A jurisprudência do STJ sobre prática abusiva no CDC

15/08/2016 às 10:59
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Na seção IV do Capítulo V do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), encontram-se previstas as denominadas práticas comerciais abusivas ou somente “práticas abusivas”, objeto de estudo do presente trabalho.

1. INTRODUÇÃO

Na seção IV do Capítulo V do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), encontram-se previstas as denominadas práticas comerciais abusivas ou somente “práticas abusivas”, objeto de estudo do presente trabalho.

Como é cediço, o microssistema formado pelo CDC objetiva a tutela, na relação consumerista, da parte considerada mais fraca (hipossuficiente) comparada a outra. No caso, o pólo contemplado com a predita tutela pertence ao consumidor.

Noutro giro verbal, infere-se que a relação consumerista é pautada de modo a configurar a posição de inferioridade do consumidor em face ao poder econômico do fornecedor, o que, per si, necessita de regulação legal.

Dessa forma, são objetivamente consideradas abusivas algumas condutas imputadas ao fornecedor, condutas estas insertas a teor do art. 39 do CDC.

Para complementar o estudo do instituto jurídico das práticas abusivas, analisar-se-á a aplicação do dispositivo legal alhures mencionado pelo Tribunal da Cidadania, o Superior Tribunal de Justiça.

2. CONCEITO-CHAVE DE PRÁTICAS ABUSIVAS

As práticas abusivas são condutas que causam um maior desequilíbrio existente entre o fornecedor e consumidor na relação consumerista.  

Como normas de ordem pública, as vedações impostas pelo art. 39 do CDC não podem, sob hipótese alguma, ser afastadas pela livre vontade das partes. Neste passo, elas objetivam proteger a esfera patrimonial ou não patrimonial do indivíduo.

Para Neves e Tartuce (2014, p. 276), as práticas abusivas encerradas pelo art. 39 são assim conceituadas:

Deve-se entender que constitui prática abusiva qualquer conduta ou ato em contradição com o próprio espírito da lei consumerista. Como bem leciona Ezequiel Morais, “prática abusiva, em termos gerais, é aquela que destoa dos padrões mercadológicos, dos usos e costumes (incs. II e IV, segunda parte, do art. 39 e art. 113 do CC/2002) e da razoável e boa conduta perante o consumidor”. Lembre-se de que, para a esfera consumerista, servem como parâmetros os conceitos que constam do art. 187 do CC/2002: o fim social e econômico, a boa-fé objetiva e os bons costumes, em diálogo das fontes. Há claro intuito de proibição, pelo que enuncia o caput do preceito do CDC, a saber: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas”. Na esteira do tópico anterior, a primeira consequência a ser retirada da vedação é a responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos ou prestador de serviços. Além disso, deve-se compreender o art. 39 do CDC como em um diálogo de complementaridade em relação ao art. 51 da mesma norma. Deve haver, assim, um diálogo das fontes entre as normas da própria Lei Consumerista. Nesse contexto de conclusão, se uma das situações descritas pelo art. 51 como cláusulas abusivas ocorrer fora do âmbito contratual, presente estará uma prática abusiva. Por outra via, se uma das hipóteses descritas pelo art. 39 do CDC constituir o conteúdo de um contrato, presente uma cláusula abusiva. Em suma, as práticas abusivas também podem gerar a nulidade absoluta do ato correspondente.

Dessa forma, são práticas abusivas as condutas dos fornecedores que desvirtuem os padrões de boa conduta nas relações de consumo, excedendo os limites da boa-fé.

Por derradeiro, impende destacar que, segundo Garcia (2013), as práticas abusivas encerradas no art. 39 nele não se esgotam, pois o rol seria meramente exemplificativo (numerus apertus).

Para Neves e Tartuce (2014, p. 276), o instituto em comento constitui-se, em sua essência, como um abuso de direito:

O art. 39 da Lei 8.078/1990 tipifica, mais uma vez em rol exemplificativo ou numerus apertus, uma série de situações tidas como ensejadoras do abuso de direito consumerista. Muitas das hipóteses ali descritas são bem comuns na contemporaneidade, sem excluir outras que surgirem pela evolução das relações negociais. Deve-se entender que constitui prática abusiva qualquer conduta ou ato em contradição com o próprio espírito da lei consumerista. Como bem leciona Ezequiel Morais, “prática abusiva, em termos gerais, é aquela que destoa dos padrões mercadológicos, dos usos e costumes (incs.II e IV, segunda parte, do art. 39 e art. 113 do CC/2002) e da razoável e boa conduta perante o consumidor”.

3. O ART. 39 DO CDC E ALGUNS PRECEDENTES DO STJ SOBRE ALGUMAS PRÁTICAS ABUSIVAS

O art. 39 do CDC assim dispõe:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;

III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;

 IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

VI - executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes;

 VII - repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos;

VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro);

IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais; (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. (Incluído pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério. (Incluído pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

XIII - aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido. (Incluído pela Lei nº 9.870, de 23.11.1999)

 Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.

O inciso inicial desse dispositivo contempla a vedação da venda casada ao consumidor. Essa conduta consiste em condicionar o fornecimento de certo produto a aquisição de outro (BRAGA NETTO, 2012).

O Colendo STJ, sobre o tema, já se posicionou favoravelmente á configuração da venda casada pelo fornecedor que, ao vender seu produto, condiciona-o á aquisição de seguro, conforme ementa exemplificativa abaixo:

DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO COM GARANTIA FIDEJUSSÓRIA. OBRIGAÇÃO DE FIRMAR CONTRATO DE SEGURO. CONTRATAÇÃO COMPULSÓRIA POR INTERMÉDIO DA FINANCEIRA. SUBTRAÇÃO DO CONSUMIDOR DA POSSIBILIDADE DE PROCURAR OUTROS CONTRATANTES PARA PACTUAR SEGURO MENOS ONEROSO. VENDA CASADA. I - Admitir a alegação da agravante de que o agravado aderiu espontaneamente ao seguro impõe o reexame das provas que levaram o Tribunal de origem a concluir que o último, na verdade, não teve escolha e foi tolhido em sua liberdade de escolher contratante que oferecesse proposta menos onerosa. Aplicação da Súmula STJ/7. Agravo Regimental improvido.

(STJ - AgRg no Ag: 1029125 RJ 2008/0059920-4, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 22/02/2011, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/02/2011)

A segunda hipótese prevista pelo artigo 39 inciso I, que regulamenta venda casada no CDC, é aquela que o fornecedor exige que se adquira uma quantidade mínima do produto. Em 2011, o STJ pacificou o entendimento de que nos condomínios em que o total de água consumida é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança do valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de unidades residenciais (Resp 1.166.561).

No inciso II do retrocitado, art. 39 encontra-se a prática abusiva consistente na recusa de contratar pelo fornecedor.

Desse modo, não pode o fornecedor em razão dos riscos da atividade negocial pretender selecionar consumidor com quem vai contratar, quer pelo fato de não ter gostado da aparência deste, quer em razão de o vulnerável pretender adquirir ou contratar em pequena quantidade.

Sobre o tema, veja-se esse precedente do STJ que fixou o dever de indenizar pela recusa imotivada de contratação de serviços pelo fornecedor:

PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS TURMA RECURSAL DA COMARCA DA CAPITAL RECURSO Nº 0004776-05.2014.8.19.0210 VOTO - Alegação do Autor de que a Ré se recusa, sem justo motivo, a celebrar com ele contrato de serviço de tv por assinatura. Pleito de condenação da Ré à prestação do referido serviço e de indenização de dano moral. Sentença às fls. 17 que julga improcedentes os pedidos. Recurso do Autor, às fls. 44/49, requerendo procedência dos pedidos. Relação de consumo. Responsabilidade objetiva. Verossimilhança nas alegações do Autor/Recorrente com base no documento de fls. 12/13, que demonstra a recusa da Ré/Recorrida em prestar o serviço em comento, sob a alegação de que o Autor possui baixa pontuação em seu perfil junto à prestadora. Ré/Recorrida que, contudo, não comprova a referida restrição, não logrando êxito em comprovar fato modificativo ou extintivo do direito do autor, nem a inexistência de falha em sua atuação (art. 14, § 3º, I da Lei 8.078/90). Ônus que lhe incumbia. Falha caracterizada. Conduta abusiva e discriminatória nas relações de consumo que é vedada pelo art. 39, IX da lei 8.078/90. Obrigação de contratar que é inerente ao princípio da igualdade, devendo o serviço ser prestado a qualquer consumidor interessado que se prontifique a efetuar o pagamento, não havendo que se falar, nesta hipótese, em autonomia privada que autorize o fornecedor a direcionar o consumo apenas para pessoas de sua preferência. Recusa que se revela prática abusiva (art. 39, II da lei 8.078/90). Dever de indenizar. Preponderância do viés punitivo e pedagógico que norteiam a reparação moral. Arbitramento que se mostra justo no valor de R$2.000,00. FACE AO EXPOSTO, VOTO NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AO RECURSO, PARA: 1- CONDENAR A RÉ A EFETUAR A ASSINATURA DO SERVIÇO DE TV A CABO, DENOMINADO OI TV, NO PLANO DE ESCOLHA DO AUTOR, NO PRAZO DE 05 DIAS, A CONTAR DESTA DATA, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA DE R$ 300,00; E 2- FIXAR O VALOR DA INDENIZAÇÃO DE DANO MORAL À QUANTIA DE R$2.000,00, ACRESCIDA DE JUROS DE 1% AO MÊS, CONTADOS DESTA DATA, DEVIDAMENTE CORRIGIDA A PARTIR DESTA DATA. FICA AINDA INTIMADA A SUCUMBENTE A PAGAR O VALOR DA CONDENAÇÃO NO PRAZO DE 15 DIAS A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DO ACÓRDÃO, INDEPENDENTEMENTE DE NOVA INTIMAÇÃO, SOB PENA DE MULTA DE 10% PREVISTA NO ARTIGO 475-J DO CPC, COM REDAÇÃO DA LEI 11.232/05 E NOS TERMOS DO COMUNICADO Nº 06 DO VIII ENCONTRO DE JUÍZES DE JUIZADOS E TURMAS RECURSAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. HONORÁRIOS DE 20% SOBRE A CONDENAÇÃO E CUSTAS. Rio de Janeiro, 09 de abril 2015. PAULO ROBERTO SAMPAIO JANGUTTA JUIZ DE DIREITO RELATOR 0004776-05.2014.8.19.0210 1 0004776-05.2014.8.19.0210

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(TJ-RJ - RI: 00047760520148190210 RJ 0004776-05.2014.8.19.0210, Relator: PAULO ROBERTO SAMPAIO JANGUTTA, Quinta Turma Recursal, Data de Publicação: 24/04/2015 00:00)

Já sobre a conduta constante especificamente do inciso III do art. 39 do CDC, Bolzan (2013, p. 735) assevera que:

Trata-se de comportamento abusivo, despido de qualquer justificativa e merecedor da consequência que equipara o produto ou o serviço fornecido nestes termos a amostras grátis. Assim, no caso do recebimento de um cartão de crédito sem solicitação, geralmente acompanhado de uma carta do gerente do banco, parabenizando-o pela contratação do serviço, não haverá a necessidade de pagar a anuidade. Claro que se o consumidor utilizar o citado serviço de crédito terá que pagar a fatura respectiva e não poderá invocar a consequência do parágrafo único do art. 39, sob pena de violar o princípio da boa-fé objetiva, que também deverá ser cumprido pelo vulnerável, por nortear toda a relação de consumo.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou uma nova súmula, a de número 532, que assevera constituir prática comercial abusiva o envio de cartão de crédito sem prévia e expressa solicitação do consumidor, sendo passível, inclusive, de indenização:

Súmula 532: Constitui prática comercial abusiva o envio de cartão de crédito sem prévia e expressa solicitação do consumidor, configurando-se ato ilícito indenizável e sujeito à aplicação de multa administrativa.

(grifos adicionados)

A súmula 532, neste passo, é fruto e síntese de entendimentos consolidados nos julgamentos do tribunal, como o transcrito abaixo:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ENVIO DE CARTÃO DE CRÉDITO NÃO SOLICITADO E DE FATURAS COBRANDO ANUIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. I - Para se presumir o dano moral pela simples comprovação do ato ilícito, esse ato deve ser objetivamente capaz de acarretar a dor, o sofrimento, a lesão aos sentimentos íntimos juridicamente protegidos. II - O envio de cartão de crédito não solicitado, conduta considerada pelo Código de Defesa do Consumidor como prática abusiva (art. 39, III), adicionado aos incômodos decorrentes das providências notoriamente dificultosas para o cancelamento cartão causam dano moral ao consumidor, mormente em se tratando de pessoa de idade avançada, próxima dos cem anos de idade à época dos fatos, circunstância que agrava o sofrimento moral. Recurso Especial não conhecido. (REsp 1.061.500/RS, Relator Ministro SIDNEI BENETI. TERCEIRA TURMA, DJe de 20.11.2008).

Por sua vez, o inciso IV do art. 39 elenca prática abusiva consistente no aproveitamento da fraqueza ou da ignorância do consumidor no mercado de consumo, em especial aquelas praticadas pelo fornecedor de planos e seguros de saúde (BOLZAN, 2013). Como o tema é recorrente na jurisprudência superior, o STJ já editou súmulas sobre a questão: Súmula 302: “É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado”; Súmula 469: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde”.

Em destaque, segue a jurisprudência abaixo transcrita:

DIREITO CIVIL. PLANOS DE SAÚDE. COBERTURA. LIMITAÇÃO CONTRATUAL/ESTATUTÁRIA AO NÚMERO DE SESSÕES DE QUIMIOTERAPIA. IRRETROATIVIDADE DA LEI N. 9.656/98. RELAÇÃO DE CONSUMO. NATUREZA JURÍDICA DA ENTIDADE. DESINFLUÊNCIA. ABUSIVIDADE DA RESTRIÇÃO.

I — “A relação de consumo caracteriza-se pelo objeto contratado, no caso a cobertura médico-hospitalar, sendo desinfluente a natureza jurídica da entidade que presta os serviços, ainda que se diga sem caráter lucrativo, mas que mantém plano de saúde remunerado” 738/1013 REsp 469.911/SP, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJe 10-3- -2008).

II — Reconhecida a incidência do Código de Defesa do Consumidor, impende reconhecer, também, a abusividade da cláusula contratual/estatutária que limita a quantidade de sessões anuais de rádio e de quimioterapia cobertas pelo plano. Aplicação, por analogia, da Súmula 302/STJ. Recurso Especial a que se nega provimento (REsp 1.115.588/SP, Rel. Ministro Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 16-9-2009).

Explicando a prática abusiva constante do inciso x, Bolzan (2013, p. 752) pontua que:

Prática comumente encontrada no mercado de consumo é aquela em que o fornecedor cobra um preço a maior se o pagamento feito pelo consumidor for realizado por meio de cartão de crédito, ou, a contrario sensu, quando concede um “desconto” se o pagamento for em dinheiro. Ambas as situações, em nossa opinião, configuram práticas abusivas violadoras do dispositivo do CDC ora em análise.

O STJ, sobre a reincidente prática desse viés pelas administradoras dos cartões de crédito, entende que:

RECURSO ESPECIAL — AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO — COBRANÇA DE PREÇOS DIFERENCIADOS PARA VENDA DE COMBUSTÍVEL EM DINHEIRO, CHEQUE E CARTÃO DE

CRÉDITO — PRÁTICA DE CONSUMO ABUSIVA — VERIFICAÇÃO — RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

I — Não se deve olvidar que o pagamento por meio de cartão de crédito garante ao estabelecimento comercial o efetivo adimplemento, já que, como visto, a administradora do cartão se responsabiliza integralmente pela compra do consumidor, assumindo o risco de crédito, bem como de eventual fraude;

II — O consumidor, ao efetuar o pagamento por meio de cartão de crédito (que só se dará a partir da autorização da emissora), exonerase, de imediato, de qualquer obrigação ou vinculação perante o fornecedor, que deverá conferir àquele plena quitação. Está-se, portanto, diante de uma forma de pagamento à vista e, ainda, pro soluto (que enseja a imediata extinção da obrigação); III — O custo pela disponibilização de pagamento por meio do cartão de crédito é inerente à própria atividade econômica desenvolvida pelo empresário, destinada à obtenção de lucro, em nada se referindo ao preço de venda do produto final. Imputar mais este custo ao consumidor equivaleria a atribuir a este a divisão de gastos advindos do próprio risco do negócio (de responsabilidade exclusiva do empresário), o que, além de refugir da razoabilidade, destoa dos ditames legais, em especial do sistema protecionista do consumidor; IV — O consumidor, pela utilização do cartão de crédito, já paga à administradora e emissora do cartão de crédito taxa por este 752/1013 serviço (taxa de administração). Atribuir-lhe ainda o custo pela disponibilização de pagamento por meio de cartão de crédito, responsabilidade exclusiva do empresário, importa onerá-lo duplamente (bis in idem) e, por isso, em prática de consumo que se revela abusiva; V — Recurso Especial provido (REsp 1.133.410/RS, Rel. Ministro Massami Uyeda, 3ª T., DJe 7-4-2010).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando a hipossuficiência do consumidor nas relações consumeristas, faz-se mister a tutela do ordenamento jurídico pátrio das aludidas práticas abusivas, quanto mais se considerarmos que elas estão cada vez mais presentes nas atividades de grandes empresas.

Em virtude do consumidor de produto/serviço ter pouco conhecimento sobre seus direitos, torna-se um alvo fácil das empresas que agem de má-fé, muitas vezes submetendo-os a, obrigatoriamente ou não, a incorrer em práticas que os desigualam.

 Deste modo, o consumidor, por falta de conhecimento, e por muitas vezes, pelo fato da empresa não assistir o direito de informação que confere aquele, acaba lesando o consumidor.

Nesse diapasão, na aplicação do art. 39 pelo Superior Tribunal de Justiça, muitas vezes é necessário, como visto, a imputação de indenização do fornecedor ao consumidor para equilibrar essa situação, punindo aqueles que incorrem nas práticas abusivas. 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Fabrício Bolzan de. Direito do consumidor esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2013.

BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Manual de Direito do Consumidor. 7ª Ed. Salvador: Editora, JusPodivm, 2012.

GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: Código Comentado e Jurisprudência. 10ª Ed. Salvador: Editora, JusPodivm, 2013.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção; TARTUCE, Flávio. Manual de direito do consumidor: direito material e processual. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.

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Sobre a autora
Thaylindre Coelho Torres

Acadêmica do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão – UFMA.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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