Tutela do Ministério Público sobre os direitos coletivos do consumidor

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23/09/2016 às 00:37
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8. CONSIDERAÇÕES SOBRE AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Mister se faz tratar sobre a ação civil pública, vez que o IC pode culminar em na sua propositura.

A lei Federal nº 7347/85 disciplina a ação.

Ao contrário do inquérito civil, o Ministério Público não é o único legitimado ativo para propor a ACP.

A sua finalidade é buscar reparação dos danos morais e patrimoniais a interesses difusos e coletivos. Excepcionalmente um direito individual homogêneo pode ser tutelado quando esta for a forma para que indiretamente se possa defender um interesse difuso ou coletivo.

A ação civil pública tem por objetivos prevenir, reparar e ressarcir os danos causados a interesses metaindividuais, nesta ordem de importância, vez que são extremamente relevantes para a sociedade e são indisponíveis; é melhor evitar o dano, porque almejar reparação significa que ele já foi causado. Não obstante, os três objetivos podem coexistir em determinada situação.

A ação deve ser proposta no local onde ocorreu o dano, a ser julgada pelo juiz do local, isto porque, teoricamente, o magistrado do local resguarda melhor os interesses da comunidade, tendo em vista que poderá avaliar melhor o prejuízo e colher provas com mais presteza.

Nas ações que figurem a união, suas autarquias ou empresas públicas, competente será o juiz federal que exerce jurisdição sobre o local onde ocorreu ou deveria ocorrer o dano.

O artigo 5º da Lei de Ação Civil Pública arrola os seguintes legitimados ativos: Ministério Público; Defensoria Pública; União, Estados, Distrito Federal e Municípios; autarquias; empresas públicas; fundações; sociedades de economia mista e associações civis.

8.1. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O artigo 129, III da CF/88 preconiza ser função institucional do MP “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

Ao Ministério Público não cabe condenação ao pagamento de verbas sucumbenciais.

Cumpre afiançar que o MP não possui legitimidade ativa para a tutela de todo e qualquer interesse metaindividual. O direito dever ser indisponível. O Parquet não atuará em defesa de um interesse disponível, como no caso de um condomínio com problemas no fornecimento de energia elétrica.

Desta maneira, o MP somente poderá ingressar no Judiciário com a ação civil pública em defesa de interesses difusos ou coletivos indisponíveis,

No campo dos interesses difusos todos podem ser tutelados pelo MP, pois em se tratando de direitos sociais, são indisponíveis. Já os coletivos podem ser ou não indisponíveis.


9. EFETIVIDADE CONFERIDA ÀS LEIS ESPECIAIS CONSUMERISTAS APÓS A INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Neste capítulo serão apresentados alguns casos concretos que demonstram a eficiente atuação do Órgão Ministerial defendendo os direitos coletivos, difusos ou direitos individuais homogêneos do consumidor, quer seja extrajudicialmente por meio do Inquérito Civil e o consequente Termo de Ajustamento de Conduta, ou judicialmente por meio da Ação Civil Pública.

  • Inquérito Civil n.019/2008 foi instaurado a partir de notícia de um consumidor ao Ministério Público do Rio de Janeiro, noticiando que o Supermercado Intercontinental Comércio de Alimentos Ltda. de Bangu fornecia alimentos estragados, esta e outras irregularidades, tais como venda de carnes e produtos de panificação sem proteção, problemas de temperatura e higiene, foram confirmadas pela Vigilância Sanitária. Foi firmado TAC entre a empresa e o MPRJ, no qual aquela se comprometeu a não vender carne pré-moída, não colocar à venda carnes e produtos de padaria sem a devida proteção, adequar a temperatura dos balcões de congelados e refrigerados e manter a higiene destes balcões.

  • O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro promoveu ACP em face de B2w – Companhia Global do Varejo, processo n. 0014524-53.2007.8.19.0001, haja vista que em suas práticas comerciais não dava informações sobre o prazo de entrega dos produtos adquiridos pelos consumidores, não trazia informações claras sobre os produtos, bem como não cumpria o art. 18. do CDC. Em sua empreitada, o MP logrou vitória, pois a sentença judicial condenou a empresa a informar aos consumidores em seu site: o preço, características, qualidades e riscos de todos os produtos postos à venda; o prazo de entrega, devendo informar em até 48h qualquer alteração de prazo; caso for impossível entregar o produto, a empresa tem de devolver o valor pago pelo consumidor ou, a critério do cliente, enviar outro equivalente. A empresa também deve receber reclamação por defeito produto e proceder à solução seguindo os mandamentos do Código de Defesa do Consumidor.

  • Ação Civil Pública (0131879-89.2004.8.19.0001) foi ajuizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro em face de Fundação Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em virtude do Teatro não conceder desconto aos idosos, descumprindo o artigo 23 da Lei 10.741/03. A notícia do desrespeito foi levada ao MP por um idoso freqüentador do Teatro, alegando que o desconto no valor do ingresso era apenas para maiores de 65 anos e exclusivamente para os locais de ingressos mais baratos, tais fatos foram devidamente comprovados. Instada a firmar Termo de Ajustamento de Conduta, a ré não o aceitou. Em sede judicial foi sentenciado que o Teatro Municipal asseguraria o direito dos idosos – a partir de 60 anos, como determina a lei – a pagar meia entrada em todos os eventos, sem discriminar assentos. Ainda, foi condenando a restituir em dobro os valores cobrados indevidamente dos idosos.

  • A Associação Franciscana de Ensino Senhor Bom Jesus foi vistoriada pelo Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, ficando constatado que a edificação não possuía todos os sistemas preventivos exigidos. Diante da irregularidade quanto às normas de segurança contra incêndio e pânico e falta de habite-se, o Ministério Público de Santa Catarina propôs o IC 06.2014.00001591-4 à Associação Franciscana, que o assinou. Esta se comprometeu a implementar: o sistema de segurança preventivo por extintores; o sistema hidráulico preventivo, adequando a instalação de gás combustível, os sistemas de saídas de emergência, de iluminação de emergência, de sinalização e orientação para abandono do local e de alarme e detecção de incêndio; sistema de proteção contra descargas atmosféricas.

  • O Ministério Público de São Paulo promoveu Ação Civil Pública em face de Unimed de Avaré Cooperativa de Trabalho Médico, processo n. 1000645-95.2014.8.26.0073. A referida rescindiu unilateralmente o contrato que tinha com a Ceripa - Cooperativa de Eletrificação Rural de Itai, Paranapanema e Avaré. Era um plano de saúde coletivo. Os consumidores puderam migrar para outro plano, mas os valores eram mais elevados, sendo consideravelmente superiores ao plano vigente. A decisão judicial determinou que empresa restabelecesse a vigência dos contratos de assistência médico -hospitalar assinados pela UNIMED Avaré com a Ceripa.

  • Diante da informação que a Medicalcenter Paulista Ltda. não informava aos pacientes o endereço e telefones dos profissionais de saúde foi iniciado o IC n. 14.0161.0000939/2013-5 pelo Ministério Público de São Paulo, os fatos foram apurados e constatados verídicos, daí firmou-se um Termo de Ajustamento de Conduta entre a empresa e o MPSP, aquela se comprometeu a informar aos pacientes o endereço e o telefone do médico que eventualmente não atue mais na empresa; ou, caso esteja impedido, a empresa deverá informar o endereço e o telefone do médico que o substituirá, pelo prazo de 02 (dois) anos.

  • Em Minas Gerais, a empresa Royal Holiday Brasil Negócios Turísticos Ltda. praticava técnicas comerciais abusivas e apresentava obstáculos à desistência ou rescisão do contrato. Descumprindo o disposto nos artigos 6º, incisos II, III, IV e V, 39, inciso V, 47, 51, incisos II e IV do CDC e artigos 12, inciso VI, 13, incisos I e XIII do Decreto 2.181/1997. E considerando que há vedação expressa ao enriquecimento sem causa no ordenamento jurídico brasileiro, art. 884. do Código Civil. Ainda levando-se em conta a Deliberação Normativa nº. 161, de 09.08.85, a Resolução Normativa CNTUR nº. 04/83, de 28.01.83 e Deliberação normativa nº 161/85, de 09 de agosto de 1985, da EMBRATUR. Foi iniciado o IC 2007.001.167265-4 pelo Ministério Público de Minas Gerais. Posteriormente foi celebrado um Termo de Ajustamento de Conduta, no qual foi firmado que a empresa estaria proibida de convidar os consumidores a adquirirem seus produtos sob o argumento de que teriam sido premiados. Também proibida de entregar folheto aos consumidores com o cronograma da apresentação, informação sobre as etapas e duração da apresentação como um todo e proibida de separar os casais no momento da comercialização ou se utilizar qualquer outra técnica abusiva de comercialização, a exemplo da simulação de prêmios ou demonstração de falsos consumidores contratando. A empresa deve abster-se de cobrar taxa de anuidade no ano da contratação do serviço, a não ser que o consumidor faça reserva no mesmo ano. A empresa, ainda, se comprometeu a inserir nos contratos a possibilidade de desistência ou rescisão, bem como o procedimento a ser observado pelo consumidor, devendo a rescisão ser iniciada mediante simples requerimento na sede da empresa.

  • O Ministério Público do Estado de Mato Grosso firmou TAC com Calcenter Calçados Centro-Oeste Ltda e Calcard Administradora de Cartões Ltda., a partir do Inquérito Civil 000926-002/2008. O cerne da questão era cobrança de taxas abusivas pelo cartão de crédito e envio de cartão sem solicitação do consumidor. Ao ser firmado TAC, as empresas, dentre outras obrigações, se comprometeram a não emitir cartão de crédito sem prévia solicitação do consumidor; não cobrar tarifa de processamento e manutenção de conta; obrigando-se a restituir os valores cobrados indevidamente, bem como informar previamente ao consumidor sobre a cobrança de anuidade pelo uso do cartão de crédito.

  • No município de Paranaguá/PR o transporte hidroviário por balsa entre o continente e a Ilha dos Valadares era oferecido de forma precária pela concessionária. O Município, representado pelo Prefeito Municipal, nos autos do Procedimento Preparatório n. MPPR – 0103.11.000146-0, celebraram o Compromisso de Ajustamento de Conduta. Nos termos do acordo o Município se comprometeu a exigir da concessionária a prestação adequada e eficiente do serviço do transporte por barca. Aos usuários, após da formalização da intervenção, passou a ser cobrado apenas a tarifa para a travessia Continente-Ilha dos Valadares, ficando isentos de pagar o percurso inverso.

  • Consumidores reclamaram junto à Ouvidoria do MPRJ sobre dificuldades para quitar as dívidas antecipadamente junto ao Banco Pine S.A, devido ao procedimento adotado no que diz respeito ao fornecimento do saldo devedor e de boleto para quitação de débito. O atendimento dos clientes era feito apenas por meio de ligações para São Paulo, o qual era deficiente, as quais se tornavam onerosas para os consumidores. Tal situação ensejou a abertura do Inquérito Civil n. 638/2009. Buscando sanar as irregularidades, o MPRJ nos autos do IC formulou proposta de Termo de Ajustamento de Conduta- TAC que foi rejeitado pelo então réu. A partir da negativa, o Órgão Ministerial deu início a ACP n. 0015109-66.2011.8.19.0001, o qual culminou em sentença condenando a empresa a indicar a agência no Rio de Janeiro onde serão feitos os pedidos de pagamento antecipado ou disponibilizará telefone gratuito para receber ligação dos clientes. O consumidor receberá boleto e planilha explicando a dívida em até 48 horas após a solicitação do pagamento antecipado. Os que não conseguirem pagar antecipadamente por causa do mau atendimento devem receber do banco todos os juros que pagaram após o pedido de pagamento antecipado.

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  • Em Goiás foi proposta pelo Ministério Público ACP em face da empresa São Luiz para tratar da taxa de seguro que era cobrada na venda de passagens de transporte rodoviário. A taxa de seguro é facultativa, e não é permitida a venda casada com a passagem. Sob o processo n. 201194853340, ficou decidido que a taxa de seguro deve ser vendida separadamente e à escolha do consumidor. Outrossim, a empresa ficou obrigada a divulgar ostensivamente a facultatividade da referida taxa.

  • Supermercado Bompreço do Nordeste descumpria a Lei Municipal n. 4330/2005, que regulamenta o tempo de espera e permanência em filas. Inicialmente foi confeccionado Inquérito Civil, de n. 007/2012, o que angariou elementos suficientes a demonstrar que as pessoas ficavam na fila por tempo superior ao previsto na legislação. Não foi pactuado qualquer acordo entre as partes, razão pela qual o MP da Paraíba propôs a Ação Civil Pública n. 0010666-82.2013.815.0011, restando a sentença positiva em condenar o mercado a cumprir a Lei mencionada, devendo adotar medidas para otimizar o atendimento ao consumidor, em especial colocar funcionários suficientes para atendimento nos caixas, sob pena de responder por sua inobservância. Além de ter sido condenado a pagar indenização por danos morais coletivos, revertido em favor do Fundo Estadual Especial de Proteção dos Bens, Valores e Interesses Difusos.

Os exemplos supra citados são alguns dos inúmeros casos de intervenções exitosas do Ministério Público por todo o Brasil. Pelo todo exposto é possível perceber que no que tange à defesa dos direitos consumeristas, a atuação Ministerial é aguerrida e profícua, com empenho fiscalizam as leis e garantem os meios para que se efetivem. São múltiplas demandas, versando sobre os mais variados temas, como oferta de alimentos, combustíveis e medicamentos adulterados, publicidade enganosa ou abusiva, transporte coletivo, planos de saúde, comércio eletrônico, vícios e defeitos em produtos e serviços em geral, água, telefonia, ensino privado, contrato imobiliário, práticas e cláusulas abusivas no fornecimento de energia elétrica.


CONCLUSÃO

A forma de consumir das pessoas veio mudando ao longo dos tempos, até que ela tornou-se uma relação em massa, de tal modo que implicou em conflitos que passaram a exigir a atuação do Estado para solucioná-los. A tutela coletiva dos consumidores é um dos aspectos mais importantes da relação de consumo, tendo em vista ser a parte técnica e economicamente vulnerável na relação de consumo.

O grande marco na defesa do consumidor é a Constituição Federal de 88, pois ela o elevou ao nível de direito fundamental e princípio da ordem econômica. Proteger o cidadão é zelar pela dignidade, integridade, liberdade.

Tem-se o Ministério Público como fiscal da lei e parte legitimada para atuar na defesa coletiva nos casos de interesses ou direitos difusos, os interesses ou direitos coletivos, e interesses ou direitos individuais homogêneos. E para isso o Código de Defesa do Consumidor no artigo 83 assegura que todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela são aceitas para a defesa dos direitos e interesses protegidos pelo CDC.

É inegável o fato de que o MP é essencial à função jurisdicional do Estado e que defende com maestria a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, como bem diz a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em seu artigo 127.

Como visto alhures, o inquérito civil é um dos instrumentos mais eficazes que o Ministério Público tem para recolher elementos de prova.

A instauração do inquérito civil não se destina exclusivamente a possibilitar a propositura da ação civil pública, mas, antes de tudo e fundamentalmente, visa à apuração séria de fatos que cheguem ao conhecimento do Parquet, tendo a precípua finalidade de permitir a atuação legítima e a formação do convencimento do agente político ministerial quanto à verificação da hipótese concreta que exija a interveniência da Instituição, tanto no que diga respeito à tomada de providências de caráter extrajudicial, como a expedição de recomendação e o compromisso de ajustamento de conduta com o inquirido, quanto na persecução da justa tutela de direito.

Pela via Judicial o MP se vale da Ação Civil Pública para pleitear a reparação dos danos morais e patrimoniais a interesses difusos e coletivos. Excepcionalmente um direito individual homogêneo pode ser tutelado quando esta for a forma para que indiretamente se possa defender um interesse difuso ou coletivo. A ação civil pública tem por objetivos prevenir, reparar e ressarcir os danos causados a interesses metaindividuais.

Conclui-se, portanto, que em suas profícuas atividades cotidianas o Ministério Público assegura a defesa plena dos direitos dos consumidores, bem com perpetua o respeito pelos princípios que norteiam o Código de Defesa do Consumidor, tanto extrajudicialmente, quanto judicialmente.

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Sobre a autora
Midian Dias Monteiro

Bacharel em Direito. Pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo elaborado em cumprimento ao trabalho de conclusão do curso de Pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil.

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