RESUMO: Neste artigo analisamos a PEC 287/16 no que se refere ao Regime Geral da Previdência, demonstrando sua inconstitucionalidade, trazendo uma abordagem técnica jurídica, mas com linguagem acessível; apresentamos um resumo das propostas de alteração previstas para os segurados do Regime Geral da Previdência, e ao final, algumas sugestões para o que consideramos ser uma reforma da previdência justa e que garanta o equilíbrio do sistema e manutenção dos direitos sociais.
Palavras-Chave: PEC 287/16, Reforma da Previdência, Retrocesso Social.
1. DA INCONSTITUCIONALIDADE DA PEC 287/2016.
O Governo Federal apresentou no dia 5 de dezembro de 2016 a Proposta de Emenda Constitucional nº 287/2016, que altera os artigos 37, 40, 42, 149, 167, 195, 201 e 203 da Constituição Federal, para dispor sobre a seguridade social, estabelecendo regras de transição e dá outras providências.
Ao estudar a PEC 287/2016, constatamos que a mesma está eivada de diversas inconstitucionalidades que afrontam os direitos e garantias constitucionais, sobretudo no que se refere aos direitos sociais que consistem Cláusulas Pétreas implícitas no IV, § 4º do art. 60 da Constituição.
Segundo Horvath Júnior (2013), no Artigo Os Direitos Fundamentais e a Seguridade Social, “chega-se a conclusão que os direitos sociais são cláusulas pétreas ao utilizarmos as técnicas de interpretação extensiva, sistemática, lógica e teleológica do texto constitucional”. Ou seja, na condição de normas intangíveis os Direitos Sociais não podem ser abolidos por emendas constitucionais.
O Artigo 6º da CF/88 estabelece quais são os Direitos Sociais, dentre eles está a previdência social e assistência aos desamparados (assistência social). A previdência social é um direito constitucional estabelecido no Princípio da dignidade da pessoa humana, na solidariedade, na cidadania e nos valores sociais do trabalho (CF/88, art. 1°, II, III e IV), que se coadunam com os objetivos do Estado de construir uma sociedade livre, justa e solidária, avançar na erradicação da pobreza e na redução das desigualdades sociais (CF/88, art. 3°, I e III). Por resguardar e garantir esses direitos sociais, a Constituição Federal de 1988 é considerada como uma das mais avançadas do mundo no âmbito das garantias individuais, sendo conhecida como Constituição Cidadã.
A Proposta de Emenda Constitucional nº 287/2016 além de inconstitucional, por afrontar os direitos sociais na condição de cláusulas pétreas, também vai de encontro à essência dos direitos individuais, intangíveis, em face de estarem atrelados ao direito da igualdade previsto no Art. 5º da Constituição.
A PEC 287/2016 atinge o há de mais caro para a sociedade brasileira, qual seja, a família, isto porque ao propor reduzir direitos como o valor da pensão por morte e estabelecer a impossibilidade de sua acumulação com a aposentadoria, fragiliza o poder financeiro da família brasileira que segundo artigo 226 da CF/88, a base da sociedade, e conta com especial proteção do Estado.
Ao propor que a concessão de benefício assistencial ao idoso deva ser a partir da idade de 70 (setenta) anos ou mais de idade, a PEC 287/2016 atinge um dos fundamentos maiores da República estabelecidos no artigo 1º da Constituição Federal de 1988, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que neste caso, se traduz na assistência social aos idosos, especialmente aos que estejam em estado de miserabilidade, também estabelecido no Artigo 203 da CF/88.
Destaque-se que os benefícios assistenciais e os da aposentadoria rural são responsáveis pela diminuição da pobreza em idade avançada e pelo sustento de um grande número de famílias que têm nesses idosos uma importante e estável fonte de renda, reduzindo as desigualdades sociais, conforme previsto no artigo 3º da Constituição Federal.
A Proposta de Emenda Constitucional de nº 287/2016 está na contramão das conquistas sociais garantidas na Constituição de 1988, alcançando de morte a Previdência e Assistência Social, direitos sociais que compõem a Seguridade Social.
2. DOS FUNDAMENTOS TÉCNICOS JURÍDICOS
O Governo Federal vem sustentando que há um déficit na Previdência Social, contudo não é isso que os estudos da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL- ANFIP demonstram, muito ao contrário do que vem sendo massificada pelo Governo Federal. Segundo a ANFIP, a Seguridade Social é superavitária.
“... se a sociedade tivesse consciência do superávit da Seguridade Social, estaria em uma luta permanente por mais recursos para a Saúde ou ampliação dos direitos sociais. Em relação à previdência, ao invés de cortes em benefícios, ganhariam força os embates pela universalização da cobertura ou por maiores reajustes para os aposentados e pensionistas. Para construir o déficit, fogem dos conceitos contidos na Constituição de 1988.” ¹
Está previsto no Artigo 194 da Constituição Federal de 1988 que a Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Nos termos da Carta Magna, a Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das contribuições sociais.
As contribuições Sociais que custeiam a Seguridade Social prevista na CF/88 são as que incidem sobre a folha de pagamentos, o faturamento e sobre o lucro das empresas; os salários e rendimentos dos segurados da Previdência Social; a receita de concursos de prognósticos e do importador de bens e serviços. Tudo exclusivamente para aplicação na Seguridade Social, assegurando desta forma a garantia da manutenção dos direitos relativos à saúde, assistência social e previdência social.
Destaque-se que além destas contribuições sociais, a Seguridade Social contou até o ano de 2007 com a CPMF, por força da previsão Constitucional que faculta a criação de Lei para constituição de outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social.
Destaque-se ainda que o legislador constituinte disciplinou, entre os artigos 194 a 204 da CF/88, não apenas os dispositivos constitucionais que definem a Seguridade Social, mas também os que disciplinam as receitas e as despesas a serem cobertas com estes recursos.
2.1 DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
É fundamental compreender que a Carta Magna, conforme determinação contida em seu Artigo 201 estabelece que a organização da Previdência Social se dê sob a forma de Regime Geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória; ou seja, somente as despesas do RGPS estão abrigadas no Orçamento da Seguridade Social. As relativas aos regimes próprios de previdência de servidores e de militares, e dos sistemas de Previdência Complementar não podem ser financiadas com os recursos da Seguridade Social.
A Previdência constitui um seguro social que garante aos seus segurados cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, idade avançada, proteção à maternidade - especialmente à gestante, proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; e aos seus dependentes garante a pensão por morte, o salário-família e auxílio-reclusão aos dependentes dos segurados de baixa renda, conforme garantido no Artigo 201 da CF/88.
2.2 DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
A Constituição assegura em seu Artigo 203, que a assistência social será concedida a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social. Dentre os objetivos da assistência social está a proteção à velhice, a garantia de um salário mínimo de benefício mensal ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Atualmente, este benefício assistencial ao idoso é concedido aos 65 anos. A PEC 287/2016 propõe a concessão de benefício assistencial ao idoso a partir da idade de 70 (setenta) anos de idade. Atenta contra o mínimo existencial necessário a uma velhice digna, protegida da miséria.
3. DAS PROPOSTAS DE ALTERAÇÃO PREVISTAS PARA O REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA- RPPS
A PEC 287/16 apresenta 18(dezoito) proposta que representam um inaceitável retrocesso social:
- Elevação da idade mínima para aposentadoria, dos atuais 60 anos de idade para mulher e 65 anos de idade para homens, para 65 anos de idade tanto para homens, como para mulheres, indistintamente.
- Elevação do tempo mínimo de contribuição de 180 contribuições (15 anos) para 300 contribuições (25 anos), para ambos os sexos;
- Elevação da idade mínima para aposentadoria dos segurados especiais (agricultores e pescadores artesanais), dos atuais 55 anos mulher e 60 anos homens, para 65 anos de idade, homens e mulheres; Destaque-se que a para a mulher agricultora, a idade foi elevada de 55 pra 65 anos de idade, de uma só vez;
- Criação de um tempo de contribuição mínimo de 25 anos, também para os segurados especiais, para ambos os sexos, com percentual de contribuição para o RGPS a ser definido em lei; Atualmente o segurado especial, em razão da natureza de subsistência da atividade, não precisa necessariamente contribuir, mas fundamentalmente, comprovar o exercício da atividade nos últimos 15 anos;
- Fim do descarte dos 20% menores salários de contribuição na apuração da média do salário de benefício;
- Redução no percentual de cálculo do valor da aposentadoria: 51% (cinquenta e um por cento) da média dos salários de contribuição e das remunerações utilizadas como base para as contribuições, acrescidos de 1 (um) ponto percentual para cada ano de contribuição considerado na concessão da aposentadoria, até o limite de 100% (cem por cento), respeitado o limite máximo do salário de contribuição do regime geral de previdência social, nos termos da lei; atualmente, parte-se de 70% da média dos salários de contribuição, acrescido de 1% para cada grupo de 12 contribuições;
- A fim do valor da aposentadoria por invalidez em 100% (cem por cento) da média dos salários de contribuição, quando não for por acidente de trabalho;
- A vedação da contagem de tempo de contribuição fictício para efeito de concessão dos benefícios previdenciários e de contagem recíproca;
- A majoração da idade mínima (65 anos) sempre que verificado o aumento de um ano inteiro na média nacional de expectativa de sobrevida da população brasileira, para ambos os sexos;
- Redução do valor da Pensão por Morte para 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria, acrescida de cotas individuais de 10 (dez) pontos percentuais por dependente, até o limite de 100% (cem por cento) do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se fosse aposentado por incapacidade permanente na data do óbito;
- A não aplicação do parágrafo 2º do artigo 201 da CF/88, que garante que nenhum benefício terá valor mensal inferior ao salário mínimo;
- A não reversão das cotas individuais da pensão por morte, com a perda da qualidade de dependente;
- Vedação de recebimento de mais de uma pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro, no âmbito do regime geral de previdência e dos regimes próprio;
- Vedação de recebimento de pensão por morte e aposentadoria no âmbito do regime geral de previdência ou entre este regime e os regimes próprios de previdência;
- Alteração da idade para concessão do benefício assistencial de 65 anos para 70 anos;
- Extinção da aposentadoria especial dos professores;
- A extinção da aposentadoria por tempo de contribuição;
- Criação de idade mínima de 55 anos para aposentadoria especial;
Inquestionável que as alterações proposta pela PEC 287 trazem pleno prejuízo aos segurados da previdência social, bem como, se distanciando de um dos objetivos da República, previstos no artigo 3º da Constituição Social que é erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.
4. CONCLUSÃO
Não tivemos o objetivo de esgotar o tema, mas tão somente expor os que consideramos mais relevantes, concluímos diante das fundamentações apresentadas que há necessidade de uma Reforma da Previdência para o Regime Geral, que seja apresentado pelo Governo federal uma proposta com o objetivo de reestruturar o custeio da Seguridade Social, sobretudo ao que se refere à desoneração da folha de pagamentos sem o correspondente repasse dos recursos da contribuição substitutiva; Que se estabeleça um política de revisão das renúncias e desonerações fiscais e cobrança das dívidas de contribuições previdenciárias; E não incidência da DRU sobre Contribuições Sociais.
Previdência constitui um seguro social que protege o segurado nos momentos mais difíceis da vida, por isso é necessária uma reforma que envolva o amplo debate com as entidades civis, e que dele resulte a manutenção e proteção dos direitos sociais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANFIP - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Disponível em <http://www.anfip.org.br/doc/publicacoes/20161013104353_Analise-da-Seguridade-Social-2015_13-10-2016_Anlise-Seguridade-2015.pdf>. Acesso em 12/12/2016,
CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, acesso em 12/12/2016, link https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
HORVATH JÚNIOR, Miguel. Os direitos fundamentais e a seguridade social. Disponível em: http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/020507.pdf. Acesso em: 13 dez. 2016.
MORAES. Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Teoria geral. Comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da Republica Federativa do Brasil. Doutrina e Jurisprudência. Coleção temas jurídicos. v. 3. 2. ed. São Paulo: Atlas. 1998.