O fim da curatela pela morte do curatelado e a remuneração devida

21/05/2017 às 10:54

Resumo:


  • A curatela é um encargo legal para gerir a pessoa e os bens de alguém incapaz de fazê-lo por si mesmo, tendo caráter assistencial e publicista, e é aplicável a pessoas maiores de idade.

  • Caracteriza-se por ser temporária, supletiva da capacidade, e sua decretação exige certeza absoluta da incapacidade, podendo ser aplicadas as disposições da tutela com algumas modificações.

  • O curador tem o dever de representar ou assistir o curatelado e pode receber uma remuneração fixada judicialmente pelo seu trabalho, devendo prestar contas ao final da curatela.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Você sabe em que consiste o instituto da Curatela, no Direito Civil? Saiba um pouco mais sobre sua natureza jurídica, seus requisitos e como a doutrina e a jurisprudência pátrias se posicionam atualmente sobre o tema.

Curatela é o encargo deferido por lei a alguém capaz, para reger uma pessoa e administrar os bens de quem, em regra maior, não pode fazê-lo por si mesmo.

A curatela assemelha-se à tutela por seu caráter assistencial, destinando-se, igualmente, à proteção de incapazes. Por essa razão, a ela são aplicáveis as disposições legais relativas à tutela, com apenas algumas modificações (CC, art. 1774).

A curatela apresenta cinco características:

1 – os seus fins são assistenciais;

2 – tem caráter eminentemente publicista;

3 – tem, também, caráter supletivo da capacidade;

4 – é temporária, perdurando somente enquanto a causa da incapacidade se mantiver (cessada a causal, levanta-se a interdição);

5 – a sua decretação requer certeza absoluta da incapacidade.

O instituto da curatela completa no Código Civil, o sistema assistencial dos que não podem, por si mesmos, reger sua pessoa e administrar seus bens.

O caráter publicista advém do fato de ser dever do Estado zelar pelos interesses dos incapazes. Tal dever, no entanto, é delegado a pessoas capazes e idôneas, que passam a exercer um múnus público, ao serem nomeadas curadoras.

O caráter supletivo da curatela, em terceiro lugar, exsurge do fato de o curador ter o encargo de representar ou assistir o seu curatelado, cabendo em todos os casos de incapacidade não suprida pela tutela.

Supre-se a incapacidade, que pode ser absoluta ou relativa conforme o grau de imaturidade, deficiência física ou mental da pessoa, pelos institutos da representação e da assistência.

O art. 3º do Código Civil menciona os absolutamente incapazes de exercer pessoamente os seus direitos e que devem ser representados, sob pena de nulidade do ato (art. 166, I).

E o art. 4º enumera os relativamente incapazes, dotados de algum discernimento e por isso autorizados a participar dos atos jurídicos de seu interesse, desde que devidamente assistidos por seus representantes legais, sob pena de anulabilidade (art. 171, I), salvo algumas hipóteses restritas em que se lhes permite atuar sozinhos.

O art. 120 do Código Civil preceitua que “os requisitos e os efeitos da representação legal são os estabelecidos nas normas respectivas”. No que concerne aos menores sob tutela, dispõe o art. 1.747, I, do Código Civil, que compete ao tutor “representar o menor, até os dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-lo, após essa idade, nos atos em que for parte”.

O aludido dispositivo aplica-se, também, mutatis mutandis, aos curadores e aos curatelados, por força do art. 1.774 do mesmo diploma, que determina a aplicação, à curatela, das disposições concernentes à tutela. 

A quarta característica da curatela, como visto, é a temporariedade, pois subsistem a incapacidade e a representação legal pelo curador enquanto peerdurar a causa da interdição.

Cessa a incapacidade desaparecendo os motivos que a determinaram. Assim, no caso da loucura e da surdo-mudez, por exemplo, desaparece a incapacidade, cessando a enfermidade físcico-psíquica que as determinou. Quando a causa é a menoridade, desaparece pela maioridade e pela emancipação.

A certeza da incapacidade, por fim, é obtida por meio de um processo de interdição, disciplinado nos arts. 1.177 e s. do Código de Processo Civil, no capítulo que trata dos procedimentos especiais de jurisdição voluntária. 

A curatela dos toxicômanos, que era regulamentada pelo Decreto Lei n. 891/38, é agora disciplinada pelo Código Civil de 2002 (art. 1.767, III, in fine).

Essas modalidades de curatela não se confundem com a curadoria instituída para a prática de determinados atos, como os mencionados nos arts. 1.692, 1.733, § 2º, e 1.819 do Código Civil.

Há ainda as curadorias especiais.  

Sobre o curador especial, ensinou  Nelson Nery Júnior (in Código de Processo Civil Comentado. Ed. Revista dos Tribunais: 2000, p. 400.):

“A curadoria especial é múnus público, incumbindo ao curador o dever de, necessariamente, contestar o feito. Na falta de elementos, pode contestar genericamente (CPC 302, parágrafo único), não se lhe aplicando o ônus da impugnação especificada. Contestando genericamente, o curador especial controverte todos os fatos descritos na petição inicial, incumbindo ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito (CPC, art. 333, I). Não há, neste caso, inversão do ônus da prova, mas aplicação ordinária da teoria do ônus da prova. Caso o curador não conteste, o juiz pode destituí-lo e nomear outro para que efetivamente apresente contestação na defesa do réu.”

O novo CPC determinou  a regra de que tal encargo deve ser imposto à Defensoria : 

Art. 72.  O juiz nomeará curador especial ao:

I - incapaz, se não tiver representante legal ou se os interesses deste colidirem com os daquele, enquanto durar a incapacidade;

II - réu preso revel, bem como ao réu revel citado por edital ou com hora certa, enquanto não for constituído advogado.

Parágrafo único.  A curatela especial será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei.

Os encargos da curadoria terminam com a morte do curatelado. 

Faço menção a importante decisão na matéria do TJMG:

AC 10569120004266001 MG

Orgão Julgador

Câmaras Cíveis / 7ª CÂMARA CÍVEL

Publicação

04/10/2013

Julgamento

1 de Outubro de 2013

Relator

Washington Ferreira

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ JUDICIAL. LEVANTAMENTO DE QUANTIA EM DINHEIRO. MORTE DO CURATELADO. EXTINÇÃO DA CURATELA. CURADOR. ILEGITIMIDADE ATIVA. DEVER DE PRESTAR AS CONTAS EM PROCEDIMENTO PRÓPRIO. RECURSO IMPROVIDO.

I. Com a morte do curatelado, extingue-se a curatela e, por conseqüência, a figura do curador, que deve, entretanto, prestar as contas da sua administração e responder pelos prejuízos caso se prove que houve má administração dos bens e dos recursos do interditado.

II. Havendo dívidas a saldar contraídas exclusivamente para o sustento do curatelado enquanto em vida, deverão ser quitadas com os recursos por ele deixados, após a devida prestação de contas

Quanto a remuneração devida ao curatelado trago importante decisão do Superior Tribunal de Justiça na matéria:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.192.063 - SP

RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE: A A DE C N

ADVOGADO: ANDRÉ LINHARES PEREIRA E OUTRO(S)

INTERES.: D DE C N F

INTERES.: O JUÍZO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INTERDIÇÃO. REMUNERAÇÃO DO CURADOR. FIXAÇÃO JUDICIAL. NECESSIDADE. RETENÇÃO DE RENDAS DO INTERDITO. POSSIBILIDADE.

1. O curador tem direito de receber remuneração pela administração do patrimônio do interdito, à luz do disposto no art. 1.752, caput, do CC-02, aplicável ao instituto da curatela, por força da redação do art. 1.774 do CC-02.

2. Afigura-se, no entanto, indevida a fixação realizada pelo próprio curador e a consequente retenção de rendas do interdito.

3. A remuneração do curador deverá ser requerida ao Juiz que a fixará com comedição, para não combalir o patrimônio do interdito, mas ainda assim compensar o esforço e tempo despendidos pelo curador no exercício de seu múnus.

4. Negado provimento ao recurso especial.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Sustentou oralmente o Sr. Sub-procurador: José Bonifácio Borges de Andrada.

Brasília (DF), 20 de março de 2012 (Data do Julgamento)

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O respeitável acórdão em discussão traz à colação doutrina que aqui colaciona-se:

Eis a lição de Rodrigo da Cunha Pereira sobre o tema:

O exercício da tutela não é necessariamente a título gratuito, cabendo ao juiz arbitrar o valor da remuneração (...). Tal remuneração classifica-se muito mais como um "prêmio" ou "gratificação" do que propriamente como contraprestação pelos serviços prestados, devendo ser ressaltada a dignidade que se traduz na designação do cargo de tutor (Comentários ao Novo Código Civil. Volume XX. Coordenador: Sálvio de Figueiredo Teixeira. Forense). (sem destaque no original)

Não somente, reforça Fredie Didier Júnior (et al):

Cabe ao juiz, em decisão fundamentada e ouvidos os interessados e o Ministério Público, arbitrar a remuneração do tutor, do protutor e das pessoas físicas e jurídicas referidas no art. 1.743, tanto incidentalmente no processo de nomeação do tutor (...) ou como decisão final em requerimento autônomo dos interessados (...).

No arbitramento da remuneração deverá o juiz verificar os preços de mercado, socorrendo-se, até mesmo, da prova pericial se necessário (Comentários ao Código Civil Brasileiro. Volume XV. Coordenadores: Arruda Alvim e Thereza Alvim. Forense). (sem destaque no original)

Vale transcrever, ainda, comentário de Milton Paulo de Carvalho Filho ao artigo 1752 do Novo Código Civil:

(...) a importância devida deverá ser fixada, eqüitativamente, pelo magistrado, que atentará para as circunstâncias de cada caso concreto (por exemplo, natureza do patrimônio administrado e extensão do envolvimento) e observará os princípios de proporcionalidade e razoabilidade (Código Civil Comentado. Coordenador: Min. Cezar Peluso. 2ª Ed. Manole).

A medida da capacidade financeira do interdito, suas necessidades – que devem ser atendidas, prioritariamente, com o seu próprio patrimônio –, o esforço despendido pelo curador no cumprimento de seu múnus e as impossibilidades ou restrições ao desenvolvimento de suas atividades próprias são fatores aos quais se agregam alto grau de subjetividade, que somente podem ser sopesados pelo Estado-Juiz.

Essa é a tônica que marca, no particular, a fiscalização do Estado quanto aos interesses do interdito e impede que, por meio da remuneração do curador, venha o patrimônio do curatelado a ser exigido em grau incompatível com o seu equilíbrio, para fins diversos da sua própria subsistência.

Como bem disse a ministra Nancy Andrigy, "note-se que não se questiona aqui a lisura, esforço, dedicação e denodo com que o recorrente tem agido em relação ao interdito – seu pai. Nem se descura que o múnus atribuído ao curador, não raras vezes, mostra-se exacerbado, pois demanda além de tempo e dinheiro – elementos, por si só compensáveis –, outros mais, de difícil aferição pecuniária, como tomadas de decisões, as preocupações daí advindas, a codependência psicológica entre outros fatores."

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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