Ex-primeira dama Marisa Letícia morre. A banalidade do mal de alguns brasileiros

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Hannah Arendt justificou o comportamento de Adolf Eichmann pelo tipo de moral que vigorava entre os nazistas, e a própria sociedade alemã. A educação influência na formação psíquica do ser humano.

A ex-primeira-dama Marisa Letícia faleceu. Marisa foi companheira do ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. O artigo aborda a mentalidade e a percepção dos brasileiros sobre o conceito de justiça.

A Operação Lava Jato estava investigando Lula e Marisa, e ambos eram alvos de inúmeras acusações provenientes de uma justiça particular, alimentada pela antipatia de quem é contrário ao Partido dos Trabalhadores (PT). Antes do desfecho final da Lava Jato, muitos "justiceiros" já haviam decretado sua própria sentença de condenação pessoal.

N o Brasil, o simples fato de ser mencionado como "devedor" — em referência à violação do contrato social — já cria, na mente de algumas pessoas, dependendo da seletividade penal, a imagem de um criminoso nato.

Há uma diferença significativa entre as fases processuais: inquérito policial (investigação policial), indiciamento (indícios de crime) e réu (processo criminal; acusado de crime). No entanto, em muitos casos, ocorre uma histeria coletiva. Fogueiras simbólicas, acesas nos corações ávidos por "justiça", ardem ao som estridente e quase em transe, clamando pela condenação do "acusado".

Na lógica das "labaredas justiciais", uma vez indicado ou réu, o indivíduo já é tratado como condenado. Para os "justiceiros", o promotor de justiça não passa de um carrasco a serviço da sociedade, ignorando-se o fato de que o promotor, em muitas situações, também pode atuar como defensor — por exemplo, em casos de maus-tratos cometidos contra crianças e adolescentes por seus responsáveis legais.


Abaixo, algumas imagens que colhi:

Corregedoria-Geral do Ministério Público de Minas Gerais abriu uma investigação sobre a conduta do procurador de Justiça do estado, Rômulo Paiva Filho, que publicou uma foto da ex-primeira-dama Marisa Letícia em uma rede social e escreveu a frase, “Morre logo, peste! Quero abrir logo o meu champagne!” (Fonte: G1)

O neurocirurgião Richam Faissal El Hossain Ellakkis, que sugeriu num grupo de WhatsApp procedimento para matar dona Marisa Letícia, é um médico que já trabalhou na rede pública em São Paulo. (Fonte: DCM)

Abaixo, três comentários do site Exame.com, que transcrevo:

“Não estamos felizes pela morte de Marisa Letícia, mulher de Lula. A morte sempre é uma tragédia. Porém não somos hipócritas. Marisa Letícia viveu uma vida de crimes. Foi a fiel comparsa de Lula, o maior bandido da história do Brasil. Usufruiu do melhor que o dinheiro pode comprar, dinheiro roubado que poderia ter salvo milhões de vidas se fosse bem aplicado nos hospitais públicos. Infelizmente Marisa não foi alcançada pela Justiça. Não pagou por seus delitos. Viveu e morreu no luxo, em um dos hospitais mais caros do país e nem gastou para isso. Todos os custos de marisa no Sirio Libanes foram custeados pelo povo brasileiro pois o Governo Federal banca todas as despesas de Presidentes, vices, Senadores, Deputados Federais e de seus familiares nesse hospital, mesmo apos o fim dos mandatos. Ou seja, Marisa já era rica, dinheiro fruto de roubo e morte de milhões de brasileiros, e ainda se internou no melhor hospital do Brasil com o nosso dinheiro. Morreu em cama quente ao lado dos melhores médicos do Brasil. Enquanto isso trabalhadores honestos morrem no chão gelado dos hospitais públicos sem qualquer tipo de atendimento digno. Não vamos endeusar bandido aqui. A morte não transforma ninguém em santo. Agora que pague o que deve do outro lado, pois se a justiça dos homens e falha, a justiça de Deus e implacável. Uma a menos para roubar o sofrido povo brasileiro.”

Também não estamos felizes pela morte de Marisa Leticia, mulher de Lula, como também, não estaria pelos familiares dos demais larápios da República como Aécio Neves, José Serra, Geraldo Alkmin, Temer, Geddel, Moreira Franco, Cabral, Paes e demais ratos, que ainda sobrevivem na luz da injustiça e continuam custeados por todos nós. Também são comparsas de Lula, maior bandido da história do Brasil? Não somos hipócritas para crucificar um e santificar os outros. Ainda usufruem do melhor que o dinheiro pode comprar, dinheiro que ainda pode salvar milhões de vidas não só em hospitais, mas em outras áreas como saneamento, segurança e educação. Esses que ainda vivem nessa lama ainda podem ser alcançadas pela Justiça e pagar por seus delitos. Vivem no luxo, em todos os confortos do país e não gastam nada por isso, custeados pelo povo brasileiro. Enquanto isso trabalhadores honestos vivem de salário mínimo para aposentar-se aos 65 anos. A questão não é endeusar bandidos aqui, nem tão pouco fazer juízo a quem ainda não foi julgado, condenado e nem sequer pode se defender. Se for assim, atire a primeira pedra, quem lhe arrodeia ou senta à sua mesa. A morte realmente não transforma ninguém em santo e se for uma menos para roubar o sofrido povo brasileiro torça para que os demais também queimem no fogo do inferno e ajude a soprar a fogueira com seu comentário sadio e com a lisura de seu espelho inquebrável.

Ridículo ver um monte de gente, que aposto que sonega imposto falando de honestidade e roubo, gente que nem sequer deve devolver o troco errado quando recebe, bando de hipócritas, pra vocês que desejam o mal e morte dos outros, saibam que o inferno tem um lugar reservado pra vocês.


DIVERGÊNCIAS E SENSO DE JUSTIÇA

Não pretendo, de forma alguma, sugerir que, caso Marisa estivesse entre nós, haveria qualquer tipo de apoio à criminalidade, seja ela qual for. Todavia, cabe questionar: qual é a formação ética e moral do corpo social brasileiro? Historicamente, características como ganância, individualismo, egoísmo, preconceito e discriminação marcam a cultura brasileira.

A história do Brasil, desde 1500 até antes de 1988, pode ser descrita, como afirmou Darcy Ribeiro, como um verdadeiro "moer de gente". Foi somente com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que as minorias passaram a ter o direito à igualdade material, além da igualdade formal. As ações afirmativas, implementadas a partir da década de 1990, asseguraram às minorias o acesso a direitos sociais, culturais e econômicos, consolidando o papel do Estado Social. Diante desse contexto, é possível traçar um delineamento do tipo de cultura que caracteriza o Brasil.

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JUSTIÇA E "JUSTIÇA"

Sócrates afirmava que o homem justo é aquele que obedece às leis de sua cidade; e que quem pratica o mal, ainda que seja contra um inimigo, age de forma injusta. Para Platão, uma cidade justa é composta por homens bons. Ou seja, a cidade reflete o âmago do ser humano. Já Aristóteles dizia que a virtude moral não é inata, mas desenvolvida pelo hábito. Cada indivíduo deve praticá-la ao longo de sua existência.

Santo Agostinho sustentava que a verdadeira justiça está em consonância com a lei de Cristo: "Amarás a Deus com toda a tua alma e ao teu próximo como a ti mesmo" e "Faça ao outro o que queres que te façam". Por sua vez, Jean-Jacques Rousseau defendia que uma lei é justa quando reflete a vontade geral, desde que esta vontade seja autônoma.

Immanuel Kant, por outro lado, postulava que cada ser humano tem o dever categórico de respeitar a dignidade do outro. Segundo Kant, as escolhas humanas não são totalmente livres, estando influenciadas pelo meio externo (regras sociais, leis) e pelo próprio organismo físico. A autonomia consiste em agir sem a influência desses fatores, enquanto a heteronomia é o oposto. Aquele que age com autonomia respeita a dignidade humana. Dessa forma, o valor moral de uma ação reside na sua qualidade, isto é, no respeito à dignidade humana, e não na intenção de utilizar outra pessoa para alcançar objetivos próprios. Assim, podemos concluir que, para Kant, o indivíduo justo não é aquele que obedece cegamente ao ordenamento jurídico ou que age visando a aprovação de um grupo. A ação justa se concretiza por meio da autonomia da vontade, alinhada à dignidade humana. A autonomia da vontade permite agir sob uma lei que cada indivíduo impõe a si mesmo, mas sem deixar de considerar os interesses da comunidade. O valor moral de uma ação deve ser avaliado à luz de sua capacidade de ser benéfica, moralmente, tanto para si mesmo quanto para as demais pessoas. Por exemplo, um fornecedor que vende um celular informando que o aparelho tem conectividade com a Internet, mas omite que o consumidor precisa contratar um plano de acesso, comete uma imoralidade pela omissão de uma informação relevante. A dignidade humana, portanto, deve ser o norte de qualquer conduta.

A justiça benéfica é aquela em que todos têm direitos e oportunidades iguais. Por outro lado, a "justiça" restritiva ocorre quando apenas alguns possuem direitos e oportunidades, enquanto outros são limitados por leis e posturas dominantes de uma parcela da sociedade. Essas desigualdades estruturais impedem a ascensão socioeconômica de um grupo e garantem privilégios a outro, frequentemente por meio da exploração da mão de obra alheia.

Concluo que, historicamente, a cultura brasileira pode ser descrita como um "moer de pessoas". A dignidade humana nunca foi respeitada de maneira universal. Apenas alguns indivíduos, por interesses utilitaristas, eram tratados com dignidade. O caminho da delinquência tem sido trilhado por muitos brasileiros, frequentemente em decorrência de pequenos e aparentemente insignificantes desvios de conduta, como o desrespeito ao contrato social. Exemplos disso incluem a fraude no processo de habilitação de trânsito, o furto de energia elétrica, a sonegação de impostos, o nepotismo e outras práticas.

No Brasil, há uma cultura enraizada de desobediência ao Estado Democrático de Direito. A "vontade líquida" — instável e centrada em interesses individuais — faz com que o errado, o injusto e o ilícito sejam legitimados pela busca incessante do status e da valorização do "ter". A solidariedade e o respeito pelo próximo foram substituídos por um individualismo exacerbado.

Se, antes de 1988, havia uma noção de sociedade, ainda que moldada por regras discriminatórias e preconceituosas, na contemporaneidade o que prevalece é o "eu e eu". Nesse século, é essencial resgatar o comunitarismo, de forma que a autonomia da vontade esteja alinhada com a verdadeira justiça: o respeito à dignidade humana.

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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