O neoprocessualimo e o princípio da primazia da decisão de mérito no novo Código de Processo Civil

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O presente artigo tem como objeto o estudo acerca do princípio da primazia do mérito e sua relação com efetividade da prestação jurisdicional.

Resumo: O presente artigo tem como objeto o estudo acerca do princípio da primazia do mérito e sua relação com efetividade da prestação jurisdicional. Inicialmente, será realizada uma abordagem acerca da influência da concepção de Estado sobre o pensamento jurídico, com ênfase na mudança de paradigma no ordenamento jurídico brasileiro no tocante ao formalismo no processo civil. Nesse contexto, buscar-se-á analisar as bases para a positivação do princípio da primazia da decisão de mérito no Novo Código de Processo Civil, abordando, inclusive, os meios previstos para a concretização do mencionado princípio.

Palavras-chave: Processo Civil. Formalismo. Neoprocessualismo. Princípio da Primazia da Decisão de Mérito.

Sumário: Introdução. 1. Perspectiva histórica sobre o formalismo. 2. Novos paradigmas do pensamento jurídico contemporâneo: o neoconstitucionalismo e o neoprocessualismo. 3. O princípio da primazia da decisão de mérito. 4. Hipóteses de extinção do processo sem resolução de mérito por inadmissibilidade. 5. O princípio da primazia da decisão de mérito e os meios para sua concretização. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.


INTRODUÇÃO

O direito processual civil brasileiro tem vivenciado diversas transformações, buscando evoluir para atender satisfatoriamente ao seu fim primordial que é o de servir como um instrumento de realização do direito material. O Código Buzaid de 1973, em vigor até o presente momento, parece não ter atendido satisfatoriamente ao fim acima delineado, o que fez com que a comunidade jurídica se preocupasse com uma necessidade latente de alterações, com o objetivo de adaptar as normas processuais às mudanças da sociedade e ao funcionamento das instituições.

Para atender aos anseios da sociedade, no sentido de conferir agilidade e efetividade à prestação jurisdicional, muitas foram as mudanças doutrinárias e jurisprudenciais, e diversas foram as inovações no sistema legislativo, que culminaram com a verificação da necessidade de um Novo Código de Processo Civil.

Nesse diapasão, levando-se em conta que as modificações do Código de Processo Civil vinham ocorrendo de forma pontual, por meio de leis esparsas, o que poderia comprometer a coerência e a segurança jurídica da norma, foi instituída uma comissão de juristas para elaboração do anteprojeto do Código de Processo Civil, presidida pelo Ministro Luiz Fux, que tramitou no Senado Federal por meio do Projeto de Lei nº 166 de 2010, e, atualmente, já se encontra inserido no ordenamento jurídico pátrio, por meio da Lei nº 13.105/2015, cuja vigência se dará a partir de março de 2016, após o período de vacatio legis de um ano.

O mote da mudança baseia-se na necessidade de acelerar o andamento de processos judiciais e simplificar o sistema processual civil brasileiro.

Embora o CPC atual tivesse positivado o princípio da instrumentalidade da formas, em seu art. 154, o operador do direito parece vivenciar, ainda, um arraigado apego ao formalismo processual, o qual desemboca na grande incidência de feitos extintos sem resolução de mérito em razão da presença de vícios formais, seja com fundamento na ausência de uma das condições da ação ou na inobservância de pressupostos processuais.

Nesse contexto, foi positivado, no capítulo que trata das normas fundamentais do processo civil, precisamente no art. 4º do novo CPC, o princípio da primazia da decisão de mérito como uma das expressões do novo paradigma do direito processual denominado de neoprocessualismo, que figura como objeto do presente trabalho.


1. PERSPECTIVA HISTÓRICA SOBRE O FORMALISMO

Compreender a dimensão do formalismo no processo civil e no pensamento jurídico como um todo, requer a compreensão da conformação da estrutura estatal em determinado momento histórico e do contexto político que a originou, aspectos estes que passarão a ser abordados doravante.

Com a instauração do Estado de Direito, após as revoluções burguesas, passou a predominar a ideia de que a lei seria o maior escudo do cidadão face aos possíveis abusos estatais. Nessa nova conjuntura, o fundamento do poder estaria na vontade do povo expressada através das leis. O Poder, assim, seria legítimo por ser pautado na vontade do povo.

Nesse contexto, a lei foi dotada de uma superioridade moral sagrada, o que, consequentemente, repercutiu na forma de interpretar e aplicar o direito, uma vez que o apego excessivo à letra da lei não deixava margem para a livre apreciação do juiz ou para a discricionariedade do administrador público.

Tal pensamento, à época, encontrou grande respaldo de boa parte da população, por objetivar frear os poderes ilimitados do monarca e dos juízes. Isso por que, conforme mencionado por Luiz Guilherme Marinoni:

Antes do Estado legislativo, ou do advento do princípio da legalidade, o direito não decorria da lei, mas sim da jurisprudência e das teses dos doutores, e por esse motivo existia grande pluralidade de fontes, procedentes de instituições não só diversas, mas também concorrentes, como o império, a igreja etc. (FERRAJOLI apud MARINONI, 2014, p.25)

Os juízes anteriores à Revolução Francesa eram tão comprometidos com o poder feudal que se recusavam a admitir qualquer inovação introduzida pelo legislador que pudesse prejudicar o regime. Os cargos de juízes não apenas eram hereditários, como também podiam ser comprados e vendidos, e daí a explicação natural para o vínculo dos tribunais judiciários com ideias conservadoras e próprias do poder instituído e para a consequente repulsa devotada aos magistrados pelas classes populares. (CAPPELLETTI apud MARINONI, 2014, p. 26)

A conjuntura apresentada justificava a falta de credibilidade dos magistrados vivenciada naquele período, o que fez com que sua atuação fosse extremamente limitada pelos ditames da lei, momento a partir do qual o absolutismo do rei e de toda a estrutura que lhe dava sustentação passa a ser substituído pelo absolutismo dos parlamentares. Nesse cenário, o aspecto formal do princípio da legalidade ganha demasiada ênfase, conforme preleciona Marinoni:

O princípio da legalidade, assim, acabou por constituir um critério de identificação do direito; o direito estaria apenas na norma jurídica, cuja validade não dependeria de sua correspondência com a justiça, mas somente de ter sido produzida por uma autoridade dotada de competência normativa. Nessa linha, Ferrajoli qualifica o princípio da legalidade como metanorma de reconhecimento das normas vigentes, acrescentando que, segundo esse princípio, uma norma jurídica existe e é válida apenas em razão das formas e sua produção. Ou melhor, nessa dimensão a juridicidade da norma está desligada de sua justiça intrínseca, importando somente se foi editada por uma autoridade competente e segundo um procedimento regular. (MARINONI, 2014, p. 25)

Essas ideias influenciaram diretamente a atuação do jurista europeu e, por consequência, a atuação de toda comunidade jurídica dos países que seguiram a tradição do civil law.

Nesse período, o direito processual, por sua vez, não ficou imune às amarras do apego rigoroso às formas, das quais o ordenamento jurídico brasileiro vem tentando se desvencilhar de forma equilibrada desde o advento do Código de Buzaid.

A supervalorização do formalismo como preceito máximo para proteção do cidadão trouxe um engessamento tão nocivo para o operador do direito que, nas palavras de Galeno Lacerda (1983), “foi responsável por séculos de equívoco, na radicalização do rito, como um valor em si mesmo, em nome de um pretenso e abstrato interesse público, descarnado do humano e do verdadeiro objetivo do processo, que é sempre um dado concreto da vida, e jamais um esqueleto de formas sem carne.”

Pode se dizer que o pensamento hegemônico, à época, tinha como base a premissa de que o postulado da segurança jurídica só estaria plenamente resguardado se a forma fosse fielmente obedecida.

No entanto, é importante frisar que o formalismo não deve ser tido como totalmente inapropriado, haja vista que sua origem está atrelada à necessidade de conter abusos da administração e da jurisdição, e tem como legado a garantia de promoção de um mínimo de previsibilidade e organização necessárias à estabilidade da ordem social e do devido processo legal. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira acentua bem a importância do formalismo para o processo:

O formalismo, ou forma em sentido amplo, não se confunde com a forma do ato processual individualmente considerado. Diz respeito à totalidade formal do processo, compreendendo não só a forma, ou as formalidades, mas especialmente a delimitação dos poderes, faculdades e deveres dos sujeitos processuais, coordenação de sua atividade, ordenação do procedimento e organização do processo, com vistas a que sejam atingidas suas finalidades primordiais. A forma em sentido amplo investe-se, assim, da tarefa de indicar as fronteiras para o começo e o fim do processo, circunscrever o material a ser formado, e estabelecer dentro de quais limites devem cooperar e agir as pessoas atuantes no processo para o seu desenvolvimento. O formalismo processual contém, portanto, a própria idéia do processo como organização da desordem, emprestando previsibilidade a todo o procedimento. (OLIVEIRA, 2006)

Nessa perspectiva, ainda segundo o referido processualista, “o formalismo processual atua como garantia de liberdade contra o arbítrio dos órgãos que exercem o poder do Estado”. Veja-se, portanto, que o formalismo afigura-se como elemento fundamental ao surgimento do Estado de Direito e a sua consolidação, representando verdadeira garantia dos cidadãos em face da atuação estatal, motivo pelo qual não pode ser visto apenas pelo seu aspecto pejorativo, conforme acentua o referido jurista:

Das considerações até agora realizadas, verifica-se que o formalismo, ao contrário do que geralmente se pensa, constitui o elemento fundador tanto da efetividade quanto da segurança do processo. A efetividade decorre, nesse contexto, do seu poder organizador e ordenador (a desordem, o caos, a confusão decididamente não colaboram para um processo ágil e eficaz), a segurança decorre do seu poder disciplinador. Sucede, apenas, que ao longo do tempo o termo sofreu desgaste e passou a simbolizar apenas o formalismo excessivo, de caráter essencialmente negativo. (OLIVEIRA, 2006)

No contexto da atividade jurisdicional, o legalismo em apreço se fez presente através do chamado positivismo jurídico, por meio do qual se imaginou ser possível criar uma ciência jurídica a partir de métodos das ciências naturais. Sob esse viés, o pensamento jurídico sofreu forte a influência de um formalismo exacerbado e, consequentemente, nocivo, em que se verificava a ausência de preocupação com o conteúdo da norma, sendo considerada válida a lei que simplesmente guardasse correspondência com o procedimento previsto para sua criação.

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Veja-se, portanto, que esse esvaziamento do conteúdo da norma não possibilitava que a atividade jurisdicional promovesse a realização da justiça, restringindo-se a garantir apenas a previsibilidade das formas e o afastamento de arbitrariedades. Tratava-se, assim, de um modo de atuação que só se preocupava em assegurar que o Estado e a sociedade permanecessem no eixo condutor daquilo que lei previamente estabelecesse.

Vivenciou-se, desse modo, o mito de que a abstração da lei, ao garantir o tratamento formalmente igualitário para todos, pudesse abarcar quaisquer situações concretas e futuras, trazendo enunciados claros e completos que pudessem ser meramente reproduzidos pelo juiz como produto de uma interpretação única e correta.

Todavia, essa preponderância de um poder sobre outro, em flagrante ofensa ao ideal de convivência harmônica entre os poderes, acabou dando margem a outras formas de abusos, dessa vez por parte do legislador, culminando com a crise da legalidade.

Nesse momento, percebe-se que a vontade da lei não representava a vontade homogênea do povo, mas sim, o prevalecimento da vontade de grupos de maior força na sociedade, notadamente os que detêm maior poder econômico. Reconhece-se, assim, que a lei é, na verdade, fruto de um jogo de interesses entre determinados grupos, motivo pelo qual se mostrou necessária sua submissão a um controle que levasse em conta a busca pela realização da justiça. É nesse contexto que a Constituição passa a ser tida como parâmetro para o alcance desse escopo, como será esmiuçado a seguir.


2. NOVOS PARADIGMAS DO PENSAMENTO JURÍDICO CONTEMPORÂNEO: O NEOCONSTITUCIONALISMO E O NEOPROCESSUALISMO.

A partir da segunda metade do século XX, o pensamento jurídico contemporâneo sofre relevante reformulação. A Constituição passa a ter um maior reconhecimento de sua força normativa, sendo vista como “principal veículo normativo do sistema jurídico, com eficácia imediata e independente, em muitos casos, de intermediação legislativa” (DIDIER, 2014, p.28).

Com o fracasso da lei, no segundo pós-guerra, as esperanças de garantia de liberdade e de justiça passam a ser depositadas no constitucionalismo, por ser a Constituição um sistema de princípios que irradia efeitos por todo o ordenamento jurídico. A lei passa a se sujeitar a sofisticados sistemas de controle de constitucionalidade e a Constituição passa a figurar como norma habilitadora da atuação administrativa e jurisdicional.

Para tanto, as constituições passam a se revestir de determinada rigidez, no sentido de impedir sua modificação pelas vias ordinárias e, assim, evitar que o legislador facilmente faça uso da função para atender certos interesses. Isso explica a existência das chamadas cláusulas pétreas e do quorum diferenciado para aprovação de emendas à constituição.

Esse novo paradigma adotado pelo pensamento jurídico contemporâneo deu ensejo ao que se convencionou chamar de neoconstitucionalismo. Falar do reconhecimento da força normativa da Constituição significa, a seu turno, falar da expansão e consagração dos direitos fundamentais.

No Brasil, essa tendência ganhou força após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que estatuiu de modo expresso em seu art. 5º, § 1º que “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Com efeito, todos os ramos do direito passam a ter uma conformação delineada de acordo com os preceitos constitucionais, e essa nova dimensão se mostrou particularmente acentuada no campo do direito processual (OLIVEIRA, 2002).

O CPC atual, inclusive, já vinha sendo alvo dessa reformulação do pensamento jurídico, passando a ser interpretado à luz dos direitos fundamentais consagrados pelo texto constitucional. O novo CPC, por sua vez, no capítulo que trata das normas fundamentais do processo civil, cuidou de reproduzir essas garantias constitucionais, como a garantia da duração razoável do processo, no sentido de reafirmar o propósito de que o processo deve ser conduzido à luz de tais preceitos.

Oliveira (2006) assevera, ainda, que cada vez mais se verificou um “distanciamento da concepção tradicional, que via os direitos fundamentais como simples garantias, como mero direito de defesa do cidadão em face do Estado e não, como os compreende a mais recente doutrina, como direitos constitutivos institucionais, com ampla e forte potencialização”.

Essa nova forma de pensar repercutiu na esfera de atuação do jurista, que passa a ter a atribuição de conformar a lei aos contornos dos direitos fundamentais, que no âmbito do direito processual, diz respeito à necessidade de conformar o rito aos ditames da celeridade e da efetividade, sem desprezar a importância da segurança jurídica. O exercício da atividade jurisdicional, portanto, passa a ter como legítima a promoção direta e imediata dos direitos fundamentais.

Nesse sentido, Marinoni (2014, p.46) entende que a referida “transformação da ciência jurídica, ao dar ao jurista uma tarefa de construção – e não mais de simples revelação -, confere-lhe maior dignidade e responsabilidade, já que dela se espera uma atividade essencial para dar efetividade aos planos da Constituição, ou seja, aos projetos do Estado e às aspirações da sociedade.”

Como caminho seguro para permitir o exercício dessa atividade criadora por parte do jurista, Oliveira aponta a equidade como técnica de apreciação, formalmente positivada, que autoriza o juiz a compreender as características do caso concreto não contempladas pela abstração da norma.

Nessa perspectiva, o juízo de legalidade constata as características essenciais e comuns, enquanto o juízo de eqüidade ocupa-se com a compreensão das características acidentais e particulares da hipótese individual verificada, mas sempre levando em conta o sistema em que inserido. Assim, legalidade e eqüidade apresentam-se como dois aspectos distintos mas logicamente indissociáveis da linguagem jurídica e do significado dos signos nela empregados, de sorte que convivem numa relação necessária e inafastável, um não existindo sem o outro. No fundo, portanto, verifica-se uma falsa contraposição entre formalismo excessivo e informalismo arbitrário, já que todos os juízos são ou devem ser mais ou menos eqüitativos, ou iníquos, segundo o seu grau de compreensão das conotações específicas e diferenciadas da hipótese posta à apreciação do juiz. (...)

Na medida em que o ponto de vista da eqüidade concede espaço à discrição judicial, mesmo em se tratando de prescrições formais de natureza cogente, proporciona o instrumento para a superação da até então ameaçadora inflexibilidade da forma, mormente porque a eqüidade (segundo Radbruch) representa a justiça do caso concreto. Uma atitude livre também toma a visão da eqüidade contra a letra da determinação formal. Ela rejeita toda obediência cega ao Código. (OLIVEIRA, 2006)

Na verdade, o formalismo, como elemento necessário à garantia da segurança jurídica e da ordem social, por vezes, precisa se curvar à promessa de efetividade feita pelo Estado quando se arvorou a desempenhar, quase que de forma exclusiva, o exercício da atividade jurisdicional.

É nesse contexto que a extinção do processo sem resolução de mérito, em razão de defeitos processuais, já era apontada como indicativo da presença marcante do formalismo exacerbado, mostrando-se, portanto, imprescindível a criação de mecanismos que minassem esse tipo de postura por parte do jurista.

É justamente nessa perspectiva de busca pela maior atenção ao conteúdo levado ao juízo, ao real problema vivido pelas partes, que se verifica o estímulo ao máximo aproveitamento do instrumento colocado à disposição dos jurisdicionados, a fim de lhes garantir a efetiva apreciação do mérito da demanda.


3. O PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA DECISÃO DE MÉRITO

Como tentativa de propor um equilíbrio entre a efetividade do processo, a ser alcançada com uma decisão de mérito justa e efetiva, e a segurança jurídica processual, assegurada pela observância das formas, o novo código de ritos positivou o princípio da primazia da decisão de mérito, também chamado de princípio da precedência do julgamento do mérito.

Para se compreender o novo panorama trazido pelo novo código, faz-se mister tecer breves considerações sobre o CPC atual no que diz respeito ao tema em apreço.

Segundo o art. 301. do CPC atual, o réu deve aduzir, prioritariamente, as matérias relacionadas às defesas processuais listadas nos incisos do referido artigo, para, na sequência, atacar o mérito. Uma interpretação literal do mencionado dispositivo leva ao entendimento de que o réu deve preferir que seu sucesso no feito se dê por meio da extinção do processo sem apreciação do mérito em detrimento da resolução deste (DIDIER, 2014, p. 532).

Porém, talvez só fosse plausível admitir essa postura por parte do réu se ele eventualmente vislumbrasse grande probabilidade de acolhimento do mérito autoral, assim, aduziria o réu, preliminarmente, uma defesa processual peremptória ou meramente dilatória.

Por outro lado, nas situações em que o réu visualizasse grandes chances de sua defesa de mérito ser acolhida, na hipótese de haver vícios processuais, ele teria que abordar primeiramente estes para só depois tratar daquela? Na verdade, conforme preleciona Fredie Didier (2014, p.532), “é preciso notar que um julgamento de improcedência do pedido pode ser mais interessante ao réu do que uma extinção sem resolução do mérito, tendo em vista a aptidão que a primeira decisão possui para tornar-se indiscutível pela coisa julgada material”.

Em termos práticos, essa aparente obrigatoriedade de estruturar primeiramente as defesas processuais para depois tratar das defesas de mérito induz, na realidade, à existência de uma suposta regra de julgamento reservada ao magistrado.

De acordo com essa premissa, o julgador, diante da constatação da presença de uma das matérias trazidas no rol do art. 301. do CPC atual, estaria condicionado a extinguir o feito sem resolução de mérito, ficando sua sentença acobertada apenas pelo manto da coisa julgada formal, deixando margem, assim, para uma nova propositura de demanda idêntica.

O art. 4º do novo CPC propõe a mudança desse paradigma e, ao mesmo tempo que traz um dever para o julgador, assegura às partes o direito de obter, em prazo razoável, a solução integral do mérito. Essa norma fundamental assegura às partes a precedência da apreciação do mérito, no intuito de garantir a tão desejada efetividade da atividade jurisdicional, consoante ensinamentos de Fredie Didier:

O CPC consagra o princípio da primazia da decisão de mérito. De acordo com esse princípio, deve o órgão julgador priorizar a decisão de mérito, tê-la como objetivo e fazer o possível para que ocorra. A demanda deve ser julgada – seja ela a demanda principal (veiculada pela petição inicial), seja um recurso, seja uma demanda incidental. (DIDIER, 2015, p. 136)

Nesse intento, o legislador não se restringiu a prevê apenas um postulado que garantisse de forma abstrata a primazia do julgamento do mérito. O novo CPC trouxe ao longo do seu texto diversas técnicas que asseguram a concretização do princípio em tela, conforme será explanado mais adiante.

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Sobre a autora
Mônica Rodrigues Lima da Costa

Graduada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2011.2). Atualmente é professora auxiliar e advogada orientadora no Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF. Especialista em Direito Processual Civil. Advogada na Fundação de Atendimento Socioeducativo - FUNASE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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