O instrumento particular de compromisso de compra e venda de lote urbano, firmado entre o loteador e o adquirente, quando acompanhado da prova de quitação do preço, serve como título para a transmissão da propriedade imobiliária perante o Cartório de Registro de Imóveis, dispensando a lavratura de escritura pública, independentemente do valor do negócio ou do imóvel.
Desse modo, foi excepcionado o monopólio estatal da escritura pública prescrito no art. 108 do Código Civil, por intermédio do § 6º, art. 26, da Lei nº 6.766/79, in verbis:
“§ 6º Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva prova de quitação.” (Incluído pela Lei nº 9.785/1999)
O legislador beneficiou com praticidade e menor ônus os consumidores que adquirem lotes diretamente do loteador que promove a abertura de ruas e execução da infraestrutura em gleba, para divisão em lotes urbanos, denominado pela lei como loteamento, conforme art. 2º, §1º, da Lei nº 6.766/79.
Tal modalidade de empreendimento urbanístico é corriqueiro nos municípios brasileiros, permitindo que o próprio compromisso de compra e venda, firmado por instrumento particular pelo consumidor com o loteador, tenha efeito de escritura pública, quando acompanhado de documento atestando que houve o pagamento integral do preço contratado.
Vale dizer, na aquisição direta de lote pelo consumidor, por meio de compromisso de compra e venda celebrado por instrumento particular com o loteador, quando instruído com prova da quitação do respectivo preço, que poderá ser apresentado diretamente no Cartório de Registro de Imóveis para registro da aquisição do imóvel, por ser título hábil à transmissão da propriedade imobiliária.
Seguindo essa ordem de ideias, João Baptista Galhardo, após transcrever o teor do § 6º e consignar a validade dos compromissos de compra e venda, cessões e promessas de cessão, como títulos para o registro da propriedade, ressalva apenas que a validade limita-se à primeira transferência, do loteador para o primeiro adquirente, valendo transcrever: “Esse parágrafo aplica-se uma única vez com referência ao lote, ou seja, quando o domínio houver de ser transferido do loteador para o comprador” (Aspectos registrários da aplicação da lei federal nº 9.785, de 29.01.1999, in Revista de Direito Imobiliário nº 46, janeiro-junho de 1999, ano 22, p. 38).
O e. Conselho da Magistratura bandeirante, por sua vez, já decidiu que o compromisso de compra e venda firmado por instrumento particular entre o loteador e o primeiro adquirente, quando acompanhado da prova de quitação, dispensa a escritura pública, servindo de título para a transmissão da propriedade perante o Cartório de Registro de Imóveis, independente do valor do imóvel ou do negócio, in verbis:
“Ora, a simplicação da primeira transferência da propriedade, do loteador ao adquirente, independentemente da natureza do lote, acaba por facilitar a inserção do bem no mercado, contribuindo para a segurança jurídica e para a circulação de riqueza, coadunando-se com o bem comum e com o fim social de zelar pela juridicidade do parcelamento.
Daí porque, como conclui o Desembargador JOSÉ OSÓRIO DE AZEVEDO JR, “a interpretação que se impõe, a meu ver, é uma só: esse preceito do § 6º, em matéria de loteamento urbano, é genérico, e portanto aplicável a qualquer loteamento e não apenas aos especialíssimos “parcelamentos populares”(A dispensa de escritura na venda de imóvel loteado. Crítica da orientação do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo. Ano 10, nº 20, jul-dez/2007, p. 159).
Assim, por todo o exposto, a conclusão a que se chega é a que o § 6º, do art. 26, da lei nº 6.766/79, não se limita a loteamentos populares, autorizando o registro da propriedade do lote com base no compromisso de compra e venda, nas cessões e promessas de cessão, desde que acompanhados da prova de quitação.” (Ap. Cível nº 0012161-30.2010.8.26.0604, Rel. Des. Maurício Vidigal, então Corregedor Geral de Justiça, DJ. 29.02.2012, TJSP)
Tal dinâmica, pois, prestigia a função social da lei de parcelamento do solo, facilitando à aquisição do lote urbano e a circulação de riqueza, sem descurar da segurança jurídica necessária ao tráfego imobiliário, por ter no registro predial a função de controle urbanístico e protetivo-social.
Destarte, o adquirente de lote urbano, por compromisso de compra e venda, celebrado por instrumento particular com o loteador, tem o direito de apresentar diretamente ao Cartório de Registro de Imóveis tal contrato e a respectiva quitação para ultimar o registro da aquisição da propriedade, por força do art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79, podendo, se assim desejar, prescindir da lavratura da escritura pública.