SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Da competência dos Juizados Especiais Cíveis e da Justiça Estadual - 3. Do Conflito de Atribuição - STJ - 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
Nas preliminares argüidas pela concessionária de telecomunicação em sua contestação nas ações declaratórias, aventam a ilegitimidade dos Juizados Especiais Cíveis e da Justiça Estadual por serem absolutamente incompetentes para apreciarem as ações, um verdadeiro absurdo. Mas, o que vem acontecendo é que na maioria das vezes esta preliminar é admitida pelos magistrados, que se declaram incompetentes e transferem a competência para a Justiça Federal.
Em declaração de voto, o juiz LEOPOLDO HAESER, apontou, em importante posicionamento, que: "Em qualquer decisão não pode o julgador alienar-se da realidade, olvidando-se de que decide sobre fatos reais e não sobre questões teórico-jurídicas. Deve sempre ter presente que o direito é dinâmico, não estático, aplicado aos fatos sociais de hoje que evoluem de forma ágil e, muitas vezes, surpreendente, atropelando o arcabouço jurídico que, freqüentemente, lhe vem de arrasto. Não é a lei, pois, que sempre muda a realidade social, mas esta que exige adequação das normas a um novo tempo, o que se efetiva através da função desbravadora da jurisprudência. O julgador, inserido na realidade de seu tempo, não pode negar-se a julgar por omissão da lei, nem aplicá-la com os olhos postos no passado, mas sintonizado com a dinâmica social. A imobilidade e alienação à realidade só podem conduzir à injustiça. Justa é a decisão que mantém o ordenamento jurídico vivo e sintonizado com a realidade". (in Ap. 193051083 - 4ª Câm. Cív. - TARS - rel. Juiz Márcio Oliveira Puggina)
E declaram ser imprescindível e obrigatória a figuração da Anatel no pólo passivo ainda que como assistente, posto que possui interesse jurídico no resultado das demandas envolvendo discussão sobre "assinatura mensal" e "discriminação de pulsos".
Baseando-se no art. 10 da Lei 9.099/95, que veda a inclusão de terceiros no processo, qualquer forma de intervenção nem de assistência e no art. 8º da Lei 9.472/97, com efeito a Anatel é uma autarquia federal integrante da União, competindo para processar e julgar a Justiça Federal.
2. DA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E DA JUSTIÇA ESTADUAL
Não deve prosperar tal assertiva, das preliminares de incompetência dos Juizados e da Justiça Estadual, pois: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito" (art. 5º, XXXV, da CF/88) e, "a menor complexidade da causa para a fixação da competência é aferida pelo objeto da prova e não em face do direito material" (Enunciado n.º 54 - Fonaje).
Nosso ordenamento jurídico autoriza qualquer usuário de serviço de telecomunicação a socorrer-se do Judiciário para livrar-se de obrigações contratuais que considera abusivas.
O pedido da concessionária de figurar a Anatel no pólo passivo como assistente, é inócuo, pois o objeto das demandas contra a concessionária esta tutelado, em respeito às normas do Código de Defesa do Consumidor e às determinações da Lei de Telecomunicações.
Nas ações impetradas contra a concessionárias são fundamentados seus pedidos nos arts. 5º, 6º, III e 31, da Lei 8.078/90, art. 3º, IV, da Lei 9.472/97 e na Resolução 85/98 da Anatel.
3. DO CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
No Conflito de Atribuição n.º 90/DF, o rel. Min. Garcia Vieira em seu voto discorre: "Sr. Presidente, - Embora possa ocorrer conflito de atribuições entre autoridades administrativas e judiciárias (CF, 105, I, g), ele se refere exclusivamente à matéria administrativa e não processual. Nele não existe jurisdição".
Ensina José Cretella Júnior, em artigo publicado na Revista Forense, vol. 291, pgs. 51/59, que: "Nos países de unidade de jurisdição ou de jurisdição una, como no Brasil, em que vigora a regra una lex, una judictio, ‘atribuição’ é desempenho de serviço público’, ‘tarefa’, ‘função’, ‘atividade administrativa’, ‘conjunto de poderes funcionais que órgãos ou agentes são autorizados, por lei, a exercer, no exercício do cargo’, ‘círculos de assuntos que devem ser resolvidos, mediante a prática de fato administrativo". (p. 51).
Define ele o conflito de atribuições como: "(...) a luta de competência administrativa entre agentes ou órgãos que se julgam, simultaneamente, aptos ou não para o conhecimento e solução de determinado assunto, afastada, desde logo, qualquer idéia de jurisdição". (p. 51)
Ele surge se as autoridades judiciárias (Poder Judiciário) e administrativas (Anatel) se julgam, ambos, competentes ou incompetentes para o conhecimento e solução da matéria administrativa.
O conflito de atribuições surge quando a autoridade judiciária e a administrativa atribuem-se competência ou não para conhecimento e solução de matéria puramente administrativa. No caso o exercício jurisdicional, privativo da autoridade judiciária. (CAT n.º 19/MG, RSTJ 28/30)
No sistema brasileiro de jurisdição una, não há conflito de atribuições entre entidade administrativa e autoridade judiciária, quando estiver esta no exercício pleno da sua função jurisdicional. (CAT n.º 03/DF, RSTJ 7/29)
Sobre o assunto, Min. Sálvio de Figueiredo, no CAT n.º 30/PE, decidiu que: "I. O conflito de atribuições configura-se quando a autoridade judiciária, no exercício da função administrativa, e autoridade administrativa propriamente dita, divergem acerca da competência para a prática do ato. II. Praticando o juiz ato de natureza jurisdicional, acatado e cumprido pela autoridade administrativa, no exercício de sua função, não se verifica a ocorrência do conflito de atribuições."
Como se vê, o conflito de atribuições entre autoridades administrativas e judiciária somente surge quando ambas atribuem-se competência para o conhecimento e solução de matéria puramente administrativa. Quando, como no caso concreto, a autoridade judiciária, no exercício pleno de sua função jurisdicional, aprecia e decide uma ação declaratória ou outra qualquer, não pode haver conflito de atribuições com a autoridade administrativa.
4. CONCLUSÃO
A um., o conflito em questão envolve apenas as concessionárias e seus usuários; por isso, dispensa a participação da Anatel nas ações declaratórias e, podendo/devendo ser objeto de apreciação pelo Poder Judiciário, já que posta à sua apreciação nos moldes exigidos pela lei.
A dois, é inequívoco que a autoridade judiciária não agiu no exercício pleno e exclusivo da função jurisdicional ao não prestar a tutela jurisdicional solicitadas pelo usuário, em defesa de seu direito e interesse referente ao serviço de telefonia prestado pela concessionária, transferindo simplesmente a sua competência, para a Justiça Federal.