Transtornos da preferência sexual: descrição e aspectos controversos do DSM-5

10/11/2016 às 00:04
Leia nesta página:

Acerca dos transtornos da preferência sexual e seus aspectos controversos no DSM-5.

INTRODUÇÃO

            Os denominados transtornos da preferência sexual são caracterizados pela presença de "impulsos sexuais intensos e recorrentes, fantasias sexuais específicas e práticas sexuais repetitivas e persistentes, exclusivamente em resposta a objetos ou situações incomuns.Portanto, preferência por parceiro sexual que não seja humano, adulto e vivo e/ou cuja finalidade não seja a excitação sexual e/ou procriação definem esse distúrbio que afeta principalmente indivíduos do sexo masculino." (Abdo, 2012)

            Os transtornos da preferência sexual (em inglês, paraphilic disordes) elencados no DSM-5 são o voyeurismo, definido como o ato de espreitar outras pessoas em situações privadas; o exibicionismo, que consiste na exposição dos órgãos genitais a terceiros, de forma não consentida; o frotteurismo, que implica tocar ou esfregar-se em outrem também de maneira não consensual; o masoquismo, entendido como a ação de submeter-se a humilhações ou sofrimento na prática sexual; o sadismo, que se trata de infligir a outrem humilhação ou sofrimento, também durante a prática sexual; a pedofilia, que é a atração sexual preferencial ou exclusiva por crianças de até 13 anos de idade; o fetichismo, consistente na utilização sexual de objetos não vivos ou em se ter um foco altamente específico em partes do corpo diversas da região genital; e o travestismo, que se trata da excitação sexual provocada pela utilização da indumentária do gênero oposto.

            Essas desordens parafílicas foram selecionadas pelo DSM por duas razões principais: são relativamente comuns comparativamente a outras e algumas delas presumem a perpetração de atos potencialmente nocivos ou causadores de danos a outrem. Nessa caso, esses transtornos são também classificados como espécie delituosa.

            O DSM-5 informa que o rol dos transtornos da preferência que elenca em seu bojo não é exaustivo, acrescentando que uma enorme quantidade de parafilias foi identificada e nomeada, mas poucas poderiam ser elevada à condição de um transtorno parafílico, por não produzirem consequencias gravosas ao indivíduo ou a terceiros.   Esta é uma inovação expressa no DSM-5: há uma distinção entre parafilias e transtornos parafílicos, ou da preferência. Parafilias não são consideradas patologias se não tiverem o condão de causar danos ao indivíduo e/ou se forem executadas de maneira consensual com seu parceiro. Há um caráter despatologizante em relação às práticas ou preferências sexuais anômalas, devendo a Psiquiatria cuidar apenas daquilo que traz prejuízo pessoal ao sujeito e/ou a terceiros. 

1. Prevalência

            Estima-se a incidência dos transtornos parafílicos em 1% da população. Por se tratar de um comportamento sexual marcado pela intensidade e habitualidade, sua prática ocasiona um grande número de vítimas. A predominância é eminentemente masculina, numa proporção de 20  homens para cada mulher. O aparecimento das parafilias ocorre, geralmente, antes dos 18 anos de idade. Registra-se também ser comum que os indivíduos apresentem entre três e cinco parafilias concomitante ou alternadamente ao longo de sua vida (Apud Abdo, 2012). A pedofilia é o transtorno da preferência sexual mais comumente relatado, dadas as suas implicações legais. Além da pedofilia, estão presentes com certa frequência, na literatura médica e leiga, o exibicionismo, o voyerismo, o masoquismo e o sadismo. O fetichismo é menos referido (ABDO, 2012).

            Entretanto, não há dados suficientes para que se afirme ser esses transtornos aqueles de maior incidência na população, vez que médicos e pesquisadores só acessam esses conteúdos da intimidades dos indivíduos caso os prejuízos causados à sua vida ou a seus parceiros sejam muito significativos.

2. Classificação segundo a CID-10

            A Classificação Internacional de Doenças (CID-10) catalogou os transtornos da preferência sexual segundo o apresentado abaixo:

Classificação dos transtornos da preferência sexual, segundo a CID-10

F65.

Transtornos da preferência sexual

F65.0

Fetichismo

F65.1

Travestismo fetichista

Fetichismo com travestismo

F65.2

Exibicionismo

F65.3

Voyerismo

F65.4

Pedofilia

F65.5

Sadomasoquismo

Masoquismo

Sadismo

F65.6

Transtornos múltiplos da preferência sexual

(Fetichismo, travestismo e sadomasoquismo)

F65.8

Outros transtornos da preferência sexual

F65.9

Transtornos da preferência sexual, não especificado

Desvio sexual sem outra especificação

3. Classificação segundo o DSM-IV-TR

            O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (texto revisado, em sua 4ª edição), classifica as parafilias de maneira bastante similar, com apenas pequenas alterações, como a inclusão do frotteurismo e a incorporação dos transtornos múltiplos da preferência sexual, outros transtornos da preferência sexual e transtornos da preferência sexual não especificados na categoria de parafilia sem outra especificação.          

Classificação das parafilias, segundo o DSM-IV-TR

Parafilias

302.4

Exibicionismo

302.81

Fetichismo

302.89

Frotteurismo

302.2

Pedofilia

302.83

Masoquimo sexual

302.84

Sadismo sexual

302.3

Travestismo fetichista

302.82

Voyerismo

302.9

Parafilia sem outra especificação

4. Classificação segundo o DSM-5

            Por sua vez, o DSM-5 classifica os transtornos da preferência sexual da seguinte forma:

Classificação dos transtornos da preferência sexual, segundo o DSM-5

F65.3

Voyerismo

F65.2

Exibicionismo

F65.81

Frotteurismo

F65.51

Masoquismo sexual

F65.52

Sadismo sexual

F65.4

Pedofilia

F65.0

Fetichismo

F65.1

Travestismo

F65.89

Outro transtorno parafílico especificado

F65.9

Transtorno parafílico sem outra especificação

            A distinção classificatória reside na inserção da categoria "outro transtorno parafílico especificado", que consiste em apresentações nas quais os sintomas são característicos de uma parafilia, mas não preenchem todos os critérios de nenhum dos transtornos da preferência. São incluídos casos em que não existem informações suficientes para um diagnóstico mais específico.

            Há também uma importante alteração, introduzida pelo DSM-5, que consiste na diferenciação entre parafilias e transtornos parafílicos. Um transtorno parafílico é uma parafilia que está causando sofrimento ou prejuízo ao indivíduo, ou uma parafilia cuja satisfação tem acarretado danos ou risco de danos, para o indivíduo e para outros. A existência de uma parafilia, entendida como a direção do desejo sexual a um alvo incomum ou a uma maneira incomum de seu exercício, é uma condição necessária, mas não suficiente para um diagnóstico de transtorno da preferência sexual. Em outros termos, a presença de uma parafilia, por si só, não necessariamente justifica ou requer uma intervenção clínica.        

            Os oito transtornos parafílicos listados não exaurem a lista de outros possíveis transtornos. É sabido que existem outras, mas foram listadas aquelas relativamente mais comuns.

            Os transtornos da preferência podem ser agrupados em dois tipos, sendo o primeiro aquele que se baseia em preferências por atividades anômalas. Subdividem-se em: a) distúrbios de relacionamento (courtship disorders) voyeurismo, exibicionismo, frotteurismo; e b) distúrbios de algolagnia (algolagnic disorders): masoquismo, sadismo. O segundo grupo de transtornos baseia-se em preferências anômalas em relação ao objeto (anomalous target preferences). Subdividem-se em: a) em relação a humanos: pedofilia; b) outros: fetichismo, travestismo

            Outra classificação quanto às formas de manifestação das parafilias reside em que algumas delas dirão respeito às atividades eróticas do indivíduo. Ex.: palmadas, chicotadas, cortes, amarrações ou estrangulamento. Já outras irão se referir aos alvos ou objetos sexuais de interesse do indivíduo. Ex.: atração por crianças, cadáveres, amputados e animais não humanos, como cachorros e cavalos, ou objetos inanimados, como sapatos ou artigos feitos de borracha.

            Em determinadas circunstâncias, o critério “interesse sexual intenso e persistente” será de difícil aplicação, como no caso de pessoas idosas ou doentes, que talvez não tenham interesse sexual intenso de nenhum tipo. Nessas circunstâncias, o termo parafilia pode ser definido como qualquer interesse sexual maior ou igual a interesses sexuais normais. Por essa razão, em alguns casos, as parafilias podem ser melhor descritas como interesse sexual preferencial do que interesse sexual intenso.

            Não é raro que um indivíduo manifeste duas ou mais parafilias. Em alguns casos, os focos das parafilias estão intimamente conectados e a conexão entre as mesmas é intuitivamente compreensível. Ex.: fetichismo envolvendo pés e fetichismo com sapatos. Em outros casos, a conexão entre as parafilias não é óbvia, e a presença de várias parafilias pode relacionar-se a alguma vulnerabilidade que remeta a uma processo anômalo do desenvolvimento psicossexual. Em qualquer caso, só haverá o diagnóstico de comorbidade de transtornos parafílicos se mais de uma parafilia causa sofrimento ao indivíduo ou danos a terceiros.

            4.1 Voyeurismo

            Trata-se de uma preocupação recorrente com fantasias ou atos envolvendo a busca ou observação de pessoas que estão nuas ou envolvidas em carícias ou na atividade sexual, sendo também conhecido como escopofilia. A masturbação geralmente ocorre durante ou após o evento. O primeiro ato de voyerismo ocorre, geralmente, na infância, sendo mais comum em homens.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

            4.2 Exibicionismo

            O exibicionismo consiste no impulso e desejo recorrente de expor os genitais a uma pessoa estranha ou desprevenida. A excitação sexual ocorre na antecipação da exposição, e o orgasmo acontece pela masturbação durante ou após o evento. Em quase 100% dos casos, trata-se de homens expondo-se a mulheres.

            4.3 Frotteurismo

            Consiste em tocar ou esfregar-se contra outra pessoa, de maneira não consentida.

Geralmente, ocorre em locais com grande concentração de pessoas, particularmente ônibus e metrôs. O frotteur é extremamente passivo e isolado, sendo esta, frequentemente, sua única fonte de gratificação sexual.

            4.4 Masoquismo

            Recebeu essa denominação a partir das atividades de Leopold von Sacher-Masoch, um novelista austríaco do  sec. XIX, cujos personagens obtinham prazer sexual do fato de serem abusados e dominados por mulheres.

            No masoquismo, existe uma preocupação recorrente com desejos ou fantasias sexuais de ser humilhado, espancado, amarrado ou levado ao sofrimento de alguma outra forma. As práticas masoquistas são mais comuns entre os homens.

            Freud concebia o masoquismo como consequência de fantasias destrutivas do indivíduo voltadas contra si mesmo. Em alguns casos, as pessoas permitem-se sentir prazer sexual somente se este for seguido de punição.

            Cerca de 30% dos masoquistas também possuem fantasias sádicas, sendo conhecidos como sadomasoquistas.

            4.5 Sadismo

            O aparecimento ocorre, geralmente, antes dos 18 anos de idade e a maioria dos sádicos é representada por homens.

            De acordo com a Teoria Psicanalítica, o sadismo é uma defesa contra temores de castração – o indivíduo faz a outros o que teme que façam consigo. O prazer deriva da expressão do instinto agressivo.

            O distúrbio recebeu este nome a partir do Marquês de Sade, aprisionado repetidas vezes por seus atos sexuais violentos contra mulheres. Há uma forte relação entre o sadismo e o estupro. Alguns estupradores sádicos precisam matar suas vítimas depois de praticarem sexo, é o denominado estupro sádico (Barlow & Durand, 2008).

            4.6 Pedofilia

            A pedofilia envolve impulso sexual ou excitação sexual recorrente e intensa por crianças de 13 anos de idade ou menos. Para seu diagnóstico, deverá persistir por, no mínimo, 6 meses. O indivíduo com tal diagnóstico deverá ter, ao menos, 16 anos de idade e ser, pelo menos, 5 anos mais velho que a vítima. Não se incluem nesse critério diagnóstico indivíduos na adolescência tardia (15 a 18 anos) que se envolvem em relacionamento sexual com criança de 12 ou 13 anos.

            A vasta maioria das molestações a crianças envolve carícias na região genital ou sexo oral. A penetração é uma ocorrência infrequente, exceto nos casos de incesto. Ofensores relatam que a maior parte das vítimas é do sexo masculino (60%). No caso de pedofilia cometida por meio de exibicionismo, no entanto, 99% das vítimas são do sexo feminino 95% dos pedófilos são heterossexuais, 50% relatam ter consumido álcool em excesso na ocasião do incidente. Relaciona-se a pedofilia com exibicionismo, voyeurismo e estupro.

            O DSM-5 fez constar, em sua edição publicada, que a pedofilia, se não concretizada em ações, tratar-se-ia de orientação sexual, não transtorno da preferência sexual.  A assertiva ganhou grande repercussão no meio científico e acadêmico, o que ensejou a publicação de uma retratação no site da Associação Americana de Psiquiatria na qual elucida-se que a pedofilia será sempre transtorno parafílico, ainda que não ultrapasse o plano da atração, e não orientação sexual, segundo havia sido publicado.

            4.7 Fetichismo

            No fetichismo, o foco sexual está em objetos intimamente associados com o corpo humano. Pode ocorrer também de se ter um alto foco específico em partes não genitais do corpo. O fetiche particular está ligado a alguém estreitamente envolvido com o paciente durante sua infância. A atividade sexual pode ser direcionada ao fetiche, ou este pode ser incorporado ao intercurso sexual. Trata-se de distúrbio quase que exclusivamente masculino.

            Nas mulheres, a cleptomania pode produzir excitação sexual. Para Freud, o fetiche serve de símbolo fálico, porque o fetichista teme inconscientemente a castração

Os teóricos do aprendizado acreditam que o objeto estava associado à estimulação sexual numa idade precoce.

            4.8 Travestismo

            O travestismo, também chamado de fetichismo travestista, é marcado pela utilização fantasiosa ou real de roupas femininas com o fim de obter excitação e como acessório na masturbação ou no coito.

            Começa tipicamente na infância ou adolescência. Com o passar dos anos, alguns indivíduos podem desejar vestir-se e viver como o gênero oposto. Geralmente, mais de uma peça do vestuário está envolvida. Frequentemente, todo um guarda-roupa é utilizado.

            Não vestido com roupas do sexo oposto, o homem pode ter uma aparência e ocupação hipermasculinas. A troca de roupa em si existe num gradiente que se estende desde o uso solitário, deprimido, culposo, de roupas do sexo oposto, até o ato sociável, ego-sintônico, numa subcultura de travestis.

            A síndrome clínica pode começar durante os anos de latência, porém é mais frequentemente observada próximo à puberdade ou na adolescência. O uso franco de roupas do outro gênero geralmente não começa até estabelecer-se razoável mobilidade e relativa independência dos pais.

            Freud os denominava “disfarçados”. Ao tratar do assunto, apontava o erro de comumente se associar o travestismo à homossexualidade. A influência do traje masculino ou feminino em toda vida sentimental dos travestidos é considerável. Com a roupa do próprio sexo sentem-se oprimidos, privados de liberdade. São como prisioneiros de cousas que lhes são estranhas e que não lhes convém. O sentimento de bem-estar é proporcionado pelo traje do sexo oposto (Apud Nerea, 1965).

            Hirschfeld cita a fala de um paciente, em que descreve a significação do traje para si: "Em traje de homem me sinto como que ultrajado, violado... Dir-se-ia que vagueio como uma alma condenada em meu próprio Eu. Mas, se me visto de mulher, desde logo me acalmo e todo o meu organismo se sente perfeitamente eufórico. É como que o repouso depois de uma grande fadiga (...)”. Segundo outro paciente, “as roupas íntimas femininas são para mim um santuário. Passo toda semana com água na boca esperando o domingo, dia em que me visto com saias engomadas com os meninos (...) Então me sinto no sétimo céu” (Apud Nerea, 1965).

            Kraft Ebbing, em sua época, entendia que o travestismo não passa de mera variedade do homossexualismo. Hirschfeld contesta tal assertiva, pontuando que existem numerosos homossexuais que não se disfarçam, há numerosos travestidos que não são homossexuais, mas que se sentem sexualmente atraídos pelo sexo oposto. Para ele, a psicanálise poderá revelar no inconsciente elementos homossexuais escondidos, ou recalcados, em indivíduos afetados de travestismo, mas para os quadros clínicos os  traços manifestos são mais importantes que os que se ocultam no inconsciente.

            No tocante a esse tema, um paciente esclarece que  “a despeito de meus desejos em vestir roupas femininas, não sinto a menor tendência ou inclinação sexual pelo homem.” (Apud Nerea, 1965). Para Freud, no entanto, o desgosto e o horror que se tem a um sentimento, testemunham, pelo contrário, a existência desse mesmo sentimento.

            Segundo Freud, na maioria das vezes, o travestido heterossexual não é atraído pela mulher tipo, senão pela mulher viril, ou intelectualmente superior, enquanto que a mulher “travestida” se sente atraída pelo homem efeminado. Um paciente relata que seu "ideal no amor será sempre a mulher forte, viril. Ao lado dela me sinto melhor. É dela que espero o ataque. Mas é preciso que seja uma mulher enérgica que se imponha por suas qualidades de espírito e de corpo. Gosto, no entanto, que tenha um pouco de bigode.” (Apud Nerea, 1965).

            Os travestidos podem ser também bissexuais. Entretanto, a bissexualidade não parece, para Freud, ser tão frequente como a fixação sobre um ou outro sexo. O material de observação de Freud indicava que 35% são automonossexuais e assexuais. Muitos travestidos relatavam, inclusive, ser quase impotentes quando se vêem privados das roupas femininas. Mas, logo que as vestiam e se viam dentro delas, tinham ereção seguida de uma rápida ejaculação. No travestimos é também frequente a presença do sentimento de culpa.

            4.9 Outro transtorno parafílico especificado

            Incluem-se apresentações nas quais os sintomas são característicos de uma parafilia, mas não preenchem todos os critérios de nenhum dos transtornos da preferência. São incluídos casos em que não existem informações suficientes para um diagnóstico mais específico.

         

5. Etiologia: modelo orgânico

            Alguns estudos que buscaram examinar a etiologia dos transtornos da preferência sexual segundo o modelo orgânico, levantaram os seguintes dados: 74% de parafílicos encaminhados a grandes centros de saúde apresentavam níveis hormonais anormais; 27% tinham sinais neurológicos acentuados ou ligeiros; 24% tinham anormalidades cromossômicas; 4% apresentavam convulsões; 9% tinham dislexia; 4% com EEGs anomais (sem convulsões); 4% com distúrbios psiquiátricos maiores e 4% apresentavam retardo mental (Barlow & Durand, 2011).

6. Etiologia: modelo psicossocial

            Sob a perspectiva psicossocial, o parafílico consistiria em um indivíduo que fracassou em completar o processo de desenvolvimento normal em direção ao ajustamento heterossexual. O que distinguiria uma parafilia de outra seria o método escolhido para enfrentar a ansiedade causada por uma ameaça de castração pelo pai e de separação da mãe. Assim, a perversão funcionaria como via de escape para impulsos sexuais e agressivos (Nerea, 1965).

            O fracasso na resolução da crise edípica seria o responsável por ocasionar uma identificação inapropriada do objeto para a catarse da libido. Segundo a Teoria Psicanalítica, em seu nascedouro, o travestismo seria uma perversão, assim como o homossexualismo e o transexualismo. Outras teorias atribuem o desenvolvimento da parafilia a experiências primitivas que condicionam ou socializam a criança para que cometa um ato parafílico. Seria o caso, por exemplo, de uma criança molestada tornar-se predisposta a ser um adulto receptor de abuso ou que abuse dos outros. Assim, os transtornos parafílicos podem resultar de modelagem, pela imitação ou pelas recordações de eventos emocionalmente carregados(Nerea, 1965).

7. Prognóstico

            O mau prognóstico está associado com a idade precoce de aparecimento, alta frequência de atos, ausência de culpa ou vergonha relativa ao ato e alcoolismo ou abuso de drogas. O prognóstico é melhor se existe história de coito além da parafilia, alta motivação para a mudança e quando o paciente procura auxílio espontaneamente, sem ser encaminhado por algum órgão do Poder Judiciário (Saleh et al., 2009)

8. Tratamento

            A psicoterapia orientada ao insight é a abordagem mais comum no tratamento das parafilias. O paciente tem oportunidade de compreender sua dinâmica e os eventos causadores da parafilia. Ele toma consciência dos acontecimentos diários que o fazem agir segundo seus impulsos. A psicoterapia permite a melhora da auto-estima e das habilidades interpessoais, encontrando métodos aceitáveis de gratificação sexual. Pode ser utilizada a terapia comportamental. A terapia por drogas, incluindo medicações antipsicóticas ou antidepressivas, é indicada no tratamento da esquizofrenia e da depressão, caso a parafilia está relacionada a esses distúrbios (Saleh et al., 2009)

            No Brasil, a medicação autorizada para esses casos são os antidepressivos (especialmente os inibidores seletivos da recaptação da seretonina) e os neurolépticos, em doses crescentes até o controle da sintomatologia.

            Em alguns países, admite-se também a administração de substâncias antiandrogênicas, como o acetato de ciproterona e o acetado de medroxiprogesterona (este pode trazer benefícios para o paciente cuja hipersexualidade está fora de controle ou oferece perigo aos outros. É indispensável fazer o acompanhamento de longo prazo, até que o parafílico atinja a quinta década da vida, pelo menos, quando esse tipo de atividade tende a recrudescer. (Saleh et al., 2009)

Referências bibliográficas

American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.). Arlington, VA: American Psychiatric Publishing.

Abdo, Carmita. Sexualidade humana e seus transtornos. 4 ed. São Paulo: Leitura Médica, 2012.

Barlow, David H.; Durand, V. Mark. Psicopatologia: uma abordagem integrada. São Paulo: Cengage Learning, 2011.

Nerea, J. Gomez. Freud e as anomalias sexuais. São Paulo: Editorial San Remo Ltda., 1965.

Saleh, Fabian. S.; Berlin, Fred S.; Malin, H. Martin; Thomas, Kate J. Parafilias e transtornos parafílicos (ou afins). In: Gabbard, Glen O. Tratamento dos Transtornos Psiquiatricos. 4 ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Anna Cecília Santos Chaves

Doutora em Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia na Universidade de São Paulo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos