Rendimentos pagos a residentes no exterior, imposto de renda e Lei nº 13.315/2016

Considerações a respeito da suplementação de aposentadoria paga pelas entidades fechadas de previdência complementar

04/02/2017 às 12:59
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O presente artigo pretende demonstrar que a Lei nº 13.315/2016, alteradora da tributação do imposto de renda, não é aplicável à suplementação de aposentadoria paga pelos Fundos de Pensão a residentes ou domiciliados no exterior.

A Lei nº 9.779/1999, ao tratar da incidência do Imposto de Renda (IR) aplicável aos rendimentos recebidos por pessoas físicas domiciliadas no exterior, estabelecia:

Artigo 7º  - Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de vinte e cinco por cento. (destacamos) (1)

Por sua vez, a Lei nº 13.315/2016, alteradora da Lei nº 9.779/1999, inovou ao consignar que:

"Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, de aposentadoria, de pensão e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento).” (destacamos)

Extraímos do simples cotejo dos dispositivos que a alteração normativa, a vigorar a partir de 01.01.2017 (2) (3), tem por finalidade submeter os rendimentos da inatividade (aposentadoria e pensão) percebidos por residentes no exterior à incidência da alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) de imposto de renda.

Em busca do alcance da expressão “de aposentadoria e pensão”, extraímos da Mensagem de Veto nº 410 a proposta de redação do parágrafo 1º do artigo 7º da Lei nº 13.315/2016:

§ 1º  - O disposto no caput não se aplica aos rendimentos provenientes de aposentadorias e pensões auferidos por pessoas físicas residentes ou domiciliadas no exterior, pagos ao beneficiário pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no seu local de residência ou domicílio, sobre os quais incidirão as mesmas alíquotas aplicadas aos benefícios da mesma natureza pagos no território nacional.” (Dispositivo Vetado) (destacamos)

A interpretação conjunta do caput, sancionado, e do parágrafo primeiro, vetado, ambos do mesmo artigo 7º, permite-nos concluir que o fim almejado pelo legislador ordinário estaria circunscrito à aposentadoria de responsabilidade do INSS, afastada sua aplicação à complementação de aposentadoria paga pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC).

Ocorre que, nas razões do veto elaborado pelo Ministério da Fazenda, tem-se que:

Os dispositivos acarretarão renúncia de receita tributária, sem atentarem para as condicionantes do artigo 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000 (LRF). Além disso, abrigam potencial de litigiosidade por alegações de afronta ao princípio da isonomia, por parte dos contribuintes beneficiários de previdência privada residentes ou domiciliados no exterior, em face do artigo 150, II, da Constituição, na medida em que os dispositivos só contemplariam tratamento tributário diferenciado para os beneficiários da Previdência Social.” (destacamos)

Pelo exposto, adotada a modalidade de interpretação literal ou gramatical, o dispositivo seria aplicável, exclusivamente, aos benefícios de aposentadoria e pensão pagos pelo INSS.

Por outro vértice, em interpretação finalística ou teleológica, seria possível extrair da Mensagem de Veto nº 410, anteriormente referida, que o objetivo do legislador ordinário também teria sido contemplar os benefícios de complementação de aposentadoria pagos pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC).

Diante da lacuna normativa, alinhados ao Princípio da Legalidade Tributária, seria vedado à União (Fazenda Nacional) exigir imposto de renda sobre a complementação de aposentadoria paga pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) aos residentes no exterior segundo os termos da novel legislação, alargando o espectro de atuação da Lei nº 13.315/2016.

Esse o entendimento que nos parece mais razoável, afastada a alegação de tratamento anti-isonômico referida nas razões de veto ao parágrafo 1º do artigo 7º da Lei nº 13.315/2016.

Ao tratar do tema “rendimentos recebidos [...] por pessoa física não-residente no Brasil” (4), a IN SRF nº 208/2002 estabelece:

Artigo 10 – Os rendimentos recebidos de fontes situadas no Brasil pela pessoa física que se retirar em caráter permanente do território nacional sujeitam-se à tributação exclusiva na fonte ou definitiva, nos termos previstos nos arts. 26 a 45, a partir da data da saída definitiva do País. (destacamos)

E complementa:

Artigo 35 - Os rendimentos pagos, creditados, empregados, entregues ou remetidos a não-residente por fontes situadas no Brasil estão sujeitos à incidência do imposto exclusivamente na fonte, observadas as normas legais cabíveis. (destacamos)

Desse modo, conclui-se que, tanto os rendimentos pagos no país (regra), como os eventualmente remetidos ao exterior (exceção), por Entidade Fechada de Previdência Complementar (EFPC) a pessoa física domiciliada no extrangeiro (“não-residente”) estão sujeitos, indistintamente, à incidência de imposto de renda na fonte, “observadas as normas legais cabíveis”.

Quanto às normais legais cabíveis, o Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966) estatui:

Artigo 98 - Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.

Embora, tecnicamente, os tratados internacionais não revoguem a legislação tributária interna, mas suspendam sua eficácia enquanto estiverem em vigor, ou seja, até que sejam denunciados (5), observados os critérios cronológico e da especialidade (6), conclui-se que o processamento do pagamento de complementação de aposentadoria no país a residentes no exterior deve observar os acordos de tributação firmados pelo Brasil, aplicando-se a alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) às hipóteses de inexistência de tratado ou convenção internacional, conforme consignado na IN SRF nº 208/2002 e no Decreto nº 3.000/1999 (Regulamento do Imposto de Renda):

Artigo 36 - Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a não-residente sujeitam-se à incidência do imposto na fonte à alíquota de 25%, ressalvado o disposto no art. 37.” (destacamos)

Artigo 685 -  Os rendimentos, ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, por fonte situada no País, a pessoa física ou jurídica residente no exterior, estão sujeitos à incidência na fonte: [...] II - à alíquota de vinte e cinco por cento: a) os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços;” (destacamos)

Nesse sentido, a Lei nº 8.212/1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, determina:

Artigo 85-A - Os tratados, convenções e outros acordos internacionais de que Estado estrangeiro ou organismo internacional e o Brasil sejam partes, e que versem sobre matéria previdenciária, serão interpretados como lei especial.” (destacamos)

Por todo o exposto, concluímos que os pagamentos efetuados no Brasil por Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) a residentes no exterior devem sujeitar-se à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) de imposto de renda na fonte, ressalvadas as hipóteses de acordo internacional de tributação, observados os critérios da especialidade e cronológico, não se lhes aplicando, tecnicamente, os termos da Lei nº 13.315/2016, alteradora da Lei nº 9.779/1999.

Notas:

(1) No mesmo sentido, ainda em vigor, o artigo 36 da IN SRF nº 208/2002 - Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a não-residente sujeitam-se à incidência do imposto na fonte à alíquota de 25%, ressalvado o disposto no art. 37. (destacamos)

(2) Artigo 3º da Lei nº 13.315/2016 - O art. 7º da Lei no 9.779, de 19 de janeiro de 1999, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 7º  - Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, de aposentadoria, de pensão e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento).”

(3) Artigo 5º da Lei nº 13.315/2016 – Esta lei entra em vigor: I - a partir de 1º de janeiro de 2017, em relação ao art. 3º; (destacamos)

(4) Instrução Normativa SRF nº 208, de 27 de setembro de 2002 - Dispõe sobre a tributação, pelo imposto de renda, dos rendimentos recebidos de fontes situadas no exterior e dos ganhos de capital apurados na alienação de bens e direitos situados no exterior por pessoa física residente no Brasil e dos rendimentos recebidos e dos ganhos de capital apurados no País por pessoa física não-residente no Brasil. (destacamos)

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(5) “O que ela pretende dizer é que os tratados e convenções internacionais prevalecem sobre a legislação interna, seja anterior ou mesmo posterior". (Curso de Direito Tributário. MACHADO, Hugo de Brito. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998.).

(6) “Gize-se que não há considerar revogada a legislação interna pelo ingresso no mundo jurídico de norma oriunda de tratado, porém, unicamente que a eficácia da legislação interna antes em vigor restou suspensa, enquanto mantida a norma posterior, como bem elucida a transcrição supra.” (Código Tributário Nacional. FREITAS, Vladimir Passos de. 4ª ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2007.).

A denúncia é ato unilateral em que o Estado manifesta a vontade de deixar de ser parte de determinado acordo internacional.

(6) “A eventual precedência dos atos internacionais sobre as normas infraconstitucionais de direito interno somente ocorrerá - presente o contexto de eventual situação de antinomia com o ordenamento doméstico -, não em virtude de uma inexistente primazia hierárquica, mas, sempre, em face da aplicação do critério cronológico (lex posterior derogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade (RTJ 70/333 - RTJ 100/1030 - RT 554/434).”

PARIDADE NORMATIVA ENTRE ATOS INTERNACIONAIS E NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS DE DIREITO INTERNO. - Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em consequência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa. Precedentes. No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras infraconstitucionais de direito interno somente se justificará quando a situação de antinomia com o ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a aplicação alternativa do critério cronológico ("lex posterior derogat priori") ou, quando cabível, do critério da especialidade. Precedentes. (ADI 1480 MC, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/1997, DJ 18-05-2001 PP-00429 EMENT VOL-02031-02 PP-00213) (destacamos)

A nosso ver, o que de fato ocorre é que as normas contidas em tais atos, por serem especiais, prevalecem sobre a legislação interna, afastando sua eficácia no que com esta forem conflitantes (critério da especialidade para a solução de conflitos normativos).” (Direito Tributário, Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. PAULSEN, Leandro. 13ª ed. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2011.).

Um tratado somente pode ser despojado de sua força obrigatória por lei posterior de caráter explicitamente revogatório, jamais de forma implícita.” (Compêndio de Direito Tributário, segundo volume. MORAIS, Bernardo Ribeiro de. 3ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 1995).

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Sobre o autor
Fábio Vasques

Pós-Graduado em Direito Tributário, Direito Público, Direto Processual Civil e Direito do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes. Especializado em Direito Previdenciário pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em Direito Civil pelo Centro de Estudos da Advocacia Pública do Estado do Rio de Janeiro. Advogado Pleno da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Em vigor a partir de 01.01.2017, a Lei nº 13.315/2016 ainda suscita dúvidas e é objeto de interpretações divergentes, o que abre campo fértil para discussões doutrinárias da espécie.

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