O direito constitucional de defesa do acusado no devido processo penal eletrônico

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24/01/2017 às 01:32
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3. O PROCESSO VIRTUAL NO ÂMBITO DO DIREITO PROCESSUAL PENAL   

Sabe-se que é um desafio da justiça brasileira lidar com a morosidade do Poder Judiciário. São inúmeros os fatores que contribuem para tal. Podemos mencionar, como principais, o desenfreado crescimento de ações judiciais, a falta de estrutura do Poder Judiciário manifestada pelo número insuficiente de juízes e demais servidores, bem como a falta de estrutura física com locais adequados à devida prestação jurisdicional.

A Constituição da República, em seu art. 5º, inc. LXXVIII assegura a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

A informatização de atos processuais resulta na diminuição do tempo gasto até o julgamento, pois somente as etapas burocráticas do processo consomem mais da metade do tempo compreendido entre o início e o fim de uma ação judicial.

Ademais, sabe-se que o Poder Judiciário conta com recursos financeiros limitados, sendo de suma importância que, sempre que possível, utilize dos mecanismos e ferramentas mais econômicos.

Eliminando-se algumas das tarefas que ora só podiam ser realizadas por servidores, é possível reduzir o número de funcionários integrantes dos quadros de pessoal do Poder Judiciário.

É nesse contexto, visando a diminuição dos custos, bem como dar celeridade à tramitação dos processos que surge o Processo Judicial Eletrônico.

Outrossim, cumpre salientar que a virtualização do processo judicial importa em maior facilidade e comodidade a todos os operadores do Direito, não só pela conveniência de realizar e ser comunicado dos atos processuais à distância através da rede mundial de computadores, como também pelo fato de que evitar-se-ia o inconveniente de perdas dos autos dos processos físicos, e o cálculo errado de prazos processuais, por exemplo.

Ressalta-se ainda que a não utilização de papel para os autos processuais é uma medida, do ponto de vista ecológico, mais correta e adequada.

O processo judicial eletrônico é dotado de algumas características, tais como a publicidade, que ganha amplitude; a facilidade de acesso à informações, a velocidade, a digitalização dos autos e a automação das rotinas e decisões judiciais.

A Lei nº 11.419/2006 dispõe sobre a informatização do processo judicial, regulando o uso do meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças processuais.

Consoante o art. 1º, § 1º do dispositivo, a informatização do processo judicial deve ser aplicada, indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista, bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição.

Ocorre que, por utilizar-se de transmissão eletrônica, passível de falhas, é certo que existe certo temor quanto à confiabilidade e eficiência de tal meio; neste sentido elucida Nestor Távora[11]:

[...] A aplicação dos enunciados normativos da Lei nº 11.419/2006 está permeada pela preocupação com a segurança e a exatidão na transmissão de dados e da comunicação dos atos processuais, preconizando o atendimento de condições para a viabilidade do processo eletrônico.

A condição de operabilidade do sistema para transmissão de peças processuais, e realização de demais atos é a assinatura eletrônica, que pode ser a assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada, ou mediante cadastro de usuário no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos (1º, §2º, Lei nº 11.419/2006).

Consoante o art. 3º da referida lei, consideram-se realizados os atos processuais por meio eletrônico no dia e hora do seu envio ao sistema do Poder Judiciário, onde é gerado protocolo eletrônico. Vale dizer que o prazo para protocolar qualquer peça processual estende-se pelas 24 horas do último dia para tal.

A comunicação eletrônica dos atos processuais e de outros comunicados se dá por meio da disponibilização destes em sítio da rede mundial de computadores, através de Diário de Justiça eletrônico criado pelos tribunais.

As publicações eletrônicas, exceto aquelas que a lei exige intimação ou vista pessoal, substitui qualquer outro meio e publicação oficial, consoante o art. 4º, § 2º da Lei. A publicação é datada do dia útil seguinte ao dia em que é disponibilizada no meio eletrônico. Vale dizer que neste caso os prazos começam a correr no dia seguinte à data da publicação.

Conforme o art. 5º, §§ 1º e 3º da Lei nº 11.419/2006, estará intimado aquele que efetuar a consulta eletrônica ao teor da intimação, ou que, decorridos 10 dias do envio desta, não procedeu à sua consulta.

Feitas essas breves considerações sobre o processo judicial eletrônico, passemos à sua análise no âmbito do Direito Processual Penal.

No Direito Processual Penal, por se tratar de processo condenatório, onde se lida com bens jurídicos de maior importância, a informatização do processo terá algumas peculiaridades.

Como já dito anteriormente, o legislador, no art. 1º, § 1º da Lei nº 11.419/2006, declarou que as disposições acerca da virtualização do processo se aplicam de igual forma ao penal. Com sorte, a realidade futura da justiça brasileira, ainda distante, será a implantação do Processo Judicial Eletrônico – PJe em todos os órgãos julgadores, substituindo em grande maioria, os processos físicos.

Vejamos o teor dos §§ 4º e 5º do art. 5º da Lei 11.419/2006:

§ 4o - Em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa de correspondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática do prazo processual nos termos do § 3o deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço.

§ 5o  Nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz.

Neste sentido, preleciona Nestor Távora[12]:

Na linha de ser garantida a segurança do sistema e da efetividade processual – com as cautelas necessárias quando se tratar de processo penal condenatório – aviva a nova lei que “em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa de correspondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática no prazo processual nos termos do § º deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço” (§ 4º, do art. 5º, Lei nº 11.419/2006), com a previsão de que “ nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz”.

No que tange à citação eletrônica, esta não poderá ser feita no âmbito da justiça criminal. Observadas as formas e as cautelas do art. 5º da Lei em comento, e desde que acessível a íntegra dos autos ao citando, as citações poderão ser realizadas por meio eletrônico, exceto a dos Direitos Processuais Criminal e Infracional (art. 6º, Lei 11.419/2006).

As provas digitais no Processo Judicial Eletrônico penal, com garantia de sua origem e de seu signatário, são consideradas originais para todos os efeitos legais. Vejamos o § 1º, art. 11 da Lei:

§ 1o - Os extratos digitais e os documentos digitalizados e juntados aos autos pelos órgãos da Justiça e seus auxiliares, pelo Ministério Público e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas autoridades policiais, pelas repartições públicas em geral e por advogados públicos e privados têm a mesma força probante dos originais, ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração antes ou durante o processo de digitalização.

A informatização do processo penal abarca também a própria produção de provas, pois é possível registrar os depoimentos do acusado, bem como das vítimas e testemunhas através de videoconferência nas hipóteses previstas por lei.

Vale dizer que este é um recurso que contribui para o bom julgamento da causa. Conforme o art. 405, §§ 1º e 2º do CPP, as cópias dos registros audiovisuais serão encaminhados para as partes, e poderão posteriormente ser revistos a qualquer momento em sede de 2ª instância, ou pelo próprio julgador.

A questão polêmica acerca da informatização do processo penal refere-se à conformidade da realização dos atos e diligências processuais de forma informatizada com o garantismo penal.

Por fim, ressalte-se que a virtualização do processo penal como meio mais célere e eficaz deve observar obrigatoriamente as particularidades do processo penal, sob o crivo dos princípios do contraditório e da ampla defesa.


4 VANTAGENS E DESVANTAGENS DO PROCESSO PENAL VIRTUAL

Como dito anteriormente, o surgimento da Lei nº 11.419/06, a qual criou disposições próprias acerca do Processo Eletrônico, modificou de forma substancial a realidade do Judiciário, o qual deve se adaptar às mudanças sociais, principalmente no tocante às relações humanas.

Nota-se que a informática tem adquirido espaço no cotidiano das pessoas, desde as relações pessoais a questões voltadas ao trabalho. Nesse contexto, surge a Lei regulamentando tal modalidade.

Observamos, acima de tudo, que o processo eletrônico possui diversas vantagens, inspiradas principalmente nos princípios da celeridade e economia processual. Dentre elas podemos elencar a desnecessidade da utilização de papel, o que por muitas vezes revela em gastos exorbitantes pelo Judiciário, uma vez que geralmente os processos são volumosos, além da grande demanda.

Outra qualidade do e-process é o fato de diminuir os riscos de danos, extravio de documentos e processos, o que ensejaria procedimentos de restauração dos mesmos, além disso, proporciona agilidade na remessa do processo à 2ª instância, não precisando mais arcar com custos de deslocamento dos mesmos.

Da mesma forma, o meio eletrônico proporciona o mais fácil acesso dos advogados, juiz, Ministério Público, os quais não precisam se deslocar até o protocolo para dar vista aos autos, obtendo-se assim, as informações desejadas sem precisar nem se deslocar para o âmbito de trabalho, uma vez que tudo pode ser feito pelo computador[13].

O processo virtual possibilita, ainda, que as petições sejam enviadas até às 24h do último dia do prazo, ou seja, o advogado ou Defensor Público, possui mais tempo para enviar suas peças para o Judiciário, uma vez que é expedido certificado do envio da mesma, servindo como comprovante para refutar a intempestividade.

Além disso, não podemos deixar de observar que essa modalidade de processo, ocupa muito menos espaço físico, pois é armazenado somente no “sítio” do Poder Judiciário, o que possibilita uma maior organização, inclusive, das instituições de um modo geral.

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Por último, cabe observar que o processo virtual supera as barreiras físicas, uma vez que um advogado pode participar, pelos meios eletrônicos, de um processo estando em outra comarca, por exemplo, e dirime, também, com as burocracias desnecessárias, como por exemplo, as juntadas e autuações, os quais dependem de atividade de pessoas determinadas, geralmente os técnicos e secretários judiciais.

Por outro lado, muitos doutrinadores, dentre eles Alexandre Vidigal de Oliveira, afirma não ser o processo virtual possuidor de tantas vantagens assim, elencando dentre as desvantagens o inconveniente da impossibilidade de transmissão de dados, petições devida a falhas no sistema, acarretando perda de prazo. Porém, tal situação foi abordada no §2º do art.10 da Lei 11.419/06, a qual afirma que, nesse caso, o prazo será prorrogado para o primeiro dia útil subsequente.

Outra circunstância com a qual se pode deparar é com o sistema lento, o que é difícil de evitar, sendo uma característica inerente ao meio virtual, estando todos sujeitos a isso. Não se pode olvidar também as questões inerentes à saúde, uma vez que passar horas em frente ao computador lendo processo e exercendo atividade cognitiva, além de extremamente cansativo, não é aconselhável, uma vez que a luz da tela é prejudicial à vista, como afirma o doutrinador Alexandre Atheniense[14].

Outras duas questões suscitadas é o fato de que computadores conectados à internet estão sujeitos a atividades de crackers, hackers, podendo os dados ser perdidos. Situação que pode ser superada pela simples prática de backups. Além de que não há uma unificação dos sistemas de processos eletrônicos, ficando demasiadamente complicado o acesso e o entendimento de todos eles, uma vez que são ferramentas novas que precisam ser treinadas e aprendidas pelos manuseadores, que são os advogados, juízes, entre outros.

Ainda, cabe discorrer sobre o fato do Judiciário ainda não estar devidamente equipado com instrumentos aptos a efetivação de tal inovação. Os computadores, em sua maioria das vezes, são antigos e mal cuidados, o que dificulta ainda mais a simpatia por tal modalidade, além de que a leitura dos autos em papel se torna mais fácil devido ao fato das folhas serem diferentes e facilmente identificadas pelo leitor.

A este ponto, interessante é a anotação feita em artigo científico de Alexandre Vidigal[15]. Senão vejamos:

“[...] os autos do processo eletrônico, com folhas padronizadas, são um óbice à informação, posto que não permitem a visualização do processo como um todo, tornando a leitura fatigante e a assimilação das informações que anteriormente poderiam ser de fácil acesso, em razão das folhas de papel com tamanhos ou cores diferentes, passam a exigir uma disposição mental apurada.”

Sabe-se, acima de tudo, que há resistência cultural às inovações, as mudanças de formas, que foram feitas no decorrer de anos, não são bem recebidas àquelas que se acostumaram a fazer de determinado jeito. Os mais velhos no ofício, geralmente optam pelas formas como sempre fizeram, pois, assim, se torna, por assim dizer, mais “cômodo”, apesar de que confrontando as vantagens e desvantagens não parece ser.

Cumpre destacar, por fim, que ainda não está bem claro o que pode ser feito e o que não pode ser feito no meio virtual, sua extensão. Por exemplo, houve o caso de uma servidora que tirou o nome do noivo do SPC entrando no sistema de processos com a assinatura digital de um juiz, acontece que “ela poderia ter tirado alguém da cadeia”, o que configura enorme falha, como afirma a especialista Tereza Fernanda Martuscello Papa[16].

É necessário, portanto, cautela acima de tudo, além da implantação de meios de certificação digital e acesso de forma segura, para que esse sistema, possuidor de tantas vantagens aptas à melhoria de vida e economia, além de celeridade, não seja desvirtuado para a prática de atividades impróprias.

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