História e humanização das penas no Direito brasileiro à luz das Leis nº 9099/95 e nº 9.714/98

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 Capítulo III

Das Penas Restritivas de direitos

                   As penas restritivas de acordo com o eminente Leonardo Sicca,[87] são reações penais que limitam o exercício de determinados direitos, liberdade ou garantias, ou seja, não afetam a liberdade dos indivíduos como um todo, e sobretudo possuem um caráter punitivo-pedagógico.

                   As penas alternativas são tidas como modernas, visto que os  reformadores do século XVIII, Beccaria, Benthan e Howard e outros,  se quer chegaram a conhecê-las.

                   A  reformulação do sistema de penas, teve início com a luta de Von Liszt por volta de 1889 contra as penas curtas  privativas de liberdades e adepto da substituição por recursos mais adequado, visto que as penas privativas não reduziu a criminalidade e tampouco reeducou os deliqüentes, mas ao contrário aumentou e degenerou ainda mais os indivíduos.

                   Mas foi em  1945 no auge do pós-guerra, que surgiu a nova defesa social, com Marc Ancel, este defendia a proteção eficaz da comunidade, por meio de medidas extrapenais, não revestidas de escopo intimidativo, da missão de neutralizar a periculosidade do agente, de forma humanitária e individualizada.    Marc Ancel propôs também a desjurisdização de alguns setores do Direito Penal, concebendo um Direito Penal  não como fim em si mesmo, mas como meio de luta contra o crime.        

                   Então em 1955, dez anos depois do surgimento da nova defesa social, quando da realização do 1º congresso da ONU, adotaram-se as denominadas Regras Mínimas para Tratamento de reclusos.

                   Indubitavelmente o Brasil foi influenciado por esses movimentos abolicionistas, minimalistas e neo-realistas. Mas os legisladores brasileiros só atestaram a falência da pena de prisão e alertaram para a necessidade de reformar o sistema, em 1977 na Moção de Goiânia .[88] 

                   Com a abertura política de 1979 para 1980, temas como paz social, violência e criminalidade, vieram a tona, solidificando de vez o terreno para a reforma do Código Penal de 1940 na parte geral, através da lei 7.209/84, que trouxe seis modalidades de penas alternativas substitutivas, quais sejam: multa, prestação de serviço à comunidade, limitação de fim de semana, proibição do exercício de profissão e suspensão da habilitação para dirigir veículo.

                   Embora, estivessem previstas tais modalidades, a experiência efetiva das penas restritivas de direitos, principalmente a de prestação  de serviço à comunidade  só ocorreu em 1987, ou seja, três anos depois, no Estado do Rio Grande do Sul, que obteve um grande sucesso nos resultados.

                    Mas somente no 8º Congresso da ONU, em 14.12.1990, recomendou-se a adoção das Regras Mínimas sobre Penas Alternativas, aprovadas por meio da Resolução 45 da Assembléia-Geral, passando a ser conhecida como as Regras de Tóquio.

                   Ainda no âmbito das regras internacionais, em matéria de sanções penais, o Pacto de São José da Costa Rica de 1969, que foi aderido pelo Brasil em 1992, através do Decreto nº. 678, que  prevê, no seu art.5º, nº.6, o seguinte: “As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados”.

                   Desta assertiva é possível vislumbrar-se a necessidade de que a pena privativa de liberdade tenha finalidades intrínsecas inafastáveis, sendo que, se tais não forem alcançadas, seguramente deve-se vedar a aplicação das mesmas, buscando-se medidas alternativas mais aptas à consecução dos fins da pena previstos em tal dispositivo.

                   Então, os adeptos do direito penal alternativo e despenalizador, por considerarem tais medidas mais úteis do que a aplicação das penas privativas, mas com um rol muito tímido, em relação ao direito comparado, pugnaram pela  ampliação do elenco das pena alternativas. Esses movimentos  movimentos fizeram com que surgisse o projeto de Lei 2684/96, que se tornou a nova Lei 9714/98,  que por sua vez  trouxe quatro novas sanções restritivas, tais como: prestação pecuniária em favor da vítima, perda de bens e valores, proibições de frequentar determinados lugares e prestação de outra natureza. Portanto, atualmente contamos com dez modalidades de penas  substitutivas.

3.1  Prestação Pecuniária

                   O mestre Roberto Bitencourt,[89] define a pena pecuniária como um pagamento em dinheiro à vitima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importânica fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário minimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos.

                   Para o mestre supracitado, a pena pecuniária, de perda de bens e valores e multa são sanções penais da mesma natureza, isto é todas as três são pecuniárias. E a diferença esta na destinação da indenização, visto que a pena de multa e a pena de perda de bens e valores são destinadas ao Fundo Penitenciàrio Nacional e a prestação pecuniária destina-se, em tese, à vitima ou seus dependentes.

                   Contudo, a ilustre Franciele Cardoso,[90] informa que essa espécie de pena foi prevista primeiramente no Código de Trânsito Brasileiro (art.297), sob a forma de multa reparatória,  e no Código Penal Brasileiro (art.43, I) e (art.45, § 1º).

                   A mestra supracitada, aduz que tal modalidade não é novidade  em nosso sistema penal, visto que ela já vem sendo aplicada, com sucesso, nos juizados especiais criminais, tanto na modalidade do pagamento em dinheiro quanto na da prestação de outra natureza, como mão-de-obra e doação de cestas básicas, isto é,   o objeto da prestação pecuniária tanto pode ser dinheiro como títulos, pedras ou metais preciosos, etc., e o seu pagamento pode se dar tanto à vista quanto parcelado.

                   Ademais, a ordem de preferência para definir os beneficiários da prestação pecuniária é a seguinte: a) vítima pessoalmente; b) dependentes da vítima, como por exemplo: descendentes, ascendentes, cônjuge e irmãos; c) entidade pública com destinação social; d) entidade privada com destinação social.[91]

3.2       Perda de bens e valores

                   Esta espécie de penalidade consiste na perda de bens e valores pertencentes ao condenado em favor do Fundo Penitenciário Nacional, conforme diposição do artigo 43, II, do CP.

                   Tendo como objetivo ressarcir o prejuízo causado pela infração penal ou proveito obtido pelo agente ou por terceiro de forma ilícita, artigo 45 § 3º.

                   O isigne mestre Cezar Bitencourt,[92] afirma que tal modalidade trata-se, da odiosa pena de confisco, que, de há muito, foi proscrita do direito penal moderno. E que foi resgatada sob essa disfarçada e eufemística expressão “perda de bens”.

                   O citado autor alerta ainda que há uma diferença entre confisco-pena e confisco-efeito da condenação. Quais sejam: a) o confisco-efeito destina-se a União, como receita não tributária; enquanto o confisco-pena destina-se ao Fundo Penitenciário Nacional ; b)  o objeto do confisco-efeito são os instrumentos e produtos do crime (art.91, II do CP), enquanto o objeto do confisco-pena  é o patrimônio pertencente ao condenado (art.45, § 3º, do CP).

                   Contudo, o “novo confisco”, como denomina Cezar Bitencourt,[93] possui limites. Caso em que pelo menos diminui ou minimiza a sua aberração e inconstitucionalidade.

                   Os limites para tais aplicaçãoes são os seguintes:

                   a) imitação do quantum a confiscar: estabeleceu-se, como teto  o maior valor entre a  o montante do prejuízo causado ou do proveito obtido com a prática do crime;

                    b) limitação em razão da quantidade da pena aplicada: esta sanção somente pode ser aplicada na hipótese de condenações que não ultrapassem o limite de quatro anos de prisão. E somente caberá “perda de bens e valores” quando for possível a substituição das pena privativa de liberdade por pena restritiva de  direitos, segundo a previsão do (artigo 45 do CPPB ).

                   Ademais, o mestre sérgio Shecaira,[94] defende que a pena de perda de bens é constitucional, uma vez que foi estabelecida pela Carta Magna vigente, no arti.5º XLVI, “b”, não obstante dependa a mesma de previsão concreta de lei ordinária para que ganhe efetividade. Lembrando todavia, que sua implementação no ordenamento jurídico deve ser questionada quanto à sua real conveniência e oportunidade, além de se restringir a casos específicos e detalhadamente regulamentados, obedecendo ao princípio da legalidade em seu aspecto material, e não simplesmente formal.

3.3       Pena de Multa

            A pena de multa de acordo com Jeremy Benthan,[95] é uma soma de dinheiro, exigida por sentença jurídica, por causa de um delito. Sendo que esta indenização é destinada para o Estado e não para a vítima.

                   No Brasil a pena de multa está  prevista no artigo 44, § 2º do CP, e teve seu alcance ampliado em relação à previsão na antiga parte geral Lei 7.209/84, já que, com as alterações procedidas pela Lei 9714/98, a pena privativa de liberdade de até um ano pode ser substituída apenas pela multa, o dobro, portanto, da previsão da Lei 7.209/84.

                   Uma observação importante em relação a pena de multa substitutiva é que esta, ao contrário das demais espécies de penas restritivas de direitos, não pode ser convertida em privação de liberdade em face do que dispõe a Lei 9.268/96, que proibiu a conversão em prisão, das  multas não pagas, uma vez que as multas não pagas devem ser convertidas como dívida de valor a ser cobrada pela Fazenda pública.

                   Outro entendimento é que quando se dá a homologação da transação aceita pelo réu, constitui-se coisa julgada, então se o réu não recolhe a pena de multa aplicada, não há como prosseguir com o feito, devendo portanto receber através de uma execução fiscal.

3.4       Prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas

                   De acordo com a determinação legal do artigo 46 § 1º, a pena de prestação de serviço a comunidade consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais (art.46, § 2º). Já o (§ 3º do art.46), prevê que as tarefas a que se refere o (§ 1º do art.46),  serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser crumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho.

                   E ainda dispõe o (§ 4º do art.46), que se a pena substitutiva for superior a um ano, é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em menor tempo  (art.55), nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada.

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                   Por fim,  o mestre Shecaira,[96] ensina que a pena de serviço à comunidade  não pode ser considerada como pena de “trabalhos forçados”, tendo em vista a natureza substitutiva da prestação de serviços e, principalmente, diante do seu caráter humanitário, isto é, de medida descarcerizadora; além do mais, na execução da pena privativa de liberdade, o trabalho também  é obrigatório para o condenado, com uma diferença, “afastado do meio social”.            

3.5    Interdição temporária de direitos

                   A interdição temporária de direitos, é definida no Vocabulário De Plácido e Silva, em sentido amplo como toda a proibição relativa à prática ou execução de certos atos, ou a privação de certas faculdades.[97]

                   Essa modalidade de pena restritiva de direitos, ao contrário das outras que são genéricas, tendo vista que a mesma é específica, pois se aplica só em determinados crimes. A saber:

                   a) Proibição de exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo (art.47, I, do CP): essa é a primeira modalidade de pena de interdição temporária de direitos, é aplicada apenas nas hipóteses de crimes praticados no exercício de cargo, função ou atividade, violando os deveres que lhe são inerentes (art.56), sendo indispensável que o delito praticado esteja diretamente relacionado com o mau uso do direito interditado. A proibição de que se trata o dispositivo analisado não se confundi, com a perda do cargo, função pública ou mandatos eletivos, que só ocorre como efeito condenação, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública  e quando a pena apllicada for superior a quatro anos (art.92, I CP). Depois de cumprida a pena, o apenado poderá voltar a exercer sua funções normalmente, desde que não haja impedimento de ordem administrativa.

                   b) Proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do Poder Público (art.47,II, do CP): a aplicação dessa modalidade de pena também está condicionada à realização de fato criminosos relacionado com a violação de deveres, que são inerentes à profissão, atividade, ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do Poder Público (art.56 CP). Tal pena aplica-se também quando se tratar de delitos próprios como violação de segredo profissional (art.154 do CP), omissão de notificação de doença (art.269 do CP), patrocíonio infiel (art.355 do CP), e não apenas quando há desobediência de deveres próprios de profissão, atividade ou ofício sujeito a hablitação ou autorização do Poder Público.

                    c) Suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículos (art.47, III, e 57 caput, do CP): Tal penalidade somente pode ser aplicada nos crimes culposos de trânsito (Lei 9.503/97, art.292). A suspensão para dirigir veículos não se confunde com a inabilitação do (art.92, III, do CP), já que essa visa disciplinar as hipóteses em que o agente usa o veículo como meio para o cometimento de crime doloso. Ademais, essa espécie de sanção nos casos de crimes de trânsito culposo, conforme previsão da própria lei 9.503/97 pode se imposta como penalidade principal, isolada ou cumulativamente com outras penalidades.

                   d) Proibição de frequentar determinados lugares (art.47, IV, do CP): esta é a novidade trazida pela Lei 9.714/98, sendo considerada a espécie que mais se coaduna com a determinação de penas restritivas de direitos, pois consiste apenas em uma limitação, específica e pontual, do direito de ir vir do apenado, não atingindo a totalidade desse direito. A  proibição a que se refere o dispositivo em questão não pode recair sobre lugares indeterminados; o juiz, ao substituir a pena privativa de liberdade por essa modalidade de pena, deve, necessariamente, estabelecer quais os lugares cuja visitação é vedade ao condenado. É certo que a definição desses locais deve guardar alguma pertinência com o crime que se visa punir, pois para justificar a proibição é necessário que haja, pelo menos em teses, uma relação de influência criminógena, como por exemplo a proibição de frequentar bares, bingos e demais lugares que possam atrapalhar a ressocialização do apenado

3.6       Limitação do fim de semana

                   A pena de limitação do fim de semana prevista nos artigos 43, VI, e 48, do Código Penal, consiste no recolhimento do condenado em casa de albergado, ou em outro estabelecimento adequado, pelo tempo de cinco horas diárias aos sábados e domingos. Na realidade, tal espécie de sanção não é uma restrição de direito, mas uma sanção de privação  de liberdade a ser cumprida aos finais de semana, sendo portanto, uma verdadeira prisão descontínua, porque o condenado fica privado da liberdade durante o período de sua execução.[98]

                   Esta modalidade de sanção penal tem uma finalidade educativa já que, conforme o parágrafo único do artigo 48 do CP, deverão ser ministrados durante o tempo em que o apenado estiver cumprindo a limitação cursos, palestras ou , ainda, quaisquer outras atividades educativas, desde que tais ações sejam efetivamente proprocionadas pelo Poder Público.

                   Com efeito, o eminente Cezar Bitencourt,[99] afirma que tal modalidade foi a que menos recebeu aplausos, visto que a sociedade sabia que esta sanção seria inaplicável, pela absoluta falta de infra-estrutura, especialmente de estabelecimentos adequados, como fala a legislação.

3.7       Prestação alternativa inominada 

                   A prestação alternativa inominada está prevista no artigo 45, § 2º, e consiste na possibilidade de o juiz havendo aceitação do condenado, substituir a prestação pecuniária, que se cumpre com o pagamento de dinheiro à vítima, por “prestação de outra natureza”, sendo por isso uma pena substituta da pena substituída (prestação pecuniária). Cezar Bintencourt,[100] afirma que tal substituição tem um caráter consensual, visto que dependerá da aceitação do beneficiário também. Então, consequentemente para que se opere essa troca da natureza da prestação pecuniária para prestação inominada, é necessário ser previamente ouvido o beneficiário.

                   A natureza inominada pode ser uma cesta básica, remédios e outros objetos, sempre que houver, também concordância da vítima.

                   No que tange, a sanção de prestação alternativa inominada, Cezar Bitencourt,[101] apontou sua  inconstitucionalidade por ferir o princípio da legalidade e da taxatividade, uma vez que pode ser qualquer coisa. Em sendo assim, esbarra-se na indeterminação da classe ou modalidade da pena, não oferecendo uma garantia suficiente diante da arbitrariedade.

                   Essa falta de garantia e certeza sobre a natureza, espécie  ou quantidade da prestação, segundo o mestre supracitado caracteriza a mais flagrante inconstitucionalidade. O autor afirma ainda que além desta pena inominada, a Lei 9.099/95, acabou involuntariamente, propiciando a utilização não só de penas indeterminadas, como inclusive, de penas não previstas em lei, como por exemplo, cestas básicas, kit pintura, kit reforma, kit paviflex, kit combustível etc. Vejamos os seus dizeres:

“O entusiasmo com que se tem divulgado a aplicação aqui e acolá da indigitada “cesta básica”, como pena alternativa, tem cegado um grande segmento de aplicadores do direito, que provavelmente, não se dera conta da ilegitimidade de tal modalidade de “pena”. Hoje se viola o princípio secular da reserva legal por um motivo nobre, amanhã, talvez, por um motivo nem tão bobre, depois...bem, depois, quem sabe, pode-se começar a defender que o princípio da reserva legal não é absoluto, que os fins justificam os meios etc (...). E o que é pior a indigitada “cesta básica  é aplicada, literalmente, na maioria daqueles, que na verdade, são necessitados de uma cesta básica, visto que essa é a verdadeira clientela dos Juizados Especiais Criminais, porque a boa classe média-rica dificílmente chega lá e quando chega, está sempre muito bem defendida”.[102]

                   Para o citado mestre, o que deve ser feito em primeiro lugar é não perder de vista o enunciado legal, que exige que  as condições sejam adequadas ao fato e, especialmente, à situação pessoal do acusado. Ou seja, aqueles denunciados, por exemplo que enfrentarem visíveis dificuldades financeiras, para satisfazer tal condição, com prejuízo para o seu sustento e o de sua família, não podem receber esse tipo de condição para a realização da suspensão do processo. Deve  portanto, o Ministério Público e o Juiz buscar outros caminhos, previstos pelas medidas despenalizadoras e descarcerizadoras.

                        Por fim, o mestre indaga ainda que somente a prestação pecuniária pode ser convertida em prestação de outra natureza, a pena de perda de bens e valores e a pena de multa que são da mesma natureza não pode, visto que a pena de perda de bens e valores e a de multa são destinadas para o Fundo Penitenciário e a pecuniária é destinada à vítima. Como se vê continua o velho descaso com o primo pobre do Direito Penal a “vítima”.

3.8       Requisitos necessários para substituição

                   As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade. Tal disposição exige a aplicação da pena privativa de liberdade e só depois é que se fará a substituição se for possível.

                   Sendo assim, deverá o juiz na sentença, procurar substituir a pena privativa de liberdade encontrada por alguma outra pena restritiva de direito, ou pela multa, de acordo com sistemática oferecida pela lei.

                   Na verdade, a pena privativa de liberdade encontrada deve ser usada apenas como índice para a plicação da pena substitutiva. Só se não for mesmo possível a substituição é que se manterá a pena privativa de liberdade.

                        Todavia, o condenado deverá atender alguns requisitos previstos no art.44, I, II, II e seus parágrafos,  para se operar a referida substituição, que se forem atendidos será obrigatória. Vejamos os requisitos:

                   a) limites mínimos e máximos da pena para cada delito estabelecido: o inciso, I, dispõe que só é aplicada a substituição nas penas privativas não superior a  4 (quatro anos), excluídos os crimes com violência ou grave ameaça à pessoa, vez que neste caso só se a pena aplicada for inferior a 1 (um) ano. E nos crimes de natureza culposa, qualquer que seja a pena aplicada. Se a pena for igual ou superior a um ano de detenção, a substituição será por uma pena restritiva de direitos, cabivel na espécie, e uma de multa, ou então por duas penas restritivas de direitos, desde que possam ser executados simultaneamente. E quando a pena aplicada for inferior a 6 (seis) meses de prisão poderá o juiz substituir por pena de multa.

                   b) natureza do crime cometido: aqui exige-se que réu não seja reincidente em crime doloso ou culposo, uma vez que o  inciso II, § 3º, última parte ressalta que não é permitida a substituição se a reincidência tenha se operado em virtude da prática do mesmo crime, ou seja, pode ser doloso ou culposo, não será permitido o benefício. Contudo, o inciso III, § 3º autoriza  ao juiz  aplicar a substituição no caso de reincidência, mas, todavia a substituição só será feita desde que, em face da condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a recindência não se tenha operado em virtude do mesmo crime.

                   d) prognose de suficiência da substituição: tal requisito tem por escopo avaliar a suficiência da medida, através dos critérios: da culpabilidade, antecedentes, conduta ou personalidade ou ainda os motivos e as circunstâncias recomendem a substituição.

                   Cabe lembrar ainda que, a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos também pode ser feita pelo juiz da vara de execução penal, conforme disposição do art. 180, incisos. I, II, II, da Lei 7.210/84 da Execução Penal,  ocorrendo com isso o fenômeno chamado incidente de execução.

                   Com efeito, o juiz da vara de execução penal, para realizar a conversão da pena privativa pela restritiva,  também deve analisar alguns requisitos, previstos no art.180, I, II e II, da (LEP). A saber: a) o condenado a esteja cumprindo em regime aberto;  b) tenha cumprido pelo menos ¼ (um quarto) da pena; c) os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão recomendável”.[103]

                   Ressalte-se que, os requisitos exigidos, seguem a mesma filosofia adotada para as hipóteses de substituição das penas privativas de liberdade no momento da sentença.

3.9       conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade

                   Para assegurar a eficácia das penas restritivas de direitos, as quais dependem em grande parte da autodisciplina e do senso de responsabilidade do sentenciado, era portanto, indispensável dotá-las de coercibilidade.

                   Por esta razão,  nada melhor que a previsão da possibilidadede convertê-la em pena privativa de liberdade. Sendo que a finalidade da conversão, é garantir o êxito das penas alternativas preventivamente com a ameça da pena privativa de liberdade, e repressivamente, com a efetiva conversão no caso concreto.

                   Com efeito, o nosso Código Penal regula as causas obrigatórias de conversão no (art. 44, III, § 4º, § 5º). Quais sejam[104]:

                   a)  descumprimento injustificado da restrição imposta;

                   b) nova condenação por outro crime, aqui não importa se a nova condenação se refira a crime anterior à primeira condenação ou praticado durante o cumprimento da pena. 

                   Observe que na hipótese de nova condenação, por outro crime, poderá haver duas alternativas: uma obrigatória e outra facultativa.         A conversão será obrigatória, se houver incompatibilidade no cumprimento das duas condenações, a anterior e a nova, isto é, se não for possível o cumprimento simultâneo das duas condenações. Com efeito, se a nova condenação for suspensa ou substituída, admitisse a manutenção da pena substitutiva anterior.

                   Em que pese, a Lei de Execução Penal, no art.181, §§ 1º a 3º, prevê outras causas de conversão, específicas, para cada modalidade de pena restritiva. São elas:

                   a) Prestação de serviço à comunidade: será convertida  quando o condenado, infringir o  ( art.181, § 1º): não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido, ou desatender a intimação por edital; não comparecer, injustificadamente à entidade ou programa em que deva prestar serviço; recusar-se, injustifcadamente, a prestar o serviço que lhe foi imposto; praticar falta grave; sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa.

                   b)  Limitação de fim de semana: será convertida quando, for infringido o  § 2º, isto é, o condenado não comparecer  ao estabelecimento designado para o cumprimento da pena; se recusa exercer a atividade determinada pelo juiz; e quando ocorrer qualquer das hipóteses das letras “a”, “d” e “e” do parágrafo §1º;

                   c) Interdição temporária de direitos: será convertida quando o condenado, infringir o ( § 3º), ou seja, praticar injustificadamente, o direito interditado; e quando ocorrer qualquer das hipóteses das letras “a” e “e”, do § 1º, do artigo 180 da LEP“.[105]

                    Não podemos nos olvidar, de que o art.182 da LEP, que dispõe sobre a conversão da pena de multa em detenção, bem como o art.50 do Código Penal, foram revogados pela lei nº.9.268/96, que proíbe sua conversão em privativa de liberdade. Dessa forma a pena de multa depois da sentença transitada em julgado será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, devendo, portanto ser executada.

                    Portanto, verificado o descumprimento ou nova condenação, conforme dito acima,  estando o réu no período de cumprimento da pena restritiva  ocorrerá o que se chama de incidente de execução, uma vez que caberá ao juiz da vara de execução penal adotar as providências previstas na Lei de Execução Penal (7.210/84), em seu art. 118, § 2º, afim de propiciar ao condenado a oportunidade de informar as razões do não atendimento, e com isso, eventualmente possibilitar a continuidade da execução.Vejamos as disposições do referido artigo:

“Art.118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado: I - praticar fato definido como crime doloso ou falta grave; II - sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena execução, torne incabível o regime (art.111). § 1º. O condenado será transferido do regime aberto se, além das hipóteses referidas nos incisos anteriores, frustrar os fins da execução ou não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta. § 2º Nas hipóteses do inciso I e do parágrafo anterior, deverá ser ouvido previamente o condenado”.[106]

                   Cabe observar ainda que, a  pena privativa de liberdade substituída terá o prazo do tempo que restar por cumprir da restritiva de direitos, aplicando o princípio da detração penal art.42 do CP. Levando sempre em conta o prazo mínimo de 30 (trinta) dias de cumprimento de pena alternativa para aplicar a detração penal.

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Sobre a autora
Neudimair Vilela Miranda Carvalho

Advogada há 8 anos, especialista em Direito Civil, Trabalho e Previdenciário pela Universidade Anhanguera - Uniderp. Exercendo as atividades de correspondente jurídico, consultoria Jurídica, atendimento ao cliente, elaboração e revisão de contratos, interposição de ações, requerimentos, pareceres, recursos, defesas, impugnações, audiências de conciliação de instrução, instrução de testemunhas, prepostos, perícias em geral, acompanhamento de processos judicias e administrativos em primeiro e segundo grau, diligências em geral em órgãos públicos, mediação, conciliação, homologação de acordos, reuniões sindicais, procedimentos administrativos junto ao MPT, DRT, INSS, Prefeitura e órgãos públicos em geral, orientação e acompanhamento de estagiários.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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