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Utilização dos créditos-prêmio de exportação do Decreto-lei nº 491/69.

Carência do mandado de segurança impetrado sem a juntada dos documentos comprobatórios das exportações realizadas

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Inúmeras empresas, por todo o país, estão ajuizando ações judiciais visando a obtenção de provimento jurisdicional que lhes assegure o aproveitamento dos créditos de exportação do IPI, que têm como fundamento os artigos 1º [1] e 5º [2] do Decreto-lei nº 491/69.

A via processual utilizada, em geral, é aquela disciplinada pela Lei nº 1.533/51 com as alterações posteriores, a saber, a ação mandamental. O art. 6°, caput, da referida lei, a respeito dos requisitos da peça vestibular, dispõe que:

"Art. 6º A petição inicial, que deverá preencher os requisitos dos artigos 153 e 159 do Código do Processo Civil [3], será apresentada em duas vias e os documentos, que instruírem a primeira, deverão ser reproduzidos, por cópia, na segunda."

Já o caput do art. 159 do Código de Processo Civil a que se refere o dispositivo supracitado determinava que:

"Art 159. A petição inicial será instruída com os documentos em que o autor fundar o pedido."

Por sua vez, o art. 8º da LMS, reza que:

"Art. 8º A inicial será desde logo indeferida quando não fôr caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos desta lei."

O Mandado de Segurança é um remédio processual que visa acudir direito líquido e certo não amparável pela via do habeas corpus ou do habeas data, em face de ato praticado por agente público ou investido na função pública [4], que tramita sob um rito mais célere em relação ao previsto para o procedimento ordinário.

O direito líquido e certo, segundo as indeléveis palavras do jurisconsulto Hely Lopes Meirelles é o "direito comprovado de plano" [5], ou seja, de imediato, no ato da impetração. A ritualística do remédio heróico não se compadece com a dilação probatória, imanente que é às ações que obedecem aos procedimentos mais amplos.

Com efeito, à míngua de comprovação do direito alegado no ato da impetração do writ of mandamus, o impetrante será possivelmente declarado carecedor da ação, e o processo será extinto sem julgamento do mérito, pela ausência de uma condição especial ao ajuizamento da ação mandamental.

O Colendo Superior Tribunal de Justiça outrora se manifestou quanto a quaestio aqui debatida, afirmando que, in ipsis litteris:

"Administrativo. mandado de segurança. prova prÉ-constituÍda. ausÊncia. indeferimento liminar. art. 8., lei 1.533/1951.

1. No mandado de segurança revela-se como condição elementar a demonstração de liquidez e certeza do direito a prova documental que deve ser ministrada no ato da impetração, não se admitindo, salvo no caso de carência de requisitos supríveis (autenticação de fotocópia, por exemplo), a emenda da inicial com juntada de documentos. O remédio, na falta de prova pré-constituída, será o indeferimento (art. 8, da lei 1.533/1951).

2. RMS improvido."

(STJ, ROMS nº 6195/PR, 6ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 16.06.1997)

"Processual civil. mandado de segurança. gratificação de incentivo funcional. incidÊncia sobre abonos. inexistÊncia de direito lÍquido e certo. carÊncia da ação. recurso ordinÁrio conhecido e improvido.

(...)

II - A essência do processo do mandado de segurança está em ser ele um "processo de documentos" (urkundenprozess), exigindo prova pré-constituída (direito líquido e certo). Quem não prova de modo insofismável com documentos o que deduz na inicial não tem a condição especial da ação de mandado de segurança. Logo, o julgador não tem como chegar ao mérito do pedido e deve extinguir o processo por carência da ação.

III - Recurso ordinário conhecido e improvido."

(STJ, ROMS nº 4258/GO, 6ª Turma, Rel. Min. Adhemar Maciel, DJ de 19.12.1994)

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSTRUÇÃO DEFICIENTE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESCABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. ANÁLISE.

I - Não obstante tenham os recorrentes apontado diversas máculas no processo administrativo, não é possível a análise das teses por eles sustentadas, porquanto carrearam aos autos tão-somente algumas peças do referido procedimento, as quais, por si só, não são suficientes para caracterizar qualquer irregularidade.

II - Consoante entendimento cediço, o mandado de segurança não comporta dilação probatória, devendo impetrante anexar à exordial as provas que possibilitem a análise de sua pretensão.

Recurso desprovido."

(STJ, ROMS nº 15405/TO, 5ª Turma, Rel. Min. Felix Fischer, DJ de 01.07.2004)

Assim, nesse caso (ausência de prova constituída a priori), a solução mais adequada não seria, como se poderia pensar prima facie, a denegação da segurança com o julgamento do mérito, em face do reconhecimento da inexistência de direito líquido e certo (lide mandamental), uma vez que a ausência de comprovação do alegado via prova pré-constituída fulmina o remédio heróico de plano, no nascedouro de seu iter, descabendo o exame mais aprofundado do mérito mediante o exercício de cognição exauriente, não havendo, a fortiori, que se falar em imutabilidade dos efeitos de tal pronunciamento judicial, fruto que é, do mero exercício de cognição sumária.

Com efeito, nem a juntada parcial dos documentos comprobatórios dos fatos relativos ao direito pleiteado teria o condão de suprir a eiva, ao menos que se admita o reconhecimento da tão-só parcela eventualmente comprovada do direito alegado.

Volvendo ao cerne da questão, cumpre salientar que o Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região prolatou um decisum específico relativo ao crédito-prêmio do IPI, cuja recuperação se pretendia sem o cumprimento do requisito probatório, veja-se:

"MANDADO DE SEGURANÇA - PRETENDIDA RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO-PRÊMIO DE IPI NA FORMA DO DL 491/69, IMPEDIDO PELO ATO DECLARATÓRIO 31/99 DO SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL - EXPEDIÇÃO DE DCCs EM FAVOR DA IMPETRANTE PARA POSSIBILITAR RECUPERAÇÃO ATRAVÉS DE CESSÃO DE CRÉDITO A TERCEIROS, DEVEDORES DO FISCO - EMPRESA COM SEDE NO RIO DE JANEIRO E FILIAL EM PERNAMBUCO - AJUIZAMENTO DA SEGURANÇA EM SÃO PAULO ONDE MANTINHA APENAS "ESCRITÓRIO" - SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE PASSIVA MANTIDA, A QUE SE ACRESCE CONSTATAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA SUPERVENIENTE (ART. 462 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL) E AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO DE PLANO PELA VIA DOCUMENTAL, MATÉRIA ESSA RECONHECÍVEL EX OFFICIO PELO JUDICIÁRIO, E AVENTADA EM PARECER MINISTERIAL - LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ MANTIDA.

(...)

2. No curso do processo sobreveio causa excludente desse direito, qual seja, a Instrução Normativa nº 41 de 7/4/2000, que revogou expressamente a possibilidade de emissão dos DCCs desde aquela data; sendo assim, impossível desde a edição dessa norma - perfeitamente legítima - exigir-se da Receita Federal que expedisse Documentos Comprobatórios de Compensação. Situação nova, a ser levada em conta na forma do art. 462 do Código de Processo Civil.

3. O mandamus merece ser extinto também em virtude da ausência de mínima prova documental acerca da extensão do direito de crédito alegado, matéria essa que - em tema de mandado de segurança – pode e deve ser apreciada ex officio pelo órgão julgador, além do que foi tema do r. parecer da Procuradoria Regional da República, que alegou a questão com profundidade, pois a inicial do mandado de segurança apresenta-se completamente genérica e formulada em termos amplos como evidencia sua leitura, e uma vez que o pedido nela formulado é o mesmo feito em mandado de segurança aparelhado no Rio de Janeiro, paira invencível dúvida acerca da origem e da extensão dos créditos-prêmio que a empresa buscava utilizar mercê do writ ajuizado em São Paulo.

4. Sem qualquer indicativo seguro dos supostos créditos e seu valor não se pode enxergar no caso a existência de direito líquido e certo a ser amparado pela via estreita do mandado de segurança, pois na medida em que desejava que o Judiciário ordenasse à Receita Federal a expedição de documentos que conteriam valores a recuperar por meio de compensação, especialmente com débitos de terceiros, impunha-se que a impetração fosse explícita sobre valores que a empresa dizia possuir em seu favor a título de crédito-prêmio de IPI, informando o estabelecimento de sua origem.

5. Na esteira de doutrina e jurisprudência dominantes só se pode falar em direito líquido e certo se comprovado de plano por documentos inequívocos (RTJ 83/130, 83/855) e a falta dessa prova induz ao não reconhecimento do direito daquela forma qualificado, ensejando a carência do uso do writ pois é requisito essencial do conhecimento do mérito da impetração que a mesma esteja acompanhada de prova documental dos fatos sobre que se assenta o pedido. Precedentes jurisprudenciais.

6. A empresa autora alterou ou omitiu situação essencial para o correto processamento do writ de forma que não há como afastar a condenação na litigância de má fé.

7. Apelo conhecido e improvido, com acréscimo de motivos."

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(TRF da 3ª Região, AMS nº 225836/SP, 4ª Turma, Rel. Juiz Johonsom di Salvo, DJU de 07.06.2002)

A conclusão é que o eventual ajuizamento do writ sem a necessária comprovação do direito líquido e certo mediante a juntada de provas documentais com a inicial mandamental contamina-o, ferindo-o de morte. A pecha é insanável na mesma base procedimental, restando inarredável a desistência do feito em trâmite e a impetração de nova ação, ou a assunção do risco de decretação de carência daquele.


Notas

1 Refere-se a créditos destinados às empresas fabricantes e exportadoras de produtos manufaturados sobre as vendas para o exterior como ressarcimento de tributos devidos internamente. In verbis: "Art. 1º As empresas fabricantes e exportadoras de produtos manufaturados gozarão a título estímulo fiscal, créditos tributários sobre suas vendas para o exterior, como ressarcimento de tributos pagos internamente."

2 Refere-se à manutenção e utilização de créditos de IPI relativos às matérias-primas, aos produtos intermediários e materiais de embalagem, utilizados na industrialização dos produtos exportados. In litteratim: "Art. 5º É assegurada a manutenção e utilização do crédito do IPI relativo às matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem efetivamente utilizados na industrialização dos produtos exportados."

3 O dispositivo se refere ao Codex de Ritos revogado (Decreto-lei n. 1.608/39).

4 Inciso LXIX, do art. 5° da Constituição Federal de 1988.

5 Mandado de Segurança, Malheiros, 26 ed., 2003, p.37.

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Sobre o autor
Luiz Fernando Pelegrina de Lima

advogado especialista em Direito da Integração e do Comércio Internacional pela Universidade Estadual de Londrina (UEL)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Luiz Fernando Pelegrina. Utilização dos créditos-prêmio de exportação do Decreto-lei nº 491/69.: Carência do mandado de segurança impetrado sem a juntada dos documentos comprobatórios das exportações realizadas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 505, 24 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5927. Acesso em: 26 abr. 2024.

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Título original: "Da carência do mandado de segurança impetrado com o desiderato de garantir a utilização dos créditos-prêmio de exportação do Decreto-lei nº 491/69 sem a juntada dos documentos comprobatórios das exportações realizadas no ato da impetração".

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