A reintegração social do apenado através das penas alternativas no sistema penal brasileiro

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3. Finalidade da pena

A doutrina comumente se vale de duas teorias para explicara finalidade da pena, quais sejam: a teoria absoluta e a teoria relativa, cada uma com seu grau de punição. De toda sorte, a pena é um meio de punir todo aquele que desobedeceu alguma norma penal. É, em outras palavras, a forma do Estado-juiz exercer o seu Jus Puniendi.

Prado preceitua que:

A justificativa da pena envolve a prevenção geral e especial, bem como a reafirmação da ordem jurídica, sem exclusivismos. Não importa exatamente a ordem de sucessão ou de importância. O que se deve ficar patente é que a pena é uma necessidade social - ultima ratio legis, mas também indispensável para a real proteção de bens jurídicos, missão primordial do Direito Penal. De igual modo, deve ser a pena, sobretudo em um Estado constitucional e democrático, sempre justa, inarredavelmente adstrita à culpabilidade (princípio e categoria dogmática) do autor do fato punível (PRADO, 2013, p. 567).

Nesse sentido, para a teoria absoluta, a finalidade da pena é retributiva, ou seja, é o castigo, consiste exclusivamente em punir o agente infrator. Para esta teoria a pena é um mal justo em resposta ao mal injusto do crime. A crítica que se faz a esta teoria é que a pena não tem nenhuma finalidade prática, se traduzindo apenas como um instrumento de vingança do Estado contra o criminoso, pois o Estado pune simplesmente por punir, não se preocupando com a ressocialização do criminoso. Na evolução do direito penal, o maior exemplo da finalidade retributiva é a pena de morte, que não se preocupa com a recuperação do agente.

De modo geral, a sociedade se satisfaz com o caráter retributivo da pena, pois este se assemelha a um pagamento feito pelo criminoso, desde que, logicamente, essa pena seja privativa de liberdade. Quando o indivíduo é condenado a uma pena restritiva de direitos, por exemplo, a sensação, para a sociedade, é de impunidade.

Já para a teoria relativa à finalidade da pena é preventiva, ou seja, é evitar novos crimes. O Estado pune para evitar a prática de novos crimes. Essa prevenção se subdivide em Geral e Especial sendo a primeira dirigida à coletividade, ou seja, o Estado pune para evitar a prática e outros crimes pelos demais membros da sociedade. E dentro da classificação geral, há uma subdivisão em negativa e positiva.

Nesse passo, para a negativa – a chamada intimidação coletiva que foi desenvolvida pelo alemão Ferverbach, o qual criou a Teoria da Coação Psicológica, em que o Estado quer amedrontar os demais membros da sociedade. Disso surge o Direito Penal do Terror, ou seja, é a hipertrofia do direito penal. A crítica que se faz a esta teoria é que ela permite a “Instrumentalização do Condenado”, ou seja, o condenado torna-se um objeto para intimidação da sociedade e isto viola a dignidade da pessoa humana que não permite o tratamento do ser humano como objeto (MASSON, 2015).

Já a positiva é a reafirmação do direito penal. O Estado pune para tranquilizar a sociedade, mostrando a força e efetividade do direito penal. Quando um crime é praticado o direito penal é sofrido, e, no momento em que o Estado aplica à pena, aquele sofrimento é cicatrizado e o direito penal se restabelece.

Por outro lado, na classificação Especial a pena se dirige ao próprio agente. O Estado pune para que o condenado não volte a delinquir. Também se subdivide em negativa (Prevenção Especial Mínima) que consiste unicamente em evitar a reincidência. O Estado pune para evitar que aquele condenado volte a delinquir. Enquanto a Positiva (Prevenção Especial Máxima) consiste na ressocialização. O Estado não se contenta em simplesmente punir, almeja preparar o condenado para o retorno à vida em sociedade. Entretanto, isso parece ser uma verdadeira utopia.

Nesse contexto, é certo que a pena precisa ser “não dessocializadora”, não pode ser ainda mais prejudicial ao condenado, ou seja, é o mínimo que o Estado deve fazer diante da sua incapacidade de tornar a pena ressocializadora.

No que tange a finalidade da pena, o Brasil adota a Teoria, também chamada de Teoria Unitária, Conciliatória, Eclética ou Intermediária. Significa que a pena apresenta uma tríplice finalidade: retribuição, prevenção geral e prevenção especial. Há que fale em dupla finalidade: retributiva e preventiva. Ambas estão corretas, sendo que uma trata o tema mais especificadamente que a outra. Tal entendimento se extrai do art. 59, caput do CPB, que diz que a pena será aplicada para reprovação e prevenção do crime. Tal conclusão também se obtém da Lei nº 7.210/1984 e do Pacto de San José da Costa Rica, incorporado no direito brasileiro pelo Decreto 678/1992 (CUNHA, 2015).

Assim, a finalidade da aplicação da pena é retributiva, preventiva e reeducativa, e cada uma é identificada em momento próprio, ou seja, na pena em abstrato visa à prevenção (foco na sociedade) e atua antes da prática do delito. Já na pena em concreto, foca-se no delinquente buscando evitar a reincidência e que ele retribua o mal causado e por fim, a pena na execução que visa o delinquente objetivando a sua ressocialização.


4. Pressupostos de aplicabilidade das penas alternativas

O sistema de penas alternativas versa sobre um determinado perfil de crime, ou seja, as infrações penais são de pequeno ou de médio potencial ofensivo. Atinge bens jurídicos com menor impacto com relação à lesividade. Trata-se de uma sanção penal imposta no lugar da pena privativa de liberdade.

Conforme determina o Art. 44. do Código Penal, as penas restritivas de direitos, também chamadas de penas alternativas, são autônomas e substituem as penas privativas de liberdade, tendo como condição ser a pena privativa de liberdade não superior a 04 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo.

De acordo com o inciso supracitado, sendo o individuo condenado por um crime culposo, a ele pode ser aplicada uma pena restritiva de direitos, independentemente da quantidade de pena imposta.

Entrementes, se o crime for doloso, a pena restritiva de direito somente poderá substituir a pena de prisão quando a ação delituosa não foi cometida por violência ou grave ameaça a vitima e, igualmente, quando a pena não for superior a quatro anos. Assim, ao revés, o art. 54. do mesmo Código, reza que as penas restritivas de direitos são aplicadas em substituição da pena privativa de liberdade, fixado em quantidade inferior a um ano, ou nos crimes culposos.

Entende alguns doutrinadores, a exemplo de Guilherme de Souza Nucci (2014) que este dispositivo teria sido tacitamente revogado pela Lei nº 9.714/98, exigindo apenas a ausência de violência ou grave ameaça para aplicar a sanção substitutiva. Nesse sentido, o condenado a uma pena inferior a um ano, mesmo que tenha executado um delito mediante violência ou grave ameaça, poderá ser beneficiado com uma sanção restritiva de direito.

Outrossim, o art. 180. da Lei de Execução Penal, que trata das conversões, compreende que a pena privativa de liberdade, não superior a dois anos, poderá ser convertida em restritiva de direitos, desde que:

I – o condenado a esteja cumprindo em regime aberto;

II – tenha sido cumprido pelo menos ¼ (um quarto) da pena;

III – os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão recomendável.

Vale ressaltar que, com a introdução da Lei 9.714/98, o prazo de dois anos foi ampliado para quatro anos, prevalecendo o prazo maior, qual seja: quatro anos. Assim, se o condenado, que, no exercício da pena, lhe resta cumprir um quantum igual ou inferior a quatro anos, e preencher os requisitos o mencionado art. 180. da LEP, terá o direito em converter a pena de prisão a ser cumprida em pena restritiva de direitos.

Mas se o agente tenha sido condenado por um crime doloso e imediatamente cometa outro crime dessa natureza, é socialmente recomendável a aplicação da pena restritiva, conforme dispõe o art. 44. parágrafo 3º CPB poderá o juiz entender que seja necessária a substituição e ainda a reincidência não se tenha operado devido a pratica do mesmo delito.

Nesse contexto, conforme o art. 44, parágrafo 2º, se a pena privativa de liberdade for igual ou superior a um ano, a substitui por multa ou por uma pena alternativa. Por outro lado, sendo a pena superior a um ano, a substituirá por uma pena de multa e uma pena restritiva de direitos, ou por duas restritivas de direitos.

Se durante o cumprimento da pena alternativa, o condenado descumpra as obrigações imposta pelo magistrado, ocorrerá à chamada reconversão obrigatória conforme art. 44, parágrafo 4º do CPB, sendo o infrator levado ao encarceramento, mas será abatido da pena privativa de liberdade que ele cumprirá em função da reconversão.

No que diz respeito aos crimes hediondos e assemelhados, o STF assentou ser inconstitucional trechos dos arts. 33, § 4º e 44, caput, da atual lei de drogas, na parte em que se vedava a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em condenação pelo crime de tráfico de drogas. Isso ocorreu por meio do Habeas Corpus n° 97.256/RS em controle difuso de constitucionalidade.

Tal julgado inspirou a edição da resolução nº 5/2012 pelo Senado gerando a suspensão da eficácia desses dispositivos. O legislador não pode substituir o juiz na sentença, proibir essa conversão iria de encontro ao principio da individualização da pena. Assim, no dia 15 de fevereiro de 2012 o senado editou a seguinte resolução:

O Senado Federal resolve:

Art. 1º É suspensa a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" do § 4º do art. 33. da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97.256/RS (BRASIL, 2012).

Essa foi à melhor solução, tendo em vista que colocar um pequeno traficante nas prisões superlotadas e ainda junto com traficantes de maior porte seria alimentar uma verdadeira “escola do crime”. Assim, se o crime for hediondo ou assemelhado, mas, não foi cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, há a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos.

As penas restritivas de direitos são, em essência, uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos, estigmatizantes e onerosos do cárcere. Ademais, nas convenções internacionais, aprovados e promulgados pelo Estado brasileiro, é conferida a possibilidade da preferência das penas alternativas ao encarceramento.

No que concerne a pena de multa, conforme o parágrafo 2º do art. 44. do Código Penal, na condenação igual ou superior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos, se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos ou multa, ou por duas restritivas direitos.


5. Espécies de penas alternativas no sistema penal brasileiro

São espécies de penas alternativas as previstas no art. 43. do Código Penal a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, a prestação pecuniária, a perda de bens e valores, a interdição temporária de direitos e a limitação de fim de semana, bem como as modalidades previstas em legislações posteriores ao Código penal, tais como a Lei de Drogas, Lei Maria da Penha, Estatuto do Idoso, Lei de Crimes Ambientais e Código de Trânsito Brasileiro.

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Tal relação para substituir penas deve ser muito bem interpretada e aplicada, para tanto, só poderão ser utilizadas as modalidades de penas previstas no artigo 43 do Código Penal. Portanto uma decisão que condene o réu a pena alternativa diversa das previstas será nula.

Nesse sentido, o art. 43. do CP apresenta um rol taxativo de penas restritivas de direitos, ou seja, no caso concreto o juiz não pode criar novas penas restritivas de direitos não previstos em lei. O rol constitucional de penas é exemplificativo, uma vez que autoriza o legislador a criar novas espécies de penas. As penas restritivas de direito possuem natureza jurídica de pena, e enquanto penas, são espécies de sanção penal. Tal natureza jurídica é atribuída pela Constituição Federal no art. 5º, XLVI.

No que tange às velocidades do direito penal, desenvolvida por Jesus Maria Silva Sanches, as penas alternativas (restritivas de direitos e multa) encontram-se na segunda velocidade, qual seja: o Direito Penal sem Prisão ou Direito Penal Periférico, a liberdade do ser humano não está em jogo, é rápido e permite a flexibilização dos direitos e garantias do ser humano (CUNHA, 2015).

As medidas alternativas de prisão trazem inúmeras vantagens: evitam que o condenado por crimes de menor potencial fiquem encarcerado com presos que cometeram crimes mais graves; diminuem gastos com o Sistema Penitenciário que já tem pouca estrutura e está superlotado; Possibilita a reeducação e ressocialização dos presos evitando a reincidência e transformando os serviços gratuitos prestados pelo sentenciado em benefícios para a toda sociedade.

Com a anuência do Poder Judiciário, as verbas provenientes da aplicação de penas alternativas são utilizadas com fins sociais. Essas verbas objetivam suprir o que o Estado não supre.

No geral, são prioritariamente destinadas para áreas de execução criminal e de segurança como o Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN). O fundo foi criado em 1994 para dar suporte financeiro ao aprimoramento dos estabelecimentos prisionais do país. A partir do FUNPEN é possível criar novas vagas em penitenciárias e cadeias públicas. Os seus recursos podem ser aplicados também na melhoria dos estabelecimentos penais estaduais. (MARCÃO, 2015).


6. Penas alternativas como instrumento de reintegração social do apenado

Antes da Lei n. 9.099/95, existia uma única jurisdição de conflito em quede um lado ficava a acusação e do outro, a defesa. Com o advento desta lei, passou a vigorar, também, uma jurisdição consensual que poderá ocasionar no máximo uma pena de multa ou restritiva de direitos, deixando de fora o encarceramento.

A Lei 9.099/95 produziu o que muitos consideram uma revolução no sistema de justiça criminal, popularizou as penas alternativas à prisão e a reparação do dano que até esse momento, gozavam de pouca utilidade e credibilidade pelos operadores do sistema de justiça criminal.

Observe-se que a lei, prevê um tratamento diferenciado para as infrações de menor potencial ofensivo, aqueles com pena máxima não superior dois anos, cominado ou não com multa, com a possibilidade de conciliação entre as partes e transação com o Ministério Público, mediante a aprovação imediata da aplicação de uma pena restritiva de direitos ou multa, ou ainda, a suspensão condicional do processo.

Segundo Cunha:

Embora não represente o ideal mais puro de Justiça Restaurativa, a Lei nº 9.099/95 é um marco inicial no campo legislativo, viabilizando a nova forma de interação em torno do crime, aproximando ofendido e infrator na busca da reparação do dano. A lei nº 11.719/08 (que alterou o CPP) confirma essa tendência, a partir do momento em que permite ao juiz, na sentença condenatória, fixar valor mínimo indenizatório à vítima (CUNHA, 2015, p. 386).

A Justiça Restaurativa é a ideia de reparar o dano causado à vítima. O grande protagonista é a vítima, e não o Estado. Parte do ponto de que nem todo crime afeta o interesse do Estado, muitos crimes ficam limitado à vítima, ao agente, e na comunidade em que vivem a exemplo da briga de vizinhos. Assim, deixa de lado a ideia de punição, para buscar a conciliação entre os envolvidos, ou seja, o reequilíbrio das relações entre o agente e a vítima. A justiça restaurativa é dotada de meios informais e flexíveis.

Hodiernamente, o ordenamento jurídico passou a volver suas atenções à reparação do dano, é a chamada terceira via do direito penal, sendo a primeira a pena e a segunda a medida de segurança. Na lei 9.099/99 o Estado deixa de cominar as duas primeiras vias para aplicar a composição civil dos danos. E como consequência visível, teremos o desafogamento do sistema penitenciário.

No que diz respeito ao procedimento investigatório da Lei nº 9.099/99, lavrar-se-á um simples Termo Circunstanciado de ocorrência (TCO) que é um procedimento investigatório é pautado na simplicidade, na busca da celeridade. Na delegacia, elabora-se um breve resumo do que foi relatado pela testemunha.

Nesse rumo, nos crimes que deixam vestígios, a rigidez da prova da materialidade prevista nos artigos 158 a 159 do CPP, cede espaço à simplicidade permitindo que se faça a prova por meio de atestado médico ou qualquer outra prova semelhante conforme prevê o art. 77. §1º da 9.099:

Para o oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência referido no art. 69. desta lei, com dispensa do inquérito policial, prescindir-se-á do exame do corpo de delito quando a materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova equivalente.

Por outro lado, a pena de prisão determina nova finalidade, com um modelo que aponta que não basta castigar o indivíduo, mas orientá-lo dentro da prisão para que ele possa ser reintegrado à sociedade de maneira efetiva, evitando com isso a reincidência.

O modelo ressocializador destaca-se por seu realismo, pois não lhe importam os fins ideais da pena, muito menos o delinquente, senão o impacto real do castigo, tal como é cumprido no condenado concreto do nosso tempo; não lhe importa a pena nominal que contemplam os códigos, senão a que realmente se executa nas penitenciárias hoje.

No ponto de vista pragmático, são muitos os aspectos que contribuem para a falência da pena de prisão, podemos citar entre eles o problema da superlotação carcerária, assim impedindo o sucesso na execução da pena privativa de liberdade.

A problemática, juntamente com os problemas estruturais da sociedade como a falta educação, emprego, saúde, saneamento básico, moradias adequadas, dentre outros incentivam o aumento da criminalidade.

Ainda que o Estado queira se eximir de suas responsabilidades “passando a bola” para o direito penal, em especial as penas, é dever proteger seu povo de todos os malefícios, deve-se salientar que o direito penal tem como atribuição cuidar do delito e do criminoso sob o prisma jurídico.

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Sobre o autor
Augusto Cleriston de Castro Lustosa Angelim

Advogado e especialista em direito público.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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