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Dialética do direito à liberdade

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26/06/2004 às 00:00
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Da indução à dedução da liberdade

Tese 1: se todos são iguais perante a lei, e a lei assegura a liberdade, logo, todos são livres e nisso são iguais.

O equívoco da Tese 1, demonstrativa do próprio pensamento liberal indutivo, está em que se a liberdade não é real – porque não há como ir e vir sem condições materiais, e não há como ser livre sem decidir livremente onde ir e vir -, logo, só é livre quem dispõe de condições materiais para decidir onde ir e vir. Assim sendo, somente se todos pudéssemos fazer a mesma coisa é que seríamos livres e nisso também seríamos iguais. Porém, de forma diversa, vejamos alguns casos de dedução.

Tese 2: se é certo que sem a igualdade formal não há liberdade real, também é certo que sem igualdade real só há liberdade formal. Logo, liberdade e igualdade necessitam ser reais, materiais. Porque o direito à igualdade é a chave de segurança pública da liberdade, mas não sua garantia.

Tese 3: se é certo que há negação da liberdade real, e sua antítese é a negação da supressão da liberdade, logo, a síntese é a supressão da negação da liberdade. A admissão de que a liberdade é negada é o primeiro passo que conduz à igualdade, uma vez que a dedução real da liberdade supõe a superação da indução formal de que todos somos livres, posto que o Direito nos assegura isso na forma da lei.

Finalizando, o que sustentei na demonstração é a necessidade de avançarmos na análise crítica do Direito, ainda que partindo de posturas mais conservadoras (da ordem), como o de Durkheim, ou pela via do chamado realismo político: na versão de que a prática política exige o abandono da ética, da liberdade, legitimidade e consenso, pois basta ao Príncipe Moderno utilizar a força, violência e coerção. Em suma, diria: da tese da liberdade assistida, à síntese da liberdade requerida; da negação da supressão da liberdade à supressão da negação de toda a liberdade. Ou, em uma última forma, podemos entender como a virtù da justiça:

Os corações também são motores.

A alma é poderosa força motriz.

Somos iguais.

Camaradas dentro da massa operária.

Proletários do corpo e do espírito.

Somente unidos,

somente juntos remoçaremos o mundo,

fá-lo-emos marchar num ritmo célere.

(Maiakóvski, s/d, p. 138)


Referências Bibliográficas

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Notas

[1] Abbagnano, 2000, p. 285.

[2] Disponibilizei um espaço, no site Democracia Virtual (http://demo.meex.com.br), para discutir com meus alunos de graduação a questão específica da política ser uma fonte do Direito.

[3] Freund, 1987, p. 184.

[4] Gurvitch (op. cit.), no entanto, discorda da análise e aponta contradições metodológicas em Weber.

[5] Muito antes, José Eduardo Faria (1989) alertava para a discussão do que se entende por politização das lides e coletivização dos conflitos.

[6] Dallari, 2000, p. 154.

[7] Boudon, et. al., 2000, p 180.

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[8] O exemplo foi tomado dos trabalhos realizados pela monitora Fátima Ferreira P. dos Santos, na disciplina Teoria Geral do Estado e Ciência Política, junto à Faculdade de Direito de Marília.

[9] Trata-se de um país virtual.

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Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINEZ, Vinício Carrilho. Dialética do direito à liberdade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 354, 26 jun. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5393. Acesso em: 19 abr. 2024.

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