1. DOS SEGURADOS, DA SEGURIDADE SOCIAL E DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
1.1. Conceituação
A seguridade social constitui-se em um conjunto de ações integradas, tanto da sociedade como dos Poderes Públicos, tendo como objetivo concretizar os direitos relativos à saúde, à assistência social e a previdência social, afigurando-se, portanto, como um sistema de proteção social.
Este é o enunciado pelo Art. 194 da Constituição Federal, ao preceituar como referido: “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.
De modo, como se pode depreender do texto constitucional citado, a previdência social trata-se de uma espécie do gênero seguridade social, prestando-se, por delegação constitucional às funções lá especificadas.
Nesse sentido, o art. 201 do Constituição Federal estabelece que: “A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a [...]”.
Desse modo, como se pode depreender do enunciado no texto constitucional, a previdência social presta-se a dar conta dos direitos adstritos a essa seara. E mais, o rol de direitos de cunho previdenciário são os delimitados constitucionalmente, em consideração ao princípio, entre outros, da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços, conforme estabelecido no art. 194, inciso III, da Constituição Federal, repetido e esmiuçado no art. 18 da Lei nº 8213/91.
Assim, o já referido art. 201 da Constituição Federal preceitua que: i) cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; ii) proteção à maternidade, especialmente à gestante; iii) proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; iv) salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda, e v) pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes.
Claro se afigura, por decorrência, que ao se propugnar por tais direitos, ou seja, os direitos previdenciários, conforme o rol acima especificado, sempre há que se ter em mente a necessidade de se supor a existência de um fundo pagador desses benefícios.
Se a previdência social presta-se ao fornecimento de prestações, correspondentes a benefícios e serviços, é necessário que o pretendente a tais direitos desembolse certa quantia para custear, v. g., sua aposentadoria ou a pensão de seus dependentes. Tal é o sentido do art. 195 da Constituição Federal, ao distribuir o ônus à coletividade de dar suporte financeiro ao Regime Geral de Previdência Social.
1.2. O Estado Social e a Gênese da Seguridade Social
O Estado Social é consequência da reforma do modelo clássico do Estado Liberal. Veio a lume na década de 1920, advindo de três experiências políticas e institucionais, baseadas em três acontecimentos históricos; a Revolução Russa de 1917, a reconstrução da Alemanha após a Primeira Guerra e a Revolução Mexicana e suas consequências (como a fundação do PRI – Partido Revolucionário Institucional).
Seu embasamento teórico, fixando as bases do garantismo social, advém de três documentos derivados dos fatos históricos relatos, quais sejam, a Constituição de Weimar de 1919; a Constituição Mexicana de 1917 e a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, na Rússia revolucionária de 1918.
Caracteriza-se pela conjugação das garantias das liberdades individuais com o reconhecimento dos direitos sociais, dentro de uma concepção de seguridade social, com lastro na intervenção estatal, através dos cidadãos, com o fito de garantir iguais oportunidades a todos.
Nesse sentido, explica Paulo Bonavides que:
Quando o Estado, coagido pela pressão das massas, pelas reivindicações que a impaciência do quarto estado faz ao poder político, confere, no Estado constitucional ou fora deste, os direitos do trabalho, da previdência, da educação, intervém na economia como distribuidor, dita o salário, manipula a moeda, regula os preços, combate o desemprego, protege os enfermos, dá ao trabalhador e ao burocrata a casa própria, controla as profissões, compra a produção, financia as exportações, concede crédito, institui comissões de abastecimento, provê necessidades individuais, enfrenta crises econômicas, coloca na sociedade todas as classes na mais estreita dependência de seu poderio econômico, político e social, em suma, estende sua influência a quase todos os domínios que dantes pertenciam, em grande parte, à área de iniciativa individual, nesse instante o Estado pode, com justiça, receber a denominação de Estado social. (BONAVIDES, 2004, p. 186).
O Estado, portanto, passa a chamar para si, a solução dos problemas sociais, a partir da ruptura de determinados aspectos da ordem política, social, jurídica e econômica existentes até então.
2. DA FILIAÇÃO E DA INCRIÇÃO AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS)
Ao se tratar do Regime Geral de Previdência Social, ou à previdência social, de modo geral, conceitos que vem à lume primacialmente dizem respeito ao modo pelo qual se possa manter a relação jurídica pertinente, que nos deixa aptos a haurir os benefícios e serviços que nos são disponibilizados, ainda que mediante contribuição social, pelos vários regimes de previdência social, que temos às mãos.
Desse modo, por filiação pode-se entender “[...] a relação jurídica estabelecida entre o segurado e o INSS, nos termos do RGPS, geradora de direitos e obrigações mútuas” (TAVARES, 2006, p. 85).
Já, a inscrição é outra coisa!
Assim, a inscrição trata-se do ato administrativo de realização do registro do segurado na esfera da pessoa jurídica responsável pela previdência social.
Ou ainda melhor: pode-se entender que a inscrição “[...] é o ato de cadastramento do segurado e do dependente junto ao RGPS” (TAVARES, 2006, p. 85).
Portanto, a filiação e inscrição são conceitos díspares. Algumas vezes, entretanto, acabam se confundindo, por ocorrem no mesmo momento. Porém, nem sempre...
Por tais razões, a fim de se evitar erros de análise, outros fatos devem ser levados em consideração, a fim de que se tenha toda a elucidação necessária para o completo discernimento dessa quaestio.
Desse modo, por filiação pode-se entender-se como o momento em que uma pessoa física ingressa no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que poderá se dar simultaneamente à inscrição ou não.
Assim, dentro desse ponto de vista, a filiação de uma pessoa física ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) dá-se no momento em que ela exerce uma atividade remunerada, legalmente estabelecida na Lei nº 8213/91, de forma automática, ou por iniciativa própria.
Para tanto, deve-se levar em consideração o tipo de segurado que se esta tratar.
Note, portanto:
De efeito, no grupo dos segurados obrigatórios, em regra, se enquadram as pessoas que exercem atividade laboral remunerada no Brasil, exceto os servidores públicos efetivos e militares já vinculados a Regime Próprio de Previdência Social, instituído pela entidade política que se encontrem vinculados (AMADO, 2015, p. 213).
Portanto, as pessoas físicas que se ocupam das atividades remuneradas, delineadas legalmente, são chamadas de segurados. Sua correlação com a filiação é inconteste, de modo a poderem, os segurados, serem chamados de filiados, notamente, filiados obrigatórios.
Já a inscrição (por se tratar de ente diverso do da filiação) poderá se dar em momento posterior (ao da filiação). Note, por exemplo, a figura do empregado, segurado obrigatório, conforme a dicção do art. 11, inciso I, da Lei nº 8213/91. Sua filiação decorre automaticamente da celebração e execução do contrato de trabalho entabulado. Já a inscrição, somente ocorre em momento posterior, e será efetuada junto ao INSS, por seu empregador.
Nessa linha de raciocínio, entre esses filiados obrigatórios, delineiam-se os contribuintes individuais, os quais se encontram capitulados no art. 11, inciso V, da Lei nº 8213/91, e nesse caso, a filiação e a inscrição ao Regime de Previdência Social ocorrem no mesmo momento, e dependem, ao se considerar que engloba, v.g., “o titular de firma individual ou rural”, ou “a pessoa física que exerce, por contra própria, atividade urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego”, da ação própria destes de pretenderem sua filiação (e por consequência inscrição) ao Regime Geral de Previdência, sob pena de engrossarem as cifras que quantificam o mercado informal.
Do mesmo modo, quando se considera essa dissociação temporal entre filiação e inscrição, também podem ser lembrados os segurados facultativos. A par dos segurados obrigatórios, ainda existem o segurados facultativos. Estes se qualificam a partir da previsão do art. 13 da Lei nº 8213/91. Caracterizam-se por não exercem nenhuma atividade remunerada, que os enquadre como segurados obrigatórios. Assim, não possuem vínculo empregatício, nem a obrigatoriedade de contribuir para o sistema, devendo ter idade mínima de 16 anos.
Dessa forma, “[...] para o segurado facultativo, a filiação apenas ocorrerá com a inscrição formalizada (mero cadastro de dados na Previdência Social) e o efetivo pagamento da primeira contribuição previdenciária [...]” (AMADO, 2015, p. 266).
Verifica-se, portanto, que a lógica adstrita à filiação dos segurados facultativos ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) segue, mutatis mudandis, a mesma métrica aplicada aos contribuintes individuais, levando em consideração, como se pode perceber, o componente volitivo, e se confundindo com a sua inscrição.
CONCLUSÃO
Os direitos sociais se legitimam em função da construção de um mínimo de condições existenciais do ser humano. Dentre esses direitos, podem ser citados os direitos securitários.
Tais direitos, por disposição constitucional, exigem uma contrapartida da sociedade, notadamente, daqueles que pretendem ter acesso alguma das prestações oferecidas pelo Estado, através do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
Nesse desiderato, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) funciona como um fundo de caráter contributivo e filiação obrigatória (de todas as pessoas físicas que exerçam atividade remunerada), objetivando o fornecimento de prestações, correspondentes a benefícios e serviços.
Assim, ao se evidenciar as pessoas físicas que se relacionam diretamente com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), emerge a figura dos segurados.
Os segurados categorizam-se como obrigatórios e facultativos, (e reflexamente os dependestes) com características próprias, inerentes a esta condição.
A vinculação jurídica dos segurados com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) dá-se por meio da filiação, caracterizada pelo exercício de uma atividade remunerada, ou por ato volitivo, com o pagamento da primeira parcela das contribuições sociais devidas.
Diferenciando-se da inscrição, que apesar de possuir alguma semelhança com a filiação, ante a eventual convergência do momento em que ambos (filiação e inscrição) se verificam, trata-se de instituto jurídico diverso deste.
REFERÊNCIAS
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 7ª ed. Salvador: Juspodivm, 2015.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15ª. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.
CASTRO. Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 14ª ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2012.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 20 ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 8ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.