4. RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA.
A legislação também inova, no país, ao propor a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e a logística reversa de retorno de produtos, a prevenção, precaução, redução, reutilização e reciclagem, metas de redução de disposição final de resíduos e a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos em aterros sanitários.
Pela disciplina constante da PNRS, prevê-se o compartilhamento de responsabilidades dentro da cadeia produtiva e de consumo, denotando preocupação acentuada também com a etapa de conclusão do ciclo produtivo e a sustentabilidade ambiental do sistema de produção e consumo, o que representa um avanço considerável.
Nos termos da PNRS, a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos é o conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei.
Em meio a essa disciplina, temos a regulamentação da logística reversa como um dos instrumentos para aplicação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, definida pela norma como um instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.
5. LOGÍSTICA REVERSA.
A logística reversa, inversa ou verde, segundo a PNRS, é a uma lógica de sistematização inversa do ciclo de vida dos produtos; ou seja, de trás para frente na gestão dos fluxos físicos de produtos e embalagens, desde os locais de consumo até e em direção aos locais de produção, a fim de implementar ações de reciclagem e reaproveitamento de materiais e resíduos na própria cadeia de abastecimento.
Também pode ser compreendida como uma técnica que prioriza a utilização de rejeitos para reintroduzi-los no ciclo de vida produtiva, conforme inciso XII, do artigo 3º, da Lei nº 12.305/10, apresentando-se interessante economicamente ao próprio fabricante, uma vez que este poderá reaproveitar componentes e materiais que seriam perdidos com o fim da vida útil dos produtos colocados no mercado.
Costuma-se dividir a logística em pós-consumo e pós-venda. Os produtos de pós-venda se referem a todas as ações que se seguem à venda, porém, norteadas pela busca de relacionamento, não de venda imediata e os pós-consumo são aqueles que tiveram sua vida útil encerrada e que podem ser enviados a destinos finais, retornando ao ciclo produtivo, porventura através de desmanches, reciclagem e reuso.
A logística reversa de pós-consumo, alvo da norma federal, está voltada para a gestão de materiais e informações referentes aos bens de consumo de pós-venda descartados pela sociedade em geral que retornam ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo por meio de canais de distribuição reversos específicos.
Em outras palavras, contrariamente a logística reversa de pós-venda, na qual os fluxos reversos se processam por meio de parte da mesma cadeia de distribuição direta, o que se procura é exigir uma cadeia pós-consumidora própria, a ensejar a criação de condições hábeis à sua efetivação junto todos os segmentos, ou seja, o empresariado, o Poder Público e também o consumidor.
O instrumental sistema de logística reversa, como se refere a Lei, é obrigatório para determinadas categorias de produtos, caso dos pneus, pilhas e baterias, embalagens com agrotóxicos, lâmpadas fluorescentes. Dessa forma, produtores, fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: 1) agrotóxicos; 2) pilhas e baterias; 3) pneus; 4) óleos lubrificantes; 5) lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; 6) produtos eletroeletrônicos; são obrigados a propiciar a efetivação da logística reversa dentro do ciclo produtivo. Quanto aos resíduos radioativos, contudo, continuam, ao menos quanto a sua destinação final, a deter tratamento específico na Lei nº 10.308/2001.
Mas nada impede que a logística reversa seja estendida a produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens, considerando, prioritariamente, o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados. No caso dos demais produtos, a competência é dos Municípios, que devem realizar a coleta seletiva, a reutilização e a reciclagem.
Como se apercebe, esse instrumento está intimamente ligado ao ciclo de vida dos produtos, cujo encadeamento é bem explicado por GREICE MOREIRA PINZ [8].
Convém explicar que os termos logística reversa e ciclo de vida de produtos estão profundamente interligados, sendo que este último trata do estudo sobre todas as fases de um produto, desde a sua fabricação até a sua destinação final.
Enquanto técnica de sustentabilidade na cadeia de abastecimento, a logística reversa permite que se constitua um circuito fechado, no qual a logística reversa complementa a logística tradicional de mercado e passa a ter um papel estratégico no ciclo de vida dos produtos, ao religar os resíduos da etapa de pós consumo a um novo ciclo produtivo ou à sua disposição final em locais seguros e passíveis de ocasionar um menor risco ambiental.
Avançando sobre o assunto, a Nova Lei da PNRS, em seu artigo 33, impôs, de forma expressa, a responsabilidade pela estruturação e implementação de sistemas de logística reversa a fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de agrotóxicos; pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
A responsabilidade pela implementação do sistema de logística reversa atinge, obviamente, a fase final do processo, impondo aos responsáveis a obrigação de dar destinação ambientalmente adequada aos produtos e às embalagens reunidos ou devolvidos, sendo o rejeito encaminhado para disposição final ambientalmente adequada, na forma estabelecida pelo órgão competente do SISNAMA e, se houver, no plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, nos termos do disposto no parágrafo 6º, do artigo 33, do novo Diploma legal.
O que não quer dizer que a preocupação com que a logística não deva iniciar-se com a própria eficiência na fabricação dos produtos, assim como com uma melhor forma de os embalar, observados os impactos no meio ambiente durante essas fases. A logística reversa tem ligação direta com o método pelo qual um produto irá voltar ao seu fabricante. Somente assim este fará a devida destinação final do produto. Convenhamos, ninguém melhor do que o fabricante de um produto para dizer como esse produto pode ser reciclado, daí porque esses atores tem um papel decisivo na implementação da PNRS.
Além disso, as leis aumentam a eficiência do uso de tecnologia modernas para soluções ambientalmente corretas, de modo que agora a logística reversa é regulamentada por Lei, obrigando os fabricantes a se preocuparem com os resíduos gerados por seus produtos. Procurando permear esse programa governamental ajustado, o Decreto Federal nº 7.404/2010, que regulamentou a Lei nº 12.305/2010, trouxe os seguintes instrumentos para a implementação e operacionalização da logística reversa de produtos:
1) regulamento expedido pelo Poder Público, ou seja, poderá ser implantada diretamente por regulamento, veiculado por decreto editado pelo Poder Executivo, desde que avaliada e confirmada a viabilidade técnica e econômica da logística reversa, precedidos de consulta pública;
2) acordos setoriais, que são atos de natureza contratual, firmados entre o Poder Público e os fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, visando a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, consoante procedimentos para implantação da logística reversa listados na Subseção I, da Seção II, do Capítulo III, do Decreto;
3) termos de compromisso, por meio dos quais o Poder Público poderá celebrar ajustes com fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes visando o estabelecimento de sistema de logística reversa nas hipóteses em que não houver, em uma mesma área de abrangência, acordo setorial ou regulamento específico ou para a fixação de compromissos e metas mais exigentes que o previsto em acordo setorial ou regulamento, sendo que terão eficácia a partir de sua homologação pelo órgão ambiental competente do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, conforme sua abrangência territorial.
Traçado esse estrato do sistema logístico reverso, sobressaem como seus formadores, especialmente, os princípios da prevenção e da precaução, do desenvolvimento sustentável, da responsabilidade compartilhada e do poluidor-pagador e protetor-recebedor tem papel fundamental na implementação do instituto da logística reversa, pois imputam a sustentabilidade por meio do compartilhamento entre todos os atores do processo produtivo e de consumo, com escoro na poluição gerada ou que podem gerar e no favorecimento daquela evitada ou reduzida, com foco, nestes termos, na destinação ou disposição ambientalmente adequada.
Considerando o fluxo da logística reversa, Administração, empresariado e consumidores tornaram-se todos responsáveis pelo produto até o seu retorno ao início da cadeia produtiva, seja para reutilização ou descarte.
Assim, da norma resta evidenciada a simbiose entre o instituto da logística reversa e o princípio da responsabilidade compartilhada, a fim de instrumentalizá-la dentro do ambiente da Política Pública.
Os pressupostos para a validação do sistema logístico acarretam a responsabilidade não só na forma de destinação ambientalmente adequada, mas também confere aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, o investimento na fabricação de produtos aptos a reutilização e reciclagem, aos consumidores, no sentido de gerar menor quantidade de resíduos, e aos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana o manejo adequado desses resíduos sólidos, com o objetivo geral de minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados e reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes dos ciclos de vida dos produtos.
Não é por acaso que a aplicabilidade do princípio da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos deve-se, em grande monta, à logística reversa, tida como a engrenagem que une responsabilidade e cooperação entre todos os participantes da cadeia produtiva e de consumo, pois, para o fechamento do ciclo, com o retorno dos mesmos aos fabricantes ou importadores, é necessária a obrigação mútua e, tão logo, a união entre os entes em empreender esforços, a fim de se obter os resultados sustentáveis esperados.
6. PERSPECTIVAS PREVENTIVA E PRECAUCIONAL.
A logística reversa pode ser vislumbrada sob uma perspectiva preventiva, como dever imposto ao setor empresarial em estruturar, implementar e operacionalizar o retorno dos resíduos, isto é produtos pós-consumo com destinação ou disposição final ambientalmente adequada quando retornados.
À medida que o setor empresarial é física e economicamente responsabilizado a dar a destinação ambientalmente adequada aos produtos que produz e coloca no mercado, espera-se, com isso, fornecer-lhes um incentivo a repensar o processo de produção de seus produtos, desde o início, com vistas à concepção de produtos menos intensivos em materiais e cujo uso não gere ou gere menos resíduos ou, ainda, permita o reuso, afinal, quanto menor a quantidade de resíduos sólidos gerados, menores serão os custos com a destinação final.
Por sua vez, a finalidade de incentivo ao “ecodesign” dos produtos, com vistas à prevenção de resíduos é o objetivo, decorrente da melhoria no gerenciamento dos resíduos gerados. Frente a obrigatoriedade de sistemas de logística reversa para parte dos produtos listados nos incisos I a VI do artigo 33 e para os demais produtos e embalagens mencionados no §1º desse mesmo dispositivo, o potencial preventivo desses sistemas deve envolver não apenas a estruturação e implementação de metas de reciclagem, mas sim o seu reuso ou o design, acompanhando a preferência sinalizada pela adoção do modelo repartido de responsabilidade.
Malgrado as previsões dos artigos 31, inciso I, e 32, ambos da PNRS, não há, nem em lei, nem em regulamento, o estabelecimento de critérios e/ou do modus operandi para o cumprimento das obrigações diretas de ecodesign, o que é explicado pelo fato se se tratar de uma Lei de resíduos; e não propriamente um instrumento de regulação de produtos. De outra sorte, no que diz respeito ao propósito de influência indireta sobre o ecodesign dos produtos mediante a responsabilidade pós-consumo em geral e a logística reversa nela embutida, o foco normativo da PNRS ainda se concentra no objetivo de gerenciamento de resíduos. Não há iniciativas na cadeia de produção, onde melhorias no design dos produtos poderiam trazer resultados efetivos para a redução de materiais.
O modelo compartilhado de responsabilidade significa o cumprimento dos deveres que compõem a responsabilidade pós-consumo, isto é, a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos a que se refere a PNRS, repartida de forma conjunta aos sujeitos obrigados (fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes), sendo a logística reversa um instrumento para sua concretização.
A principal vantagem desse modelo é a criação de escala e a redução dos custos incorridos com o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos pós-consumo, mas que tende, entretanto, a comprometer a internalização, pelos produtores, dos custos associados a esse gerenciamento.
Visível que, para reaproveitar o volume de matérias-primas gerado pela logística reversa, o mercado deverá superar alguns preconceitos quanto à utilização de matéria-prima reciclada, como exemplo a baixa qualidade do material reciclado, já que o material reciclado pode ter a mesma qualidade de uma matéria-prima nova desde que tenha o tratamento adequado durante o período de reciclagem.
O estabelecimento de selos, certificação ou outras formas de comprovação da qualidade do material e do processo nele empregado, referente a matéria-prima reciclada, podem possibilitar o êxito do sistema.
Ora, outro preconceito a ser combatido seria quanto a não contribuição por parte do consumidor final na devolução dos produtos. Para isso, os fabricantes devem dispor de canais logísticos que suportem essa operação. Mesmo porque, a utilização do material reciclado apresentam algumas vantagens em relação à matéria-prima original, entre elas menores preços de mercado, combate à nova extração de matéria-prima escassa, economia no consumo de recursos naturais (energia elétrica, água) e vantagem competitiva com a melhora da imagem da empresa, por exemplo.
Sob uma ótica precaucional, a obrigação legalmente estabelecida de que as embalagens devem ser fabricadas com materiais que propiciem a reutilização ou a reciclagem, consoante artigo 32, incontestavelmente, traz a oportunidade de formatação de novos mercados industrializados que venham a gerenciar e, sem dúvida, mitigar os riscos ambientais.
Destarte, para demonstrar as ações precautórias ou precaucionais ou acautelatórias que a PNRS adota, tem-se uma diversidade de alternativas ou soluções para evitar o descarte dos resíduos, incluindo no rol de destinação final adequada a reutilização, reciclagem, compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético, ampliando, ainda, esse rol, quando admite outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do SISNAMA, do SNVS e do SUASA, segundo o artigo 3º, inciso VII, da Lei nº 12.305/2010.
Mesmo com tantas alternativas de destinação final que a PNRS entende como sendo adequada, a Política admite a hipótese de que pode haver resíduos que não terão nenhuma das destinações previstas.
Para tanto, mesmo que tais resíduos não sejam reutilizados, reciclados, recuperados, energeticamente aproveitados ou destinados à compostagem, deverão seguir para alguma outra destinação final ambientalmente adequada, ou mesmo para a disposição, definida como sendo a distribuição ordenada de rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas, de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar impactos ambientais adversos, como se pode notar do disposto no artigo 3º, inciso VIII, da Lei Nacional.
A PNRS estabelece uma diferença clara entre disposição final adequada, que diz respeito apenas e tão somente àqueles resíduos que não apresentam quaisquer alternativas para seu reaproveitamento; e destinação adequada, que abrange os resíduos cujo reaproveitamento é possível com a utilização de diferentes técnicas de tratamento.
A necessária minimização dos riscos, diante da atual produção excessiva de resíduos sólidos obrigou o legislador pátrio a estabelecer a destinação adequada, elencando diversas alternativas com o fim de evitar o descarte e promover o reaproveitamento dos resíduos.
Desse modo, ao definir a gestão integrada de resíduos sólidos, a Política Nacional, considerou a maior amplitude de possibilidades de impactos que a produção de resíduos sólidos poderá causar nas diversas esferas da sociedade, reconhecendo que os riscos ou possibilidades de impactos possuem várias dimensões difíceis de serem contornadas e amplamente conhecidas.
O sistema de logística reversa é o principal elemento de materialização da destinação adequada de resíduos, uma vez que fomenta a integração e o elemento reversibilidade no sistema de produção e de consumo quanto aos resíduos produzidos. Através desse instituto também se dá uma modificação conceitual e nos próprios processos de produção, que devem preocupar-se com os fluxos de retornos dos materiais.
Mas, por meio dele, também há a triagem de produtos que receberão a disposição final correta, uma vez que a mesma dependerá da conclusão aviada após a avaliação feita pelo produtor ou fabricante.