Concursos públicos: quem realmente pode te ajudar?

A linha tênue entre a ambição e o estelionato.

19/03/2017 às 17:55
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Este texto cuida de uma reflexão pessoal quanto a forma em que concurseiros e outros profissionais estão se colocando diante do mercado gerado pelos concursos públicos.

 

Há tempos uma inquietação me ocorre e, talvez imprudentemente, resolvi socializar tal questionamento. Ab initio observo que são reflexões absolutamente pessoais e, obviamente, não pretendem obter qualquer validação universal ou concordância. De outra forma, continuarei pensando e, como é da natureza do pensar, talvez eu mude de ideia em breve (ou não, enfim...). 
Os concursos púbicos continuam sendo, em termos de mercado, algo altamente atrativo. Isso se dá pelas mais variadas razões que todos conhecemos, a se exemplificar pela crise econômica e seus reflexos na iniciativa privada, pelo desejo de estabilidade financeira, também em razão da vocação para o exercício de uma atividade pública. Enfim, são inúmeras as razões que ainda movem milhares (quiçá milhões) de pessoas em busca do cargo público e, toda essa demanda, obviamente, traz com ela um mercado altamente atrativo para a venda de produtos e serviços (algo absolutamente natural). 
Neste cenário várias “fórmulas” aparecem para auxiliar o concurseiro em sua empreitada: cursos, livros, resumos, apostilas, assessorias, mentorias, coaching, padres, pastores, curandeiros, benzedeiros, enfim, toda sorte de auxílio possível. 
Desde logo observo que, em certa medida, toda iniciativa pode ser válida e auxiliar. Explico: desde o sorriso da namorada pela manhã até o melhor professor de processo civil do país podem contribuir em algum ponto da caminhada. O personal trainer especialista em concurseiros que compreende a situação deste tipo específico de pessoa pode auxiliar montando um treino que não te leve a exaustão, mas que te revigore para o dia de estudos; o padre e o pastor que conhecem a realidade do seu fiel podem efetivamente, por meio da palavra, incentivar o estudante e o tal sorriso da namorada pela manhã eventualmente te trará uma sensação de compreensão da pessoa amada que tornará seu cansativo dia de estudos mais leve e proveitoso. 
O ponto é: em certa medida tudo pode auxiliar, mas há um limiar bem estreito entre o veneno e o remédio (é o que dizem por aí). Preciso fazer um recorte aqui, pois caso não o faça teria eu que escrever um livro e não um simples texto. 
Especificarei no seguinte ponto (em apertadíssima síntese): planejamento e técnicas de estudo. Ou seja, quem, de fato, pode auxiliar (de maneira útil e honesta) o concurseiro com dicas de estudo, planejamento, técnicas etc?
Quero também direcionar o texto em uma dupla vertente: a) àquele que busca a ajuda; b) àquele que se propõe a ajudar.
Talvez muitos (provavelmente a maioria) discordem de mim na abordagem inicial que farei agora (mas felizmente sou membro de um poder de Estado que efetivamente exerce um papel contramajoritário, então tudo certo kk). 
Brincadeiras de lado, tenho a impressão inicial que no aspecto que aqui colaciono (planejamento e técnicas de estudo), como regra, somente podem efetivamente ajudar a passar em concursos aqueles que efetivamente já passaram. Sim, pode parecer besta tal afirmação (“poxa Mário, para eu ser técnico de futebol, não preciso ter jogado futebol). Ok, mas tenho para mim que as amarguras da vida concursal tratam de uma dimensão da vida bem específica e que, como regra, somente aqueles que efetivamente já sofreram com isso, podem, com honestidade, auxiliar quem está tentando superar os inúmeros desafios.
Melhor explicando. Lecionar uma disciplina específica não exige a experiência prática como regra. Um professor pode dedicar a vida exclusivamente à docência e ensinará tão bem ou melhor que o professor que exerce alguma atividade profissional relacionado ao que ensina. Agora, me pergunto: como alguém que nunca planejou com sucesso, nunca obteve reprovações e aprovações (e conseguiu entender o que tinha que fazer para converter reprovação em aprovação), como alguém que nunca teve sua técnica submetida às provações pode, em momento posterior, entregar a fórmula mágica da aprovação? 
A síntese primária do que quero transmitir em caráter orientativo é no sentido de que você concurseiro desesperado, deve beber a água (dicas) em fontes mais seguras: o candidato aprovado, o concurseiro experiente que já superou as fases iniciais (aqui um alerta para os professores de Deus que nunca passaram em nada, mas são os donos das técnicas insuperáveis) e por aí vai, já que o leque de pessoas honestas e com capacidade é amplo. Outra hipótese honesta são os profissionais de áreas de ensino, planejamento etc. Óbvio que alguém com formação consolidada em Mentoring pode trabalhar contigo aspectos de planejamento e técnicas de estudo, o mesmo se aplicando aos pedagogos, profissionais de coaching, dentre tantos outros (mas não vale aqueles com formação online de 10hrs).
Enfim e para não perder o caráter sintético da coisa: antes de se orientar com o amigo ou contratar algo pesquise o perfil e o histórico da pessoa ou da instituição, busque referências, não se iluda com os baixos custos, já que é o seu sonho que está em jogo. 
O lado “b” e conclusivo desse texto é para aqueles que em tese estão se propondo a ajudar. Veja, auxiliar é nobre e eventualmente querer ganhar algo com isso é natural. A ambição que, segundo o profeta google, significa o forte desejo de poder ou riquezas, honras ou glórias; cobiça; cupidez ou o anseio veemente de alcançar determinado objetivo, de obter sucesso; aspiração, pretensão é algo natural de nós humanos, mas em reflexão me parece que ela pode, em alguns momentos, estar bem próxima de uma conduta criminosa elencada no art. 171, caput, do Código Penal, o estelionato: “ Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
Desejo todo o sucesso e bênçãos do mundo àqueles que se propõem a auxiliar o concurseiro nessa difícil tarefa em busca da tão sonhada aprovação, mas deixo a sugestão de que todos devem fazer uma reflexão inicial para saber se realmente podem entregar o que prometem, pois, brincar com sonho alheio em proveito pessoal é bastante sombrio e triste. 
Um abraço, #PAZ.

 

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Sobre o autor
Mario Celegatto

Mario Celegatto é Juiz do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Mestrando em Direito pela Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP, Especialista em Direito Processual, Bacharel em Direito pela PUC-MG e Professor. (facebook: Mario Celegatto / Snapchat: mario_celegatto / instagram: mario_celegatto / e-mail: [email protected]).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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