individual; e as medidas específicas de atenção à sua saúde.
No que concerne ao cumprimento das medidas de semiliberdade ou de internação, pelo adolescente infrator, o PIA será diferenciado, até mesmo pela maior gravidade da medida socioeducativa. Além dos requisitos supramencionados, o plano individual conterá, ainda a designação do programa de atendimento mais adequado para o cumprimento da medida; a definição das atividades internas e externas, individuais ou coletivas, das quais o adolescente poderá participar; e fixação das metas para o alcance de desenvolvimento de atividades externas, como dispõe o artigo 55 do SINASE.
Quanto ao procedimento, tem-se que, em regra geral, o Plano Individual de Atendimento (PIA) deve ser elaborado no prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias, contados da data do ingresso do adolescente infrator no programa de atendimento. No entanto, no que concerne ao cumprimento das medidas de prestação de serviços à comunidade e de liberdade assistida o PIA será elaborado no prazo de até 15 (quinze) dias contados do ingresso do adolescente infrator no programa de atendimento. O acesso ao plano individual será restrito apenas aos servidores do respectivo programa de atendimento, ao adolescente e a seus pais ou responsável, ao Ministério Público e ao defensor, ressalvadas as expressa autorizações judiciais. Tal restrição objetiva a manutenção da intimidade e da proteção do menor.
Conforme o artigo 57 da SINASE, para que haja a elaboração do PIA, a direção do respectivo programa de atendimento, pessoalmente ou por meio de membro da equipe técnica, terá acesso aos autos do procedimento de apuração do ato infracional e aos dos procedimentos de apuração de outros atos infracionais atribuídos ao mesmo adolescente. O acesso à tais documentos deverá ser realizado por funcionário da entidade de atendimento, devidamente credenciado para tal atividade, ou por membro da direção, em conformidade com as normas a serem definidas pelo Poder Judiciário, de forma a preservar o que determinam os arts. 143. e 144 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Além disso, a direção poderá requisitar também ao estabelecimento de ensino, o histórico escolar do adolescente e as anotações sobre o seu aproveitamento; os dados sobre o resultado de medida anteriormente aplicada e cumprida em outro programa de atendimento; e os resultados de acompanhamento especializado anterior. É importante mencionar que, havendo reavaliação da medida socioeducativa aplicada, é obrigatória a apresentação pela direção do programa de atendimento, o relatório da equipe técnica sobre a evolução do adolescente no cumprimento do plano individual.
10. DA ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADOLESCENTE EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA – DISPOSIÇÕES GERAIS
A atenção integral à saúde do adolescente compõe direito indisponível deste, previsto na própria Magna Carta, constituindo uma garantia fundamental do menor, não podendo, portanto, ser suprimido pelo Poder Público. No que concerne ao adolescente submetido ao Sistema de Atendimento Socioeducativo a atenção integral à saúde deverá seguir diretrizes específicas, tais como as mencionadas no artigo 60 do SINASE, in verbis:
Art. 60. A atenção integral à saúde do adolescente no Sistema de Atendimento Socioeducativo seguirá as seguintes diretrizes:
I - previsão, nos planos de atendimento socioeducativo, em todas as esferas, da implantação de ações de promoção da saúde, com o objetivo de integrar as ações socioeducativas, estimulando a autonomia, a melhoria das relações interpessoais e o fortalecimento de redes de apoio aos adolescentes e suas famílias;
II - inclusão de ações e serviços para a promoção, proteção, prevenção de agravos e doenças e recuperação da saúde;
III - cuidados especiais em saúde mental, incluindo os relacionados ao uso de álcool e outras substâncias psicoativas, e atenção aos adolescentes com deficiências;
IV - disponibilização de ações de atenção à saúde sexual e reprodutiva e à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis;
V - garantia de acesso a todos os níveis de atenção à saúde, por meio de referência e contrarreferência, de acordo com as normas do Sistema Único de Saúde (SUS);
VI - capacitação das equipes de saúde e dos profissionais das entidades de atendimento, bem como daqueles que atuam nas unidades de saúde de referência voltadas às especificidades de saúde dessa população e de suas famílias;
VII - inclusão, nos Sistemas de Informação de Saúde do SUS, bem como no Sistema de Informações sobre Atendimento Socioeducativo, de dados e indicadores de saúde da população de adolescentes em atendimento socioeducativo; e
VIII - estruturação das unidades de internação conforme as normas de referência do SUS e do Sinase, visando ao atendimento das necessidades de Atenção Básica.6
As entidades que ofereçam programas de atendimento socioeducativo em meio aberto e de semiliberdade deverão prestar orientações aos socioeducandos sobre o acesso aos serviços e às unidades do SUS. Por outro lado, as entidades que ofereçam programas de privação de liberdade deverão contar com uma equipe mínima de profissionais de saúde cuja composição esteja em conformidade com as normas de referência do Sistema Único de Saúde.
Conforme preleciona o artigo Art. 63§ 1º do SINASE, o filho de adolescente nascido nos estabelecimentos relacionados ao cumprimento de medidas socioeducativas não terá tal informação lançada em seu registro de nascimento. Além de que, serão asseguradas as condições necessárias para que a adolescente mãe submetida à execução de medida socioeducativa de privação de liberdade permaneça com o seu filho durante o período de amamentação, como dispõe o artigo §2º do mesmo dispositivo legal.
No que se refere ao atendimento de adolescente com transtorno mental e com dependência de álcool e de substância psicoativa, em cumprimento de medida socioeducativa, tem-se que este deve ser avaliado por equipe técnica multidisciplinar e multissetorial, em virtude de seu peculiar estado de saúde físico e mental. Tal avaliação subsidiará a elaboração e execução da terapêutica a ser adotada, a qual será incluída no Plano Individual de Atendimento do adolescente, prevendo, se necessário, ações voltadas para a família. Ressalte-se que as informações produzidas na referida avaliação são consideradas sigilosas.
Nos termos do artigo 64 §4ª do SINASE, de forma excepcional, o juiz poderá suspender a execução da medida socioeducativa, ouvidos o defensor e o Ministério Público, com vistas a incluir o adolescente em programa de atenção integral à saúde mental que melhor atenda aos objetivos terapêuticos estabelecidos para o seu caso específico. Uma vez suspensa a execução da medida socioeducativa, o juiz designará o responsável por acompanhar e informar sobre a evolução do atendimento ao adolescente. Tal suspensão será avaliada, no mínimo, a cada 6 (seis) meses. Por fim, é importante mencionar que enquanto não cessada a jurisdição da Infância e Juventude, a autoridade judiciária, nas hipóteses tratadas no art. 64. da SINASE, poderá remeter cópia dos autos ao Ministério Público para eventual propositura de interdição e outras providências pertinentes.
11. DAS VISITAS A ADOLESCENTE EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA DE INTERNAÇÃO
Dentre os artigos 67 a 70, é assegurado o direito a visita a adolescente em cumprimento de medida de internação. Assim, ele pode receber visita de cônjuge, companheiro, pais ou responsáveis, parentes, amigos, bem como, de seu filho. É assegurado, inclusive, o direito a visita íntima.
O direito a visita é de extrema importância, pois assegura ao adolescente o contato com sua família, com o fito de preservar e fortalecer os vínculos familiares.
Tal direito se encontra preceituado na própria Lei nº 12.594/2012, no art. 35, IX, como também se encontra expressamente estabelecido pela ECA em seu artigo 100, caput e parágrafo único, incisos IX e X e artigo 124, VII.
Ademais, como máxima constitucional, o direito a convivência familiar é contemplado no artigo 127 da Constituição Federal:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Por fim, com o intuito de assegurar o direito a convivência familiar de maneira adequada e segura, a Lei do SINASE estabeleceu o necessário registro e identificação do visitando, nas visitas íntimas. Caberá, ainda, ao regulamento interno estabelecer as hipóteses de proibição de entrada de objetos na unidade de internação.
12. DOS REGIMES DISCIPLINARES
A lei nº 12.594/2012, em seus artigos 71 a 75, estipula diretrizes gerais sobre as medidas disciplinares a estarem previstas nos regimentos internos nas entidades de atendimento socioeducativo.
Assim, cada regimento interno deverá realizar a previsão de regime disciplinar que obedeça aos seguintes princípios: tipificação explícita das infrações como leves, médias e graves e determinação das correspondentes sanções; exigência da instauração formal de processo disciplinar para a aplicação de qualquer sanção, garantidos a ampla defesa e o contraditório; obrigatoriedade de audiência do socioeducando nos casos em que seja necessária a instauração de processo disciplinar; sanção de duração determinada; enumeração das causas ou circunstâncias que eximam, atenuem ou agravem a sanção a ser imposta ao socioeducando, bem como os requisitos para a extinção dessa; enumeração explícita das garantias de defesa; garantia de solicitação e rito de apreciação dos recursos cabíveis e apuração da falta disciplinar por comissão composta por, no mínimo, 3 (três) integrantes, sendo 1 (um), obrigatoriamente, oriundo da equipe técnica.
Percebe-se que a aplicação de tais princípios coadunam com princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório, devido processo legal e anterioridade. Assim, os artigos 74 e 75 do dispositivo estabelecem que não será aplicada sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar e o devido processo administrativo, bem como, não será aplicada sanção disciplinar ao socioeducando que tenha praticado a falta por coação irresistível ou por motivo de força maior ou em legítima defesa, própria ou de outrem.
Ademais, o regime disciplinar é independente da responsabilidade civil ou penal que advenha do ato cometido e nenhum socioeducando poderá desempenhar função ou tarefa de apuração disciplinar ou aplicação de sanção nas entidades de atendimento socioeducativo, como preceituam os artigos 72 e 73 da Lei n.º 12.594/2012.