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Tutela penal dos interesses difusos

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29/11/2004 às 00:00
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5. A Tutela Penal dos Interesses Penais Difusos:

A tutela penal dos interesses difusos, devido às características típicas e diferenciadas destes, exige todo um tratamento também diferenciado da criminalidade, o que implica em mudanças adaptativas profundas no sistema penal.

Na sociedade globalizada em que vivemos observamos um aumento crescente de crimes de natureza econômica e ambiental praticados por empresas, sendo que estas, em face da presente realidade mundial, apresentam uma preocupante desnacionalização e despersonalização dos fenômenos que lhes concernem.

A fim de trabalhar com esta realidade, o Direito Penal teve de criar teorias quanto à responsabilidade penal da pessoa jurídica, dentre as quais traremos para este trabalho as três que entendemos principais.

A primeira teoria é a que não admite a responsabilização penal das pessoas jurídicas, posto que, se são elas pura ficção legal, não podem ser verdadeiramente responsabilizadas penalmente. Entende que tal responsabilidade penal deverá recair sobre os homens cuja vontade conjugada fez nascer a ficção legal pessoa jurídica.

Esta teoria se fundamenta no seguinte argumento: se as pessoas jurídicas somente podem atuar no mundo dos fatos através de seus órgãos humanos, nunca pessoalmente, então não podem elas ser apenadas, mas apenas aqueles que são seus órgãos. [35]

A segunda teoria ora estuda é a que prega a responsabilização da pessoa jurídica por meio de medidas especiais, não penais. Seus argumentos são praticamente os mesmos acima, todavia admitindo a existência de um meio termo entre o Direito Penal e o Direito Administrativo, denominado Direito de Intervenção.

Para esta teoria, como não é possível a aplicação de sanções graves, tais como as privativas de liberdade, aos entes morais, a eles devem ser aplicadas, por via do Direito de Intervenção, que faça aquele meio termo, medidas especiais, tais como: dissolução da entidade, intervenção na empresa, fechamento desta, suspensão de atividades, proibição da realização daqueles no futuro, etc. [36]

A terceira teoria é a que reconhece a responsabilidade penal da pessoa jurídica, o que pressupõe a criação de todo um novo sistema teórico a possibilitar tal posicionamento.

Esta posição doutrinária se baseia na teoria da realidade da pessoa jurídica, donde possuir ela vontade própria, distinta e independente dos membros que a constituem, mas que, por possuir peculiaridades próprias distintas da ação humana, faz imprescindível uma análise diferenciada do dolo e tipicidade de sua conduta. [37]

Nossa Carta Magna prevê expressamente, no seu art. 225, § 3º, a possibilidade de aplicação de sanções penais a pessoas jurídicas, e assim o Direito Penal pátrio não pode se esquivar ao reconhecimento da capacidade penal daquelas pessoas.


6. Conclusão:

Por tudo quanto dito acima, podemos observar que hoje ainda não existe questão fechada no que tange aos direitos penais difusos e a forma pela qual devam receber proteção jurídica. Todavia, não se questiona a necessidade premente de se buscar garantir tutela jurídica e jurisdicional àqueles direitos.

Mais uma vez convém ressaltar que, sendo função do Direito a regulamentação dos hábitos e atividades sociais, compete-lhe, diante da natural contínua evolução a que estão sujeitas as sociedades humanas, acompanhar-lhe os movimentos evolucionários através de alterações das regras jurídicas existentes ou da criação de novas interpretações para aquelas.

Se atualmente as sociedades, em decorrência das evoluções tecnológicas que minimizaram a interação tempo-espaço, passam a apresentar uma conflituosidade até então desconhecida do Ordenamento Jurídico, deverá este, indubitavelmente adaptar-se através da criação de novas regras jurídicas ou da adaptação das pré-existentes àquelas novas exigências.


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Notas

1 COSTA, José Francisco de Faria. O Perigo em Direito Penal. Coimbra: Coimbra Editora, 1992

2 DAZA, Abrahan Pérez. El Derecho Penal ante la Globalización. Instituto de Ciencias Jurídicas de Egresados de la UNAM, Campus Aragón A.C. 2001. <http://www.tepantlato.com.mx/biblioteca/tepantlato_19/el_derecho.htm>. acessado em: 02 out. 2003.

3 Estefania, Joaquim. La nueva economia: a globalización. 4ª ed., Madrid: Temas de Debate, 2000, p. 11.

4 KAUFMANN, A. Filosofia del derecho. Universidad Externado de Colombia, Bogotá: Colombia. 1999, p. 529.

5 PAZ, Maria Isabel S.G de. El moderno derecho penal y la antecipación de la tutela penal. Valladolid: Universidad de Valladolid, 1999, p. 83.

6 Feijoo Sánche, B. El principio de confianza como critério normativo de imputación em el derecho penal: fundamento y consecuencias dognáticas. Revista de Derecho Penal y Criminologia, 2ª Época, nº extraordinário 1, Madrid: Espana, 2000, p. 94.

7 COSTA, José Francisco de Faria. O Perigo em Direito Penal. Coimbra Editora: Coimbra. 1992, p. 482.

8 DIAS, Jorge de Figueiredo. Questões Fundamentais do Direito Penal. São Paulo: RT, 1999, p. 81.

9 COSTA, José Francisco Faria da. O Perigo em Direito Penal. Coimbra Editora: Coimbra. 1992, p. 50.

10 GUIRAO, Rafael Alcacer. La Protección del Futuro y los Daños Cumulativos. Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminologia, Universidad de Granada: España. <http://criminet.ugr.es/recpc/recpc_04-08.html> acessado em 23 agosto 2002.

11 Silveira, Renato de Mello Jorge. Direito penal supra-individual: interesses difusos. Ciência do Direito Penal Contemporâneo, v. 3, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 33.

12 SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.67.

13 POLAINO NAVARRETE, Miguel. El bien jurídico en derecho penal. Sevilla: Publicaciones de la Universidad de Sevilla, 1974, p. 34.

14 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. v. 1, t. 2, 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 10; BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral. v. 1, t. 2, 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p.212; NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. v. 1, 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 1974, p. 109; JESUS, Damásio Evangelista. Direito penal. v. 1, 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 159.

15 FIGUEIREDO DIAS, Jorge de. Questões fundamentais de direito penal revisitadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.62.

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16 SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.93.

17 Silveira, Renato de Mello Jorge. Direito penal supra-individual: interesses difusos. Ciência do Direito Penal Contemporâneo, v. 3, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 54-56.

18 NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Aide, 1991, p. 101-111, apud ALMEIDA, João Batista. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 149.

19 SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.19.

20 PRADE, Péricles. Conceito de interesses difusos. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p 39-58, apud ALMEIDA, João Batista. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 23-24.

21 GRINOVER, Ada Pellegrini. A problemática dos interesses difusos. In GRINOVER, Ada Pellegrini (Coord.). A tutela dos interesses difusos. São Paulo: Max Limonad, 1984, p. 30.

22 BASTOS, Celso. A tutela dos interesses difusos no direito constitucional brasileiro. Revista de Processo, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 6, n. 23, jul./set., 1981, p. 41-42.

23 STJ, Resp nº 49.272-6, RS, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, j. 21.9.1994.

24 PRADE, Péricles. Conceito de interesses difusos. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p 39-58, apud ALMEIDA, João Batista. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 23-24.

25 MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. São Paulo: Saraiva. 1996, p. 7.

26 SOUSA, Miguel Teixeira. A tutela jurisdicional dos interesses difusos no direito português. <http://www.judidium.it/archivio/teixeira01.html>, acessado em 22 agosto 2003.

27 BENJAMIN, Antonio Herman V. A insurreição da aldeia global contra o processo civil clássico. In Ação civil pública – Lei 7.347/85 – reminiscências e reflexões após dez anos de aplicação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 90.

28 PRADE, Péricles. Conceito de interesses difusos. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p 47-58; MIRRA, Álvaro Luiz Valery. A coisa julgada nas ações para tutela de interesses difusos. Revista dos Tribunais, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 631/71-82, 1988, p.73. apud SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.27.

29 CAPPELLETTI, Mauro. Formações sociais e interesses coletivos diante da justiça civil. Revista de Processo, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 2, n. 5, jan./mar. 1977, p. 131-136.

30 MIR PUIG, Santiago. Derecho penal: parte geral. 5ª ed., Barcelona: Reppertor, 1998, p. 135, in SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.106.

31 REALE JR., Miguel. Novos rumos do sistema criminal. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p.214; FERREIRA, Ivete Senise. A tutela penal do patrimônio cultural. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 67.

32 SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.108.

33 Silveira, Renato de Mello Jorge. Direito penal supra-individual: interesses difusos. Ciência do Direito Penal Contemporâneo, v. 3, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 66.

34 SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.84.

35 JESCHECK, Hans-Heinrich. Tratado de derecho penal: parte general. Trad. José Luis Manzanares Samaniego. Granada: Comares, 1993, p. 205; DOTTI, René Ariel. A incapacidade criminal da pessoa jurídica. Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 11, 1995, p. 201; DUEK MARQUES, Oswaldo Henrique. A responsabilidade da pessoa jurídica por ofensa ao meio ambiente. Boletim IBCrim, nº 65, edição especial, 1998, p. 7.

36 MIR PUIG, Santiago. Derecho penal: parte general. 5ª ed., Barcelona: Reppertor, 1998, p. 174.

37 SAMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela penal dos interesses difusos. São Paulo: Atlas, 2000, p.121 e ss.

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Sobre a autora
Rosana Ribeiro da Silva

advogada em Moji Mirim (SP), mestranda em Direito Processual Civil na Universidade Paulista (UNIP), professora de Direito na Fundação de Ensino "Octávio Bastos" (FEOB)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Rosana Ribeiro. Tutela penal dos interesses difusos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 510, 29 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5980. Acesso em: 16 nov. 2024.

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