Reforma agrária.

Terra para Rose e O sonho de Rose 10 anos depois

31/05/2017 às 10:20
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Os documentários apresentam uma constante luta pela reforma agrária no Rio Grande do Sul, sendo um movimento popular que envolveu elementos políticos e religiosos. Em seguida é retratado como o movimento permaneceu 10 anos após terem conseguido as terras.

TERRA PARA ROSE

Terra para Rose é uma história documentada em que mostra a luta pela reforma agrária no Rio Grande do Sul aqui no Brasil, em meados dos anos 80, sendo um dos movimentos sociais em busca de terras por aqueles que não a tem. Assim, é demonstrada uma luta pelo direito a terra, consistindo como um forte movimento da luta popular, que se organizou para exigir seus direitos e fazer valer suas ideias, reunindo elementos políticos e religiosos.

A primeira cena do documentário apresenta uma marcha de pessoas sobre uma ponte compostas de mulheres, homens e crianças acompanhados de instrumentos de lavoura em que reuniu 1.500 famílias. De início eles estão gritando e cantando que vão em busca da terra prometida e em seguida passam a cantar o hino nacional.

Após essa cena, é apresentado um breve histórico sobre a questão agrária no Brasil e as medidas que o presidente José Sarney havia prometido realizar em relação à Reforma Agrária, afirmando ser um plano novo sem nenhuma experiência na história do país.

A terra em que as famílias buscam a título de reforma agrária é a da Fazenda Anoni, onde o processo de desapropriação iniciou em 1972 quando foi classificada como latifúndio improdutivo. O governo prometeu assentar as famílias, porém passaram-se 14 anos e nada foi resolvido.

Somente em outubro de 1985, 1.500 famílias de pequenos agricultores sem terras iniciaram as ações de ocupação da Fazenda Anoni.

Rose é a primeira das mulheres a contar a história de como eles viviam antes da ocupação, de como ela chegou grávida na Anoni e de como enfrentaram a polícia. Dois dias após a ocupação, Rose deu a luz a primeira criança, Marcos, nascida no acampamento, onde participou do movimento sem terra junto a mãe, desde que estava em sua barriga, se tornando um dos símbolos de esperança que movia o grupo.

Com “coragem e fé em Deus”, sendo essas as palavras usadas por Rose, todos prosseguiram com sua luta.

Quase oito mil pessoas acampadas na Fazenda Anoni à espera da terra prometida pelo Governo, onde no documentário é demonstrado o cotidiano dos acampados cortando lenha, lavando roupas, mulheres cozinhando e crianças brincando. Viviam em barracões cobertos por lonas, sendo um símbolo de luta e força pela divisão igualitária da terra.

Depois de meses de negociações, sem resultados concretos, os acampados decidiram fazer mais pressão, onde em 1986 algumas famílias sem terra da Anoni acamparam o estacionamento do Incra, porém foi uma tentativa que não obteve êxito.

Se reuniram para decidirem se iam todos em marcha para Porto Alegre e decidiram. Dessa forma, ao partirem, o documentário dividir-se  em três momentos de ação. Primeiro temos o acompanhamento das ações que  passam a ocorrer na marcha e na  cidade de Porto Alegre, o cotidiano dos  acampados  no Incra e na Assembléia legislativa, além dos depoimentos e acontecimentos no acampamento na Anoni e os comentários do dono da Fazenda e do Ministro da Agricultura. 

As promessas do governo não se concretizavam, mas existia a solidariedade das pessoas para os acampados que foram em marcha, onde em cada local que paravam para descansarem, a população os ajudavam.

O grande objetivo dessa marcha para Porto Alegre era a tentativa de demonstrar para os governantes o sofrimento vivido por eles na ocupação, para que realizassem de uma vez por todas a tão sonhada e prometida Reforma Agrária.

 A relação existente entre a religião e o movimento na Anoni, é pouco explorada durante o documentário. As pastorais e os padres ligados à  teologia da Libertação formaram elementos muito fortes na constituição desses movimentos populares. A religião aparece como uma das principais  bases para a ação dessas pessoas, além das suas consciências políticas. É principalmente através da fé em Deus, que muitos do grupo diziam conseguir sobreviver a tantas diversidades e dificuldades. As ações do movimento pela posse da Anoni eram sempre acompanhadas pela   execução de missas, recebendo um apoio efetivo de padres e até mesmo de  freiras.

Levaram 28 dias para chegarem ao destino, em que os 300 romeiros se multiplicaram transformando-se em 100.000 marchando para Porto Alegre. Ao chegarem lá, tomaram parte das ruas até se localizarem em frente à Praça Central como forma de protesto a espera de uma solução. Dessa forma, o presidente Sarney anuncia a desapropriação de algumas fazendas do Rio Grande do Sul, mas não era o suficiente para assentar as 1.500 famílias da Anoni.

Enquanto isso, os que permaneceram na Fazenda Anoni a espera de uma solução, depositam total confiança e credibilidade para que os que foram em marcha possam realmente buscar uma solução efetiva para todos, trazendo com isso melhores condições de vida.

Durante o depoimento do proprietário da Fazenda Anoni, afirma com convicção ser uma desapropriação irregular com o apoio da igreja e de pessoas da esquerda do governo, desapropriando empresas rurais de grande produtividade no país, afirmando ele ser uma situação muito difícil para a classe de produtores. Pode-se perceber ser extremamente fortes e contraditórias a visão do dono da fazenda e a dos componentes do grupo que tentam conseguir a posse das terras.

No decorrer disso tudo, a espera continua no Incra e a vida daqueles que foram se instalar na Assembléia Legislativa vai tomando um norte, conseguindo doações para se alimentarem e apoio dos populares para não desistirem da luta. Rose e mais um das mulheres, ficaram com a incumbência de organizar a alimentação das pessoas que estavam acampadas. Tem-se o grupo que se responsabilizará em cozinhar, cortar os alimentos os que farão a limpeza do chão, os que  lavam os pratos. Todos ajudam.

Enquanto esperam, os acampados se organizam e conseguem apoio do Estado para fazer uma escola e um posto de saude, se dividindo em equipes de trabalho. A Disputa na justiça entre proprietário e Estado continua e os sem terra não podem plantar, sendo a ocupação considerada irregular. Para se alimentarem era por meio de mantimentos básicos doados pelo Estado.

Quando lutam por Reforma Agrária, os depoimentos dos assentados no documentário,  falam em restabelecer a produção agrícola, com a diminuição do desemprego e o fornecimento de produtos alimentares mais baratos para quem vive na cidade. Muitas mulheres, afirmam o desejo de terem terra para plantar, criar gado, porco, ter uma horta; ou seja, permanecerem no campo e não de irem viver na cidade. 

Serli, que só aparece no final do documentário, e Rose dizem ter aprendido a viver como irmãos com pessoas que nunca tinha visto, e mais para as outras pessoas, aprendendo também a repartir o pouco que eles tinham.

Sem obterem êxito, os sem terras decidem sair da Fazenda Anoni e ir em busca de uma nova caminhada para ocuparem outras fazendas que estavam também em processo de desapropriação e cultivá-las. A partir daí que o confronto entre os ocupantes e a abrigada militar começam, em que os homens impedem a saída em marcha dos colonos, gerando com isso violência.

Impedidos de saírem do acampamento, os colonos recebem apoio de igrejas, deputados e artistas. Durante mais de um mês, eles tentam sair do acampamento e não conseguem. Como forma de protesto, eles queimam bonecos como sendo os representantes do governo.

Após todas as brigas, é emitida a posse da Fazenda Anoni no Incra e os proprietários recebem indenizações pelas terras perdidas e os sem terras podem finalmente plantar. Porém a área não comporta todas as famílias, indo as demais em busca dos seus sonhos.

Rose sempre fez questão de acompanhar e participar de todo o movimento com seu filho Marquinhos nos braços, demonstrando alegria e satisfação, junto da esperança de uma terra para morarem com dignidade. Fato é que o seu sonho acaba quando um caminhão se joga por cima de uma manifestação próximo a Fazenda Anoni, vindo Rose a falecer atropelada.

O documentário todo é marcado por um diálogo entre opiniões divergentes do movimento dos acampados na fazenda, com as autoridades e o dono da propriedade. Apresentando ainda uma divisão em cinco partes: a promessa, a espera, o confronto, o sonho e a trégua. 

O SONHO DE ROSE 10 ANOS DEPOIS

Trata-se de um documentário, produzido 10 anos após o Terra para Rose, sendo retratado o que havia acontecido com as famílias de sem terra, na qual tinha o objetivo maior de descobrir se o tão sonhado desejo de Rose havia se concretizado, levando em consideração que a mesma faleceu antes ainda de ocorrer o processo da legalização da terra ocupada em seu benefício e dos demais agricultores que a acompanhavam.

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Foi um reencontro com quase todos os personagens que haviam participado do filme anterior. Já devidamente assentados, com casas e lavouras compondo a paisagem substituindo aquelas do antigo acampamento marcadas pelas lonas pretas estendidas ao longo do campo. Inclusive mostra um frigorífico da comunidade que comercializa carne bovina fornecendo para os moradores da região próxima da Fazenda Anoni. Escolas com alunos, a maioria filhos de sem terra que lutaram pela posse daquela fazenda há 10 anos.

Durante todo o documentário é repassado a satisfação e comemoração que eles possuem de terem conseguido sucesso na Reforma Agrária.

Mas logo surge uma questão que parece ter gerado certo desentendimento entre os integrantes do movimento. Trata-se da opção por parte de alguns do grupo de assentados que não estão mais lá, de não participarem do sistema coletivo de produção. Os ex-integrantes do MST, agora proprietários rurais, que se separaram das primeiras cooperativas

Entre um depoimento e outro, desses não-cooperativados, alternam-se imagens e relatos acerca dos benefícios das tecnologias adotadas pelos assentados. Essas novidades contribuiriam para fazer crescer os rendimentos das pequenas propriedades, como por exemplos os computadores que mantém os registros de comercialização dos produtos cooperativados. Também o prédio da CETAP (Centro de Tecnologias Alternativas Populares) que oferece cursos técnicos aos agricultores. Tudo isso, segundo a narradora, são conquistas dos “antigos sem terra”.

Outra cena de grande relevância apresentada no documentário, onde é possível perceber as melhoras, é quando uma família exibe sua propriedade composta de muitas plantações e de animais no campo.

Passaram-se dez anos entre um documentário e outro. O que vemos acontecer é uma transformação de narrativas que os sujeitos apresentam sobre si mesmos. A defesa pelo modelo de cooperação é substituída pela justificativa da necessidade de se priorizar o trabalho individual, sob risco de prevalecer a desordem entre os sujeitos assentados. De fato, os caminhos seguidos foram múltiplos.

É interessante perceber como se deu o berço do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, mesmo que alguns integrantes tenham seguido caminhos distintos. O movimento sempre esteve muito bem articulado e impressiona a maneira como cada um o respeita e levanta sua bandeira, ainda que de formas diferentes. O documentário é sensível a essa questão e trata justamente dos medos e dos sonhos desse povo, que, assim como Rose, tanto lutou por um pedaço de terra.

Do meio para fim são apresentados depoimentos dos assentados, amigos da Rose, sendo retratado, por meio a tristeza, todo o esforço que ela teve e dizem não entender o motivo pelo qual o seu marido e seus filhos não conseguiram a terra, alegando ser eles uma das pessoas que mais mereciam uma moradia digna.

E por último, é apresentada a família de Rose, sendo marcada com a insatisfação de José, o marido, pois desistiu do acampamento alegando nunca ter conseguido um pedaço de terra pela qual a “protagonista” do movimento lutou tanto. Além disso, na época das gravações desse segundo documentário, 10 anos após sua morte, Marquinhos, a primeira criança a nascer na Fazenda Anoni, relata não se lembrar da mãe. Vanisa, que tinha sete anos na época, reconhece a importância da luta de Rose pela terra, onde acaba se emocionando. Paulo sonha em ser cantor.

O final do documentário é marcado por uma mensagem através de versos de uma musica, emocionando a todos. A letra da canção é baseada na luta daqueles que não tinham nada e daqueles que tem muito e não querem enxergar as necessidades dos outros.

Ao final das gravações, as coisas mudaram por lá. Surgiram diversas discussões pelo fato da família de Rose ter ficado sem um pedaço de terra. Assim, foi realizado um movimento junto ao INCRA, onde o viúvo e seus filhos ganharam um lote de terra. E assim o sonho de Rose finalmente foi se construindo e tornando realidade durante todos esses anos.

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