Do cumprimento imperfeito ao inadimplemento escasso.

Aplicação prática do adimplemento substancial e tutela dos interesses negociais

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21/02/2017 às 19:15
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CONCLUSÃO

A doutrina do adimplemento substancial não se resume a uma mera criação do direito positivo, mas sim o resultado de um largo processo histórico de transformações na dogmática jurídica privatista mediante os influxos políticos e sociais ocorridos no século passado. A esta teoria, preexistem as novas concepções acerca do Direito Obrigacional e Contratual. Surgindo apenas por meio de uma relação obrigacional compreendida enquanto uma totalidade dinâmica abarcando não apenas um dever atomizado e estático, mas um longo feixe de deveres éticos e interdependentes, bem como a noção do contrato integrado a sua realidade extrínseca e tangível a regramentos e limitações dotados de conteúdo substancial. De modo que a disciplina dos contratos e obrigações não mais se regem de forma abstrata e apartada de seu contexto, havendo então um controle externo de legitimação proporcionado pelo novo viés interventivo do sistema jurídico proporcionado pelo atrito entre os princípios jurídicos de faceta liberal e social.

O inadimplemento da relação obrigacional se tornou mais elástico, estando não mais restrito ao simples incumprimento pontual da prestação principal, desta feita, sensível ao descumprimento de qualquer feixe de deveres gerais de conduta inerentes a relação jurídica em particular. Não se resumindo entre o inadimplemento absoluto (impossibilidade) e relativo (mora), surge uma terceira via, compreendida segundo cumprimento imperfeito. Esta, dada a elasticidade e sensibilidade pertinente a nova compreensão tida sobre o inadimplemento da relação obrigacional, pode ser apreendida como um gênero cujas espécies, em sua diferenciação, abstratamente não possuem critérios tão nítidos e rígidos de diferenciação, sendo esta determinada por cada caso concreto em suas particularidades. Cumprimentos imperfeitos como a violação positiva do contrato e o adimplemento substancial possuem uma relação de forte intercâmbio, a depender da natureza da violação de conduta sobre o tipo de obrigação contratual (se principal ou acessória) bem como a possibilidade de satisfação do interesse da outra parte credora.

A doutrina do adimplemento substancial surge visando a realizar a justiça contratual para concretizar o equilíbrio material entre as partes exigindo métodos aptos a temperar o direito à resolução contratual de modo que este não se desdobre em abuso de direito com uma possível lesão desnecessária entre as partes e o desaproveitamento de uma relação jurídica ainda útil e apta a concretizar seus efeitos e lhes beneficiar socioeconomicamente. A priori, exclui-se a identificação do adimplemento substancial pela simples boa-fé de adimplir por parte do devedor, ou uma vontade hipotética tácita a ser presumida sobre a pretensão ou interesse de qualquer uma das partes em realizar a causa final do contrato, sendo, portanto, ignorado qualquer critério de índole puramente subjetivo entre as partes para a identificação do adimplemento substancial.

É, destarte, identificado o adimplemento substancial justamente pela aferição objetiva de um inadimplemento que possa ser considerado enquanto ínfimo, ou seja, mínimo, quando relativo à totalidade da prestação principal, de modo que o descumprimento desta possa ser objetivamente analisado quantitativamente e qualitativamente. Tal critério, embora mais suscetível de identificar a substancialidade do adimplemento comparado ao critério puramente subjetivo, é passível de falhas à partir do momento que exclui o interesse das partes sobre a manutenção do vínculo contratual em prol de sua realização e produção de efeitos concretos e úteis entre as partes. Devendo, então, ser adotado um critério misto ou eclético para evitar um desvio de finalidade por parte da doutrina do adimplemento substancial, não devendo esta se tornar um critério abstrato de aferição cujo parâmetro se descontextualiza da realidade.  


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1967.


Notas

[1] IGLESIAS, Juan. Direito Romano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. P. 459-470.

[2] Idem Ibidem. P.459-470.

[3] MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado, tomo XXII. Rio de Janeiro: Borsoi, 1958. P. 7-12.

[4] Idem Ibidem. P. 12.

[5] SILVA, Rafael Peteffi da. Teoria do adimplemento e modalidades de inadimplemento, atualizado pelo novo Código Civil. Disponível em: 

<http://advocacia.pasold.adv.br/artigos/arquivos/teoriadoadimplemento.doc> Acesso em: 02-10-2009. P. 1-2.   

[6] Idem Ibidem. P. 3-4.

[7] SILVA, Clóvis V. do Couto. A Obrigação como Processo. Rio de Janeiro: FGV, 2011. P. 18-19.

[8] Idem Ibidem. P. 17. 

[9] Idem Ibidem. P. 19-21.

[10] SILVA, Rafael Peteffi da. Teoria do adimplemento e modalidades de inadimplemento, atualizado pelo novo Código Civil. Disponível em: <http://advocacia.pasold.adv.br/artigos/arquivos/teoriadoadimplemento.doc> Acesso em: 02-10-2009. P. 4-5.

[11] WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. 1967. P. 597-598.

[12] Idem Ibidem. P. 598.

[13] ALBUQUERQUE, Fabíola Santos. O instituto do adimplemento substancial e suas repercussões na teoria clássica da relação jurídica obrigacional. In: Leituras complementares de direito civil – o direito civil-constitucional em concreto. V.(?), N. (?), p. 233-243, (mês) 2007.

[14]LOBO, Paulo. Direito civil: Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 74-77.

[15]CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa fé no direito civil. Coimbra: Edições Almedina, 2015. P. 1160-1161.

[16] Idem Ibidem. P. 1170.

[17] LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. P. 534.

[18]} Idem Ibidem. P. 534-538.

[19] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais. P. 56-71

[20] Idem Ibidem. P. 56-71.

[21] ALVES, Carolina Fátima de Souza; EFING, Antonio Carlos. Contratações na sociedade de consumo e tecnologia: função social do contrato e boa-fé objetiva. In: Revista jurídica da faculdade de direito. Curitiba: Dom Bosco, v. 1, n. 4, 2008. P. 85-86.

[22]Idem Ibidem. P. 87-88.

[23] LÔBO, Paulo. Princípios sociais dos contratos no CDC e no novo Código Civil. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2796>. Acesso em: 20 jul. 2016.

[24] LOBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do direito civil. In: Leituras complementares de direito civil – o direito civil-constitucional em concreto. v.(?), n. (?), p. 21-36, (mês) 2007.

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[25] WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. 1967. P. 594-595.

[26]Idem Ibidem. P. 599-600.

[27] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 3: contratos e atos unilaterais. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 180.

[28] Idem Ibidem. P. 186.

[29] LOBO, Paulo. Direito civil: contratos. São Paulo: Saraiva, 2014. P. 192-194.

[30] Idem Ibidem. P. 193.

[31] MARTINS, Lucas Gaspar de Oliveira. Contornos do inadimplemento absoluto, da mora e do adimplemento substancial: principais características e distinções. 2008. 135 f. Mestrado em Direito - Pontífice Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, São Paulo, 2008. P. 5-9.   

[32] Idem Ibidem. P. 17-24.

[33] Idem Ibidem. P. 35-37.

[34] FRANCISCO, Carolina Cardoso; FRANCISCO; Luiz Felipe Miranda de Medeiros. Adimplemento substancial e resolução dos contratos: necessidade de fixação de um critério unificado. In: Quaestio Iuris. Rio de Janeiro: UERJ. vol.06, nº02, ISSN 1516-0351, p. 195-213, 2016.  P. 200-201.

[35] Idem Ibidem. P. 201.

[36] SILVA, Clóvis V. do Couto. A Obrigação como Processo. Rio de Janeiro: FGV, 2011. P. 97-98. 

[37 SCHREIBER, Anderson. A tríplice transformação do adimplemento substancial, inadimplemento antecipado e outras figuras. In: Revista Trimestral de Direito Civil. vol. 8, n° 32, out./dez. 2007. P. 5-11.

[38] Idem Ibidem. P. 12-15.

[39]{ AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor: resolução. Rio de Janeiro: Aide, 2003. P. 123-124.

{C}[40]{C} Idem Ibidem. P. 124-126.

{C}[41]{C} LABOURIAU, Miguel Drummond de Paula. Do inadimplemento antecipado. 2009. 98f. Monografia (Graduação em Direito) – Pontífice Universidade Católica do Rio de Janeiro, PUC-RJ, Rio de Janeiro, 2009. P. 24-30.

{C}[42]{C} Idem Ibidem. P. 31-34.

{C}[43]{C} CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa fé no direito civil. Coimbra: Edições Almedina, 2015. P. 603.

{C}[44]{C} LOBO, Paulo. Direito civil: Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 196-197. 

{C}[45]{C} ALVES, Jones Figueirêdo. A teoria do adimplemento substancial (“substancial performance”) no negócio jurídico como elemento impediente ao direito de resolução do contrato. In: Leituras complementares de direito civil – o direito civil-constitucional em concreto. v.(?), n. (?), p. 21-36, (mês) 2007. P. 224.

{C}[46]{C} BECKER, Anelise. A doutrina do adimplemento substancial no direito brasileiro e em perspectiva comparativista. In: Revista da Faculdade de Direito UFRGS, Porto Alegre, 9(1): 60-77, nov. 1993, p. 61.

{C}[47]{C} ALVES, Jones Figueirêdo. A teoria do adimplemento substancial (“substancial performance”) no negócio jurídico como elemento impediente ao direito de resolução do contrato. In: Leituras complementares de direito civil – o direito civil-constitucional em concreto. v.(?), n. (?), p. 21-36, (mês) 2007. P. 224.

{C}[48]{C} LOBO, Paulo. Direito civil: Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 196-197.  P. 197-198.

{C}[49]{C} CHUEIRI, Rodrigo Cunha. Adimplemento substancial: análise crítica de parâmetros para aplicação no direito brasileiro. 2014. 153 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Federal de Pernambuco, CCJ, Recife, 2014. P. 64.    

{C}[50]{C} Idem Ibidem. P. 64.

{C}[51]{C} LEITE, Rodrigo Costa Rodrigues. Teoria do adimplemento substancial ou do inadimplemento de escassa importância: reflexos da boa-fé objetiva. In: Revista Direito e Liberdade - ESMARN - v. 11, n. 2, p. 231 – 252 – jul/dez 2009. P. 232-233.

{C}[52]{C} Idem Ibidem. P. 233-239.

{C}[53]{C} MARCACINI, Daniela Tavares Rosa. O abuso do direito. 2006. 148 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, São Paulo, 2006. P. 65-70.

{C}[54]{C} LÔBO, Paulo. Princípios sociais dos contratos no CDC e no novo Código Civil. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2796>. Acesso em: 28 jul. 2016.

{C}[55]{C} LEMOS, Wilson Macedo. Adimplemento Substancial e sua função social. ANIMA: Revista Eletrônica do Curso de Direito das Faculdades OPET. Curitiba PR - Brasil. Agosto de 2014.  P. 149.

[56] SILVA, Iury Mendes. O adimplemento substancial e os limites à resolução contratual. 2014. 77 fl. Monografia (Graduação em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, 2014. P. 39-41.

[57] CHUEIRI, Rodrigo Cunha. Adimplemento substancial: análise crítica de parâmetros para aplicação no direito brasileiro. 2014. 153 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Federal de Pernambuco, CCJ, Recife, 2014. P. 107-111.     

[58] Idem Ibidem P. 112-113.  

[59] STJ. REsp: 272739 MG 2000/0082405-4. Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Data de Julgamento: 01/03/2001. T4 – Quarta turma. Data de Publicação: DJ 02.04.2001.

[60] STJ. REsp: 1430067 DF 2014/0012042-8. Relator: Ministro Antônio Carlos Ferreira. Data de Publicação: DJ 18/11/2014.

[61] STJ.  AgRg no Resp: 1.489.600 - DF (2014/0264153-6). Relator: Paulo de Tarso Sanseverino. Data de julgamento: 03/03/2015. T3 – Terceira turma.

[62] STJ. AgRg no Resp: Nº 362.459 - PE (2013/0237019-4). Relator: Paulo de Tarso Sanseverino. Data de julgamento: 20/11/2014. T3 – Terceira turma. 

[63] STJ. REsp: 1488374 SP 2014/0254414-2. Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze, Data de Publicação: DJ 12/11/2014.

[64] TJ-DF. AGV1: 201500203238891. Agravo de Instrumento. Relator: Sérgio Rocha. Data de Julgamento: 03/02/2016. 4ª Turma Cível. Data de Publicação: Publicado no DJE: 22/02/2016. Pág.: 223.

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[67] TJ-MG. AC: 10153130096941002 MG. Relator: Pedro Aleixo. Data de Julgamento: 13/04/0015.   Câmaras Cíveis / 12ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 22/04/2015.

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     TJ-PE. Agravo: AGV 4157119 PE. Relator: Jones Figueirêdo. Data de Julgamento: 11/02/2016. Quarta Câmara Cível. Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 29/02/2016.                                       

[69] SCHREIBER, Anderson. A tríplice transformação do adimplemento substancial, inadimplemento antecipado e outras figuras. In: Revista Trimestral de Direito Civil. vol. 8, n° 32, out./dez. 2007. P. 18-20. 

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Sobre o autor
Rodrigo Tenório

Graduando da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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