A apreciação de provas obtidas na investigação antes do oferecimento da denúncia

14/09/2017 às 10:09
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O artigo discute sobre o momento apropriado para o juízo de admissibilidade da denúncia.

O Supremo Tribunal Federal (STF) não concluiu no dia 13.9.2017 o julgamento o pedido da defesa do presidente Michel Temer para que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, só apresente eventual denúncia contra o peemedebista depois que terminar a investigação sobre os novos áudios dos delatores da JBS.

O julgamento será retomado apenas na próxima semana quando Janot já tiver deixado o cargo. Entretanto, isso não deve impedir que Janot apresente denúncia contra Temer ao STF até o fim desta semana.

Segundo o site da PGR tem-se: 

"O vice-procurador-geral da República, Nicolao Dino, defendeu no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (13), a rejeição da questão de ordem suscitada pela defesa do presidente da República, Michel Temer, no Inquérito 4483. A defesa busca a sustação do andamento de eventual nova denúncia apresentada contra o presidente da República até a conclusão de investigações e análise do agravo regimental na Arguição de Suspeição 89. O julgamento foi suspenso após as sustentações orais, sem definição da data em que será retomado. 

Em sustentação oral, Nicolao Dino destacou que o Supremo aprecia esta questão de ordem logo após a rejeição em grau de recurso da arguição de suspeição em desfavor do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Segundo ele, “ausente a suspeição, o ponto atinente à inviabilidade da atuação do procurador-geral da República neste inquérito parece cair por terra”.

Sobre os aspectos referentes às provas, ele apontou que a sociedade brasileira tem conhecimento do que se deu em relação à produção das provas, a partir do acordo de colaboração premiada. “O procurador-geral da República foi ludibriado. Houve omissão de informações em relação à formulação do acordo de colaboração premiada. Esse é um dado público e desse fato foram, estão sendo e serão extraídas consequências jurídicas sérias e passará, inclusive, pelo crivo do Supremo Tribunal Federal”, destacou.

Para Nicolao Dino, a questão da ilicitude da prova no grau de profundidade exigido pela defesa “parece demandar ou pressupor o próprio exame dessa prova”. E questionou: “A Corte Suprema fará isso no bojo de uma questão de ordem? Nos estreitos limites de uma questão de ordem?”.

O vice-PGR argumenta que “há uma antecipação do juízo de admissibilidade de uma futura e eventual denúncia sequer proposta”. Ele ainda recordou que, se a denúncia vier a ser proposta, passará, num primeiro momento, pelo juízo jurídico-político de admissibilidade da Câmara dos Deputados, nos exatos termos da Constituição. “Somente após o exercício desse juízo jurídico-político é que o Supremo Tribunal Federal irá se debruçar para a realização do juízo de admissibilidade do aspecto estritamente técnico-jurídico de uma futura e eventual ação penal”, apontou.

Ora, o Ministério Público tem o "poder de ação", e o Juiz o "poder jurisdicional". Como ensinou Carnelutti, "jurisdicto denota el resultado al que el juicio tiende, que és de jus dicere del judex, o sea su respuesta a las preguntas de las partes em cuanto que la acción és essencialmene desarollo de um interés" (Lecciones, volume II, pág. 55). 

Se o Ministério Público é o dominus litis, ele pode e deve apreciar a viabilidade da ação penal que ajuíza. 

Se o Parquet ajuizar a ação e o Judiciário entender que há ilicitude de provas, caberá a este rejeitar a ação, fazendo um juízo de admissibilidade da denúncia, que, para os autores, tem o caráter de um juízo de delibação.  

Mas essa apreciação se dá a posteriori. 

O  trancamento de denúncias é de fato algo realmente extraordinário, mas que ocorre na análise de habeas corpus em que se verifica situações excepcionais, como abuso de poder. Não é, pois, num incidente como uma questão de ordem, que a matéria deva ser analisada. 

O  teor do pedido serve para “obstaculizar” o trabalho do MP. 

Não cabe ao Judiciário apreciar antecipadamente se cabe ou não ao Parquet ajuizar ação penal pública. Pois, do contrário, isso seria um absurdo, a criar uma estranha e inconstitucional condição de procedibilidade. 

Incabível, pois, essa antecipação do juízo de admissibilidade antes do oferecimento da denúncia. 

 A questão da rescisão do acordo de delação premiada e sua extensão, a manutenção de provas colhidas durante a investigação, tudo isso é matéria a ser discutida quando do recebimento da denúncia. 

Se o STF considerar que as provas obtidas na delação são nulas, tem que ver se uma eventual denúncia contra Temer será embasada exclusivamente nesta delação ou se terá provas independentes. A regra é que a invalidez das provas não alcança fonte independente, ou seja, provas cuja origem não se confunde com as provas invalidadas ou que teriam sido obtidas de qualquer forma. 

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

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