O artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prevê que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.
E diferentemente da assistência judiciária, que se limita ao processo judicial, a assistência jurídica tratada pela Constituição engloba a proteção na esfera extrajudicial.
Neste ponto, importante inovação da Constituição foi a criação da Defensoria Pública, à qual, por força do artigo 134, incumbe a prestação de assistência jurídica integral e gratuita, na forma daquele artigo 5º, inciso LXXIV.
Portanto, dizer que os necessitados têm direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita é dizer que eles têm direito fundamental à Defensoria Pública. Esta, pela norma de extensão do artigo 134 da Constituição, está inserida no rol de direitos e garantias fundamentais, sendo um direito individual e coletivo, um direito humano, uma cláusula pétrea do povo “heroico o brado retumbante”.
Acontece que, ignorando a opção do constituinte pela Defensoria Pública e – mais do que isso – a determinação da presença de defensores públicos em todas as Comarcas até 2022, o Governo do Estado do Espírito Santo tem gastado cada vez mais o dinheiro público com advogados dativos.
Apenas para esclarecer, o advogado dativo é aquele nomeado pelo magistrado em razão da falta de Defensor Público, para prestar assistência judiciária, que se limita ao processo, não humanizada, diferentemente da assistência jurídica integral e gratuita prestada pela Defensoria Pública, que é extraprocessual, além de organizada institucionalmente.
Facilmente perceptível, o advogado dativo, um verdadeiro arremedo de defensor público, é a válvula de escape do Governo capixaba no cumprimento de sua meta de pôr fim aos processos proporcionando contraditório e ampla defesa. Triste ilusão! Não existem critérios transparentes para a nomeação dos dativos pelos magistrados, tampouco fiscalização sobre a sua atividade, que por vezes se limita a sentar ao lado do cidadão.
Já a Defensoria Pública está no sistema de pessoas para servir justiça, e não no Sistema de Justiça para servir pessoas, tampouco autoridades. Essa é a verdadeira virada de Copérnico da Constituição de 88, ainda não assimilada pelo Governo Estadual. A Defensoria é uma carreira institucionalizada, que conta com Corregedoria e previsão de Ouvidoria Externa. O cidadão sabe aonde buscar orientação, com quem contar na luta pelos seus direitos e a quem reclamar no caso de falha do serviço.
O fato é que, a Defensoria Pública tem um potencial infinito que já não cabe mais no conceito de assistência jurídica, que por sinal – frise-se – já é muito maior que o de assistência judiciária, prestada pelos dativos. O papel da Defensoria perpassa – e muito – estes conceitos, revelando-se um grande ativo financeiro por parte de qualquer governo que realmente pretenda construir uma sociedade mais livre, justa e solidária.
Isto porque, justiça não é exclusividade do Poder Judiciário. Dizer o Direito o é. Justiça está no coração das pessoas, e a Defensoria Pública, por meio da solução extrajudicial de conflitos, da educação em direitos e da difusão e conscientização dos direitos humanos e cidadania, é a grande contribuição do legislador constituinte de 1988 para que a justiça seja cada vez mais despertada no coração das pessoas.
O problema todo é que, o gasto com advogados dativos é crescente e parece descontrolado no solo espírito-santense. Não há verdade nos números apresentados, pela fata de domínio. Há advogados dativos ganhando muito mais que advogados que não conseguem atuar como dativos e, o pior, muito mais que defensores públicos. A verdade é que, todo o dinheiro público aplicado em dativos é um desperdício, diferentemente de qualquer dinheiro aplicado na Defensoria Pública, que é um grande investimento.
O mais curioso disso tudo é que, o discurso padrão, fechado, de arrocho financeiro, de austeridade fiscal, frequentemente repetido aos quatro cantos do Estado do Espírito Santo desde 2015, não passa de um discurso meramente retórico, afinal de contas, em termos de assistência jurídica, o Governo vem gastando muito mais e muito mal o dinheiro do contribuinte, fingindo que oferece Defensoria Pública aos necessitados. Triste realidade de 80% da população capixaba!
Mas, enfim, o que esperar de um governo dativo, que faz o mínimo necessário para o cidadão, quando na verdade deveria fazer o máximo possível? Serviços dativos, advogados dativos, gastos dativos, contas dativas, finanças dativas, gestão dativa...