A teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova na fraude à execução

10/11/2016 às 18:41
Leia nesta página:

A teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova rompe com as regras rígidas e estáticas da distribuição legal do onus probandi, tornando-as mais flexíveis, adaptáveis a uma situação concreta. Assim, não importa a posição da parte, se autora ou ré, nem a espécie do fato a ser provado, se constitutivo, impeditivo, modificativo ou extintivo. O magistrado deverá atribuir o encargo de provar, levando em consideração, no caso concreto, qual das partes possui melhores condições de assumi-lo. Tal teoria está ligada aos princípios processuais e aos deveres de lealdade, solidariedade, colaboração, cooperação e boa-fé objetiva das partes, dos terceiros e de todos aqueles que participam do processo.

Para Bruno Garcia Redondo, a distribuição dinâmica do ônus da prova "também se revela como a mais compatível com a visão cooperatória e publicista do processo civil (que deve ser entendido como instrumento de direito público, destinado à pacificação social e à correta prestação da tutela jurisdicional), a busca pela verdade substancial (material ou real), o princípio da comunhão das provas e, finalmente, o princípio da adequação e da adaptabilidade do procedimento (flexibilização procedimental, previsto no art. 265.º-A do CPC português e que deverá vir expresso no novo Código de Processo Civil brasileiro".

Nem sempre autor e réu têm condições de atender ao ônus probatório rigidamente atribuído na sistemática ordinária do direito processual.

Na ausência de elementos suficientes nos autos para evidenciar os fatos, o juiz terminará por proferir decisão desfavorável àquele que não se desincumbiu do seu encargo de provar (regra de julgamento), podendo levar a resultados injustos.

A aplicação da distribuição dinâmica do ônus da prova já é possível de acordo com o sistema processual do Código de Processo Civil de 1973.

O Código de Processo Civil de 2015 autoriza, no § 1.º do art. 373 (regra de instrução ou procedimento), a redistribuição do ônus da prova pelo juiz, seja de ofício, seja a requerimento de uma das partes, diante das peculiaridades do caso concreto relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo (prova diabólica), ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário. "Visa-se ao equilíbrio das partes (art. 7.º do CPC): o ônus da prova deve ficar com aquele que, no caso concreto, tem condições de suportá-lo".

Como bem esclarece Bruno Garcia Redondo, o Código de Processo Civil de 2015 consagra duas regras gerais distintas de distribuição do ônus da prova: (i) a distribuição estática ,no caput e incs. I e II do art. 373; e a distribuição dinâmica, no § 1.º do mesmo art. 373.

O momento mais adequado para a inversão do ônus da prova é o da fase de saneamento e organização do processo, como expressamente indica o art. 357, III, do CPC/2015.

Humberto Theodoro Junior esclarece que "na hipótese, v.g., de aquisição de imóveis, é obrigatória a apresentação de certidões negativas de ações para a lavratura do ato notarial, de modo que, se isto não se realiza a contento, a falha é do adquirente que tenha condições e, até mesmo, o dever de se certificar das demandas pendentes contra o alienante, das quais poderia decorrer sua insolvência, para os fins do art. 593, II, do CPC/1973 (art. 792, IV, do CPC/2015). Por isso, ao invocar a boa-fé para eximir-se das consequências da fraude de execução, o terceiro terá de demonstrar que, não obstante o zelo com que diligenciou a pesquisa e certificações de inexistência de ações contra o alienante, não chegou a ter conhecimento daquela que, in concreto, existia e, na realidade, acabou sendo fraudada".

É razoável e correto que seja imposto ao adquirente o ônus de realizar a prova, em meio aos embargos de terceiro que ajuizará (e não ao credor na execução, que somente trará indícios de que os requisitos para a decretação da fraude estão presentes), de que agiu com diligência, obtendo as certidões dos distribuidores forenses do local do bem e do domicílio do alienante e, mesmo assim, não teve conhecimento da pendência da ação que poderia reduzir o alienante à insolvência, pois tem as melhores condições de fazê-lo.

O ônus de provar a má-fé do adquirente deverá ser do exequente (e não do alienante) somente nos casos em que existir ação em curso em comarca ou seção judiciária diversa do foro onde se situa o bem ou o domicílio do alienante. Tendo em vista que no Brasil inexiste um registro público nacional que centralize o cadastro de todas as ações judiciais, seria desproporcional e desarrazoado exigir do adquirente a apresentação de certidões negativas fora da comarca ou seção judiciária em que se localiza o bem ou em que tem domicílio o alienante.

O Centro de Estudos Avançados de Processo (CEAPRO) aprovou, por aclamação, um enunciado elaborado por seu grupo de execução, no mesmo sentido do que defendemos: "A Súmula 375 do STJ não impede a atribuição diversa do ônus da prova de que trata o § 1.º do art. 373".

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Fadi Georges Assy

Advogado empresarial.Sócio do escritório de advocacia Assy&Valhe Advogados.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos