5. DAS CAUSAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
Se o profissional de saúde comete erro grosseiro ou manifesto, deve o mesmo ser compelido a indenizar o paciente lesado. Nada mais justo. Existem causas, porém, que se verificadas, eximem o profissional de saúde de culpabilidade, ensejando a improcedência de uma ação de indenização eventualmente proposta: são as chamadas causas excludentes de responsabilidade.
Jerônimo Romanello Neto[13], citando Kirmser, enumera algumas causas que eximem a responsabilidade do profissional de saúde: iatrogenia, estado de necessidade, obediência de vida, cumprimento de um dever legal e exercício regular de um direito, erro e ignorância, caso fortuito e força maior, dispensa de culpa, culpa do enfermo e culpa concorrente. Tal enumeração, porém, não é taxativa, e sim exemplificativa, podendo surgir outras causas do mesmo tom ao longo do desenvolvimento da ciência, do direito, e da análise do caso concreto pelo magistrado.
Ainda que haja controvérsia doutrinária e jurisprudencial acerca de um ou mais dos motivos supra (há autores, v.g., que entendem que a culpa concorrente não exime completamente o dever de indenizar do profissional de saúde, apenas reduz tal obrigação; que entendem que apenas as iatrogenias de caráter lícito têm o condão de eximir o profissional da responsabilidade[14] etc.), o fato é que mesmo que haja o dano, o nexo causal entre a lesão e a conduta do profissional, e a verificação da culpa deste (nos casos de obrigação de meio), exime-se a obrigação de indenizar se presentes uma ou mais das causas excludentes de responsabilidade.
6. CONCLUSÃO
Diante do exposto, concluímos que a obrigação do profissional de saúde pelos seus atos profissionais (aí incluído consultas, tratamento, cirurgias, diagnósticos, curativos etc.) pode ser de meio ou de resultado, devendo-se sempre analisar de forma concreta o procedimento do profissional de saúde realizado e o acordo pactuado entre este e o paciente, para se definir qual forma obrigacional deve ser aplicada na medição da responsabilidade civil profissional.
Dependendo da caracterização supra, poderá ser aplicada tanto a teoria da responsabilidade civil objetiva (ou teoria do risco), quanto a teoria subjetiva nas ações indenizatórias visando o ressarcimento dos danos morais, patrimoniais ou estéticos, causados pelo chamado erro profissional. Dessa forma, para que o médico, dentista, enfermeiro, fisioterapeuta etc. seja compelido a ressarcir os danos a que deu azo, mister se faz a presença dos três pressupostos da responsabilização: o dano, o nexo causal entre tal lesão e a conduta do profissional de saúde, e a existência de culpa.
Ocorre que nesses processos é possível que o Juiz inverta o ônus da prova, se verificada a verossimilhança da alegação do paciente ou sua hipossuficiência técnica ou econômica, fato que deve ser analisado no caso concreto, atendendo-se sempre ao princípio da razoabilidade.
Assim, a posição do profissional de saúde no processo indenizatório pode torna-se bastante delicada, pois o mesmo é quem terá o ônus, nesses casos, de provar que é inocente, ou que não houve nexo causal entre sua conduta e a lesão etc.
Necessário se faz, portanto, que os referidos profissionais liberais sejam "reeducados", no sentido de proteger-se documentalmente, antes mesmo de uma ação indenizatória, nos moldes do ordenamento jurídico vigente, de forma a facilitar a prova de sua inocência na instrução processual de um eventual procedimento de indenização a seu desfavor.
Finalizando, sobrelevamos que cabe ao Magistrado responsável pela causa coibir as extrapolações processuais daqueles pacientes que ingressam com um processo contra determinado profissional visando apenas o enriquecimento ilícito. Deve prosperar, nesses casos, os escólios do Prof. Washington de Barros Monteiro, no sentido de que "ao direito compete distinguir, cuidadosamente essas miragens de lucro, de que falava Derburg, da verdadeira ideia de dano"[15].
7-NOTAS
1.PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1989, p. 162;
2.DIREITO, Carlos Augusto. "Responsabilidade médica nas cirurgias estéticas", in www.solar.com.br/~amatra/carlosgustavo_1.html;
3.STOCO, Rui. Iatrogenia e Responsabilidade Civil do Médico. in RT 784/105;
4.BRUNO, Aníbal. Direito Penal – Parte Geral – v. I. Rio de Janeiro: Forense, 2ª ed., 1978, p. 13;
5.MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil – v. 4. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 54;
6.MONTEIRO, Whashington de Barros. Ob. cit., p. 54;
7.Idem;
8.Nota do Autor: Alguns autores entendem, porém, que a obrigação do médico é extracontratual ou aquiliana, por causa da localização do art. 927 do Código Civil na parte que versa sobre as obrigações por atos ilícitos. Tal caracterização, porém, é irrelevante, pois substancialmente a obrigação contratual e a aquiliana geram os mesmos efeitos civis.
9.Culpabilidade do Médico e a "Lex Artis", in RT 695/427, apud CASABONA, Carlos Maria, La Actividad Curativa (Licitud y Responsabilidad Penal), Barcelona: Ed. Boch, Casa Editorial S.A., 1981, p. 71;
10.Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: RT, 2ª edição revista e ampliada, 1999, p. 81;
11.Curso de Direito Civil Brasileiro – Obrigações e Contratos. São Paulo: RT, 2000, p. 582;
12.TJSP – Ap. Cív. 204.430-1 – São Paulo – p. 24.05.94;
13.Responsabilidade Civil dos Médicos. São Paulo: Ed. Jurídica Brasileira, 1998, p. 39;
14.STOCO, Rui, ob. cit.;
15.MONTEIRO, Washington de Barros. Ob. cit., p. 386.
8- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRUNO, Aníbal. Direito Penal – Parte Geral – v. I. Rio de Janeiro: Forense, 2ª ed., 1978;
DIREITO, Carlos Augusto. Responsabilidade médica nas cirurgias estáticas, in www.solar.com.br/~amatra/carlosgustavo_1.html;
KFOURI NETO, Miguel, Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais: 2ª edição revista e ampliada, 1999;
LIMA, Gilberto Baumann de. Culpabilidade do Médico e a "Lex Artis", in RT 695/427;
MONTEIRO. Washington de Barros. Curso de Direito Civil – v. 4 – Obrigações – 1ª Parte. São Paulo: Saraiva, 1997;
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1989;
ROMANELLO NETO, Jerônimo. Responsabilidade Civil dos Médicos. São Paulo: Ed. Jurídica Brasileira: 1998;
STOCO, Rui. Iatrogenia e Responsabilidade Civil do Médico. in RT 784/105;
WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro – Obrigações e Contratos. São Paulo: RT, 2000.